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Os agentes políticos como sujeitos ativos de atos de improbidade administrativa

Os agentes políticos como sujeitos ativos de atos de improbidade administrativa

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Agentes políticos podem ser considerados sujeitos ativos de atos de improbidade administrativa?

Resumo: Este trabalho tem como objeto o estudo da possibilidade dos agentes políticos serem considerados sujeitos ativos de atos de improbidade administrativa, tal como regulado através da Lei nº 8.429/92. O tema reveste-se de relevância em virtude de sua atualidade. Basta, para tanto, atentar-se para os acontecimentos relativos aos atos da Administração Pública ocorridos nos últimos anos. Entende-se, então, que a discussão acerca do tema não se encontra esgotada, haja vista que atos de improbidade administrativa continuam sendo praticados pelos diversos agentes públicos e atualmente há enorme celeuma em relação à aplicação da Lei de Improbidade Administrativa aos agentes políticos. O presente trabalho está dividido em quatro partes. A primeira analisa a corrupção e sua relação com a improbidade administrativa, passando ainda pela evolução legislativa do combate à improbidade administrativa. A segunda parte cuida da análise dos princípios constitucionais que norteiam a moralidade administrativa, bem como faz uma análise da tríade moralidade, legalidade e probidade. Num terceiro momento aborda-se a sistemática dos sujeitos ativos de atos de improbidade administrativa. Por fim, é analisada a decisão do Supremo Tribunal Federal na Reclamação nº 2.138-6-DF e suas conseqüências para o tema em estudo.

Palavras-chave: Administração pública, improbidade administrativa, agentes políticos.

Sumário: Capítulo 1 - A busca pela moralidade administrativa. 1.1. A cultura da corrupção. 1.2. Corrupção e improbidade administrativa. 1.3. A evolução constitucional e legislativa da repressão à improbidade administrativa no Brasil. Capítulo 2 - Os princípios constitucionais norteadores da moralidade administrativa. 2.1. O princípio da moralidade administrativa. 2.2. O princípio da probidade administrativa. 2.3. Moralidade, legalidade e probidade. Capítulo 3 - Sujeitos ativos dos atos de improbidade administrativa. 3.1. Sujeitos ativos de atos de improbidade administrativa. 3.2. Alcance do termo agente público constante da lei de improbidade administrativa. 3.3. Agentes políticos. 3.4. A improbidade administrativa e os agentes políticos. Capítulo 4 - Crimes de responsabilidade ou atos de improbidade administrativa. 4.1. Crimes de responsabilidade. 4.2. A relação entre crimes de responsabilidade e atos de improbidade administrativa. 4.3. A reclamação nº 2.138-6-DF. Considerações finais. Referências.


Capítulo 1 - A busca pela moralidade administrativa

A corrupção é um dos maiores entraves para o desenvolvimento de nosso País. Não é de hoje que assistimos incrédulos a atos de corrupção que atordoam toda a sociedade. Desde os primórdios do Estado brasileiro convivemos – às vezes de forma até muito aceitável – com atitudes que vão de encontro à idéia basilar da Constituição de todos os Estados que é o bem comum. Antagonicamente à eterna procura do bem comum, temos a busca dos interesses individuais, que, infelizmente, em inúmeros casos são alçados a uma posição superior ao bem comum.

A busca pelo interesse individual em contraponto ao bem comum não é exclusividade de particulares que tentam de alguma forma obter vantagem em desfavor do Estado. Encontramos o mesmo comportamento nos agentes públicos, que, para o exercício regular de suas prerrogativas e para que o bem comum seja alcançado, têm poderes que lhes são conferidos pelo povo, poderes estes que algumas vezes são utilizados para fins contrários aos quais foram concedidos. Wallace Paiva Martins Júnior [01] descreve muito bem essa prática:

Embora o poder seja de elementar uso regular do agente público, e nessa medida também represente um dever para o alcance dos fins objetivados pelo direito, muitos investidos nessa condição o empregam como uma fonte inesgotável de aquisição, usufruto, distribuição e transmissão de regalias e mordomias, um modo de obter vantagens ilícitas para si ou para outrem [...], como um meio para distribuir favores ou prejudicar direitos, exercer o poder de maneira abusiva, em concurso com pessoas físicas e jurídicas de direito privado, motivo pelo qual não é de hoje a preocupação legislativa concreta com o fenômeno da imoralidade administrativa.

A corrupção não é um fenômeno recente. Em todas as sociedades pode-se encontrar algum tipo de corrupção, em maior ou em menor escala, entretanto, como afirma George Sarmento [02]: "À medida que a humanidade evolui, as sociedades ficam mais complexas" de tal sorte que a ética se torna mais rígida e condutas que antes eram tidas como normais, hoje não são mais aceitas pela sociedade. E mais: "Atitudes toleradas no Ancien Régime e nos primórdios do regime republicano, hoje, configuram atos de improbidade administrativa".

1.1. A cultura da corrupção.

No Brasil, desde o período da colonização portuguesa convivemos com atos que podem ser considerados como embrionários dos atuais atos de improbidade. Podemos citar como exemplos os inúmeros privilégios que eram concedidos aos que auxiliavam os representantes da Coroa em solo brasileiro: as vantagens ilícitas, o malbaratamento dos recursos públicos, dentre outros.

Acerca do período de transição do Império para a República, Rafael Cláudio Simões [03] expõe:

A transformação do nosso regime político de Império para República, em que pese todas as expectativas que existiam naquele período, acabou por se revelar também pouco substantiva do ponto de vista da cidadania e do combate à corrupção. [...] Os poderes públicos continuavam dominados pelas elites e seus interesses e a descentralização serviu, na verdade, para "democratizar" o acesso das elites estaduais ao poder local.

Não podemos esquecer as críticas formuladas pelo saudoso Pontes de Miranda [04] à República Velha:

[...] não há nenhum país em que sejam tão irresponsáveis e irresponsabilizados os dirigentes, os funcionários e os próprios particulares. Nada se apura; só há um limite para os desmandos e dilapidações dos dinheiros públicos, dos incapazes, das instituições: o apetite dos funcionários, governantes e gestores.

Ainda analisando a República, Sarmento [05] expõe o pensamento exarado por Rui Barbosa:

Rui Barbosa comparava a República a um ser ‘multimâmico’, uma gigantesca vaca de milhares de tetas, nas quais se dependuram insaciáveis e contumazes mamadores a sugar infinitamente suas riquezas. Para a mamata não havia desmame. Todos queriam uma boquinha, um emprego de fachada, mordomias nababescas, prestígio e poder. Uma vida de fausto. A metáfora do jurista baiano é uma alegoria que simboliza o descaso das elites brasileiras com o patrimônio público, considerado res nullius – coisa de ninguém – a ser livremente utilizado para fins privados, sobretudo para o enriquecimento ilícito e para a manutenção do empreguismo, isenção ilegal de impostos, multas, concessões gratuitas, etc.

Por sua vez, Graciliano Ramos, antes de se tornar um brilhante escritor, exerceu entre 1928 e 1930 o cargo de Prefeito de Palmeira dos Índios. Enquanto prefeito foi um político honesto e zeloso com os cofres públicos. Sarmento [06], referindo-se a Graciliano, afirma:

[...] embora tenha dado grandes demonstrações de sua integridade pessoal, não conseguiu convencer os seus conterrâneos de que o ato administrativo era isento de lucro pessoal, de que as verbas não podiam ser desviadas para os bolsos de parentes e aliados políticos. [...] Em seu famoso Relatório ao Governador do Estado de Alagoas, demonstrou que a probidade na gestão da coisa pública começa a ser construída a partir da decisão política de romper com o clientelismo provinciano e com o favorecimento a grupos econômicos comprometidos com a fraude eleitoral, com a sonegação de impostos e com o tráfico de influência.

O quadro exposto por Pontes de Miranda, citado há pouco, esteve completamente presente até pouco tempo atrás. Políticos e funcionários graduados tinham certeza da impunidade em relação aos seus deslizes funcionais, tendo por máxima o "rouba, mas faz", que se refletia no conformismo da sociedade.

Nos dias de hoje, não é incomum ligarmos a televisão ou abrirmos um jornal e lermos sobre casos de corrupção. Presenciamos desvios de milhões de reais, tráfico de influência, negociatas e inúmeros outros atos reprováveis. Todos esses atos importam por conseqüência lógica em diminuição de investimentos em saúde, educação, segurança pública, infra-estrutura e outros tantos investimentos afetos ao Estado e extremamente necessários em nosso País.

Nesse sentido, Leonardo da Costa Barreto [07] ressalta que para um País como o nosso a corrupção tem efeitos preocupantes:

A corrupção pública atingiu índices alarmantes nos últimos anos. Segundo pesquisas, a proporção é a seguinte: a cada R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) desviados dos cofres públicos uma criança morre. É que se o referido valor fosse investido em redes de esgoto, por exemplo, evitaríamos uma série de doenças, as quais levam a óbito inúmeras crianças.

A corrupção no Brasil está tão arraigada que é como se fosse parte de sua cultura. Encontramos pequenos atos de corrupção tidos como normais perante a sociedade. Pode-se usar como exemplo o fato de motoristas que subornam policiais rodoviários para evitar que os mesmos multem o condutor do veículo quando encontrada alguma irregularidade. Wallace Paiva Martins Júnior [08] descreve muito bem esse fenômeno de absorção por parte da sociedade da cultura da improbidade:

Essa cultura da improbidade foi fomentada, anos e anos, não só com o incentivo passivo da própria população espoliada [...] como, também, com a confortável impunidade dos autores dos maiores atentados à moralidade que deve presidir os negócios públicos. [...] Tão arraigada na cultura popular brasileira, produziu uma imagem do malbaratamento da coisa pública como regular alicerce do próprio Estado.

Adiante, Wallace Paiva Martins Júnior [09], arremata a questão da cultura da improbidade e as suas conseqüências, bem como, a sua solução, a saber:

Na essência, a cultura da improbidade atribuiu ao patrimônio público, isto é, aos bens, direitos e interesses e valores materiais e morais da sociedade, uma absurda condição de res nullius ou quiçá de res dereclita, quando em verdade se trata de incontestável res omnius. [...] Por isso, a adoção de um sistema composto de meios eficientes para salutar prevenção e exemplar punição dos culpados nas mais variadas instâncias é providência útil para a sagração da credibilidade da democracia e da confiança nas instituições, de forma a remodelar na sociedade brasileira um grau de respeito à coisa pública.

A idéia de que as coisas do Estado não são de ninguém como muito bem exposto por Paiva Martins é de extrema repugnância e posicionamento este que deve ser combatida frontalmente. As coisas públicas não são res nullius, muito pelo contrário, a coisa pública necessita, exatamente por ser coisa pública, dos maiores cuidados no seu trato.

Devem-se ressaltar, entretanto, as conseqüências nefastas ao desenvolvimento social do País advindas da corrupção. No dizer de Madeleine de Paula Lima [10]:

Sem dúvida, qualquer desvio de verba pública constitui um prejuízo para a comunidade em geral, alcançando todas as classes, por suas conseqüências nas interações sociais, em prazo maior ou menor. No entanto, o desvio das verbas destinadas às políticas sociais constitui prejuízo maior para uma vasta população, haja vista que enfraquece a implementação dos direitos econômicos, sociais e culturais, que compõem a base do direito ao desenvolvimento, gerando um círculo vicioso de falta de perspectiva de promoção social e afetando, muitas vezes, várias gerações.

Por fim, os atos de corrupção podem ser classificados, de acordo com o seu grau de complexidade, em atos de microcorrupção e de macrocorrupção. George Sarmento [11] dá como exemplo de atos de microcorrupção "o uso de veículos oficiais, utilização de linhas telefônicas da repartição para fins particulares, [...] peculato, recebimento de propinas ou presentes [...]". Adiante, Sarmento [12] tece alguns comentários acerca da macrocorrupção, dando como exemplo a pilhagem do patrimônio público e que ela atinge "dimensões astronômicas", chegando a afirmar que a movimentação proveniente de crimes financeiros é estimada em U$ 1 trilhão de dólares anuais em escala mundial. Desse montante, estipula-se que U$ 100 bilhões de dólares provêm de atos de improbidade administrativa.

Fala-se, portanto, de uma cifra considerável se levar em consideração que o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro se encontra hoje na ordem de U$ 1.3 trilhão [13], de tal sorte que, anualmente, em todo o mundo, movimentam-se valores provenientes de atos de corrupção um pouco inferiores ao PIB da 8ª economia do mundo.

1.2. Corrupção e improbidade administrativa

Após a identificação de que há uma espécie de absorção da corrupção por parte da cultura de determinada sociedade, notadamente, na sociedade brasileira, devemos, então, identificar a conexão entre improbidade administrativa e corrupção.

De início, é importante tecermos alguns comentários acerca do significado do termo corrupção e para tal iremos utilizar o bem dizer de George Sarmento [14] que afirma:

O vocábulo corrupção deriva do latim corruptione, palavra que evoca a idéia de degenerescência, putrefação, decomposição, devassidão, suborno ou peita. Hoje em dia é utilizada para definir a conduta de uma autoridade que abusa do cargo para obter ganhos privados ou lesar os cofres públicos.

Como bem expõe Josenildo da Costa Santos [15]: "a corrupção implica no descumprimento de deveres e quebra de confiança".

Como exposto alhures, a corrupção existe em todas as sociedades, seja em maior ou menor grau, de tal maneira que sempre os Estados procuraram um mecanismo jurídico eficiente para combatê-la, de Atenas até os dias atuais.

Como também já dito acima, atos que eram realizados por agentes públicos em determinados regimes e que eram tidos como naturais hoje seriam considerados atos de improbidade administrativa, portanto, é importante que façamos a identificação do momento em que a sociedade começa a identificar os atos de corrupção como atos de improbidade administrativa.

Sarmento [16] cita como exemplo desta já antiga busca pelo combate à improbidade administrativa a posição defendida pelo romano Cícero que defendia perante seus pares, nos casos mais danosos, a execução sumária dos governantes desonestos. A posição de Cícero já em Roma demonstra, até de forma ferrenha em virtude da pena defendida por ele, o quanto, para aquele senador, a boa administração pública deve ser uma realidade a ser buscada a qualquer custo.

Com o advento da Revolução Francesa, a responsabilização pessoal do funcionário pelos atos de gestão do erário foi erigida a direito fundamental, conforme constante do art. 15 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1789, que dispõe: "a sociedade tem o direito de pedir contas a todo agente público pela sua administração" [17].

A Revolução Francesa trouxe inúmeros avanços à administração pública ao romper com o antigo regime monarquista onde era consagrado o princípio "the king can do no wrong", ou seja, o rei não erra. Partindo desse pressuposto de rompimento, foi alçado a direito fundamental dos cidadãos a possibilidade de serem cobradas as contas da gestão, conseqüentemente, essa gestão teria que ser eficiente. Apesar de encontrarmos referências dessa busca pela probidade já em Roma, como citado, entendemos que foi em França que o Estado moderno alçou a uma categoria superior o ideal de probidade na administração.

No caso do Brasil, como será demonstrada abaixo, a luta pela probidade na administração só se tornou efetiva em meados do século passado, tendo em vista que o Estado brasileiro ainda está em plena formação. Portanto, não é de estranhar que só agora a sociedade esteja entendendo que a boa administração não é uma opção, é uma necessidade para o desenvolvimento do País. Não é de estranhar porque o Brasil tem um histórico de ser contrário à mudança na velocidade que seria desejável. Temos como exemplo a aceitação da forma com que Portugal nos colonizou, tendo por conseqüência uma independência tardia, e quando a mesma chegou foi adotada uma forma de governo imperial até quase cem anos após a revolução francesa. Embora isso não deva ser levado como justificativa, demonstra que o Brasil ainda está amadurecendo como Nação.

A corrupção pode ser analisada por diversos prismas. Nesse contexto, Sarmento [18] afirma:

Para o filósofo, é considerada transgressão das normas éticas que regem os cargos públicos. O sociólogo prefere encará-la como fato social decorrente de um sistema administrativo ilegítimo e defeituoso. O antropólogo procura explica-la como desvio de conduta ditado pela incapacidade de a autoridade resistir às tentações financeiras ou às pressões políticas para romper o pacto de lealdade ao Estado. Para o jurista dogmático, a improbidade é ato ilícito (contrário à lei) a ser punido civil, administrativa e criminalmente pelo aparelho estatal.

O Direito Penal distingue duas formas de corrupção: a ativa e a passiva. A corrupção ativa consiste em oferecer vantagens – sejam elas pecuniárias ou não – a agente público para que pratique, omita ou retarde ato de ofício. A corrupção passiva, por seu turno, ocorre quando o agente público tira proveito do cargo, função ou emprego público para reclamar, propor, insinuar ou sugerir propina em troca de ato de ofício.

A doutrina internacional, especialmente a espanhola, a francesa e a norte-americana, define corrupção como sinônimo de improbidade administrativa, referindo-se "a um conjunto de condutas desviantes do funcionário público que implica enriquecimento ilícito, que acarreta prejuízos ao erário ou que colida com os valores éticos da administração pública", no bem dizer de Sarmento [19].

Há diversas linhas de definições de corrupção. Alguns entendem que corrupção se restringiria apenas ao crime de peculato, outros, tentam explicá-la pela idéia de abuso do cargo público para satisfazer interesses públicos. Existe, ainda, a corrente doutrinária que a encara como desvio ético da autoridade pública, que se expressa pela transgressão aos princípios da administração pública. Nessa linha, Miguel Seabra Fagundes [20] define corrupção como:

[...] quaisquer modalidades de ação que representem a utilização indevida, isto é, sem motivo ou título hábil, de bens do patrimônio público, ou o custeio, direto ou indireto, de despesas não impostas pela função exercida, senão para o gáudio de agente público de qualquer categoria. E, ainda, os atos de favorecimento, à custa dos cofres públicos, de parentes, amigos e eleitores, como admissões irregulares no serviço público ou estipulação de salários privilegiados.

Não se pode isolar, entretanto, a corrupção no serviço público dos outros fenômenos sociais. A corrupção reflete o momento histórico vivenciado pela sociedade e o estágio de organização social e política, ou seja, quanto mais avançado social e politicamente o País, menores serão seus índices de corrupção.

Josenildo da Costa Santos, ao citar Manuel Villoria Mendieta [21] expõe sobre as diversas concepções de corrupção da seguinte maneira:

Manuel Villoria Mendieta faz referência a quatro grupos de definições de corrupção. Em primeiro lugar, existem as definições vinculadas ao abuso de cargo público e ao descumprimento de normas jurídicas por parte dos agentes públicos. Sob esse ângulo, corrupta seria toda conduta do agente público que, no exercício das suas funções, se desvia das obrigações juridicamente postas, para satisfazer interesse privado, em troca de benefícios pecuniários ou de situações favoráveis. Existem também definições baseadas numa análise econômica da corrupção, pois corrupto seria o funcionário que utiliza seu cargo como negócio, em busca de maximizar resultados; quanto maior a demanda do público, maiores serão seus ganhos. Em terceiro lugar, vêm as definições baseadas no interesse geral e que, por conta disso, precisam ser vistas com bastante sutileza. O agente público é corrupto quando, em razão de vantagens financeiras ou de outra ordem legalmente inadmitidas, favorece os seus protetores, ainda que implementando programas de política pública que vão aproveitar a parcela significativa da sociedade. Por fim, alguns autores repelem uma definição pronta e acabada de corrupção, argumentando que o conceito deve ser formulado a partir de uma análise histórica e sociológica, sendo certo que os critérios utilizados pelos ingleses ou americanos para examinar o fenômeno da corrupção poderão mostrar-se insuficientes ou supérfluos para analisar o tráfico de influência nos países africanos, por exemplo: ressaltando-se, por igual, que condutas atualmente consideradas corruptas já foram aceitas e defendidas. Essa última forma de apreciação da corrupção leva os autores a falar em corrupção negra, cinza e branca. A negra inclui todas as condutas condenadas tanto pelas elites como pelos cidadãos comuns; a cinza corresponde às situações ambíguas ou duvidosas, sobre as quais não há consenso, ou seja, que podem ser condenadas pela elite e aprovadas pelo povo, ou vice-versa; a corrupção branca é tolerada pelo conjunto da sociedade, não recebendo oposição cerrada. Dependendo do momento histórico um caso de corrupção branca pode passar a ser cinza ou negra.

E, por fim, arremata Josenildo [22] ao afirmar que:

[...] apesar das diferenças, há um ponto em comum nas várias concepções. Todas fazem referência à ofensa aos valores morais como substrato institucionais do Estado. Basta desviar-se da finalidade institucional para que a conduta seja imoral.

Como pressuposto da boa administração pública, vem surgindo, no dizer de Sarmento [23], a Ética da Administração Pública que:

[...] fundamenta-se em um conjunto de valores morais que regem as condutas das autoridades e orientam as políticas e serviços sociais na consecução do interesse geral. [...] a realização desses valores pressupõe a existência do Estado Democrático de Direito baseado na legalidade, moralidade e respeito aos direitos humanos fundamentais. [...] Apenas nessa ambiência é que se pode falar [...] em improbidade administrativa como ato ilícito. Quando o sistema político é ilegítimo, despótico, ditatorial [...], nem todo desrespeito às normas administrativas é antiético.

Nesse sentido, é necessário relativizar o conceito de corrupção em países com elevado quantum despótico [24].

Aproveitando do conceito criado por Pontes de Miranda, Sarmento [25] afirma:

Do ponto de vista sociológico, podemos afirmar que a corrupção é um fenômeno dotado de elevado quantum despótico na medida em que fraudes, comissões ilícitas, desfalques e a venalidade das autoridades lesam o patrimônio público, impedindo que a população tenha acesso a políticas sociais que lhe assegurem uma boa qualidade de vida. A partir do momento que o poder é ocupado por um grupo político comprometido com a moralidade administrativa, com a concretização dos direitos humanos e com as instituições democráticas, ocorre a liberação de forças adaptativas que pacificam a sociedade, melhoram os serviços públicos e legitimam o poder político.

Percebe-se, portanto, que não é simplesmente a idéia de tais atos serem legais ou ilegais. Sua gênese encontra-se na concepção de tais atos serem morais ou imorais.

Feitas estas colocações, iremos partir para a análise da legislação que busca o combate à improbidade administrativa em nosso País. Desde a sua existência nas constituições pretéritas até a avançada Lei de Improbidade Administrativa que se encontra em vigor.

1.3. A evolução constitucional e legislativa da repressão à improbidade administrativa no Brasil

A Constituição Imperial de 1824 ressalta, em relação ao Imperador, a máxima de que dele não advém erros e no caso de uma possível existência de erros, não há a possibilidade de responsabilização, como exposto no art. 99: "A Pessoa do Imperador é inviolável, e Sagrada; Elle não está sujeito a responsabilidade alguma".

Por seu turno, os membros de seu Governo poderiam ser responsabilizados por seus atos de acordo com o disposto no art. 133, que dispunha que os ministros de estado seriam responsáveis, dentre outros casos, por peita, suborno, concussão e dissipação de bens públicos. Assim dispõe:

Art. 133. Os ministros de Estado serão responsáveis

I – Por traição.

II – Por peita, suborno, ou concussão.

III – Por abuso do Poder.

IV – Pela falta de observancia da Lei.

V – Pelo que obrarem contra a Liberdade, segurança ou propriedade dos Cidadãos.

VI – Por qualquer dissipação dos bens públicos.

Percebe-se, portanto, que desde a primeira Constituição brasileira há uma preocupação, mesmo que de forma muito tímida, na persecução da boa administração por parte dos membros do Poder Executivo, ressalvando-se, como já afirmado, a pessoa do Imperador. Trata-se aqui da existência de crime de responsabilidade. Não devemos esquecer, de qualquer forma, que essa disposição era apenas literal. Sarmento [26] afirma: "A Corte era administrada por gente ambiciosa e sedenta de poder. A maioria dos fidalgos mantinha fortes ligações com o tráfico de escravos, atividade extremamente lucrativa que contava com a tolerância do poder imperial". Adiante: "A competência para o exercício da função pública era o que menos importava".

A 1ª Constituição Republicana, por outro lado, já trazia em seu bojo a menção à probidade administrativa ao elencar os crimes de responsabilidade do Presidente da República. Constava do art. 54 a seguinte redação:

São crimes de responsabilidade os atos do Presidente que atentarem contra:

(omissis)

6º) a probidade da administração;

(omissis)

Como na atual Constituição, o crime de responsabilidade cometido pelo Presidente era julgado pelo Senado Federal, após a aprovação da declaração de procedência por parte da Câmara dos Deputados. Sistemática esta mantida até os dias atuais.

Em relação aos Ministros de Estado, a Constituição de 1891 também previa o julgamento dos Ministros por crimes de responsabilidade, conforme disposto no art. 52, entretanto, não fazia menção à probidade administrativa:

Art. 52 - Os Ministros de Estado não serão responsáveis perante o Congresso, ou perante os Tribunais, pelos conselhos dados ao Presidente da República.

§ 1º - Respondem, porém, quanto aos seus atos, pelos crimes em lei.

§ 2º - Nos crimes, comuns e de responsabilidade serão processados e julgados pelo Supremo Tribunal Federal, e, nos conexos com os do Presidente da República, pela autoridade competente para o julgamento deste.

Apesar da disposição constitucional de crime de responsabilidade do Presidente da República nos atos de improbidade administrativa, a República nascia com os mesmos vícios constantes da época do Império. Sarmento [27] define bem tal momento histórico:

Com a proclamação da república, em 1889, o sistema monárquico foi substituído pelo mandonismo dos chefes políticos e dos patriarcas rurais. Os cargos públicos foram loteados e distribuídos entre apadrinhados políticos e cabos eleitorais. Os primeiros anos da República foram marcados por barganhas partidárias e pela impunidade dos governantes.

Tais afirmações nos levam a diagnosticar que ainda permanecia em vigor um princípio já em desuso, que seria o da irresponsabilidade do agente público, instituído legalmente no Brasil a partir da Constituição Imperial e mantido, agora apenas como costume, por nossos administradores.

Por sua vez, a Constituição Federal de 1934, mantém a mesma idéia já defendida no bojo da Constituição de 1891. O art. 57 possui praticamente o mesmo teor do antigo art. 52, tendo sido mantida a responsabilização do Presidente da República no caso de improbidade administrativa.

Entretanto, difere da Constituição anterior por caracterizar também como crimes de responsabilidade atribuídos aos Ministros os atos constantes do art. 57, que tratam da responsabilização do Presidente da República, caracterizando, portanto, a sujeição, agora Constitucional, dos Ministros de Estado à probidade administrativa, conforme disposto no art. 61:

São crimes de responsabilidade, além do previsto no art. 37, in fine, os atos definidos em lei, nos termos do art. 57, que os Ministros praticarem ou ordenarem; entendendo-se que, no tocante às leis orçamentárias, cada Ministro responderá pelas despesas do seu Ministério e o da Fazenda, além disso, pela arrecadação da receita.

§ 1º - Nos crimes comuns e nos de responsabilidade, os Ministros serão processados e julgados pela Corte Suprema, e, nos crimes conexos com os do Presidente da República, pelo Tribunal Especial.

A Constituição Federal de 1937 manteve a mesma sistemática que vinha sendo utilizada nas Constituições anteriores ao manter a probidade administrativa como crime de responsabilidade do Presidente da República, conforme disposto no art. 85:

São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República definidos em lei, que atentarem contra:

(omissis)

d) a probidade administrativa e a guarda e emprego dos dinheiros público;

A Constituição Federal de 1946 utiliza a mesma sistemática adotada na Constituição de 1934, repetindo, inclusive, a redação dos artigos referentes. Entretanto, o art. 141, § 31 indica a possibilidade de o Estado poder reaver legalmente dinheiros que foram desviados do Erário, passando a compor patrimônio privado. Assim, dispõe o referido artigo:

A Constituição assegura aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, à liberdade, a segurança individual e à propriedade, nos termos seguintes:

(omissis)

§ 31 - Não haverá pena de morte, de banimento, de confisco nem de caráter perpétuo. São ressalvadas, quanto à pena de morte, as disposições da legislação militar em tempo de guerra com país estrangeiro. A lei disporá sobre o seqüestro e o perdimento de bens, no caso de enriquecimento ilícito, por influência ou com abuso de cargo ou função pública, ou de emprego em entidade autárquica. (grifo nosso)

Esta norma necessitava de regulamentação, não sendo auto-aplicável. O País passava naquele momento por um aumento desenfreado da corrupção, sendo o primeiro escalão do Governo Vargas denunciado sistematicamente de envolvimento em escândalos financeiros. Foi nesse contexto que o Deputado Ari Pitombo, ainda de forma muito tímida, em 1951, propôs um projeto para regulamentar o supramencionado dispositivo. Tal iniciativa foi pioneira, e propiciava a proposição de ação civil contra os servidores que praticavam tais atos.

Mesmo sendo a aprovação de uma lei regulamentando tal dispositivo constitucional, e, acima de tudo, uma lei de extrema importância que visava moralizar, mesmo que timidamente, o serviço público, a mesma só veio a ser aprovada em 1957, recebendo o nº 3.164, e, o seu relator o Deputado Gódoi Ilha já demonstrou, naquele instante, a necessidade de se manter a independência das instâncias cíveis e penais. Mesmo que o acusado viesse a ser inocentado das acusações em processo criminal, tal julgamento não impediria a possibilidade de ação civil objetivando a perda dos bens ilicitamente adquiridos.

Tal lei ficou mais conhecida como a Lei Pitombo-Godói Ilha, e, deve-se a ela a introdução dos seguintes institutos no ordenamento brasileiro, na síntese de Sarmento [28]:

  1. Medida cautelar de seqüestro de bens do agente público acusado de enriquecimento ilícito;

  2. Reversão à fazenda pública dos bens adquiridos por influência ou abuso de cargo público;

  3. Competência do juízo cível para a apreciação da ação civil pública;

  4. Independência das esferas cível e criminal em matéria de improbidade administrativa;

  5. Criação do registro público obrigatório de valores e bens pertencentes ao patrimônio privado dos servidores da União, Estados e Municípios;

  6. Obrigatoriedade de atualização bienal dos bens dos agentes públicos e respectivos cônjuges, sob pena de demissão na hipótese de falsidade das informações;

  7. Legitimação do Ministério Público para a propositura de ação cível de ressarcimento ao erário.

Em 1958, foi sancionada a Lei nº 3.502, que complementava a Lei Pitombo-Godói Ilha. Apesar do surgimento da primeira lei visando o combate à improbidade administrativa, o País vivia um momento de escalada da corrupção, chegando a colocar em risco as instituições democráticas. Em relação ao descontentamento da sociedade, Francisco Bilac Pinto [29], filho do autor do projeto de lei, definiu muito bem tal descontentamento:

Em nosso país, atualmente, ninguém se anima a denunciar as falhas de conduta moral de políticos e servidores públicos, pela certeza de que seu zelo pela decência da administração não encontrará eco favorável nas esferas responsáveis pela direção do respectivo serviço público. [...] Os que ousam denunciar os escândalos administrativos de que têm conhecimento, correm o risco de receber punição disciplinar por essa imprudência. (grifo no original)

À época, a improbidade administrativa era tratada como sinônimo de enriquecimento ilícito, e foi nesse sentido que a Lei nº 3.502/58, conhecida por Lei Bilac Pinto, buscou se tornar eficaz instrumento de combate à improbidade, e, no dizer de Sarmento [30], introduziu as seguintes matérias:

  1. tipificação dos atos de enriquecimento ilícito, através da descrição das transgressões mais comuns no serviço público;

  2. ampliação do conceito de servidor público;

  3. equiparação dos atos de enriquecimento ilícito aos crimes contra a administração e o patrimônio público;

  4. especificação do procedimento cautelar de seqüestro dos bens do agente público acusado de enriquecimento ilícito;

  5. inclusão do ressarcimento ao erário e indenização por perdas e danos como sanções aplicáveis às hipóteses de enriquecimento ilícito.

O surgimento dessas duas leis infelizmente não tiveram o resultado esperado. Ambas se tornaram letras mortas e não foram utilizadas como meio de coibir atos de improbidade e não é noticiado nenhum julgamento exemplar. É evidente que não houve vontade política suficiente objetivando a plena aplicação da lei, que, embora reducionista no conceito de atos de improbidade administrativa – limitando-se a caracterizar tais atos apenas os casos de enriquecimento ilícito – não foi plenamente levada a cabo, até mesmo pela ausência da independência do Poder Judiciário.

George Sarmento [31], com muita propriedade, em relação ao conceito reducionista de corrupção, leciona:

[...] a concepção reducionista de corrupção, que restringia o delito aos casos de enriquecimento ilícito, foi incapaz de conter o crescimento das novas formas de improbidade administrativa, cada vez mais sofisticadas e eficientes. Isso sem falar nas condutas flagrantemente desonestas que ficavam impunes em razão da ausência de previsibilidade legal. O financiamento de campanhas políticas foi o exemplo mais contundente desse vazio normativo.

A Constituição de 1967 e sua respectiva Emenda Constitucional de 1969, que transformou a Constituição de 1967 em outra muito diferente de seus ideais originais, manteve a mesma sistemática adotada anteriormente nas outras Constituições sobre os atos de improbidade administrativa e sua responsabilização.

A Constituição de 1988, por seu turno, deu um salto no que trata da busca pela moralidade administrativa. Ao reforçar os poderes do Ministério Público, dando-lhe atribuições para combater a má gestão e a corrupção, confere legitimidade aos Promotores de Justiça para propor ações civis públicas contra atos de improbidade administrativa.

Em quatro disposições, a Carta Magna emprega o termo "probidade", ou, na forma negativa, "improbidade". A primeira menção se encontra no art. 14, § 9º:

Lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato, considerada a vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício da função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta. (grifo nosso)

Adiante, em seu art. 15, a Constituição Federal dispõe:

É vedada a cassação de direitos políticos cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de:

(omissis)

V – improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º.

Ademais, a Constituição de 1988, brilhantemente, em seu art. 37, desde a sua redação original, contemplou o princípio da moralidade como fundamental ao funcionamento da Administração pública. Ele tinha a seguinte redação: "A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade [...]". Com o advento da Emenda Constitucional nº 19/98 foi adicionado, aos princípios já existentes no caput do referido artigo, o princípio da eficiência, traduzindo, portanto, uma nova concepção de Administração Pública, concepção esta, que busca tornar a administração da coisa pública eficiente sem deixar de lado a moral ímpar que deve servir como base nos atos dos administradores públicos.

Buscando responsabilizar os agentes públicos que praticam atos de improbidade administrativa, a Constituição Federal, em seu art. 37, § 4º, previu várias sanções a serem previstas em lei, nos seguintes termos:

Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.

Adiante, em seu art. 37, §5º, a Constituição Federal ainda consagra o princípio da imprescritibilidade da ação civil pública que objetiva a reparação de prejuízos causados ao erário, tendo em vista a taxatividade de seu enunciado:

A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento.

Em consonância com o ideal de tornar o controle da moralidade administrativa e da boa administração pública inerente à própria administração e, sendo todo poder emanado do povo, a Constituição conferiu-lhe o direito de propor ação popular em defesa do patrimônio público e da moralidade administrativa, conforme dispõe o art. 5º, inciso LXXIII:

Qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente, ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência. (grifos nossos)

Por fim, a última menção à probidade administrativa na nossa Constituição Federal se encontra no art. 85 que dispõe:

São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra:

(omissis)

V – a probidade na administração

(omissis)

Tendo em vista que a norma constante do §4º, do artigo 37 da CF é de eficácia contida, necessitando, para sua plena eficácia, de regulamentação, as Leis Pitombo-Godói Ilha e Bilac Pinto foram recepcionadas pela Constituição. Entretanto, não eram suficientes para coibir os atos de improbidade administrativa dentro da nova perspectiva do princípio da moralidade administrativa dada pela nova Constituição. De tal sorte que, o então Ministro da Justiça do Governo Collor, Jarbas Passarinho, apresentou ao Presidente da República um anteprojeto que previa a responsabilização de agentes públicos implicados em enriquecimento ilícito. Este anteprojeto foi apresentado à Câmara dos Deputados em 1991.

Aproveitando o interesse do Governo Federal em disciplinar a matéria constante do artigo 37, § 4º, da CF, os Deputados José Dutra e Carlos Alberto Campista e o Senador Pedro Simon apresentaram substitutivos que alteraram completamente o perfil tímido do Projeto de Lei apresentado. A matéria foi aprovada em 1992, nascendo a partir daí a Lei nº 8.429/92, bem mais avançada do que as outras duas leis que já trataram da matéria e que foram revogadas por ela, abrindo assim o caminho para a implantação de um novo paradigma para a administração pública no Brasil.

A Lei de Improbidade Administrativa trouxe muitas novidades em relação às anteriores. Podemos perceber de pronto a ampliação do conceito de improbidade administrativa. Nas outras duas leis já citadas o ato de improbidade administrativa era sinônimo de enriquecimento ilícito. Agora, além do enriquecimento ilícito, foram acrescentadas mais duas espécies de atos de improbidade: a gestão ruinosa do erário e a violação aos princípios da administração pública. Tais atos constam de forma genérica no caput dos arts. 9º, 10º e 11, respectivamente, e seus incisos elencam as transgressões mais comuns não sendo, de maneira alguma, taxativos.

Adiante, a referida Lei estabelece um padrão ético a ser seguido por todos os agentes públicos, ao exigir a estrita observância aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos (art. 4º). O referido artigo é uma repetição do art. 37 da Constituição Federal em sua redação original – o referido dispositivo foi alterado pela Emenda Constitucional nº 19/98, portanto, muito posterior à edição da Lei de Improbidade Administrativa, razão pela qual o princípio da eficiência não se encontra presente no dispositivo em análise. Embora seja uma mera repetição da Constituição Federal, Marcelo Figueiredo [32] ressalta a importância do referido artigo:

Ressalte-se a importância do comando, notadamente no Brasil, onde os agentes públicos, diretamente, interpretam regulamentos e demais atos administrativos de modo totalmente divorciado da lei. Nunca é demais repetir: a Administração nada pode senão aquilo que a lei lhe comanda e determina.

A Lei de Improbidade Administrativa ainda se preocupou em exigir que os agentes públicos apresentem anualmente declaração de bens e valores patrimoniais, sob pena de demissão, caso recuse-se a prestar a declaração de bens, objetivando o controle da evolução patrimonial de seus servidores (art. 13).

A Lei nº 8.429/92 consagrou a independência das sanções penais, civis e administrativas pela prática do mesmo ato ilícito, independência esta de importância fundamental para o desenvolvimento deste trabalho, razão pela qual, será mais bem estudada no momento oportuno.

Por fim, outra grande novidade foi a ampliação dos sujeitos passivo e ativo dos atos de improbidade. O art. 1º tem a seguinte redação:

Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei.

Parágrafo único: Estão também sujeitos às penalidades desta lei os atos de improbidade praticados contra o patrimônio de entidade que receba subvenção, benefício ou incentivo, fiscal ou creditício, de órgão público bem como daquelas para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com menos de cinqüenta por cento do patrimônio ou receita anual, limitando-se, nestes casos, a sanção patrimonial à repercussão do ilícito sobre a contribuição dos cofres públicos.

Adiante, o artigo 2º dispõe:

Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.

É possível perceber a partir da leitura dos dois artigos citados acima a amplitude dos conceitos tanto do sujeito ativo como do sujeito passivo. Iremos nos debruçar acerca do conceito de sujeito ativo de atos de improbidade administrativa mais à frente.

Assim, Fernando Grela Vieira [33] afirma que a Lei nº 8.429/92 "constitui marco de uma nova cultura no trato da coisa pública, pois até então o gestor público não estava acostumado a ter seus atos questionados e submetidos ao controle judicial, como passou a ser feito".

Vê-se, portanto, desta breve análise acerca de alguns pontos importantes da Lei de Improbidade Administrativa o quanto seus conceitos são elásticos e a importância que a mesma deu ao cuidado da coisa pública. Afastou a idéia de que improbidade administrativa seria apenas o enriquecimento ilícito e adicionou duas novas espécies como já mencionado. Tudo isso leva a crer que temos agora um meio avançadíssimo de controle da coisa pública.


Capítulo 2 - Os princípios constitucionais norteadores da moralidade administrativa

Antes de analisarmos o princípio da moralidade, é importante tecer algumas palavras acerca dos princípios constitucionais.

Os princípios constitucionais estão postos como sendo a base estrutural de todo o ordenamento jurídico. É inconcebível a realização de qualquer estudo e não dedicarmos alguma atenção a este tema, principalmente quando o tema primordial deste trabalho - a improbidade administrativa - emana do princípio constitucional da moralidade.

George Sarmento [34] define princípio da seguinte forma: "Etimologicamente, o vocábulo princípio deriva do latim e significa ponto de partida, origem de uma ação, de um conhecimento, a base ética de uma estrutura organizacional ou os alicerces de determinada ciência" (grifo no original).

Fica claro, de pronto, que os princípios possuem uma função de sustentar todo o ordenamento jurídico. Nesse sentido, colacionamos a definição de Celso Antônio Bandeira de Mello [35] que tão bem demonstra a sua importância e as conseqüências lógicas do enfrentamento às suas disposições:

Princípio [...] é, por definição, mandamento nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalização do sistema normativo, no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido harmônico. É o conhecimento dos princípios que preside a intelecção das diferentes partes componentes do todo unitário que há por nome sistema jurídico positivo.

Violar um princípio é muito mais grave que transgredir uma norma qualquer. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um específico mandamento obrigatório mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais, contumélia irremissível a seu arcabouço lógico e corrosão de sua estrutura mestra.

Isto porque, com ofendê-lo, abatem-se as vigas que o sustêm e alui-se toda a estrutura neles esforçada.

Bandeira de Mello demonstra a importância dos princípios como base de sustentação de todo o ordenamento jurídico, no mesmo sentido que, por ser o alicerce de todo o ordenamento, a sua violação conseqüentemente equipara-se a violação de todo o ordenamento e não apenas a determinado mandamento.

A Constituição Federal de 1988 alçou à categoria de normas constitucionais os princípios da legalidade, moralidade, impessoalidade, publicidade e eficiência, que devem presidir as atividades da Administração Pública direta, indireta e fundacional, conforme disposto em seu art. 37.

2.1. O princípio da moralidade administrativa

De todos os princípios previstos no art. 37, da Constituição Federal, o que surge com maior importância é o princípio da moralidade. Nas palavras de Wallace Paiva Martins [36], o princípio da moralidade "constitui verdadeiro superprincípio informador dos demais (ou um princípio dos princípios), não se podendo reduzi-lo a mero integrante do princípio da legalidade".

A respeito da moral, importante trazemos logo à baila a lição de Emerson Garcia [37]:

Moral, como se sabe, é algo mais fácil de ser sentido do que propriamente definido. Trata-se de conceito eminentemente variável, sofrendo acréscimos, ajustes e supressões em conformidade com os critérios de ordem sociológica vigentes no meio em que se desenvolverá a sua análise; critérios estes que variarão em conformidade com os costumes e os padrões de conduta delimitadores do alicerce ético do grupamento. Moral, por conseguinte, é noção de natureza universal, apresentando conteúdo compatível com o tempo, o local e os mentores de sua concepção.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro [38] afirma que, embora alguns autores não aceitem a existência do princípio da moralidade haja vista entenderem que o conceito de moral administrativa é vago e impreciso resultando em sua absorção pelo princípio da legalidade, "antiga é a distinção entre Moral e Direito, ambos representados por círculos concêntricos, sendo o maior correspondente à moral e, o menor, ao direito." Vai mais além e afirma: "Licitude e honestidade seriam os traços distintivos entre o direito e a moral, numa aceitação ampla do brocardo segundo o qual non omne quod licet honestum est (nem tudo que é legal é honesto)".

Não iremos nos aprofundar na já conhecida distinção entre Moral e Direito, até porque não é o objetivo primordial deste estudo ir tão a fundo à concepção jusfilosófica do princípio da moralidade. Não iremos nos ater, também, às causas e efeitos acerca do surgimento da teoria do desvio de poder. Para nós é importante apenas a concepção de que a moralidade administrativa surge para combater o desvio de poder, razão pela qual passaremos direto ao estudo do princípio da moralidade administrativa.

O princípio da moralidade administrativa teve como primeiro defensor Maurice Hauriou que definia a moralidade administrativa como o "conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração" [39]. Maria Sylvia [40] com base nos pensamentos de Hauriou leciona que com o surgimento da moralidade administrativa é necessário fazer a distinção:

[...] não só o bem e o mal, o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, mas também entre o honesto e o desonesto; há uma moral institucional, contida na lei, imposta pelo Poder Legislativo, e há a moral administrativa, que é ‘imposta de dentro e vigora no próprio ambiente institucional e condiciona a utilização de qualquer poder jurídico, mesmo o discricionário’.

O objetivo primordial do princípio da moralidade é a luta contra o desvio de poder nos atos administrativos. Nesse sentido, Hauriou [41] leciona:

[...] a legalidade dos atos jurídicos administrativos é fiscalizada pelo recurso baseado na violação da lei; mas a conformidade desses atos aos princípios basilares de ‘boa administração’, determinante necessária de qualquer decisão administrativa, é fiscalizada por outro recurso, fundado no desvio de poder, cuja zona de policiamento é a zona da ‘moralidade administrativa’.

É importante traçarmos um marco divisório entre a moral administrativa e a moral comum. Nesse sentido, fazemos nossas as palavras de Josenildo da Costa Santos que muito bem disserta sobre o tema:

A moral administrativa não coincide com a moral comum. Esta condiciona a conduta externa do ser humano; a primeira vincula a conduta interna do administrador, a quem não se admite possa agir tendo em vista finalidade diversa do bem comum, e que deve consagrar-se às exigências da instituição e nunca de quaisquer outras instâncias [42].

Mais a frente em seu estudo, Josenildo da Costa Santos [43] define a moralidade institucional como sendo:

[...] o conjunto de regras de conduta objetiva, distinta da moral comum, que impõe o dever de resguardar o desenvolvimento dos seres humanos, enquanto corpos da coletividade, e a sua dignidade, com a imposição de limites (consciência do que é justo, injusto, bom ou mal, de acordo não com valores pessoais mas com o objetivo de alcançar, o desejável e possível bem comum) e de obrigações recíprocas entre os sujeitos.

Ao mesmo tempo, deve-se perceber que o fim almejado pelo ato administrativo é o bem comum e é nesse sentido que a defesa da moralidade institucional finca a sua bandeira. No dizer de Sarmento [44]:

A finalidade do ato administrativo será sempre pública, porque voltada para o interesse coletivo, para o bem comum. Quando o servidor, no exercício de suas atribuições, distancia-se desses parâmetros ético-jurídicos, incorrerá na improbidade administrativa [...] A conduta desviante implica abuso de cargo, emprego ou função pública ou traição aos princípios administrativos.

Ainda nesse sentido, José Augusto Delgado [45] leciona:

[...] a administração pública não está somente sujeita à lei. O seu atuar encontra-se subordinado aos motivos e aos modos de agir, pelo que inexiste liberdade de agir. Deve, assim, vincular a gestão administrativa aos anseios e necessidades dos administrados, mesmo que atue, por autorização legal, como senhor da conveniência e oportunidade. Qualquer excesso a tais limites implica adentrar na violação do princípio da moralidade administrativa sempre exigindo uma correta atividade.

No mesmo sentido, José Afonso da Silva [46] leciona:

Pode-se pensar na dificuldade que será desfazer um ato, produzido conforme a lei, sob o fundamento de vício de moralidade. Mas isso é possível porque a moralidade administrativa não é meramente subjetiva, porque não é puramente formal, porque tem conteúdo jurídico a partir de regras e princípios da Administração. A lei pode ser cumprida moralmente ou imoralmente. Quando sua execução é feita, p. ex., com intuito de prejudicar alguém deliberadamente, ou com intuito de favorecer alguém, por certo que se está produzindo um ato formalmente legal, mas materialmente comprometido com a moralidade administrativa. (grifo no original)

Como demonstrado, todo exercício de poder só será legítimo se com obséquio à moralidade administrativa. Fica claro, portanto, a importância que o princípio da moralidade possui para a boa administração e para a concepção de administração direcionada para o bem comum – objetivo primordial da Administração Pública.

2.2. O princípio da probidade administrativa

George Sarmento [47] informa que foi Cícero quem definiu a base de sustentação da improbidade administrativa. Ele afirma que:

Cícero lançou as bases da probidade administrativa ao afirmar que o homem púbico não deve desejar nada que não seja honesto, justo e decoroso. Para ele, a cobiça expressava a baixeza da alma; já o desapego às coisas materiais e o desprezo à riqueza eram a principal manifestação da fortaleza de caráter. Também sustentava que o homem público deveria estar sempre disposto a correr riscos e a enfrentar as adversidades com coragem e serenidade. Em uma passagem do Tratado dos Deveres, Cícero confessa sua admiração pelos servidores da República, asseverando que ‘a vida dos homens que se consagram à gestão dos negócios públicos e à realização dos grandes projetos é mais útil ao gênero humano e mais plena de brilho e esplendor’. No De officis, é taxativo ao afirmar que um dia vivido honestamente é preferível a uma imortalidade imoral.

A probidade administrativa veste-se como uma espécie de subprincípio da moralidade administrativa, fundamentando-se, como bem diz Sarmento [48], na "honestidade funcional". Segue: "enquanto a moralidade vincula-se à noção de boa administração visando à satisfação dos interesses coletivos, a probidade tem como núcleo o dever de honestidade no trato da coisa pública".

Acerca da existência de subprincípios, trazemos a seguinte lição de Cármen Lúcia Antunes Rocha [49]: "os princípios constitucionais são primários. Deles decorrem outros princípios, que são subprincípios em relação aos anteriores, e que se podem conter, expressa ou implicitamente, no próprio sistema constitucional". Mais a frente em seu estudo, Cármen Lúcia continua:

[...] os subprincípios constitucionais são secundários e menos gerais que os princípios, mas regem-se pela mesma fundamentalidade reguladora que domina todas as diretrizes básicas constitucionalmente fixadas. São eles decorrentes daqueles, dos quais nascem e para cujas aplicação e realização se acrescem aos primários [...] a fim de dar leveza e concretude às normas constitucionais. As definições principiológicas constitucionalmente estabelecidas complementam-se pelos subprincípios. [50]

José Afonso da Silva [51] afirma que "a improbidade administrativa é uma imoralidade administrativa qualificada pelo dano ao erário e correspondente vantagem ao ímprobo ou a outrem".

Assim, Marcello Caetano [52], explica o dever de probidade como aquele pelo qual:

[...] o funcionário deve servir à Administração com honestidade, procedendo no exercício de suas funções sempre no intuito de realizar os interesses públicos, sem aproveitar os poderes ou facilidades delas decorrentes em proveito pessoal ou de outrem a quem queira favorecer.

Na mesma linha, Marino Pazzaglini Filho [53] leciona:

O princípio da probidade administrativa, resultante dos princípios constitucionais basilares da legalidade e da moralidade, significa, como já ressaltado, que o agente público, no desempenho de suas funções, tem o dever jurídico de agir com honestidade, decência, honradez, movido sempre e exclusivamente pela concreção dos fins do interesse público da Administração a que está vinculado.

Por sua vez, Wallace Paiva Martins Júnior [54] afirma:

[...] a probidade administrativa estabelece-se internamente como dever funcional inserido na relação jurídica que liga o agente público à Administração Pública (sendo esta titular do direito) e, externamente, determina que nas relações jurídicas com terceiros a Administração Pública por seus agentes observe o seu postulado.

Importante, pela lucidez de seu comentário, trazer à baila os ensinamentos de Juarez Freitas [55] que define o princípio da probidade da seguinte forma:

O princípio da probidade administrativa consiste na proibição de atos desonestos ou desleais para com a Administração Pública, praticados por agentes seus ou terceiros, com os mecanismos sancionatórios inscritos na Lei n. 8.429/92, que exigem aplicação cercada das devidas cautelas para não transpor os limites finalísticos traçados pelo ordenamento.

Por fim, se faz necessário trazer as palavras de Martins Júnior [56] ao afirmar que o princípio da probidade administrativa, mesmo que decorrente do princípio da moralidade "adquire contorno próprio por sua função instrumentalizadora da moralidade administrativa, desempenhando, assim, uma atuação sensível de garantia da eficácia".

Passemos então à análise da relação existente entre moralidade, legalidade e probidade.

2.3. Moralidade, legalidade e probidade

A relação existente no trinômio: moralidade, legalidade e probidade é de fundamental importância. Não se deve confundir moralidade com legalidade e ambas com a probidade. Já tecemos comentários acerca do princípio da moralidade administrativa e acerca do princípio da probidade, de tal sorte que ambas já se encontram muito bem delimitados e suas diferenças se encontram expostas, mesmo assim, é de suma importância que façamos uma análise mais acurada acerca do enlace entre os três princípios.

Sarmento [57] inicia tal análise com um questionamento que se faz questão trazer à baila e, que, conseqüentemente, irá nos guiar em nossa atual jornada: "a moralidade administrativa manifesta-se no plano ético ou no jurídico?".

A discussão levantada no questionamento acima é de suma importância. Sabemos que as normas jurídicas possuem o papel de orientar a conduta da sociedade. Não possuem papel diverso as normas morais. Temos, entretanto, que apontar algum ponto de distinção, razão pela qual, utilizamo-nos da lição de Hermes Lima [58] ao pontuar que a "distinção entre elas está na natureza do castigo". Que continua:

As sanções morais atuam em duas frentes: (a) no universo psicológico do indivíduo, através da vergonha, do arrependimento, das crises de consciência, e (b) no meio social, pela reprovação pública [...] As sanções jurídicas são marcadas pela coerção estatal, justificada pela manutenção da ordem pública, da paz social e da segurança jurídica.

Como exposto através das palavras de Hermes Lima, as sanções morais implicam juízo de reprovação perante a sociedade e as sanções jurídicas implicam no castigo imposto pelo Estado. No dizer de Hans Kelsen [59], "a Moral é uma ordem positiva sem caráter coercitivo, ao passo que o Direito caracteriza-se pela coerção normativa socialmente organizada", ao passo que, de qualquer sorte, ambas não estão em posições estanques. Nesse sentido, determinados valores constantes da moral acabam por ser absorvidos pelo Direito. Sarmento [60] ressalta: "Esse é o caso da moralidade administrativa, que é composta por um conjunto de valores que foram juridicizados e transformados em normas jurídicas cogentes".

Logo, fica claro que quando o Direito absorve determinados valores defendidos pela moral, esta, ao ser inserida na norma jurídica, reaparece como uma moralidade administrativa dotada de coercitividade - característica fundamental das normas jurídicas.

Já percebemos, então, que há nos primórdios a noção de moralidade e legalidade. A primeira decorre de imposições de condutas sociais aceitáveis, a segunda decorre de imposições normativas. Sabe-se, ainda, que ambas não estão em universos estanques e a comunicação de ambas faz com que o Direito acabe por absorver valores que são albergados pela moral surgindo, assim, a moral administrativa.

Plácido e Silva [61] leciona que o vocábulo improbidade, que deriva do latim improbitas, tem o sentido de desonestidade, má fama e má índole e "revela a qualidade do homem que não procede bem, por não ser honesto, que age indignamente, por não ter caráter, que não atua com decência, por ser amoral" e "sem capacidade ou idoneidade para a prática de certos atos".

Como muito bem leciona Maria Sylvia [62]:

[...] não é fácil estabelecer distinção entre moralidade administrativa e probidade administrativa. A rigor, pode-se dizer que são expressões que significam a mesma coisa, tendo em vista que ambas se relacionam com a idéia de honestidade na Administração Pública. Quando se exige probidade ou moralidade administrativa, isso significa que não basta a legalidade formal [...] é preciso também a observância de princípios éticos, de lealdade, de boa-fé [...]

Adiante, Di Pietro [63], ainda tecendo considerações acerca da relação entre moralidade e improbidade administrativa afirma:

A improbidade administrativa, como ato ilícito, vem sendo prevista no direito positivo brasileiro desde longa data, para os agentes políticos, enquadrando-se como crime de responsabilidade. Para os servidores públicos em geral, a legislação não falava em improbidade, mas já denotava preocupação com o combate à corrupção, ao falar em enriquecimento ilícito no exercício do cargo ou função, que sujeitava o agente ao seqüestro e perda de bens em favor da Fazenda Pública. O mesmo não ocorreu com a lesão à moralidade. A inclusão do princípio da moralidade administrativa entre os princípios constitucionais impostos à Administração é bem mais recente, porque ocorreu apenas com a Constituição de 1988. Vale dizer que, nessa Constituição, quando se quis mencionar o princípio, falou-se em moralidade (art. 37, caput) e [...] quando se quis mencionar à lesão à moralidade administrativa, falou-se em improbidade (art. 37, par. 4º); do mesmo modo a lesão à probidade administrativa aparece como ato ilícito no artigo 85, V, entre os crimes de responsabilidade do Presidente da República, e como causa de perda ou suspensão dos direitos políticos no artigo 15, V.

Alexandre de Moraes [64] também se preocupa na definição de atos de improbidade administrativa afirmando, in verbis:

Atos de improbidade administrativa são aqueles que, possuindo natureza civil e devidamente tipificados em lei federal, ferem direta ou indiretamente os princípios constitucionais e legais da administração publica, independentemente de importarem enriquecimento ilícito ou de causarem prejuízo material ao erário público.

Adiante, Alexandre de Moraes [65], fazendo uso da lição de Manoel Gonçalves Ferreira Filho, ainda ressalva que a lei de improbidade "não pune a mera ilegalidade, mas sim a conduta ilegal ou imoral do agente público, e de todo aquele o auxilie, voltada para a corrupção".

No mesmo sentido e, corroborando a definição acima referida, tem-se o magistério de Maria Sylvia Zanella Di Pietro [66]:

Comparando moralidade e probidade, pode-se afirmar que, como princípios, significam praticamente a mesma coisa, embora algumas leis façam referência às duas separadamente, do mesmo modo que há referência aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade como princípios diversos, quando este último é apenas um aspecto do primeiro.

No entanto, quando se fala em improbidade como ato ilícito, como infração sancionada pelo ordenamento jurídico, deixa de haver sinonímia entre as expressões improbidade e imoralidade, porque aquela tem um sentido muito mais amplo e muito mais preciso, que abrange não só atos desonestos ou imorais, mas também e principalmente atos ilegais. Na lei de improbidade administrativa [...] a lesão à moralidade administrativa é apenas uma das inúmeras hipóteses de atos de improbidade previstos em lei.

Aristides Junqueira Alvarenga [67] conceitua a improbidade administrativa como "espécie do gênero imoralidade administrativa, qualificada pela desonestidade de conduta do agente público, mediante a qual este se enriquece ilicitamente, obtém vantagem indevida, para si ou para outrem, ou causa dano ao erário". Ele continua: "É essa qualificadora da imoralidade administrativa que aproxima a improbidade administrativa do conceito de crime, não tanto pelo resultado, mas principalmente pela conduta, cuja índole de desonestidade manifesta a devassidão do agente".

José Armando da Costa [68] fornece a seguinte definição da improbidade administrativa:

Como infração de natureza disciplinar, a improbidade administrativa define-se como sendo a ação ou omissão, dolosa ou voluntária, praticada por agente público, que, consistindo em ato de desonestidade, cause lesão ao erário, implique enriquecimento ilícito (com obtenção de qualquer vantagem patrimonial em razão da função pública que exerce) ou atente contra os princípios da Administração Pública.

Sobre a conduta de um agente público, Aristides Junqueira Alvarenga [69], ressalva que o ato praticado pode ir contra o princípio da moralidade administrativa, entretanto, apenas isso não o tornará um ato de improbidade haja vista não ter todos os elementos necessários à identificação como tal, in verbis:

Assim, a conduta de um agente público pode ir contra o princípio da moralidade, no seu estrito sentido jurídico-administrativo, sem, contudo, ter a pecha de improbidade, dada a ausência de comportamento desonesto, atributo esse que distingue a espécie (improbidade) do gênero (imoralidade).

Achamos de extrema importância, ainda, a lição de Mauro Roberto Gomes de Mattos [70], ao tecer comentários acerca do caput do art. 11 da LIA:

Notamos que o art. 11 equipara, sem autorização constitucional, ilegalidades ou vícios administrativos como atos ímprobos.

Improbidade [...] está ligada juridicamente à desonestidade, devassidão e má-fé, em que o agente público, utilizando-se intencionalmente de uma prerrogativa funcional, procede com falta de decência, lesando o erário.

No mesmo sentido, José Emmanuel Burle Filho [71] ressalta que "não é qualquer violação da lei ou dos princípios constitucionais [...] que caracteriza a improbidade administrativa." E adiante: "Nesta, a ilegalidade tem que estar qualificada pela desonestidade".

Assim, concordamos com o que leciona Josenildo dos Santos [72] ao afirmar:

A imoralidade é mais ampla que a improbidade. Todo comportamento ímprobo é imoral. O contrário não pode ser verdade. Por tal razão, ao caput do art. 11 da Lei nº 8.429/92 que tem a seguinte redação: ‘Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade e lealdade às instituições’, deve-se dar uma interpretação conforme a constituição, sob pena de se lhe negar validade. Não se pode considerar improbidade qualquer ataque à legalidade. (grifo no original)

Após todo o exposto, percebe-se, claramente, a distinção existente entre moralidade, legalidade e probidade. Podemos, portanto, passar para o próximo ponto, a saber, o estudo acerca dos sujeitos ativos dos atos de improbidade administrativa.


Capítulo 3 - Sujeitos ativos dos atos de improbidade administrativa

A Lei de Improbidade Administrativa, logo em seus primeiros artigos, define quais os sujeitos passíveis de responsabilização pela prática de atos de improbidade. Com o objetivo de alcançar todas as pessoas que poderiam praticar tais atos, adotou conceitos genéricos procurando, como já dito, albergar todos os que, de qualquer forma, exerceriam o munus público. Vejamos assim o que dispõe o artigo 1º:

Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público, servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na forma desta lei. (grifo nosso)

O supracitado artigo dispõe acerca de quais seriam os sujeitos ativos e passivos dos atos de improbidade administrativa. No art. 2º, encontramos a definição do legislador para o que se considera agente público perante a Lei de Improbidade Administrativa:

Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.

Deixaremos para tecer comentários acerca do alcance do termo "agente público", bem como ampliar a discussão acerca das disposições constantes no artigo supracitado mais a frente.

Adiante, a Lei de Improbidade Administrativa trata em seu artigo 3º da responsabilização de terceiros que praticam atos de improbidade. Assim, dispõe:

As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.

Sabe-se, por oportuno, que nem sempre a interpretação literal é a mais indicada simplesmente porque não adentra nos motivos que levaram à edição da norma. Entretanto, no presente caso, é patente que a interpretação literal do dispositivo nos leva ao resultado esperado pelo legislador pátrio ao procurar, com expressões genéricas, alcançar todas as pessoas que poderiam exercer atos de improbidade administrativa. Nesse sentido, afirma Mauro Roberto Gomes de Mattos [73]: "a Lei de Improbidade abrange, de uma forma ampla, todos os que direta ou indiretamente se relacionam com o Poder Público, com o objetivo de não deixar ninguém excluído do campo de ação das sanções que ela dispõe".

3.1. Sujeitos ativos de atos de improbidade administrativa.

Todo o estudo acerca dos sujeitos ativos dos atos de improbidade administrativa deve levar em consideração a técnica legislativa empregada na concepção da Lei em comento. Há uma conectividade entre as disposições dos artigos 1º, 2º e 3º. Nesse sentido, leciona Emerson Garcia [74]:

Ante a técnica legislativa adotada, considerando sujeitos ativos em potencial os agentes que mantenham algum tipo de vínculo com os sujeitos passivos, a individualização daqueles pressupõe a exata identificação destes, tornando contraproducente ou mesmo infrutífera qualquer tentativa de análise isolada.

É importante destacar que a Lei nº 8.429/92 ampliou sua órbita de alcance atingindo todo aquele que se vincula à Administração. No dizer de Wallace Paiva Martins [75]:

A própria lei dilata a sua órbita, pois de maneira exemplificativa emprega a expressão ‘ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo’ (art 2º), dando concepção bem ampla à expressão ‘função pública’ como qualquer forma de vinculação, funcional ou contratual, remunerada ou não, definitiva ou transitória, do agente (pessoa física ou jurídica) com a Administração Pública direta, indireta e fundacional [...] para a prestação de um serviço público ou de utilidade pública.

Adiante, Martins [76] ressalta que a "lei não se esgota no servidor público". A Lei de Improbidade Administrativa "abrange também o particular em colaboração com a Administração Pública (tabeliães, [...] concessionários de serviço público [...]); enfim alcança o gênero maior e mais abrangente, que é o de agente público, incluindo o agente político".

Por fim e no mesmo sentido, como muito bem assevera Luiz Gonzaga Pereira Neto [77], "a Lei de Improbidade Administrativa não exige que o agente seja servidor público, muito pelo contrário, prevê que não se exigirá tal condição para aplicação das penas nela previstas".

Percebe-se, assim, a vontade do legislador em proteger a administração pública sujeitando todos os possíveis agentes praticantes de atos de improbidade administrativa. Trata-se, portanto, de um grande avanço no combate à corrupção e malversação das verbas públicas, que se encontra em perigo, como poderá se perceber quando da análise do último posicionamento do Supremo Tribunal Federal a respeito do tema.

3.2. Alcance do termo agente público constante da lei de improbidade administrativa

A Lei de Improbidade Administrativa define o que considera agente público da seguinte forma:

Art. 2º Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no artigo anterior.

O conceito utilizado na Lei de Improbidade Administrativa, como se pode perceber é mais amplo do que o conceito de funcionário público contido no art. 327 do Código Penal Brasileiro.

Wallace Paiva Martins [78] cita as decisões do Egrégio Superior Tribunal de Justiça nos Recursos Especiais de nos 416.329-RS e 255.861-SP que reputam como sujeitos ativos de atos de improbidade administrativa o médico conveniado ao SUS que administra verbas públicas e, também, os empregados e dirigentes de empresas estatais, respectivamente. Fica patente, assim, a amplitude desse conceito.

Nesse sentido, Emerson Garcia [79] afirma:

[...] para os fins da Lei de Improbidade, tanto será agente público o presidente de uma autarquia, como o proprietário de uma pequena empresa do ramo de laticínios que tenha recebido incentivos, fiscais ou creditícios, para desenvolver sua atividade.

Por seu turno, Hely Lopes de Meirelles [80] define agentes públicos como sendo:

[...] todas as pessoas físicas incumbidas definitiva ou transitoriamente do exercício de alguma função estatal. Os agentes normalmente desempenham funções do órgão, distribuídas entre os cargos de que são titulares, mas excepcionalmente podem exercer funções sem cargo.

Para Celso Antônio Bandeira de Mello [81]:

Esta expressão – agentes públicos – é a mais ampla que se pode conceber para designar genérica e indistintamente os sujeitos que servem ao Poder Público como instrumentos expressivos de sua vontade ou ação, ainda quando o façam apenas ocasional ou episodicamente. Quem quer que desempenhe funções estatais, enquanto as exercita, é um agente público. Por isso, a noção abarca tanto o chefe do Poder Executivo (em quaisquer das esferas) como os senadores, deputados e vereadores, os ocupantes de cargos ou empregos públicos da Administração Direta dos Três Poderes, os servidores das autarquias, das fundações governamentais, das empresas públicas e sociedades de economia mista nas distintas órbitas de governo, os concessionários e permissionários de serviço público, os delegados de função ou ofício público, os requisitados, os contratados sob locação civil de serviços e os gestores de negócios públicos.

Para Waldo Fazzio Júnior [82]:

Toda pessoa física que exerce cargo, emprego ou função pública é agente público. A locução agente público compreende todas as pessoas que mantêm vínculo de trabalho, temporário ou permanente, a qualquer título, com o Estado. Vale para a Administração Direta e Indireta, quer dizer, designa a pessoa natural que, sob qualquer pretexto, exerce atividade típica do Estado.

Maria Sylvia Zanella Di Pietro [83] disserta da seguinte forma sobre a definição de agente público: "Agente público é toda pessoa física que presta serviços ao Estado e às pessoas jurídicas da Administração Indireta".

Fica claro, com a análise dos dispositivos supracitados, bem como com a análise doutrinária acerca do termo agente público, que o legislador ao elaborar a Lei nº 8.429/92 procurou abarcar todos os potenciais agentes dos atos de improbidade administrativa. Como exposto, foi ainda mais longe do que o legislador pátrio quando da elaboração do Código Penal. O conceito é demasiadamente genérico o que também enseja um cuidado todo especial acerca de sua interpretação.

Adiante, passemos, então, à análise acerca do termo agente político. Suas definições doutrinárias e o seu alcance em relação à Lei de Improbidade Administrativa que é o que nos interessa de forma mais profunda.

3.3. Agentes políticos

Regis Fernandes de Oliveira [84] conceitua agente político da seguinte forma:

Os agentes políticos ocupam cargos eletivos ou vitalícios. São os integrantes dos três Poderes do Estado, e, por equiparação, os integrantes do Ministério Público. Os que compõem o Executivo e o Legislativo ocupam cargos eletivos. É o Presidente da República (e seus homólogos nos Estados e Municípios), os Ministros de Estado, bem como os que a eles são equiparados, e também os diplomatas e os Secretários estaduais, distritais e municipais. No Legislativo, os Senadores e os Deputados Federais, bem como os correspondentes a estes nos Estados e Municípios.

São agentes políticos porque detêm e são titulares do Poder do Estado, isto é, possuem a possibilidade jurídica de ingressar na esfera jurídica de outros, impondo-lhes deveres ou criando direitos. São não só os Chefes do Executivo, mas todos aqueles a quem é dada parte do exercício do Poder, isto é, os Ministros, Secretários Executivos e os diplomatas [...] Os Magistrados, membros do Ministério Público e os integrantes dos Tribunais de Contas, igualmente são agentes políticos, ocupando cargos vitalícios, ou seja, são indemissíveis, salvo mediante sentença judicial.

Nesse mesmo sentido é a definição de Hely Lopes Meirelles [85] que afirma serem agentes políticos:

[...] os componentes do Governo nos seus primeiros escalões, investidos em cargos, funções, mandatos ou comissões, por nomeação, eleição, designação ou delegação para o exercício de atribuições constitucionais. [...] São as autoridades públicas supremas do Governo e da Administração na área de sua atuação, pois não estão hierarquizadas, sujeitando-se apenas aos graus e limites constitucionais e legais de jurisdição. (grifo no original)

Assim, para Meirelles, tanto são agentes políticos os Chefes do Poder Executivo federal, estadual e municipal, seus auxiliares diretos, os membros do Poder Legislativo, como também os da Magistratura, Ministério Público, Tribunais de Contas, representantes diplomáticos e "demais autoridades que atuem com independência funcional no desempenho das atribuições governamentais, judiciais ou quase judiciais, estranhas ao quadro do funcionalismo estatutário" [86].

Por outro lado, Celso Antônio Bandeira de Mello [87] defende um conceito mais restrito para o termo agente político ao afirmar que:

Agentes políticos são os titulares de cargos estruturais à organização política do País, ou seja, ocupantes dos que integram o arcabouço constitucional do Estado, o esquema fundamental do Poder. Daí que se constituem nos formadores da vontade superior do Estado. São os agentes políticos apenas o presidente da República, os Governadores, Prefeitos e respectivos vices, os auxiliares imediatos, isto é, Ministros e Secretários das diversas Pastas, bem como os Senadores, Deputados federais e estaduais e Vereadores.

O vínculo que tais agentes entretêm com o Estado não é de natureza profissional, mas de natureza política. Exercem um munus público.

Assim, Bandeira de Mello demonstra que a relação jurídica existente entre os agentes políticos e o Estado é de natureza institucional. São deveres e direitos que descendem diretamente da Constituição e das leis. Logo, uma das características primordiais do conceito lançado acima é que o cargo ocupado pelos agentes é de elevada hierarquia na organização da Administração Pública, bem como a natureza especial das atribuições exercidas por eles.

Luiz Gonzaga Pereira Neto [88] ressalva que não se deve levar "em consideração o sujeito que ocupa o cargo, mas o cargo que é ocupado (de natureza especial, em regra determinada pela própria célula mater do ordenamento jurídico)".

Por seu turno, Di Pietro [89] leciona:

São, portanto, agentes políticos, no direito brasileiro, porque exercem típicas atividades de governo e exercem mandato, para o qual são eleitos, apenas os Chefes dos Poderes Executivos federal, estadual e municipal, os Ministros e Secretários de Estado, além de Senadores, Deputados e Vereadores. A forma de investidura é a eleição, salvo para Ministros e Secretários, que são de livre escolha do Chefe do Executivo e providos em cargos públicos, mediante nomeação. (grifos no original)

Filiamo-nos à opinião de Celso Antônio Bandeira de Mello e de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, que utilizam um conceito mais restrito para definir quais seriam os agentes políticos, pelas mesmas razões já expostas pelos citados doutrinadores.

Entretanto, é importante ressaltar que os membros do Ministério Público, Tribunais de Contas e Magistrados, mesmo não estando albergados pelo conceito de agente político defendido aqui, são passíveis de responsabilização pela Lei de Improbidade Administrativa, haja vista o amplíssimo conceito do art. 2º da Lei de Improbidade Administrativa.

3.4. A improbidade administrativa e os agentes políticos

Existe a propósito da aplicabilidade da Lei de Improbidade Administrativa aos agentes políticos uma enorme discussão. De ambos os lados – tanto acerca da aplicabilidade quanto contrário à sua aplicabilidade – há argumentos que precisam ser abordados. Iremos nos aprofundar nessa discussão no próximo capítulo, entretanto, neste momento, é importante fazermos uma análise inicial e definirmos alguns pontos básicos que darão sustentação ao estudo que será feito mais a frente.

A discussão sobre a imunidade dos agentes políticos em face da Lei de Improbidade Administrativa implica uma análise acurada. Afinal de contas, trata-se de compreender o alcance da Lei de Improbidade Administrativa, tendo em vista a disposição constitucional acerca dos crimes de responsabilidade.

De início, Wallace Paiva Martins Júnior [90] leciona:

Há algum tempo ergueu-se a tese de inaplicabilidade da Lei nº 8.429/92 aos agentes políticos, construída sobre o argumento de seu regime jurídico especial derrogatório da Lei nº 8.429/92, instaurando um juízo exclusivo (v.g., impeachment) pela ofensa à probidade administrativa praticada ou imputada a tal espécie de agentes públicos. Perfilha-se entendimento contrário a essa tese. Em nenhum momento a Constituição reservou à instância do julgamento político-administrativo o caráter de jurisdição exclusiva dos agentes políticos, na medida em que respondiam e respondem pelo fato também civil e criminalmente.

Segundo Fábio Medina Osório [91], quem primeiro suscitou a absorção da Lei de Improbidade Administrativa pela Lei dos Crimes de Responsabilidade foi Ives Gandra Martins, argumentando que tal possibilidade se sustenta "em face da semelhança entre os tipos sancionadores" e porque já se encontraria consagrado que o regime jurídico da improbidade, para os agentes políticos, estaria submerso na Lei dos Crimes de Responsabilidade.

Por outro lado, Di Pietro [92] afirma que na aplicação da Lei de Improbidade Administrativa aos agentes políticos faz-se necessário algumas ressalvas. Primeiro, em relação aos parlamentares não é possível, segundo a autora, a aplicação da sanção de perda da função pública, que implicaria em perda de mandato, porque tal medida é de competência da Câmara dos Deputados ou do Senado Federal, tal como previsto no art. 55 da Constituição Federal. Entretanto, nada impede que sejam suspensos os direitos políticos aos Deputados Federais e Senadores, em ação civil por improbidade administrativa, haja vista a disposição do art. 15, V, da CF, que inclui entre as hipóteses de perda ou suspensão de direitos políticos a "improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º". Nessa hipótese, haverá a incidência do art. 55, § 3º, da CF, e a perda do mandato será "declarada pela Mesa da Casa respectiva, de ofício ou mediante provocação de qualquer de seus membros ou de partido político representado no Congresso Nacional, assegurada ampla defesa".

Por força do disposto no art. 27, § 1º, da Constituição Federal, a mesma conclusão exposta acima deve ser aplicada aos Deputados estaduais. Para os Vereadores, segundo Di Pietro [93], como não existe nenhuma norma semelhante na Magna Carta, pode "aplicar-se inclusive a pena de perda da função pública".

Por outro lado, alguns agentes políticos ensejam uma maior dificuldade em relação à aplicação da Lei de Improbidade Administrativa em virtude do disposto no art. 52 da Constituição Federal, ex vi:

Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:

I – processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;

II – processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade;

(omissis)

Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais.

Logo, segundo a citada autora, os agentes públicos relacionados no inciso I e no inciso II do artigo acima transcrito, quando do cometimento de crimes de responsabilidade, serão julgados pelo Senado Federal e a única sanção aplicável será a perda do cargo, com inabilitação por oito anos para o exercício de função pública.

Ressalte-se, por oportuno, a expressão "sem prejuízo das demais sanções judiciais" encontrada no parágrafo único, in fine. Assim, Di Pietro [94] afirma: "como os atos de improbidade administrativa nem sempre correspondem a ilícitos penais, a competência para processar e julgar referidas autoridades por tais atos estaria inteiramente fora do alcance do artigo 52".

Em relação ao Presidente da República, o art. 85, V, da CF, inclui entre os crimes de responsabilidade os que atentem contra a probidade na administração. Assim, em praticando um ato de improbidade administrativa, a perda da função e a suspensão dos direitos políticos do Presidente deverão ocorrer nos termos da Lei nº 1.079/50.

Por fim, o Supremo Tribunal Federal fez distinção entre os regimes de responsabilidade político-administrativa previstos na Constituição Federal, conforme disposto no art. 37, §4º, regulado pela Lei nº 8.429/92, e o regime do crime de responsabilidade, que é disposto no art. 102, I, "c" da CF, regulado pela Lei nº 1.079/50.

Iremos nos aprofundar, entretanto, na decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal na Reclamação 2.138-6-DF mais adiante. Importa, por ora, apenas identificar o posicionamento do STF acerca do tema.


Capítulo 4 - Crimes de responsabilidade ou atos de improbidade administrativa

A administração da coisa pública sempre deu origem a críticas dentro da estrutura social brasileira. Tais críticas são levadas a termo tanto pela população, se referindo, para tanto, como o problema da corrupção, como por estudiosos que procuram definir e buscar soluções acerca do problema.

4.1. Crimes de responsabilidade.

Os crimes de responsabilidade remontam à Inglaterra entre os séculos XIII e XIV, dentro da idéia de responsabilidade penal de altas autoridades públicas, ante o Parlamento, como bem explica Medina Osório [95].

Ainda a respeito das origens do crime de responsabilidade, Fábio Medina Osório [96] leciona:

É certo que embora venha do Direito inglês, a idéia de "delitos de responsabilidade" tem suas raízes modernas no Direito norte-americano, com seu pragmatismo e seu espírito republicano. Naquele país, o Direito Penal baliza a responsabilidade dos altos mandatários da Nação. É o processo de "impeachment", outrossim, um dos corolários lógicos do princípio da responsabilidade, ganhando realce, aqui, a dimensão política dessa espécie de responsabilidade.

A respeito da natureza dos crimes de responsabilidade, Fábio Medina Osório [97] informa que existem três grandes vertentes acerca do tema: os que defendem a natureza criminal dos delitos de responsabilidade, os que defendem a natureza política e, por fim, os que sustentam a natureza mista do ilícito. O STF, por sua vez, entende que se trata de delitos no sentido criminal da expressão, embora o julgamento seja de natureza política. Por outro lado, conforme exposto por Gabriel Abrão Filho [98], prevalece na doutrina o entendimento manifestado por Paulo Brossard, no sentido de que se trata de infrações de natureza político-administrativa.

No sistema vigente, ocupando o agente o cargo de Presidente da República, Ministro de Estado, Ministro do Supremo Tribunal Federal ou Procurador-Geral da República, o crime de responsabilidade por ele praticado será julgado pelo Senado Federal. No caso do Governador do Estado, do Distrito Federal ou de Território, o julgamento será da respectiva Assembléia Legislativa.

A Lei que regula os crimes de responsabilidade das autoridades citadas acima é a Lei nº 1.079/1950, conhecida como Lei dos Crimes de Responsabilidade. Por seu turno, a norma que regula os crimes de responsabilidade dos Prefeitos e Vereadores é o Decreto-lei nº 201/1967. Percebe-se que são duas legislações muito antigas e que não tiveram a sua eficácia comprovada ao longo do tempo.

Nesse sentido, Fábio Medina Osório [99] tece uma crítica ferrenha à Lei dos Crimes de Responsabilidade:

Se estivesse funcionando a contento, com todo o vigor necessário, essa legislação certamente tornaria desnecessária, do ponto de vista político-institucional, a LGIA para os agentes públicos enquadráveis nessa normativa. Não é o que ocorreu, ou ocorre, porque a Lei dos Crimes de Responsabilidade falhou, nas mãos de Instituições competentes, como instrumento de contenção da improbidade.

Após esta breve análise acerca dos crimes de responsabilidade, passaremos ao próximo item onde iremos analisar com mais profundidade a relação existente entre os crimes de responsabilidade e os atos de improbidade administrativa e a conseqüente independência das esferas de ilicitude.

4.2. A relação entre crimes de responsabilidade e atos de improbidade administrativa

Iremos nos ater, prioritariamente, a analisar os fatos tendo como referência a Lei dos Crimes de Responsabilidade, pois é ela que é usada como paradigma no caso analisado pelo Supremo Tribunal Federal na Reclamação 2.138-6-DF.

É importante, neste momento, ressaltarmos que tanto a Constituição Federal quanto a Lei dos Crimes de Responsabilidade não excluem a responsabilização do acusado nas demais sanções judiciais cabíveis. Assim, a Lei nº 1.079/50, em seu artigo 3º, de forma expressa, dispõe que a imposição de pena por cometimento de crime de responsabilidade não exclui processo e julgamento do acusado de crime comum, na justiça ordinária, nos termos das leis de processo penal, revelando, dessa forma, uma nítida distinção entre os crimes comuns e os crimes de responsabilidade.

A respeito do exposto, Mônica Nicida Garcia [100] leciona que não encontra guarida na Constituição Federal a tese de que os agentes políticos por responderem por crime de responsabilidade seriam exonerados da responsabilização por crime comum, por ilícito civil, ou por ato de improbidade administrativa.

Tanto é assim que o art. 52 da Magna Carta prevê que a condenação se dará sem o prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis, tal como ressaltamos anteriormente neste trabalho. A interpretação de tal disposição constitucional só nos permite chegar a opinião de que a Constituição em nenhum momento afastou os agentes políticos da possibilidade de responsabilização por atos de improbidade administrativa por estarem sujeitos à incidência da Lei dos Crimes de Responsabilidade.

Nesse sentido, Gabriel Abrão Filho [101] assevera:

Se se quiser concluir que o fato de a Constituição ter previsto a esfera de responsabilidade político-administrativa exclui a possibilidade de responsabilização em qualquer outra instância ou esfera, ainda que constitucionalmente albergada, como é o caso da improbidade administrativa, haverá que se admitir que inexiste, para os agentes políticos, a responsabilidade penal, o que, verdadeiramente, não se concebe. Então, se existe a responsabilidade penal e se esta não se confunde, nos termos da lei, da doutrina e da jurisprudência, com a responsabilidade pela prática de ato de improbidade administrativa, é inafastável a conclusão pela existência e incidência desta última.

Deve-se trazer então, à discussão, se a figura da improbidade administrativa disposta no art. 85, V, da CF é a mesma que se encontra tipificada no art. 37, §4º, da CF.

Fábio Medina Osório [102] entende que a improbidade do art. 37 é diversa daquela encontrada no art. 85, e, para tanto leciona:

Entendemos que a improbidade do art. 37, § 4º, não se confunde nem é eliminada por aquela contemplada no art. 85, V, ambas da Magna Carta. Não é o mesmo falar de Improbidade no marco da Lei 1079/50, a raiz do que prevê o art. 85, V, da CF, que falar da enfermidade prevista no art. 37, § 4º, da CF. E isso porque a CF previu que a Improbidade ali desenhada não é um ilícito penal, sendo distintas e peculiares as conseqüências previstas. O que estamos a sustentar encontra respaldo no próprio STF, no STJ e em posicionamento recente da Procuradoria-Geral da República, porque todos, sem dúvida, preconizam, de uma parte, a natureza penal dos delitos de responsabilidade, e, de outra, a natureza não penal dos ilícitos de improbidade.

Na mesma linha de pensamento, encontramos a opinião de Wallace Paiva Martins Júnior [103] que argumenta:

[...] o que há são instâncias diferentes e autônomas para diversas qualificações jurídicas de um mesmo fato. Embora o efeito prático de algumas sanções seja equivalente, não há reserva ou exclusividade de "jurisdição" ao Poder Legislativo para repressão da improbidade administrativa. O regime republicano é o da responsabilidade sem comportar a abertura de nichos de imunidade do poder, razão pela qual a Lei Federal n. 8.429/92 aplica-se a qualquer ato de improbidade administrativa de qualquer dos Poderes.

Mais adiante, Martins Júnior [104] defende que se o ordenamento jurídico tivesse a intenção de excluir das punições da Lei de Improbidade Administrativa os agentes políticos objetivando que os mesmos só estariam sob a égide do regime jurídico da responsabilidade política, os legisladores teriam instituído a "cláusula de exceção expressamente e não conferiria a possibilidade de sua censura em diferentes instâncias [...] como feito nos arts. 14, § 4º, e 85 da Constituição Federal".

É importante, ainda, colacionar a análise de Fernando Grela Vieira [105]:

A defesa da probidade, no caso de agentes políticos, não pode ser exclusividade dos crimes de responsabilidade, mesmo porque se a conduta não estiver prevista na lei especial respectiva, não se cogita da ocorrência de crime de tal natureza. Mas, ainda assim, não há impedimento a que o ato seja considerado improbidade administrativa, nos termos da Lei 8.429/1992, com todas as conseqüências legais.

Como bem defende Luiz Gonzaga Pereira Neto [106], o argumento de que a submissão dos agentes políticos ao regime de crimes de responsabilidade afastaria a concorrência com a responsabilização de acordo com a Lei de Improbidade Administrativa corresponderia a bis in idem, não deve prosperar, pois inexiste dependência entre as diferentes esferas de responsabilidade (tanto administrativa, civil e penal). Ele ainda afirma:

[...] embora se pretenda punir o mesmo fato, trata-se de punições em esferas distintas do direito. A condenação do Réu ímprobo no Processo Penal, por exemplo, não lhe assegura o direito de não responder, pelo mesmo fato, nas esferas civil e administrativa [107].

Passemos, então, para a análise da Reclamação nº 2.138-6-DF.

4.3. A reclamação nº 2.138-6-df

Acerca da Reclamação nº 2.138-6-DF, Fábio Medina Osório [108] relembra um fato inusitado, afinal de contas foi a União Federal quem propôs a sobredita Reclamação no STF em face de decisão proferida pela Justiça Federal do Distrito Federal, pela qual foi condenado ex-ministro de Estado nas penas da Lei de Improbidade Administrativa. A curiosidade suscitada é que a União Federal figura como defensora direta dos interesses do acusado, o que não deixa de ser uma distorção em si mesma, em se tratando de ação punitiva endereçada pessoalmente contra o agente público, e não contra a entidade estatal.

Feitas essas colocações acerca do tema, é hora de analisarmos a r. decisão do Excelso Supremo Tribunal Federal que excluiu do campo de incidência da Lei nº 8.429/92 os agentes políticos. Para tanto, é imprescindível citar a Ementa da decisão, in verbis:

RECLAMAÇÃO. USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. CRIME DE RESPONSABILIDADE. AGENTES POLÍTICOS.

I – PRELIMINARES. QUESTÕES DE ORDEM.

I.1. Questão de ordem quanto à manutenção da competência da Corte que justificou, no primeiro momento do julgamento, o conhecimento da reclamação, diante do fato novo da cessação do exercício da função pública pelo interessado. Ministro de Estado que posteriormente assumiu cargo de Chefe de Missão Diplomática Permanente do Brasil perante a Organização das Nações Unidas. Manutenção da prerrogativa de foro perante o STF, conforme o art. 102, I, "c", da Constituição. Questão de ordem rejeitada.

I.2. Questão de ordem quanto ao sobrestamento do julgamento até que seja possível realizá-lo em conjunto com outros processos sobre o mesmo tema, com participação de todos os Ministros que integram o Tribunal, tendo em vista a possibilidade de que o pronunciamento da Corte não reflita o entendimento de seus atuais membros, dentre os quais quatro não tem direito a voto, pois seus antecessores já se pronunciaram. Julgamento que já se estende por cinco anos. Celeridade processual. Existência de outro processo com matéria idêntica na seqüência da pauta de julgamento do dia. Inutilidade do sobrestamento. Questão de ordem rejeitada.

II. MÉRITO.

II.1. Improbidade administrativa. Crimes de responsabilidade. Os atos de improbidade administrativa são tipificados como crime de responsabilidade na Lei nº 1.079/1950, delito de caráter político-administrativo.

II.2. Distinção entre os regimes de responsabilização político-administrativa. O sistema constitucional brasileiro distingue o regime de responsabilidade dos agentes políticos dos demais agentes públicos. A Constituição não admite a concorrência entre dois regimes de responsabilidade político-administrativa para os agentes políticos: o previsto no art. 37, § 4º (regulado pela Lei nº 8.429/1992) e o regime fixado no art. 102, I, "c", (disciplinado pela Lei nº 1.079/1950). Se a competência para processar e julgar a ação de improbidade (CF, art. 37, § 4º) pudesse abranger também atos praticados pelos agentes políticos, submetidos a regime de responsabilidade especial, ter-se-ia uma interpretação ab-rogante do disposto no art. 102, I, "c", da Constituição.

II.3. Regime especial. Ministros de Estado. Os Ministros de Estado, por estarem regidos por normas especiais de responsabilidade (CF, art. 102, I, "c"; Lei nº 10.79/1950), não se submetem ao modelo de competência previsto no regime comum da Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992).

II.4. Crimes de responsabilidade. Competência do Supremo Tribunal Federal. Compete exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal processar e julgar os delitos político-administrativos, na hipótese do art. 102, I, "c", da Constituição. Somente o STF pode processar e julgar Ministro de Estado no caso de crime de responsabilidade e, assim, eventualmente, determinar a perda do cargo ou a suspensão de direitos políticos.

II.5. Ação de improbidade administrativa. Ministro de Estado que teve decretada a suspensão de seus direitos políticos pelo prazo de 8 anos e a perda da função pública por sentença do Juízo da 14ª Vara da Justiça Federal – Seção Judiciária do Distrito Federal. Incompetência dos juízos de primeira instância para processar e julgar ação civil de improbidade administrativa ajuizada contra agente político que possui prerrogativa de foro perante o Supremo Tribunal Federal, por crime de responsabilidade, conforme o art. 102, I, "c", da Constituição.

III. RECLAMAÇÃO JULGADA PROCEDENTE.

(STF, Recl. 2.138-6-DF, Rel. Min. Nelson Jobim, Rel. para acórdão Min. Gilmar Mendes (art. 38, IV, b, do RISTF), DJe nº 70 de 18.04.2008)

Insta acentuar, de pronto, que o precedente supra mencionado não retrata posição pacífica do STF acerca da matéria, até porque o próprio julgamento foi dado por maioria, tendo sido vencidos os Ministros Carlos Velloso, Marco Aurélio, Celso de Mello, Sepúlveda Pertence e Joaquim Barbosa. Também é importante ressaltar que quatro Ministros não puderam votar em virtude de que seus precedentes já tinham votado. Deixa-se claro, portanto, que a decisão proferida na Reclamação em análise pode não representar a opinião atual do Supremo Tribunal Federal.

A referida Reclamação foi proposta pela Advocacia Geral da União em face do Juízo Federal da 14ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal, que teve sua sentença mantida pelo TRF da 1ª Região.

A Ação de Improbidade Administrativa foi proposta pelo Ministério Público Federal em face do então Ministro Ronaldo Mota Sardemberg, em virtude do uso indevido de aeronaves da FAB para transporte particular seu e de terceiro, sem vinculação às suas atividades funcionais e também pela fruição de Hotel de Trânsito da Aeronáutica no Distrito Estadual de Fernando de Noronha.

A União alega que houve usurpação da competência do STF porque Ministro de Estado não poderia ser julgado pelo juiz de 1º grau, além do mais, alega que Ministro de Estado não responde por improbidade administrativa com base na Lei nº 8.429/92, mas apenas por crime de responsabilidade. Para sustentar tal alegação, no mérito, a União defende que as conseqüências advindas da responsabilização por crimes de responsabilidade são semelhantes às previstas na Lei de Improbidade. Defende, ainda, que a maneira de prevenir o bis in idem é que seja adotado o critério da especialidade, no sentido de que a Lei de Improbidade é dirigida genericamente a todo agente público, e sendo a Lei dos Crimes de Responsabilidade orientada para punir os agentes políticos, a lei especial exclui a incidência da lei geral.

Em seu voto, o e. Relator Min. Nelson Jobim [109] premia a todos com justificativas pra lá de quixotescas. De pronto, ele argumenta:

As viagens de fim de semana a algum local são, em geral, viagens a serviço. Ou, se não eram, acabam se tornando, pela demanda de contatos por parte de autoridades locais e pela continuidade do programa rotineiro de serviço que não sofre qualquer interrupção.

Adiante o Ministro Jobim argumenta que "é preciso aqui se valer de uma outra observação, amplamente conhecida no âmbito estatal, que é aquela, segundo a qual os pilotos e aviões da FAB estão obrigados a voar". Chegando ao ponto de justificar a descaracterização da improbidade por não ser uma viagem de lazer e sim porque se os aviões não voarem irão enferrujar no chão.

Deixemos de lado os argumentos fáticos levantados pelo Ministro Jobim e iremos nos ater às questões jurídicas que é a intenção deste trabalho, entretanto, não poderíamos deixar de comentar tais fatos.

O Ministro Nelson Jobim [110] defende ainda que:

[...] se a competência para processar e julgar a ação de improbidade (CF, art. 37, §4º) pudesse abranger também atos praticados pelos agentes políticos, submetidos a regime de responsabilidade especial, ter-se-ia uma interpretação ab-rogante do disposto no art. 102, I, "c", da Constituição.

Ele chega então à conclusão de que os agentes políticos não se submetem ao regime geral da Lei de Improbidade e arremata:

O entendimento contrário importaria no completo esvaziamento da competência do STF para processar e julgar, por crime de responsabilidade, os MINISTROS DE ESTADO [...] (CF, art. 102, I, ‘c’).

Mais adiante, em um lampejo de lucidez, o e. Ministro Jobim defende que seria possível sustentar que a ação de improbidade tivesse caráter autônomo, não se confundindo, portanto, "com aquela destinada a perseguir os crimes de responsabilidade". E adiante: "Nesse caso, [...] ela haveria de ser processada perante esta Corte" [111].

Portanto, o Relator Ministro Nelson Jobim defende num primeiro momento de seu voto que não seria possível a coexistência da responsabilização dos agentes políticos pela Lei dos Crimes de Responsabilidade e da Lei de Improbidade Administrativa, esta última porque os fatos não seriam suficientemente ponderados por Promotores, Procuradores e Juízes com atuação no 1º Grau da jurisdição. Num segundo momento, ele argumenta que poderiam coexistir tanto a responsabilização por crimes de responsabilidade como a ação por atos de improbidade administrativa, sendo esta, de qualquer forma, proposta perante o STF em virtude do instituto do foro privilegiado que tais autoridades teriam direito, em se tratando de infração de natureza penal.

O voto do Relator foi seguido pelos Ministros Gilmar Mendes, Ellen Gracie e Maurício Corrêa, sem maiores considerações.

O Ministro Ilmar Galvão votou com o Relator, entretanto, há uma passagem de seu voto que entendemos por bem transcrever: "Há de concluir-se, portanto, que a Lei nº 8.429 se presta tão-somente, no meu entendimento, a uma função normativa residual de responsabilizar, por atos de improbidade, os servidores públicos cujas funções não tiverem sido contempladas com foro civil privilegiado" [112].

Em seu voto-vista o e. Ministro Carlos Velloso ressalta que a Constituição da República tem em alta conta o princípio constitucional da moralidade administrativa e, nesse sentido, o instrumento de realização deste princípio maior é a Lei de Improbidade Administrativa.

Adiante, o Ministro Velloso [113] defende que:

A lei que dispõe sobre as sanções aplicáveis ao administrador ímprobo é, portanto, instrumento de realização do princípio da moralidade administrativa. Assim, a interpretação desta, que tem por finalidade, vale repetir, realizar o princípio constitucional, há de ser a mais larga, a fim de se conferir a máxima eficácia a este.

Feitas tais considerações, o Ministro passa a analisar de forma bem didática o caso sub examen. Ele entende que da leitura dos dispositivos constitucionais chega-se à conclusão que os atos do Presidente da República que atentem contra a probidade na administração são crimes de responsabilidade que estão definidos na Lei especial nº 1.079/50. Em relação aos Ministros de Estado, no que concerne à probidade, os crimes de responsabilidade do Presidente aplicam-se para aqueles, além dos que lhe são específicos. O Min. Velloso analisa os crimes de responsabilidade dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, do Procurador-Geral da República, do Governador do Distrito Federal e dos Territórios, dos Prefeitos e Vereadores e, por fim, ressalva que não há que se falar em crimes de responsabilidade para os parlamentares.

Assim, conclui o Ministro Carlos Velloso [114] que:

[...] os agentes políticos mencionados somente respondem pelos crimes de responsabilidade tipificados na lei especial [...] no que não estiver tipificado como crime de responsabilidade, mas estiver definido como ato de improbidade, responderá o agente político na forma da lei própria, a Lei 8.429, de 1992, aplicável a qualquer agente público.

A aplicação da Lei de Improbidade [...] a esses agentes públicos faz-se, em certos casos, sob restrições. Por exemplo, ao Presidente da República não podem ser aplicadas as sanções de perda e suspensão dos direitos políticos, tendo em vista o disposto no art. 86 da CF.

O Ministro Velloso [115] destaca ainda que no caso em exame, as tipificações da Lei nº 8.429/92, invocadas na ação civil pública, não se enquadram como crime de responsabilidade definido na Lei nº 1.079/50, a menos que:

[...] se empreste interpretação extensiva ao crime de responsabilidade do Presidente da República inscrito no inciso 7 do art. 9º: proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo. A interpretação extensiva, entretanto, não seria possível, por isso que, tratando-se de crime, seja crime comum, ou crime de responsabilidade, observa-se a tipificação cerrada.

E arremata mais adiante em seu voto:

No que concerne à pena de perda do cargo e a suspensão dos direitos políticos [...] a interpretação sistemática da constituição, artigos 15, 51, I, 86 e 87 [...] não autoriza a sua aplicação senão em sentença transitada em julgado, tal como aliás, está disposto no art. 20, caput, da Lei nº 8.429/92.

Por fim, o Ministro Velloso ressalta que a isenção dos agentes políticos "da ação de improbidade administrativa seria um desastre para a administração pública" [116].

O Ministro Cezar Peluso [117] votou a favor da Reclamação, afastando a incidência da Lei de Improbidade aos agentes políticos basicamente pelos seguintes argumentos:

[...] a categoria dos agentes políticos é uma categoria especial de servidores públicos que têm, na Constituição, a sede da disciplina de cargos, das suas atribuições, [...] que por isso mesmo pressupõem um regime funcional específico, ligado à dignidade dessas funções estatais [...] Todos devem ter, a meu juízo, por conseqüência, sistema próprio de responsabilidade funcional, compatível com a liberdade política de que devem desfrutar na tomada de decisões, e, segundo o qual, não podem ser responsabilizados de acordo com os critérios comuns, como por exemplo, o da culpa comum ou dos erros técnicos que atuam como critérios de responsabilidade dos demais servidores públicos.

Em seu voto-vista, o Ministro Joaquim Barbosa, de início, esclarece que a tese central defendida pelo Relator parte da premissa de que a competência do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar ministros de Estado por crimes de responsabilidade atrairia o julgamento desses agentes políticos titulares de altos cargos da administração federal também pelos atos de improbidade administrativa (art. 37, § 4º da CF e Lei nº 8.429/92). Ele faz questão de deixar claro que tal tese é defendida há tempos pelo Ministro Gilmar Mendes.

Adiante, o Min. Barbosa defende que os fatos que levaram o Ministério Público Federal a ajuizar a ação de improbidade administrativa não se enquadram na tipificação dos crimes de responsabilidade. Não se cuida, pois, de responsabilização política, e por isso mesmo não é aplicável ao caso o art. 102, I, "c" da Constituição Federal. Vai mais além ao defender que há no Brasil:

[...] uma dupla normatividade em matéria de improbidade, com objetivos distintos: em primeiro lugar, existe aquela específica da lei 8.429/92, de tipificação cerrada mas de incidência sobre um vasto rol de possíveis acusados [...] e uma outra normatividade relacionada à exigência de probidade que a Constituição faz em relação aos agentes políticos, especialmente ao chefe do Poder Executivo e aos ministros de Estado, ao estabelecer no art. 85, inciso V, [...] essa segunda normatividade se completa com o art. 9º da lei 1.079/50" [118].

Trata-se de disciplinas normativas diversas, embora visem à preservação do mesmo princípio constitucional. Nesse sentido, o art. 37, §4º da CF, disciplinado pela Lei de Improbidade, traduz, como já dito anteriormente, a concretização do princípio da moralidade administrativa. Com bem assevera o Ministro Barbosa [119], buscou-se coibir a prática de atos antiéticos tão corriqueiros em nossa história político-administrativa, "aplicando-se aos acusados, atendidos os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, as inúmeras e drásticas penalidades previstas na lei – e tão somente elas".

Por outro lado, a apuração da responsabilização política, tal como prevista no art. 85, V da CF e na Lei 1.079/50, assume uma outra roupagem porque o objetivo constitucional buscado é mais elevado. Como bem esclarece o Min. Barbosa [120]:

[...] cuida-se aí de mais um dentre os inúmeros mecanismos de becks-and-balances típicos das relações entre os poderes do Estado no regime presidencial de governo. [...] a natureza do instituto e os objetivos constitucionais por ele visados é que explicam por que nessa modalidade especial de responsabilização as penalidades são diferenciadas e podem parecer relativamente brandas, se comparadas às previstas na lei de improbidade. [...] Igualmente, a natureza política e os objetivos constitucionais visados com esse instituto é que explicam por que ao agente eventualmente condenado por crime de responsabilidade são aplicáveis apenas duas punições [...]: a perda do cargo e a inabilitação para o exercício de funções públicas pelo prazo de 8 anos.

O Ministro Joaquim Barbosa [121] diferencia os dois institutos chegando a seguinte conclusão:

Com isto quero dizer, parodiando o ministro Brossard, que estamos diante de "entidades distintas e nada mais". Distintas e que não se excluem, podendo ser processadas separadamente, em procedimentos autônomos, com resultados absolutamente distintos, embora desencadeados pelos mesmos fatos.

Nesse sentido, o Ministro relembra o fato de que o ex-presidente Fernando Collor teve sua Ação Penal julgada perante o Supremo Tribunal Federal após ter respondido pelo crime de responsabilidade perante o Senado Federal. Assim, fica demonstrado que não há óbices constitucionais para a existência da duplicidade de sanções iguais quando o escopo dos processos de punição é diferente.

Refutando os argumentos da maioria já estabelecida no julgamento da já tão repetida reclamação, o Ministro Barbosa [122] afirma que a opinião da maioria cria uma situação que não deveria prosperar, in verbis:

[...] a tese abraçada pela maioria que já se formou [...] cria no nosso sistema jurídico [...] uma situação de absoluta perplexidade, que fere os princípios isonômico e republicano que informam a nossa organização político-jurídica. [...] É que, à luz da Constituição Federal e da Lei 8.429/1992, todo e qualquer servidor, efetivo ou comissionado, que cometa um ato de improbidade tal como descrito na lei, estará sujeito a ver sua conduta enquadrada numa das drásticas sanções previstas na Lei 8.429/1992. Porém, se esse mesmo hipotético servidor, sem se exonerar do cargo efetivo, vier a assumir um posto ministerial e praticar a mesma conduta, a ele não se aplicarão as severas sanções da lei de improbidade, mas sim as duas únicas sanções que a responsabilidade política é suscetível de engendrar [...] tal discrepância contraria, a meu sentir, um dos postulados básicos do regime democrático [...] que consiste nas verdadeiras Democracias [...] quanto mais elevadas e relevantes as funções assumidas pelo agente público, maior há de ser o grau de sua responsabilidade, e não o contrário, como se propõe nestes autos.

Por fim, o Min. Barbosa explicita que o juiz de primeiro grau pode conduzir ação de improbidade administrativa contra autoridades detentoras de prerrogativa de foro, podendo, portanto, aplicar as sanções previstas na Lei de Improbidade Administrativa, ressalvando, entretanto, a perda do cargo político, afinal, "isto configuraria um fato de desestabilização político-institucional para a qual a lei de improbidade administrativa não é vocacionada" [123].

Assim, o Min. Joaquim Barbosa votou no sentido de que a reclamação seria procedente "tão-somente para declarar a impossibilidade de, na via da ação de improbidade administrativa regida pela lei 8.429/1992, ser a autoridade interessada destituída do cargo político" [124].

O Ministro Marco Aurélio em seu voto acompanha integralmente o voto do Ministro Carlos Velloso.

O Ministro Celso de Mello [125] em seu voto ressalta que:

[...] a sujeição dos agentes públicos às conseqüências jurídicas de seu próprio comportamento, é inerente e consubstancial [...] ao regime republicano. [...] A forma republicana de Governo, analisada em seus aspectos conceituais, faz instaurar, portanto, um regime de responsabilidade a que se devem submeter, de modo pleno, todos os agentes públicos, inclusive aqueles que se qualificam como agentes políticos.

Continuando a análise do voto do Ministro Celso de Mello [126], ele expõe:

[...] o princípio constitucional da moralidade administrativa, ao impor limitações ao exercício do poder estatal, legitima o controle jurisdicional de todos os atos do Poder Público que transgridam os valores éticos que devem pautar o comportamento dos órgãos e agentes governamentais.

O Min. Celso de Mello expõe ainda que a importância da moralidade administrativa foi alçada a um nível tão alto pela Constituição Federal que:

[...] a estrita observância do postulado da moralidade administrativa passou a qualificar-se como pressuposto de validade dos atos que, fundados, ou não, em competência discricionária, tenham emanado de autoridades ou órgãos do Poder Público [127].

O Min. Celso de Mello conclui, então:

[...] pela competência dos magistrados de primeira instância para processar e julgar ação civil por improbidade administrativa ajuizada em face de agentes políticos, observando-se o rito da Lei nº 8.429/92, respeitadas as exigências constitucionais para efeito de perda do cargo e de privação do mandato. [128]

Por fim, o Ministro Sepúlveda Pertence acompanha os votos divergentes daqueles do Relator, acompanhando, assim o voto do Ministro Carlos Velloso. Entretanto, o e. Ministro tece algumas considerações que são extremamente pertinentes e que fazemos questão de transcrever, in verbis:

Levo em conta, sobretudo, que a perda da função pública, seja ela a de um cargo efetivo, seja de um mandato político, só se consuma com o trânsito em julgado da procedência da ação de improbidade.

Por isso, não há a temer o argumento ad terrorem de que pudesse um juiz singular suspender, preventivamente, o Presidente da República ou outro dignitário de alta hierarquia, nem dar à sua sentença força para destituí-lo imediatamente do mandato e suspender-lhe os direitos políticos. [129]

Passada a análise dos votos colhidos na Reclamação diversas vezes mencionada, passemos a uma análise crítica da decisão proferida.

A tese defendida perante o Supremo Tribunal Federal e que obteve sucesso é a de que os atos de improbidade, na verdade, redundariam em crimes de responsabilidade, de tal sorte que os agentes políticos só estariam sujeitos à responsabilidade de igual natureza. A respeito do exposto, Emerson Garcia [130] afirma:

Os artífices dessa curiosa e criativa tese argumentam que boa parte dos atos de improbidade encontram correspondência na tipologia da Lei nº 1.079/50, que trata dos crimes de responsabilidade, o que seria suficiente para demonstrar que a infração política absorveria o ato de improbidade.

Adiante, Emerson Garcia [131] continua tecendo críticas à tese levantada junto ao Excelso Supremo Tribunal Federal:

Além disso, o próprio texto constitucional, em seu art. 85, V, teria recepcionado esse entendimento ao dispor que o Presidente da República praticaria crime de responsabilidade sempre que atentasse contra a probidade na administração, o que possibilitaria o seu impeachment.

O impeachment, desde a sua gênese, é tratado como um instituto de natureza político-constitucional que busca afastar o agente político de um cargo público que demonstrou não ter aptidão para ocupar. Os crimes de responsabilidade, do mesmo modo, consubstanciam infrações políticas, sujeitando o agente a um julgamento de igual natureza. Essa constatação, por si, já demonstra o desacerto da tese que procura equipará-los às condutas disciplinadas pela Lei de Improbidade, afeita à seara cível e sujeitas a uma relação processual conduzida por um órgão jurisdicional.

Como bem afirma Pereira Neto:

[...] não há impedimento para que o agente político seja duplamente punido, ou seja, seja punido civil e penalmente, já que se trata de esferas de competências distintas. Portanto, o agente público que, utilizando-se de seu cargo, apropria-se ilicitamente de dinheiro público responderá, nos termos do art. 9º da Lei nº 8.429/92, por ato de improbidade, sem prejuízo da responsabilidade penal por crime contra a administração, prevista no Código Penal ou na legislação penal especial. [132]

Pereira Neto [133] defende ainda que uma imunidade à Lei de Improbidade Administrativa, conseqüência da decisão em análise, deferida aos agentes políticos, irá produzir nefastos efeitos políticos, além de ferir flagrantemente a Constituição Federal, que garante a proteção aos princípios da legalidade, probidade e moralidade.

Por sua vez, Cassio Scarpinella Bueno [134] argumenta que prevaleceu o argumento de que a Lei de Improbidade Administrativa deveria ser aplicada apenas para aqueles que "’cumprem ordens’; não pelos que formulam as grandes linhas das políticas públicas que são, em última análise, concretizadas por ordens administrativas que devem ser cumpridas" e ainda tece críticas aos argumentos lançados pelo e. Ministro Relator, Nelson Jobim, chegando ao ponto de afirmar que:

[...] trata-se [...] da recuperação, para os dias e preocupações atuais, de um tema clássico do direito público e do controle jurisdicional dos atos administrativos: a distinção entre os atos administrativos propriamente ditos e os atos políticos. Estes, por exemplo, por disposição expressa do art. 94 da Constituição Federal de 1937, não poderiam ser contrastados pelo Poder Judiciário.

Portanto, da análise dos votos colhidos na Reclamação 2.138-6-DF, observa-se que a tese de que os agentes políticos não estariam sujeitos à Lei de Improbidade Administrativa obteve uma maioria de seis votos a cinco. Percebe-se de toda a análise doutrinária acerca do tema que há uma divergência estabelecida e que não há como definir, de maneira contundente, qual o posicionamento deveria transparecer como majoritário.

Ambos os argumentos foram analisados, tanto a favor da tese de que os agentes políticos estariam sujeitos à Lei de Improbidade Administrativa quanto à tese que defende que a Lei dos Crimes de Responsabilidade afasta a incidência da Lei de Improbidade. Mesmo assim, admite-se, de qualquer forma, que a decisão proferida pelo Pretório Excelso não é final. Há a possibilidade de alterações em sua jurisprudência, até mesmo porque, como demonstrado, a maioria se deu por seis votos a cinco, quando a composição do Supremo Tribunal Federal poderia – e fazemos questão de ressaltar, poderia – chegar a uma conclusão diferente da que obteve.


Considerações finais

Com o presente trabalho monográfico pretendeu-se analisar a possibilidade dos agentes políticos serem responsabilizados por atos de improbidade administrativa, tal como disposto na Constituição Federal e na Lei nº 8.429/92.

Como exposto, a corrupção existe em todas as sociedades. No Brasil a corrupção chegou a níveis endêmicos levando o legislador constituinte a alçar à categoria de normas constitucionais o princípio da moralidade administrativa. Assim, coloca como preceito fundamental de toda atividade estatal a observância desse princípio.

Na esteira do legislador constituinte, foi editada a Lei nº 8.429/92, conhecida como Lei da Improbidade Administrativa, que regulamenta o disposto no art. 37, § 4º da Constituição Federal.

A edição da Lei de Improbidade Administrativa, entretanto, provocou enorme celeuma em relação à sua aplicabilidade aos agentes políticos, tendo em vista o argumento defendido por parte dos doutrinadores de que o agente político apenas se submeteria à Lei dos Crimes de Responsabilidade. Assim, não poderia ser punido também pela Lei de Improbidade Administrativa.

Por outro lado, por entender-se que o princípio da moralidade administrativa possui uma importância ímpar em nosso ordenamento jurídico, defende-se que a aplicação da Lei de Improbidade Administrativa aos agentes políticos, independente da sua responsabilização por crimes de responsabilidade, significa a defesa de sua eficácia. Entende-se, nesse sentido, que os crimes de responsabilidade e os atos de improbidade administrativa seriam diferentes entre si.

Assim, após a análise das correntes existentes acerca do tema, entende-se que os agentes políticos devem responder por atos de improbidade administrativa independente de sua responsabilização por crimes de responsabilidade. Chega-se a tal arremate em virtude da importância dada pela Constituição Federal ao princípio da moralidade administrativa e por não haver nenhum óbice à responsabilização dos agentes políticos por crimes de responsabilidade e por atos de improbidade administrativa, afinal de contas, trata-se de punições de diferentes naturezas.

Ressaltem-se, entretanto, as exceções constitucionais em relação à aplicação da Lei de Improbidade Administrativa ao Presidente da República e aos Senadores e Deputados. Em relação ao primeiro, a cassação de seu mandato pressupõe a existência de crime de responsabilidade, entretanto, não ficam afastadas as demais sanções existentes na Lei de Improbidade Administrativa. Em relação aos Senadores e Deputados, a perda da função pública também não poderá ser objeto da Ação Civil, tendo em vista o disposto no art. 55 da CF.

Nesse sentido, conforme defendido por cinco Ministros do Supremo Tribunal Federal, entende-se que quando os atos dos agentes políticos não forem considerados crimes de responsabilidade, deverão os agentes políticos responder normalmente por atos de improbidade administrativa, conforme preceitua a Constituição Federal e a Lei nº 8.429/92, data maxima venia à opinião da maioria formada no Pretório Excelso quando da votação da Reclamação nº 2.138-6-DF.


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______. Lei nº 1.079, de 10 de abril de 1950. Define os crimes de responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento. Disponível em: . acesso em: 14 de março de 2008.

V. Jurisprudência

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação nº 2.138-6-DF. Reclamante: União. Reclamado: Juiz Federal Substituto da 14ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal e outro. Relator: Min. Nelson Jobim, Rel. para acórdão Min. Gilmar Mendes. Brasília/DF, DJe nº 70 de 18/04/2008. Disponível em: < http://www.stf.gov.br/portal/inteiroTeor/obterInteiroTeor.asp?numero=2138&classe=Rcl> acesso em: 20 abril 2008.

VI. Sites de internet

http://oglobo.globo.com/

http://www.pedrojorge.org.br/

http://www.presidencia.gov.br/legislacao

http://www.stf.gov.br


Notas

  1. MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 1

  2. SARMENTO, George. Improbidade administrativa. Porto Alegre: Síntese, 2002. p. 37

  3. SIMÕES, Rafael Cláudio. Combate à corrupção e cidadania no Brasil: uma construção ainda inacabada. In: Improbidade administrativa: uma responsabilidade social na prevenção e controle. Coleção do avesso ao Direito, Ministério Público do Espírito Santo, 2004. v. 6. p. 34-35

  4. MIRANDA, Pontes de. apud SARMENTO, George. op. cit., p. 54

  5. SARMENTO, George. op. cit., p. 54

  6. SARMENTO, George. op. cit., p. 55

  7. BARRETO, Leonardo da Costa. O controle social sobre os atos de improbidade administrativa. In: Improbidade Administrativa: responsabilidade social na prevenção e controle. Coleção do avesso ao Direito, Ministério Público do Estado do Espírito Santo, 2004. v.6. p. 269

  8. MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. op. cit., p. 2

  9. Idem, p. 10

  10. LIMA, M. Madeleine Hutyra de Paula. Corrupção: obstáculo à implementação dos direitos econômicos, sociais e culturais. Revista de direito constitucional e internacional, São Paulo, a. 8, n. 33, out./dez. 2000. p. 176

  11. SARMENTO, George. op. cit., p. 35

  12. Cf. SARMENTO, George. op. cit.

  13. acesso em: 02/05/2008.

  14. SARMENTO, George. op. cit., p. 28

  15. SANTOS, Josenildo da Costa. Improbidade administrativa: uma máxima constitucional. 2001. 197 f. Dissertação (Pós-graduação em Direito)-Faculdade de Direito, Universidade Federal de Pernambuco. Pernambuco. p. 107

  16. Cf. SARMENTO, George. op. cit.

  17. Cf. SARMENTO, George. op. cit.

  18. SARMENTO, George. op. cit., p. 29

  19. Idem, p. 30

  20. FAGUNDES, Miguel Seabra. apud SARMENTO, George. op. cit., p. 31

  21. MENDIETA, Manuel Villoria. apud SANTOS, Josenildo da Costa. op. cit., p. 107-108.

  22. SANTOS, Josenildo da Costa. op. cit., p. 108

  23. SARMENTO, George. op. cit., p. 32

  24. Expressão de Pontes de Miranda.

  25. SARMENTO, George. op. cit., p. 34

  26. SARMENTO, George. op. cit., p. 54

  27. Idem, p. 54

  28. SARMENTO, George. op. cit., p. 56

  29. PINTO, Francisco Bilac. apud SARMENTO, George. op. cit., p. 57

  30. SARMENTO, George. op. cit., p. 56

  31. SARMENTO, George. op. cit., p. 58

  32. FIGUEIREDO, Marcelo. Probidade administrativa. Comentários à Lei 8.429/92 e legislação complementar. 5. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 54.

  33. VIEIRA, Fernando Grela. Ação civil pública de improbidade – foro privilegiado e crime de responsabilidade. In: MILARÉ, Edis (Coord.). A ação civil pública. Após 20 anos: efetividade e desafios. São Paulo: Editora RT, 2005. p.176.

  34. SARMENTO, George. Improbidade administrativa. Porto Alegre: Síntese, 2002. p. 108

  35. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 841-842

  36. MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 31

  37. GARCIA, Emerson. A moralidade administrativa e sua densificação. Revista de Direito Constitucional e Internacional, São Paulo, a. 11, n. 43, abr./jun. 2003. p. 120

  38. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 91-92

  39. HAURIOU, Maurice. apud DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit., p. 92

  40. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit., p. 92

  41. HAURIOU, Maurice. apud MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. op. cit., p. 32

  42. SANTOS, Josenildo da Costa. Improbidade administrativa: uma máxima constitucional. 2001. 197 f. Dissertação (Pós-graduação em Direito)-Faculdade de Direito, Universidade Federal de Pernambuco. Pernambuco. p. 35

  43. Idem, p. 42

  44. SARMENTO, George. op. cit., p. 112

  45. DELGADO, José Augusto. apud SARMENTO, George. op. cit., p. 113

  46. SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 27. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2006. p. 668

  47. SARMENTO, George. op. cit., p. 118

  48. Idem, p. 121

  49. ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. Princípios constitucionais da administração pública. Belo Horizonte: Del Rey, 1994. p. 30

  50. ROCHA, Cármen Lúcia Antunes. op. cit., p. 41

  51. SILVA, José Afonso da. op. cit., p. 669

  52. CAETANO, Marcello. apud MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. op. cit., p. 101

  53. PAZZAGLINI FILHO, Marino. Lei de improbidade administrativa comentada: aspectos constitucionais, administrativos, civis, criminais, processuais e de responsabilidade fiscal. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 43

  54. MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. op. cit., p. 103

  55. FREITAS, Juarez. apud SANTOS, Josenildo da Costa. op. cit., p. 136.

  56. MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. op. cit., p. 113

  57. SARMENTO, George. op. cit., p. 106

  58. LIMA, Hermes. apud SARMENTO, George. op. cit., p. 106

  59. KELSEN, Hans. apud SARMENTO, George. op. cit., p. 106

  60. SARMENTO, George. op. cit., p. 106

  61. DE PLÁCIDO E SILVA. apud ABRÃO FILHO, Gabriel. Aspectos materiais, processuais e procedimentais da ação civil por improbidade administrativa. 2007. 299 f. Dissertação (Mestrado em Direito Processual Civil)-Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica. São Paulo. p. 21

  62. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit., p. 766

  63. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit., p. 766

  64. MORAES, Alexandre de. Direito constitucional administrativo. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2007. p. 339

  65. Idem, ibidem.

  66. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit., p. 768

  67. ALVARENGA, Aristides Junqueira. O conceito de improbidade administrativa à luz da constituição da República Federativa do Brasil promulgada em 5 de outubro de 1988. Improbidade administrativa: responsabilidade social na prevenção e controle. Coleção do avesso ao Direito. Ministério Público do Estado do Espírito Santo, 2004. v. 6. p. 44

  68. COSTA, José Armando da. apud ABRÃO FILHO, Gabriel. op. cit., p. 21.

  69. ALVARENGA, Aristides Junqueira. op. cit., p. 44

  70. MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. O limite da improbidade administrativa: o direito dos administrados dentro da lei nº 8.429/92. 3. ed. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2006. p. 439

  71. BURLE FILHO, José Emmanuel. A ação civil pública e a tutela da probidade administrativa. In: MILARÉ, Edis (Coord.). A ação civil pública. Após 20 anos: efetividade e desafios. São Paulo: Editora RT, 2005. p. 299

  72. SANTOS, Josenildo da Costa. op. cit., p. 149

  73. MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. O limite da improbidade administrativa: o direito dos administrados dentro da lei nº 8.429/92. 3. ed. Rio de Janeiro: América Jurídica, 2006. p. 16

  74. GARCIA, Emerson. Sujeitos ativos dos atos de improbidade administrativa. In: Improbidade administrativa: responsabilidade social na prevenção e controle. Coleção do avesso ao Direito. Ministério Público do Estado do Espírito Santo, 2004. v. 6. p. 96

  75. MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 298

  76. Idem, ibidem.

  77. PEREIRA NETO, Luiz Gongaza. Os agentes políticos e sua responsabilização à luz da lei nº 8.429/92. Revista da AGU, Brasília, a. IV, n. 12, abr. 2007. p. 13

  78. Cf. MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. op. cit.

  79. GARCIA, Emerson. Sujeitos ativos..., op. cit., p. 115

  80. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 33. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2007. p. 74

  81. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 226

  82. FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Corrupção no poder público: peculato, concussão, corrupção passiva e prevaricação. São Paulo: Atlas, 2002. p. 55-56

  83. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 499

  84. OLIVEIRA, Regis Fernandes de. Servidores públicos. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. p. 10-11

  85. MEIRELLES, Hely Lopes. op. cit., p. 75

  86. MEIRELLES, Hely Lopes. op. cit., p. 78

  87. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. op. cit., p. 229

  88. PEREIRA NETO, Luiz Gonzaga. op. cit., p. 12

  89. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit., p. 501

  90. MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. op. cit., p. 308

  91. OSÓRIO, Fábio Medina. Obstáculos processuais ao combate à improbidade administrativa: uma reflexão geral. Improbidade administrativa: responsabilidade social na prevenção e controle. Coleção do avesso ao Direito, Ministério Público do Estado do Espírito Santo, 2004. v.6. p. 199

  92. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit., p. 779

  93. Idem, p. 780

  94. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. op. cit., p. 780

  95. Cf. OSÓRIO, Fábio Medina. Obstáculos processuais ao combate à improbidade administrativa: uma reflexão geral. Improbidade administrativa: responsabilidade social na prevenção e controle. Coleção do avesso ao Direito, Ministério Público do Estado do Espírito Santo, 2004. v.6. p. 201

  96. Idem, ibidem.

  97. Cf. OSÓRIO, Fábio Medina. op. cit.

  98. Cf. ABRÃO FILHO, Gabriel. Aspectos materiais, processuais e procedimentais da ação civil por improbidade administrativa. 2007. 299 f. Dissertação (Mestrado em Direito Processual Civil)-Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica. São Paulo. p. 96

  99. OSÓRIO, Fábio Medina. op. cit., p. 200

  100. Cf. GARCIA, Mônica Nicida. Agente político, crime de responsabilidade e ato de improbidade. Boletim dos Procuradores da República. a. v, n. 56, dez/2002. Disponível em: acesso em: 16/10/2008.

  101. ABRÃO FILHO, Gabriel. op. cit., p. 89

  102. OSÓRIO, Fábio Medina. op. cit., p. 203

  103. MARTINS JÚNIOR, Wallace Paiva. Probidade Administrativa. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 310

  104. Idem, p. 311

  105. VIEIRA, Fernando Grela. Ação civil pública de improbidade – foro privilegiado e crime de responsabilidade. In: MILARÉ, Edis (Coord.). A ação civil pública. Após 20 anos: efetividade e desafios. São Paulo: Editora RT, 2005. p. 178

  106. Cf. PEREIRA NETO, Luiz Gonzaga. Os agentes políticos e sua responsabilização à luz da lei nº 8.429/92. Revista da AGU, Brasília, a. IV, n. 12, abr. 2007.

  107. PEREIRA NETO, Luiz Gonzaga. op. cit. p. 19

  108. Cf. OSÓRIO, Fábio Medina. op. cit.

  109. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação nº 2.138-6-DF. Reclamante: União. Reclamado: Juiz Federal Substituto da 14ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal e outro. Relator: Min. Nelson Jobim, Rel. para acórdão Min. Gilmar Mendes. Brasília/DF, DJe nº 70 de 18/04/2008.

  110. Ibidem.

  111. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação nº 2.138-6-DF. Reclamante: União. Reclamado: Juiz Federal Substituto da 14ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal e outro. Relator: Min. Nelson Jobim, Rel. para acórdão Min. Gilmar Mendes. Brasília/DF, DJe nº 70 de 18/04/2008.

  112. Ibidem.

  113. Ibidem.

  114. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação nº 2.138-6-DF. Reclamante: União. Reclamado: Juiz Federal Substituto da 14ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal e outro. Relator: Min. Nelson Jobim, Rel. para acórdão Min. Gilmar Mendes. Brasília/DF, DJe nº 70 de 18/04/2008.

  115. Ibidem.

  116. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação nº 2.138-6-DF. Reclamante: União. Reclamado: Juiz Federal Substituto da 14ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal e outro. Relator: Min. Nelson Jobim, Rel. para acórdão Min. Gilmar Mendes. Brasília/DF, DJe nº 70 de 18/04/2008.

  117. Ibidem.

  118. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação nº 2.138-6-DF. Reclamante: União. Reclamado: Juiz Federal Substituto da 14ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal e outro. Relator: Min. Nelson Jobim, Rel. para acórdão Min. Gilmar Mendes. Brasília/DF, DJe nº 70 de 18/04/2008.

  119. Ibidem.

  120. Ibidem.

  121. Ibidem.

  122. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação nº 2.138-6-DF. Reclamante: União. Reclamado: Juiz Federal Substituto da 14ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal e outro. Relator: Min. Nelson Jobim, Rel. para acórdão Min. Gilmar Mendes. Brasília/DF, DJe nº 70 de 18/04/2008.

  123. Ibidem.

  124. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação nº 2.138-6-DF. Reclamante: União. Reclamado: Juiz Federal Substituto da 14ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal e outro. Relator: Min. Nelson Jobim, Rel. para acórdão Min. Gilmar Mendes. Brasília/DF, DJe nº 70 de 18/04/2008.

  125. Ibidem.

  126. Ibidem.

  127. Ibidem.

  128. Ibidem.

  129. BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Reclamação nº 2.138-6-DF. Reclamante: União. Reclamado: Juiz Federal Substituto da 14ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal e outro. Relator: Min. Nelson Jobim, Rel. para acórdão Min. Gilmar Mendes. Brasília/DF, DJe nº 70 de 18/04/2008.

  130. GARCIA, Emerson. Sujeitos ativos dos atos de improbidade administrativa. In: Improbidade administrativa: responsabilidade social na prevenção e controle. Coleção do avesso ao Direito. Ministério Público do Estado do Espírito Santo, 2004. v. 6. p. 117

  131. Idem, ibidem.

  132. PEREIRA NETO, Luiz Gonzaga. Os agentes políticos e sua responsabilização à luz da lei nº 8.429/92. Revista da AGU, Brasília, a. IV, n. 12, abr. 2007. p. 19

  133. Cf. PEREIRA NETO, Luiz Gonzaga.

  134. BUENO, Cassio Scarpinella. O foro especial e a lei 10.628/02. In: BUENO, Cassio Scarpinella; PORTO FILHO, Pedro Paulo de Rezende (Coord.). Improbidade administrativa (questões polêmicas e atuais). São Paulo: Malheiros Editores, 2003. p. 441



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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SÁ, João Raphael Correia Barbosa de. Os agentes políticos como sujeitos ativos de atos de improbidade administrativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2113, 14 abr. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12628. Acesso em: 25 abr. 2024.