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Sobre a importância do protocolo e a impossibilidade de ele ser negado pelo oficial de registro

Sobre a importância do protocolo e a impossibilidade de ele ser negado pelo oficial de registro

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São atributos do registro, segundo FARIAS & ROSENVALD (2006: 246-258), a constitutividade, a prioridade (ou preferência), a força probante, a continuidade, a publicidade, a legalidade e a especialidade.

No que se refere ao Livro 1 dos Registros de Imóveis, Livro do Protocolo, importa o estudo da prioridade ou preferência.

A máxima do prior in tempore prior in jure vale para a prioridade registral. Estabelece que quem primeiro apresentou os títulos para buscar a inscrição de seus direitos recebe proteção em relação a títulos contraditórios ao seu direito, caso estes sejam apresentados posteriormente ou até simultaneamente aos seus títulos (art. 186, LRP).

Percebe-se, então, a importância do protocolo do Registro de Imóveis, pois é a prenotação em primeiro lugar no Livro do Protocolo que estabelece a prioridade protetora dos direitos do interessado. Vale ressaltar que a data do protocolo será, caso gerado algum ato registral, o termo inicial da oponibilidade a terceiros e da publicidade (2006: 247). Isso porque, como se sabe, protocolizados os títulos, possui o registrador 30 dias para analisá-los e proceder ao registro, salvo as exceções previstas em lei (art. 188, LRP). Ou seja: se for gerado um ato registral, sua eficácia retroagirá à data do protocolo do título, mesmo que tal ato registral só tenha sido feito vários dias depois da protocolização.

Dada a importância do protocolo como requisito para assegurar direitos dos interessados, a própria Lei de Registros Públicos cria mecanismos que impedem o registrador de recusar protocolo a títulos que lhe forem apresentados. É o que se conclui da leitura do art. 12, art. 174 e art. 182, da LRP, abaixo citados:

Art. 12. Nenhuma exigência fiscal, ou dívida, obstará a apresentação de um título e o seu lançamento do Protocolo com o respectivo número de ordem, nos casos em que da precedência decorra prioridade de direitos para o apresentante.

Parágrafo único. Independem de apontamento no Protocolo os títulos apresentados apenas para exame e cálculo dos respectivos emolumentos.

Art. 174 - O livro nº 1 - Protocolo - servirá para apontamento de todos os títulos apresentados diariamente, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 12 desta Lei. (Renumerado do art. 172 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

Art. 182 - Todos os títulos tomarão, no Protocolo, o número de ordem que lhes competir em razão da seqüência rigorosa de sua apresentação. (Renumerado do art. 185 com nova redação pela Lei nº 6.216, de 1975).

Vale frisar que o art. 12 impede que até mesmo as exigências fiscais ou a existência de dívidas obstem o lançamento no protocolo de títulos cuja prioridade interesse para o apresentante.

No Brasil a efetivação do registro é vinculada à legitimidade do título ou da causa jurídica da aquisição. Sendo assim, a legitimidade precisa ser apurada para que não se façam registros nulos, anuláveis ou ineficazes. É por isso que a lei 6.015/73 concede 30 dias de prazo, após apresentação dos documentos, para que o registro venha a ser efetuado. Este prazo não é fatal e pode ser estendido de acordo com as necessidades do caso concreto. Sendo assim, se não houvesse a imediata protocolização dos títulos apresentados, injusta se tornaria a busca de averiguação da legitimidade. Afinal esta traria prejuízo à parte, por retardar a aquisição da prioridade resultante da ordem de apresentação no protocolo.

Tem-se, portanto, como função do protocolo, marcar a apresentação do título, a fim de que o exame da legitimidade não prejudique a prioridade com o eventual ingresso de outro título conflitante. Nas claras palavras de AFRANIO DE CARVALHO (1998: 316), "a prenotação do título no protocolo serve para obviar esse risco e antecipar a eficácia da inscrição, fazendo-a valer antes de ser materialmente escriturada no livro próprio."

Conclui-se, portanto, que não cabe ao Cartório obstar o protocolo de nenhum título, pois isso poderia prejudicar, fatalmente, o apresentante. A recepção e prenotação dos títulos apresentados têm que ser feitas, sendo a fase de seleção dos títulos como inscritíveis ou não posterior ao protocolo. Este, porém, não pode deixar de abranger os títulos apresentados, sob alegação de que não gerariam ato registral.

AFRANIO DE CARVALHO (1998: 320) divide essa mesma opinião. Para o autor:

"Assim, a porta do protocolo acha-se franqueada a todos os títulos que aspirem prioridade, não podendo fechar-se a nenhum deles sob pretexto algum. Na entrada não há discriminação, à vista do incisivo mandamento, segundo o qual ‘todos os títulos tomarão, no protocolo, o número de ordem que lhes competir em razão da seqüência rigorosa de sua apresentação’ (art. 182)."

Prossegue esclarecendo que só depois de dado o número de ordem aos títulos no protocolo é que caberá começar o exame de sua legalidade. Defende, ainda, com muita clareza, que o protocolo deve ser feito ainda que o serventuário do Cartório entenda que aquele título não dará origem a nenhum ato registrável (1998:320):

"Ainda que um serventuário do cartório, ou circunstante, insinue que o título não é registrável, isso não deve deter o apresentante, visto como, se realmente não o for, o registrador, após a prenotação, fará a exigência cabível ou levantará a dúvida, sem prejuízo da prioridade que já então estará assegurada."

Essa mesma opinião é abraçada por FARIAS & ROSENVALD (2006: 247), os quais ensinam que apenas o exame de legalidade, mas não o número de protocolo, ficará obstado caso títulos incompatíveis sejam protocolados posteriormente a outro título anterior:

"Note-se que (segundo o art. 186 da LRP) o título posteriormente remetido ao Registro Geral Imobiliário também será protocolizado, mas não sofrerá qualquer exame de legalidade, enquanto aquele que recebeu o número de ordem preferencial não for avaliado." (grifo acrescido)

Ou seja: todos os títulos têm que ser protocolizados, mas, se houver contradição entre eles, examina-se a legalidade pela ordem de protocolização. Afinal, isso garantirá que o registro ou a averbação feitos será do título que primeiro foi apresentado.

Essa opinião é acertada, vez que o protocolo é uma formalidade essencial para a existência de prioridade. Inscrição feita sem prenotação dos títulos no protocolo é nula (CARVALHO, 1998: 320). Sendo assim, vez que o exame de legalidade se estende no tempo, é direito do apresentante garantir seu direito à prioridade por meio da imediata protocolização. A prioridade não pode ser obstada por antecipação daquilo que a lei dá 30 dias para ser feito: a decisão final quanto à feitura do ato registral.


REFERÊNCIAS BIBIOGRÁFICAS

BRASIL, Lei 6.015, de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os registros públicos e dá outras providências. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6015.htm>. Acesso em: 04 abr. 2007.

CARVALHO, Afrânio de. Registro de Imóveis. 4ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998.

FARIAS, Cristiano Chaves de. ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 3ª ed. Rio de Janeiro: Lumen Iuris, 2006.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GARCIA, Raquel Duarte. Sobre a importância do protocolo e a impossibilidade de ele ser negado pelo oficial de registro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 13, n. 1741, 7 abr. 2008. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/11129. Acesso em: 26 abr. 2024.