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Universalidade do acesso e gratuidade do ensino superior

Universalidade do acesso e gratuidade do ensino superior

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1. O PORQUÊ DO PRESENTE ESTUDO

O meu interesse acadêmico e a busca pela moralidade pública e pelo conhecimento servem como molas propulsoras da produção do presente artigo, até porque o tema se aproxima da minha pessoa tanto no campo da minha atividade como Procurador Federal, bem como no da minha titulação acadêmica.

Ingressei no serviço público para cursar Escola de Especialistas da Aeronáutica no ano de 1.986. Entretanto, não concluí o curso e estudei na Academia Policial Militar do Guatupê, em São José dos Pinhais, Estado do Paraná, onde fui declarado Aspirante a Oficial, em 1.989. Meu interesse acadêmico foi determinante nas minhas escolhas, daí ter cursado Direito, bacharelando-me em 1.994.

A docência sempre me interessou, sendo que iniciei o magistério superior em 1.995, do qual não me afastei mais. Entretanto, sempre ressenti a dificuldade de acesso ao ensino público de boa qualidade no Brasil. Trabalho desde tenra idade e o ensino superior particular me era mais favorável porque a única instituição pública instalada no Distrito Federal tinha horários incompatíveis com aqueles não podem viver exclusivamente do estudos.

Concluí dois cursos de pós-graduação lato sensu em instituição privada, mas – enquanto jurista – sempre me incomodei com a forma com que passei a verificar um processo de privatização dos cursos de pós-graduação lato e stricto sensu nas instituições públicas.

Laborei, enquanto Procurador Federal, junto ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (de 1.996 a 2.002). Fui transferido para a Procuradoria Federal Especializada junto ao Instituto Nacional do Seguro Social, onde permaneci no período de 2.002 a 2.008. Depois, incomodado com o grande número de notícias de corrupção envolvendo obras em estradas brasileiras, pedi remoção para a Procuradoria Federal Especializada junto ao Departamento Nacional de Infra-Estrutura (DNIT), onde permaneci por, tão-somente, quatro meses, isso por dois motivos: a) surgiram vagas no concurso de remoção para a Procuradoria Federal Especializada junto à Fundação Universidade de Brasília; b) lutar contra a imoralidade que grassa no DNIT é uma peleja inglória.

Apresentei-me na PFE/FUB no início do mês de dezembro do ano de 2.008, sendo que um dos primeiros processos que apreciei trazia a proposta de convênio da FUB com outra instituição para desenvolvimento de pesquisa. Logo em seguida, verifiquei outro processo com proposta de aditamento de convênio semelhante e em relação à mesma área do conhecimento. Então comecei a ter algum cuidado a mais em relação a tais processos administrativos [01].

Proferi parecer em outro processo em que a FUB oferecerá curso de pós-graduação lato sensu aos serventuários de determinado tribunal. Não bastasse, recentemente, fui instado a opinar sobre consulta feita por um Centro de Excelência da UnB acerca de minuta de contrato para cobrança de mensalidades de alunos especiais. Hoje, 25.3.2008, tenho comigo processo semelhante a este último, em que se pretende que os docentes da UnB sejam pagos como prestadores de serviço.

Finalmente, estou cursando doutorado em universidade pública argentina, onde pago, e sou mestre pela Universidade Federal do Pernambuco, em curso dirigido especificamente para docentes do UDF – Centro Universitário do Distrito Federal, ou seja, tanto profissionalmente, quanto em minha vida particular, tenho proximidade com o assunto, o que me legitima a tratar academicamente sobre o mesmo.


2. ILEGALIDADE DA COBRANÇA DE TAXAS EM CURSOS DE GRADUAÇÃO E PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU

A cobrança de taxas por estabelecimentos de ensino oficiais em cursos de graduação encontra óbice na Constituição Federal, a qual dispõe:

"Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;

III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

V - valorização dos profissionais do ensino, garantidos, na forma da lei, planos de carreira para o magistério público, com piso salarial profissional e ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos;

VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;

VII - garantia de padrão de qualidade".

Parece-me ser evidente a impossibilidade de cobrança de taxa de matrícula, transferência, expedição de diploma etc. Não obstante isso, as universidades cobravam tais taxas, até que o Ministério Público passou a provocar o Poder Judiciário. Foram várias as ações, sendo que algumas foram julgadas em último grau de recurso no Supremo Tribunal Federal, o qual pacificou entendimento no sentido da impossibilidade de tais cobranças, tendo editado, em 13.8.2008, a Súmula Vinculante n. 12, com o seguinte conteúdo: "A cobrança de taxa de matrícula nas universidades públicas viola o disposto no art. 206, IV, da Constituição Federal". [02]


3. É VEDADA A UTILIZAÇÃO DE FUNDAÇÃO DE APOIO PARA OFERECIMENTO DE CURSOS DE PÓS-GRADUAÇÃO

Na década de 1.990 proliferaram as fundações de apoio, instituídas por universidades públicas, as quais passaram a oferecer cursos de pós-graduação, lato e stricto sensu, mediante parcerias com outras instituições públicas e privadas. Tais práticas foram criticadas, sendo que surgiram seus defensores, podendo ser apresentada a seguinte notícia:

"4. Fundações: CONFIES responde à Folha de São Paulo

Analisando o artigo publicado pela Folha de São Paulo em 22.6.2005 (cotidiano) sob o título "USP é acusada de cobrar mensalidade", e o editorial de 23.6.2004, e visando esclarecer a opinião pública temos a tecer os seguintes comentários:

1.Que é pacífica a legalidade e legitimidade de se cobrar taxas de inscrição e de mensalidades em cursos de extensão e de especialização patrocinados pelas Universidades Públicas. Tal entendimento está consignado nos pareceres do Conselho Nacional de Educação CNE/CES 0364/2002 e 81/2003 do Ministério da Educação – MEC. O assunto também foi objeto de análise e deliberação por parte do Tribunal de Contas da União – TCU, a exemplo da Decisão n. 321/2000 e do Acórdão n. 966/2003 – 1.ª Câmara.

A decisão 321/2000 – Plenário tratou de representação formulada pela Associação dos Docentes da Universidade Federal do Espírito Santo, inquirindo a cobrança de taxa de inscrição e de mensalidade em cursos de extensão patrocinados pela universidade. O Acórdão 966/2003-1ª Câmara, por sua vez, foi proferido em sede de representação reformulada pela Procuradoria da República de São Paulo. O voto condutor desse Acórdão consigna que:

(...) o Tribunal entendeu, mediante Decisão n. 321/2000-Plenário, de 19/04/2000, que a cobrança de taxas e de mensalidades em cursos de extensão, por parte de universidades públicas, não fere o princípio da gratuidade do ensino público, podendo seus recursos humanos e materiais ser utilizado em atividades lucrativas, ressaltando que o lucro aferido deva ser em benefício das instituições e das atividades de pesquisa e extensão.

3. Não vejo razão para outro entendimento, visto que se as atividades de pesquisa e extensão fossem realizadas, exclusivamente, com recursos públicos, o desenvolvimento científico universitário estaria negativamente comprometido , haja vista o orçamento público restrito destinado a essas atividades.

4. É, portanto aceitável que as universidades possam cobrar taxas e mensalidades para atividades relacionadas à pesquisa e extensão, mesmo por que a Constituição Federal, ao estabelecer em seu art. 213, § 2º, que tais atividades podem receber apoio financeiro ao Poder Público, já deixa entender que esse apoio é adicional ao apoio privado.

2.No âmbito federal é legal e legítimo a participação remunerada de professores, mesmo em dedicação exclusiva, em atividades de ensino e prestação de serviços de interesse de Instituições Federais de Ensino junto às suas fundações de apoio. Esta possibilidade está prevista no § 1º do art. 14 do Decreto n. 94.664/1987, na Lei n. 8.958/1994 e no Decreto n. 5.205/2004.

3.Há que se distinguir, do ponto de vista de regulamentação e controle, as fundações de apoio as Universidades e Estaduais e Municipais públicas das fundações de apoio às Universidades Federais. As primeiras não possuem marco regulatório que legalizem esta relação, já as fundações de apoio às Instituições Federais de Ensino Superior – IFES para serem consideradas como fundações de apoio têm que ser aprovadas como tal pelo Conselho Superior da IFES apoiada, bem como serem credenciadas junto ao MEC e MCT conforme previsto na Lei 8958/1994, na Portaria Interministerial n.º 3185 de 07/10/2004 e no Decreto 5205/2004.

4.Existe projeto de lei tramitando na Câmara dos Deputados para incluir as Universidades Estaduais e Municipais, na Lei n. 8958/1994. Isto permitirá um maior controle por parte do governo das fundações que apóiam estas instituições. Semelhante ao que já ocorre a nível federal.

Em um país em que a quase totalidade de pesquisas se dá nas universidades públicas, em algumas privadas e em algumas instituições públicas, um dos principais desafios a enfrentar nessa área é a integração do setor privado no esforço do desenvolvimento tecnológico do Brasil.

Na exposição dos motivos, que acompanhou o anteprojeto do Executivo para a Lei n. 8.958/1994 entre outras argumentações podemos destacar que "as fundações de apoio constituiriam o meio eficaz e as condições especiais de trabalho, imprescindíveis às IFES, que poderão, dedicar às atividades – fins, participar e contribuir efetiva e sistematicamente para o desenvolvimento tecnológico do país".

Neste contexto as fundações de apoio têm desempenhado um papel importante na transferência do conhecimento gerado nas Universidades para a sociedade.

Portanto o trabalho desenvolvido pelas fundações de apoio não pode ser tratado de forma simplista como muitos apresentam, sem estudar e conhecer o assunto a fundo.

Prof. Antonio Manoel Dias Henriques

Professor da Universidade de Brasília – UnB

Presidente do Conselho Nacional das Fundações de Apoio as IFES – CONFIES" [03]

A análise perfunctória da Lei n. 8.958, de 20.12.1994, leva à conclusão do Presidente do CONFIES, eis que seu art. 1º dispõe:

"As instituições federais de ensino superior e de pesquisa científica e tecnológica poderão contratar, nos termos do inciso XIII do art. 24 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, e por prazo determinado, instituições criadas com a finalidade de dar apoio a projetos de pesquisa, ensino e extensão e de desenvolvimento institucional, científico e tecnológico de interesse das instituições federais contratantes".

O problema foi o excesso. A interpretação literal e isolada do preceito levou à necessidade de controle, sendo que o regulamento da lei (Decreto n. 5.205, de 14.9.2004) pouco ajudou, uma vez que reproduziu as autorizações da lei regulamentada e permitiu, expressamente, a contratação de fundação de apoio sem procedimento licitatório (art. 1º, § 5º). Corroborou a Portaria n. 80, de 16.12.1998, editada pela Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, a qual prevê a vocação da pós-graduação stricto sensu, nível mestrado profissionalizante, para o autofinanciamento, esclarecendo a opção por convênios para o patrocínio das suas atividades (art. 6º).

Ao meu sentir, o convênio pode e deve ser objetivado, mas sem desnaturar a Constituição Federal. Outrossim, parece-me que há um equívoco na exposição do CONFIES porque o art. 213, § 2º da CF prevê a participação do Poder Público para custear atividades universitárias de pesquisa e extensão, isso sem qualquer discriminação, ou seja, podem ser empregados recursos financeiros do Estado em instituições privadas.

O Acórdão n. 2.731/2008 traz uma série de recomendações, em relação à utilização de fundações de apoio para ganhos indevidos de servidores, professores, pesquisadores etc., tudo visando à moralidade pública. Daí transcrever alguns trechos de tal acórdão:

"9.2.1.8. previsão de critérios para participação de professor em atividades relacionadas a projetos de ensino, pesquisa ou extensão que acarretem pagamentos de bolsas, inclusive no que se refere à colaboração esporádica, remunerada ou não, prevista no Decreto 94.664/1987;

9.2.1.9. definição quanto à repartição de receitas e recursos oriundos dos projetos em parceria.

9.2.2. implantem rotinas de encaminhamento dos projetos que contenham informações tais como: definição precisa do objeto, projeto básico, metas e indicadores de desempenho e de resultados, recursos humanos e materiais envolvidos, discriminados como pertencentes ou não aos quadros da IFES, planilha de custos incluindo os ressarcimentos à IFES, bolsas a serem pagas, discriminadas por valores e beneficiários nominalmente identificados (com matrícula Siape caso servidores da IFES e CPF em caso contrário), pagamentos previstos por prestação de serviços por pessoas físicas e jurídicas e demais dados julgados relevantes;

(...)

9.2.9. exijam que as contratações relativas a projetos classificados como de desenvolvimento institucional impliquem produtos que resultem em melhorias mensuráveis da eficácia e eficiência no desempenho da IFES, com impacto evidente em sistemas de avaliação institucional do MEC e em políticas públicas plurianuais de ensino superior com metas definidas, evitando enquadrar nesse conceito atividades tais como: manutenção predial ou infra-estrutural, conservação, limpeza, vigilância, reparos, aquisições e serviços na área de informática, expansões vegetativas ou de atividades de secretariado, serviços gráficos e reprográficos, telefonia, tarefas técnico-administrativas de rotina, como a realização de concursos vestibulares, e que, adicionalmente, não estejam objetivamente definidas no Plano de Desenvolvimento Institucional da IFES;

9.2.10. normatizem e fiscalizem a atuação de coordenadores de projetos, com vistas a evitar favorecimento, nas composições de equipes, para cônjuges e parentes de servidores da instituição, não integrantes dos quadros das IFES, bem como a contratação de empresas, pelas fundações de apoio, nas quais participem de alguma forma, ou ainda o direcionamento de bolsas em benefício dessas pessoas;

(...)

9.2.12. não permitam pagamento de bolsas para servidores da IFES ligados à área do projeto, de forma concomitante com a subcontratação irregular de pessoas físicas e jurídicas que executem efetivamente o objeto do contrato;

9.2.13. não permitam a subcontratação de outras fundações de apoio como executoras da totalidade ou mesmo de partes do projeto, tendo em vista a caracterização de fraude no uso da possibilidade de dispensa de licitação prevista no art. 1º da Lei nº 8.958/1994, com o surgimento de cadeias irregulares desse tipo de dispensa;

(...)

9.2.22. não permitam o pagamento de quaisquer tipos de bolsas a servidores, por parte de fundações de apoio, que caracterizem contraprestação de serviços, como participação, nos projetos, de servidores da área-meio da universidade para desenvolver atividades de sua atribuição regular, mesmo que fora de seu horário de trabalho; participação de professores da IFES em cursos de pós-graduação não-gratuitos; e a participação de servidores em atividades de desenvolvimento, instalação ou manutenção de produtos ou serviços de apoio a áreas de infra-estrutura operacional da IFES, devendo tais atividades serem remuneradas, com a devida tributação, pela contratação de pessoas físicas ou jurídicas por parte das fundações de apoio ou, quando permitidos, pagamentos de servidores por meio de instrumentos aplicados para a prestação de serviços extraordinários;

9.2.23. abstenham-se de pagar bolsas a alunos que estejam atuando em projetos regidos pela Lei nº 8.958/1994;

9.2.25. não permitam o pagamento de quaisquer bolsas a servidores que tenham como finalidade o pagamento de valores a título de funções comissionadas sem previsão de pagamento regular ou, ainda, a remuneração de servidores da IFES como diretores ou membros de conselhos das fundações, impedida pelo parágrafo 1º do art. 4º do Decreto 5.205/2004;

(...)

9.2.32. efetuem os procedimentos para adequação dos cursos de pós-graduação lato sensu ligados às suas correspondentes Pró-Reitorias de ensino nesse nível, ainda que realizados em parceria administrativa e financeira com fundações de apoio, ao que dispõe o art. 9º da Resolução CNE/CES 1/2001, que exige um percentual mínimo de professores, em cada curso, de 50% de mestres e doutores, zelando também para o cumprimento de todas as demais exigências dessa Resolução e do Parecer CNE/CES 364/2002, que regula a cobrança de taxas e mensalidades nessa vertente de ensino;

9.2.33. abstenham-se de permitir a inclusão dos cursos mencionados no subitem acima em qualquer sistemática aplicada à vertente acadêmica de extensão, dado que o art. 44 da Lei 9.394/1996, em seus incisos III e IV, não enquadra a pós-graduação na mencionada vertente;

9.2.34. não paguem a seus professores e servidores técnico-administrativos a Gratificação de Cursos e Concursos, instituída pela Lei 11.314/2006, de forma concomitante com remuneração por bolsas ou por serviços extraordinários;

9.2.35. apliquem todas as possibilidades oferecidas pela Gratificação de Cursos e Concursos instituída pela Lei 11.314/2006 e regulamentada pelo Decreto 6.114/2007, em especial quanto à substituição de pagamentos por bolsas a servidores quando da realização de cursos nas vertentes de ensino e extensão, internos e externos, inclusive pós-graduação lato sensu, bem como de concursos, incluindo vestibulares e concursos públicos de provas e títulos para seleção de servidores;

9.2.36. efetuem, gradativamente e em paralelo com as demais providências correlatas aqui determinadas, a inserção dos cursos de pós-graduação lato sensu, porventura oferecidos, em seus processos acadêmicos e administrativos regulares, sem a condução exclusiva por fundações de apoio, uma vez que o Parecer CNE/CES 364/2002 considerou tais cursos como não-regulares apenas para fins de não-gratuidade, sendo mantidas as orientações da Resolução CNE/CES 1/2001 quanto ao acompanhamento e gestão pela IFES autorizada a ministrar e conduzir esses cursos;

9.2.37. atentem, em suas relações com fundações de apoio, para o estrito cumprimento do Decreto 6.170/2007, que dispõe sobre as normas relativas às transferências de recursos da União mediante convênios e contratos de repasse, inclusive quanto ao cumprimento do estabelecido no art. 2º, inciso II, que estabelece restrições quanto à participação de servidores da IFES como dirigentes das fundações;

9.2.38. não permitam que as ações a serem realizadas pelas fundações de apoio possam ser conduzidas ou tenham como participantes parentes de dirigentes e/ou servidores das IFES ou de dirigentes das fundações de apoio, em respeito às orientações éticas para impedimentos de nepotismo na Administração Pública".

O Parecer CNE/CES n. 364, de 6.11.2002, deixou evidente que o curso de pós-graduação lato sensu não é considerado regular, apenas para os fins de não gratuidade, conforme consta da recomendação 9.2.36 transcrita. No entanto, o que se infere é a impossibilidade de se realizar tais cursos exclusivamente por meios das fundações de apoio.

Tudo que foi transcrito evidencia a total impossibilidade de se utilizar fundação de apoio para a realização de cursos regulares das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), salvo a pós-graduação lato sensu, apenas para transformar o ensino que deveria ser gratuito, por ser regular, em não gratuito.

A Lei n. 8.443, de 16.7.1992, dispõe:

"Art. 3° Ao Tribunal de Contas da União, no âmbito de sua competência e jurisdição, assiste o poder regulamentar, podendo, em conseqüência, expedir atos e instruções normativas sobre matéria de suas atribuições e sobre a organização dos processos que lhe devam ser submetidos, obrigando ao seu cumprimento, sob pena de responsabilidade."

A força normativa da decisão do TCU impede pretender verificar qualquer possibilidade de se instituir pós-graduação strictu sensu por meio de fundações de apoio. Não bastasse, como tal curso se sujeita ao controle da CAPES, integrando o sistema nacional de pós-graduação, deve ser gratuito.

É antiga a prática de utilização de fundações de apoio para fins ilícitos e imorais, o que levou o TCU, em 1.992, a cogitar a extinção de tal espécie de fundação. Sobre o assunto, Di Pietro, reservou um capítulo, intitulado "Da Utilização Indevida da Parceria com o Setor Privado como Forma de Fugir ao Regime Jurídico Publicístico", [04] o que induz à certeza que toda participação de fundação de apoio na administração pública é merecedora de especial cautela, sendo que a Procuradoria Federal Especializada junto à IFES deverá adotar postura intransigente para defesa dos princípios orientadores do Direito Público em geral e, por consequência, do patrimônio público.


4. PROFESSORES, PESQUISADORES E SERVIDORES DAS IFES DEVEM SER GRATIFICADOS POR SUAS ATIVIDADES

4.1 Por participação em cursos e concursos

Urge a necessidade de destacar a recomendação n. 9.2.35, uma vez que é vasta a consulta que é feita à Procuradoria Federal Especializada (PFE) junto à Universidade de Brasília (UnB) sobre a possibilidade de professor receber diretamente alguma bolsa ou pagamento por sua atividade.

Quanto à bolsa ou pagamento por prestação de serviço, são hipóteses expressamente vedadas se as atividades forem realizadas por fundações de apoio. De outro modo, ainda que seja por convênio, no tocante aos cursos de pós-graduação com participação de docentes e servidores das UFES, o mecanismo próprio é a utilização permissivo legal do art. 76-A da Lei n. 8.112, de 11.12.1990, acrescido pela Lei n. 11.314, de 3.7.2006, ou seja, pagamento de gratificação por cursos ou concursos.

Ressalte-se, entretanto, que a atividade que se der com prejuízo das funções normais do professor ou servidor, não deverão ser gratificadas, ex vi do art. 76-A, salvo se possível a compensação de horário. Neste ponto, é importante vislumbrar a moralidade administrativa, haja vista que o Professor que se valer do seu horário normal de aulas para outras atividades poderá estar prejudicando os alunos ou curso por meio de afastamentos frequentes.

É necessário que as coordenações dos cursos das IFES não admitam que as aulas sejam ministradas unicamente por Professores Voluntários ou Professores Substitutos, quando professores Titulares e Adjuntos estiverem em atividades paralelas para terem acréscimos em seus salários. Outrossim, os horários normais de aulas dos alunos não podem se transformar em outros marcados extraordinariamente para reposição de aulas.

Não se olvide que o art. 76-A, § 1º, inc. II, da Lei n. 8.112/1990 estabelece o número máximo de 120 horas de trabalho por ano em atividades extraordinárias de cursos e concursos, sendo que qualquer excesso deverá contar com satisfatória motivação e aprovação expressa do órgão máximo da IFES.

A gratificação mencionada deve atender, inclusive, os centros de seleção instituidos pelas IFES, evitando-se nepotismos, terceirizações indevidas ou, pior, burla ao art. 37, inc. II, da Constituição Federal. Destarte, os órgãos de controle interno e externo devem ficar atentos para que centros de seleção (v.g., CESPE/UnB) não violem as recomendações expostas por meio da criação de mecanismos substitutivos do emprego indevido das fundações de apoio. Nesse ponto, emerge a necessidade da Procuradoria Federal Especializada junto à IFES passar a exercer com rigor seu múnus de zelar pelas legalidades, formal e material, dos atos administrativos.

4.2 Direitos autorais ou de invenção

Não se pode pretender estabelecer convênio para pagamento direto ao pesquisador da IFES por atividades de pesquisa que ele desenvolver. Toda atividade de pesquisa que puder gerar invenção/criação será regulada pela Lei n. 10.973, de 2.12.2004.

Embora tal lei autorize a retribuição pecuniária ao servidor público criador/inventor, o percentual deve encontrar o mínimo de racionalidade, devendo-se vedar o pagamento de propriedade imaterial ao criador/inventor se for utilizado bem restrito ao uso interno da IFES, bem como horário de efetivo serviço. Ainda que se autorize tal pagamento porque a lei é omissa quanto a isso, o percentual a ser atribuido ao pesquisador não deverá ser fixado sempre no máximo.

A Lei n. 10.973/2004 não poderá ser interpretada laconicamente, a ponto de gerar ruptura à legalidade e à supremacia do interesse público sobre o particular. É certo que todo direito público é regido por apenas dois princípios (legalidade e supremacia do interesse público sobre o particular) [05], razão de ser necessário demonstrar que a criação/invenção não decorreu de recursos públicos e não foi desenvolvida no horário de trabalho do criador/inventor, pois ainda que seja formalmente legal, firmar convênios atribuindo sempre percentual máximo (30%) dos rendimentos decorrentes da licença ou uso da invenção/criação constituirá prevalência do interesse particular sobre o público.

Os centros de desenvolvimento tecnológico das IFES, também, devem ficar atentos para não criarem, sob o manto de fomento à pesquisa, mecanismos espúrios para pagamentos diretos aos seus pesquisadores, sendo inconveniente firmar convênio com empresa para favorecimento específico dela ou do pesquisador. Assim, a supremacia do interesse público sobre o particular será suficiente para inviabilizar contratos ou convênios que não contem com a necessária publicidade, a fim de assegurar igualdade aos administrados, eis que não se pode olvidar que tais centros são partes integrantes das IFES.

A constitucional igualdade de tratamento exige que os projetos não tenham em vista o favorecimento de qualquer pessoa física ou jurídica em especial, daí ser necessária a publicidade das iniciativas de projetos de pesquisa, a fim de não tornar a IFES ponto de apoio de determinadas empresas. Outrossim, deve-se evitar que o cargo público de Professor ou Pesquisador perca seu escopo maior de benefício à coletividade e passe a representar lugar para atendimento aos interesses particulares de determinadas pessoas (administrados e agentes públicos).

A Lei n. 9.610, de 19.2.1998, regula os direitos autorais. Entretanto, não se pode pretender atribuir ao autor de uma obra desenvolvida com patrocínio da administração pública, todo direito sobre ela. A esse respeito, nos autos do Processo Administrativo n. 23106.004402/2008-45, ofereci parecer em que sustentei:

"O citado Min. Celso de Mello produz verdadeiras teses jurídicas, como no emblemático caso que envolvem a utilização de embriões humanos para pesquisas científicas, não podendo perceber valores específicos devido a tais produções, as quais, na literatura especializada, certamente lhe resultariam bons direitos autorais".

Assim como votos em processos judiciais são públicos, atos oficiais também não são merecedores de direitos autorais, dispondo a Lei n. 9.610/1998: "Art. 8º Não são objeto de proteção como direitos autorais de que trata esta Lei: (...) IV - os textos de tratados ou convenções, leis, decretos, regulamentos, decisões judiciais e demais atos oficiais". Destarte, o projeto de iniciativa da IFES não poderá gerar direito ao criador/inventor de lançar a tecnologia protegida em uma dissertação ou tese para, violando o direito sobre a invenção/criação, gerar ao pesquisador direitos autorais.

É certo que a lei nupercitada estabelece em seu art. 6º: "Não serão de domínio da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos Municípios as obras por eles simplesmente subvencionadas". Isso, porém, não quer dizer que a IFES não tenha qualquer direito sobre a produção intelectual decorrente de invenção/criação que tenha sido desenvolvida no ambiente de trabalho e com ônus ao erário. Destarte, a publicação de dissertação ou tese que divulgue a tecnologia só será possível se autorizada pela IFES.

Contratos e convênio para produção intelectual, portanto, deverão primar pela observância do disposto na Lei n. 8.666, de 21.6.1993, visto que o art. 116 desta assim determina. Nesse ponto, é importante lembrar que o art. 3º, § 3º, da referida lei informa que os atos do procedimento licitatório são públicos e que seu art. 61, parágrafo único, determina a publicação resumida do contrato. Desse modo, convênios e contratos da administração pública devem atender à plena transparência de seus atos como condição indispensável da moralidade [06].

É certo que a formalidade extrema pode ser prejudicial, sendo oportuno o magistério de Marçal Justen:

"Sempre será possível encontrar uma interpretação que realize, de modo satisfatório, os interesses protegidos pelo Direito. Nenhum aplicador pode escolher a alternativa hermenêutica que deixe de realizar satisfatoriamente esses valores (que são os princípios norteadores da atividade administrativa e a proteção à isonomia)." [07]

É atribuição da Procuradoria Federal Especializada junto à IFES verificar o respeito à supremacia do interesse público sobre o particular, exigindo-se publicidade, como forma de dar conhecimento popular, "como fator de justificação, legitimação e controle por parte dos administrados. É o caso de garantia de transparência e visibilidade ampla dos atos administrativos praticados, sempre voltados para o interesse público e geral". [08] Destarte, a análise não deve se contentar com a simples aprovação do projeto por decanato ou qualquer órgão colegiado da IFES, bem como a parceria público-privada deverá encontrar motivação adequada, mormente em relação à escolha de determinada pessoa jurídica.


5. A UNIVERSALIDADE DO ACESSO AO ENSINO

Vedada a utilização de fundação de apoio para realização de cursos de pós-graduação, surge a possibilidade de se fazer convênio para realização de pós-graduação lato sensu, atendendo aos interesses de categorias específicas do setor público ou privado. Essa é uma prática corrente, mas que merece ser analisada com muito cuidado.

A Lei n. 9.394, de 20.12.1996, é a Lei de Diretrizes Básicas da Educação Nacional (LDB), a qual preceitua:

"Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho."

Parece-me discutível a posição esposada pelo Conselho Nacional de Educação no seu Parecer CNE/CES n. 364, de 6.11.2002, uma vez que o curso de especialização lato sensu visa à qualificação para o trabalho e, portanto, está abrangida pela LDB. Não é o fato da pós-graduação lato sensu não ser controlada pela CAPES que deve lhe retirar a natureza de ensino regular do sistema nacional de educação.

A especialização deve estar abrangida pelo sistema nacional de educação, a fim de evitar a simples venda de títulos. Estes tem reflexos no patrimônio público, até porque, em muitos lugares, há acréscimo nos vencimentos, em face da capacitação profissional por meio de cursos de especialização.

Para contratar diretamente com determinados órgãos ou empresas, as IFES vislumbraram, então, os tais mestrados profissionais, os quais tem fins específicos e, em face dos currículos, não se confundem com mestrados acadêmicos. De qualquer modo, mestrado é integrante do sistema nacional de educação e, portando, sujeito ao controle da CAPES. Assim sendo, emerge a necessidade de respeito ao art. 206 da Constituição Federal.

Estabelecer convênio para que a IFES ofereça, remuneradamente e diretamente, curso de pós-graduação lato sensu a algum órgão ou empresa será estranho porque tal curso, segundo a concepção da CAPES, não integra o sistema nacional de ensino superior, portanto, a IFES estaria desviando sua finalidade. De outro modo, atribuir ao mestrado profissional status de pós-graduação lato sensu, constituirá burla ao art. 206, inc. IV, da CF, apenas para tornar o ensino que deveria ser gratuito em oneroso.

Não verifico como burlar a Constituição Federal e cobrar preço público por uma atividade que ela estabeleceu que deve ser gratuita. Ademais, a LDB estabelece: "Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de: (...) V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um". Desse modo, o acesso universal e gratuito não se restringe ao ensino fundamental, que é obrigatório. Ele se estende a todos os níveis. Nesse sentido, há decisão judicial que fulmina a cobrança em mestrados profissionalizantes. Vide matéria a respeito:

"Juiz veta cobrança em mestrado profissionalizante

O juiz Firly Nascimento Filho, da 5ª Vara Federal do Rio de Janeiro, expediu liminar proibindo a cobrança de taxas de matrícula nos mestrados profissionalizantes, praticada pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e Fundação IBGE.

A liminar foi concedida em ação civil pública movida pela Procuradoria da República, tendo como rés não só as instituições federais citadas, mas também a Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

O procurador Daniel Sarmento, que assinou a ação, contesta a cobrança de 100 reais pela matrícula, sustentando que "instituições públicas federais, como a UFF, a UFRRJ e o IBGE, não estão autorizadas a cobrar qualquer contraprestação dos alunos dos cursos de pós-graduação stricto sensu que mantêm, sob pena de ostensiva afronta ao art. 206, IV, da Constituição da República". Esse dispositivo determina a gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais.

A ação pede que a Capes seja condenada a ‘coibir e reprimir’ a cobrança de valores aos alunos dos cursos de mestrados profissionalizantes promovidos por instituições públicas no Rio de Janeiro.

Carga horária

Na liminar, o juiz diz não haver distinção entre mestrado profissionalizante e mestrado tradicional: ‘ambos conferem o título de Mestre, não havendo discriminação de qualquer nível’. O argumento de que se tratava de cursos diferentes, dirigidos a profissionais inseridos no mercado, era a justificativa das instituições para defender a cobrança.

O juiz considera, ainda, que a remuneração dos professores já está definida no orçamento das instituições. ‘A carga horária dos docentes e o ingresso de professores convidados devem se pautar pelo orçamento normal da instituição pública, como ocorre com os mestrados e doutorados acadêmicos. Por outro lado, o periculum in mora está caracterizado diante da possibilidade de existência de novos cursos custeados pelo estudante em Universidades Públicas’." [09]

Ainda que se observe o mestrado profissionalizante como pós-graduação lato sensu, a jurisprudência vem se orientando no sentido de não admitir a cobrança de preço público, em face da gratuidade constitucionalmente assegurada:

"Notícias

Quinta, 05 de Março de 2009

UFRGS não poderá mais cobrar por cursos de pós-graduação lato sensu

A 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) determinou que a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) deixe de promover cursos pagos de pós-graduação lato sensu. A decisão foi publicada nesta semana (3/3) no Diário Eletrônico da Justiça Federal.

A ação civil pública foi movida pelo Ministério Público Federal (MPF). Para a procuradoria, o ensino ministrado em estabelecimentos oficiais deve ser gratuito, conforme estabelece a Constituição.

O relator do processo, Juiz Federal Márcio Rocha, convocado para atuar no TRF4, julgou procedente o pedido do MPF. Segundo o magistrado, os cursos de pós-graduação em sentido amplo (especializações) integram o ensino superior, oferecidos regularmente ou não.

Para Rocha, a universidade não pode impor barreiras financeiras para o acesso da população, pois esta já contribui para a manutenção da instituição mediante o recolhimento de tributos, não sendo correta uma nova cobrança de valores.

A UFRGS poderá recorrer da decisão."

Embora seja defeso ao Procurador Federal declarar inconstitucionalidade de norma, haja vista que ele deve cumprir a lei, mesmo sem adentrar no mérito da constitucionalidade do art. 6º da Portaria n. 80, de 16.12.1998, o preceito normativo deve ser interpretado segundo a vontade constitucional, sob pena de se pretender estabelecer um sistema oneroso de ensino em universidades públicas, o que inadmissível.

É fundamental que se observe a igualdade de acesso, a fim de se preservar a universalidade do ensino público. Sem atender aos critérios orientadores da educação (denominados pela Constituição Federal de princípios), será impossível a consecução prática dos seus objetivos [10]. Por isso, é fundamental que se esclareça como tais alunos serão selecionados. Nesse ponto, é oportuna a crítica feita por José Afonso da Silva, no sentido de que pobres pagam seus cursos e ricos estão em universidades públicas [11]. Entretanto, não se pode atender à pretensão de violar a Constituição Federal, a qual estabelece ser a educação direito de todos e dever do Estado (art. 205).

O art. 26 da Declaração Universal dos Direitos do Homem assegura a gratuidade do ensino. Desse modo, não podem existir cursos onerosos, dirigidos a determinadas pessoas, senão aqueles que não podem pagar terão negado seu direito de acesso. O que verifico na Universidad Nacional de Lomas de Zamora, Argentina, é que o acesso é garantido a todos que pretendam realizar o curso de doutorado em Direito e que atendam aos requisitos de seleção. Assim, ainda que possam existir problemas quanto aos critérios de seleção e o ensino seja pago, o curso não é dirigido a qualquer pessoa física ou jurídica em especial. Ao contrário, o mestrado profissionalizante e a pós-graduação lato sensu estabelecidos por convênios ou contratos com as IFES brasileiras são cursos dirigidos a determinados órgãos ou empresas, violando a universalidade do ensino. Não bastasse, aqui no Brasil, há preceito constitucional que assegura a gratuidade do ensino em estabelecimentos oficiais.

Gilmar Mendes, Inocêncio Coelho e Paulo Gustavo Branco informam que os denominados princípios norteadores da educação devem ser analisados em conjunto, [12] o que dá azo para que tratemos de universidade e gratuidade como inseparáveis. Nesse sentido, oportuna é a lição de Marcos Jorge Catalan, in verbis:

"Por determinação legal, emanada da Constituição Federal de 19886 , o ensino, nos estabelecimentos oficiais, é público e gratuito, não podendo ser cobrada, dos acadêmicos, quaisquer taxas ou emolumentos, para que lhes seja garantido o direito ao saber." [13]

Essa garantia dada pela gratuidade se manifestará na universalidade do acesso. Destarte, ao contrário de criar convênios para cursos pagos, as IFES deveriam buscar mecanismos para aumentar o número de vagas a todos, mantendo a gratuidade.


6. CONCLUSÃO

A análise jurídica empreendida permite afirmar que as IFES não podem cobrar taxas e emolumentos por suas atividades de ensino, devendo os professores e servidores serem gratificados na forma do art. 76-A da Lei n. 8.112/1990, isso no tocante à participação em cursos e concursos realizados extraordinariamente e fora do horário normal de trabalho, salvo nos casos de possibilidade de compensação de horas.

Por publicações, invenções e criações que geram direitos intelectuais, professores e servidores terão seus direitos regulados na forma da legislação pertinente, devendo a IFES se atentar para as exigências da Lei n. 8.666/1993, bem como se proteger contra publicações que divulguem invenções/criações de sua propriedade. Outrossim, por tais participações, devem ser vedados pagamentos diretos aos pesquisadores, salvo os previstos nas leis de direito autoral e de incentivo à criação/invenção, mormente quando a atividade estiver na esfera da atividade do pesquisador no âmbito da IFES.


Notas

  1. Peço vênia ao leitor para não apresentar dados dos processos administrativos porque, embora a administração pública esteja norteada pela publicidade, tomei conhecimento dos assuntos em razão do meu cargo, o que me leva a procurar manter postura que não desgaste pessoas ou instituições específicas.
  2. STF. Pleno. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurispruden cia.asp? s1=12.NUME.%20E%20S.FLSV.&base=baseSumulasVinculantes. Acesso em: 24.3.2009, às 15h35.
  3. Disponível em: www.unb.br/administracao/reitoria/linha_direta/downloads/linha_direta86.doc. Acesso em: 22.3.2008, às 11h.
  4. Di Pietro, Maria Sylvia Zenella. Parcerias na administração pública: concessão, permissão, franquia, terceirização, parceria público-privada e outras formas. 6. ed. São Paulo: Atlas, 2.008. p. 278-289
  5. PIETRO, Maria Sylvia Zanella Di. Direito administrativo. 9. ed. São Paulo: Atlas, 1998. p. 60.
  6. FURTADO, Lucas Rocha. Curso de licitações e contratos administrativos. Belo Horizonte: Fórum, 2.007. p. 42.
  7. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 12. ed. São Paulo: Dialética, 2.008. p. 57.
  8. GONÇALVES, Cláudio Cairo. Contrato administrativo: tendências e exigências atuais. Belo Horizonte: Fórum, 2.007. p. 77.
  9. Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo: Disponível em: http://www.adusp.org.br/noticias/ Informativo/122/inf12203.html. Acesso em: 22.3.2009, às 8h30.
  10. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2.000. p. 814.
  11. Idem. p. 816-818.
  12. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet; COELHO, Inocêncio Mártires; MENDES, Gilmar Ferreira. Curso de direito constitucional. São Paulo: Saraiva, 2.007. p. 1302.
  13. 13.CATALAN, Marcos Jorge. O ensino público gratuito, sua garantia constitucional e seus mecanismos de defesa. Educere, n. 2, jul-dez 2.003. p. 105-118. Disponível em: http://revistas.unipar.br/educere/article/viewFile/184/158. Acesso em: 22.3.2009, às 2h15.

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MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Universalidade do acesso e gratuidade do ensino superior. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2105, 6 abr. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12580. Acesso em: 23 abr. 2024.