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Momento processual propício para determinar a inversão "ope judicis" do ônus da prova.

Análise à luz da Constituição Federal de 1988

Momento processual propício para determinar a inversão "ope judicis" do ônus da prova. Análise à luz da Constituição Federal de 1988

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O que deve fazer o magistrado: inverter o ônus de provar na fase instrutória ou durante a prolação da sentença? A incerteza quanto ao momento apropriado pode causar prejuízos aos jurisdicionados, em especial aos fornecedores.

Sumário: 1. Notas introdutórias. 2. A prova e o ônus da prova; 2.1. Inversão do ônus da prova; 2.1.1 Relação de consumo e inversão do ônus da prova; 2.1.2 Inversão do ônus da prova "ope judicis"; 2.1.3 A inversão do ônus da prova e o profissional liberal. 3 teorias sobre o momento propício para determinar a inversão; 3.1 Na sentença; 3.2 Na fase instrutória. 4 Princípios processuais relacionados à prova; 4.1 Princípios processuais como direitos fundamentais; 4.2 devido processo legal; 4.3 Princípio do contraditório; 4.4 Ampla defesa; 4.5 Acesso à justiça; 4.6 Princípio da adaptabilidade do procedimento; 4.7 Princípio da cooperação; 4.8 Princípio da eventualidade; 4.9 Princípio da motivação das decisões; 4.10 Princípio da imparcialidade do juiz. 5 Implicações da inversão do ônus da prova na sentença; 5.1 Violação a garantias constitucionais do fornecedor; 5.2 Ocorrência nos Juizados Especiais Cíveis. 6 Conclusão.


1. Notas introdutórias

A regra geral do sistema de distribuição da prova está estabelecida no CPC, mas o CDC aponta algumas exceções. Nele, o legislador estabeleceu previamente algumas circunstâncias em que é dever do fornecedor produzir a prova, e também previu ocasiões em que o julgador, observando a presença dos pressupostos necessários, deve inverter o ônus em desfavor do fornecedor, com o propósito de equilibrar a situação em razão da desigualdade entre as partes.

Quando a lei estabelece diretamente a inversão, trata-se da modalidade "ope legis". Já a inversão do ônus de provar determinada pelo julgador se opera "ope judicis", e deve ser conferida exclusivamente em prol do consumidor. É tormentosa, porém, a discussão sobre o momento oportuno para decretação da inversão "ope judicis", havendo divergência doutrinária e jurisprudencial, mas sempre no campo da legislação infraconstitucional.

O ponto nevrálgico do tema é a discussão sobre o que fazer o magistrado: inverter o ônus de provar na fase instrutória ou durante a prolação da sentença, sendo que a incerteza quanto ao momento apropriado pode causar prejuízos aos jurisdicionados, em especial aos fornecedores.

Para desanuviar o assunto, propõe-se a presente discussão sob a ótica da CRFB/1988, observando os princípios processuais constitucionais, e não esquecendo os infraconstitucionais, que incidem sobre o tema. Incluam-se as circunstâncias que envolvem a alteração do sistema de distribuição de provas conferida ao magistrado no rito dos Juizados Especiais Cíveis.

Antes, porém, convém estabelecer a importância da atividade probatória, já que somente a partir da análise das provas produzidas o julgador poderá chegar o mais próximo de uma solução ideal para a demanda e concluir seu dever, respeitando a lógica constante nos autos e considerando o modelo determinado pela lei para a apreciação dessas provas.


2. A prova e o ônus da prova

Apesar dos inúmeros aspectos a serem explorados sobre a prova, para o presente estudo interessa a visão estabelecida no artigo 332 do CPC, e que se traduz no elemento levado em juízo para auxiliar a formação do livre convencimento do juiz: "Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa".

Uma vez ocorridos os fatos em determinado tempo e espaço, é impossível reproduzi-los da forma que realmente aconteceram. Sua "reconstituição" será feita pelo homem, que os enxergará conforme sua perspectiva, sua vivência, seus valores e seus humores; e, considerada a impossibilidade latente de alcançar a verdade real em razão dos fatores externos apontados, correto é dizer que o que se busca é a "verdade possível".

Através do processo e da sua intrínseca necessidade de produzir provas que comprovem os fatos alegados, as partes devem fornecer ao magistrado o máximo de subsídios, que irão contribuir para a prestação da tutela jurisdicional mais justa possível. Fux1 lembra que:

"Para o processo, o que importa é a verdade que migra para os autos, ou seja, a verdade do judiciário, aquela que importa para a decisão e que timbra de imutabilidade a definição que advém da cognição. A conclusão a que chega o juízo não tem esse compromisso com a verdade, senão com a justiça, a estabilidade e a segurança sociais, e é alcançada mediante a colaboração das partes". (Grifos do autor)

Então, a partir da necessidade de apontar a quem caberia o ônus de produzir a prova, o legislador estabeleceu uma regra geral: cabe ao requerente provar o fato constitutivo de seu direito, enquanto ao requerido compete provar a existência de fato que impeça, modifique ou extinga o direito do requerente. É o que depreende do artigo 333, "caput" e incisos, do CPC.

Essas regras de distribuição em abstrato revelam o chamado ônus subjetivo ou formal, e num ambiente de incerteza causada pela ausência de subsídios que auxiliem o julgador a formar seu convencimento, permitem identificar qual parte não esclareceu fatos relevantes. Cintra, Grinover e Dinamarco2 assim trataram a distribuição subjetiva do ônus da prova:

"O fundamento da repartição do ônus da prova entre as partes é, além de uma razão de oportunidade e de experiência, a ideia de equidade resultante da consideração de que, litigando as partes e devendo conceder-se-lhes a palavra igualmente para o ataque e a defesa, é justo não impor só a uma o ônus da prova (do autor não se pode exigir senão a prova dos fatos que criam especificamente o direito por ele invocado; do réu, as provas dos pressupostos da exceção). O ônus da prova consiste na necessidade de provar, em que se encontra cada uma das partes, para possivelmente vencer a causa".

"Ônus" significa um encargo atribuído a quem deve agir de determinada maneira para, atendendo a interesse próprio, evitar sofrer prejuízos. Não existe qualquer contraprestação se o interessado o descumpre, ao contrário do que ocorre na obrigação, quando a pessoa deve agir de forma a atender o interesse alheio. Porém, apesar da não obrigatoriedade, se a parte não se livrar desse encargo poderá experimentar prejuízos, conforme lembra Dinamarco3:

"[...] para o juiz ‘fato não provado é fato inexistente’ (‘regra de julgamento’) e, uma vez finda a instrução, as afirmações, omissões e negativas referentes aos fatos de relevância para o julgamento serão interpretadas e confrontadas à luz do resultado da experiência probatória. O ‘direito à prova’ é de primeira importância para a efetividade da garantia constitucional da ação e da defesa e, correlativamente, o seu não-exercício, nos casos de maior disponibilidade e na medida da disponibilidade do direito substancial em cada caso, conduz a conseqüências mais graves quanto ao resultado substancial do processo".

Ao determinar a distribuição apriorística do ônus da prova, desconsiderando o caso concreto e incumbindo às partes a produção de provas que confirmem suas alegações, o CPC adotou a teoria estática com vistas a observar o seu artigo 126, que veda ao julgador manifestar o "non liquet" para não prestar a tutela jurisdicional.

2.1. Inversão do ônus da prova

As regras de ônus da prova não se prestam a distribuir tarefas processuais; são regras de julgamento que devem ser aplicadas subsidiariamente e que indicam ao julgador quem arcará com o prejuízo se determinado fato que mereça ser examinado não for demonstrado nos autos. Todavia, a teoria estática não se demonstra satisfatória, pois não atende plenamente às expectativas de uma prestação jurisdicional justa.

Com isso, "vem ganhando força [a] teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova"4, regra de distribuição objetiva (ônus objetivo ou material) que determina qual parte irá suportar o ônus da prova a partir do caso concreto5; e orienta o julgador, apontando qual parte possui melhores condições de produzir a prova e quem irá sofrer prejuízos se surgirem incertezas pela falta de demonstração dos fatos alegados, evidenciando o princípio constitucional da igualdade. Consoante detalha Godinho (apud DALL’AGNOL JUNIOR)6:

"Pela teoria da distribuição dinâmica do ônus probatórios, portanto, a) inaceitável o estabelecimento prévio e abstrato do encargo; b) ignorável é a posição da parte no processo; c) e desconsiderável se exibe a distinção já tradicional entre fatos constitutivos, extintivos etc. Releva, isto sim, a) o caso em sua concretude e b) a "natureza" do fato a provar – imputando-se o encargo àquela das partes que, pelas circunstâncias reais, se encontra em melhor condição de fazê-lo".

Enquanto para a teoria estática do ônus da prova a não confirmação das alegações nos autos é considerada, no momento do julgamento, em desfavor de quem caberia prová-las (regra de julgamento), a regra que determina a inversão do ônus da prova é regra de procedimento7:

"Aplicação prática deste princípio [constitucional da isonomia] é a inversão do ônus da prova nas relações de consumo. Pensamos que a regra de inversão é regra procedimental, que autoriza o desvio de rota; não se trata de regra de julgamento, como a que distribui o ônus da prova".

É fácil concluir que o legislador, ao estabelecer o sistema protetivo das relações de consumo, encontrou na inversão do ônus da prova um instrumento que garante a facilitação da defesa do consumidor em sede jurisdicional, mais precisamente no que tange à instrução do processo. Contudo, convém lembrar, esse mecanismo não se presta a assegurar de antemão a procedência da ação.

Por fim, se produzidas provas suficientes para a formação do juízo de valor do julgador, que se sente apto a fundamentar a decisão com o material constante nos autos, é despiciendo falar em inversão do ônus da prova, uma vez que não há dúvidas quanto aos fatos suscitados nos autos e inexiste hipossuficiência que não permita a produção de provas.

2.1.1 Relação de consumo e inversão do ônus da prova

Conforme depreende do artigo 6º, inciso VIII, do CDC8, são requisitos para a inversão do ônus da prova, e somente eles: a hipossuficiência do consumidor e a verossimilhança da alegação. Descabe ao julgador utilizar critério pessoal para analisar o caso concreto e decidir pela aplicação ou não do mecanismo, pois na presença de um desses requisitos, tem ele o poder-dever de decretar a inversão, até por se tratar de matéria de ordem pública.

Não se pode esquecer que o dispositivo também determina a verificação de tais requisitos à luz das regras ordinárias de experiência.

Quanto à hipossuficiência, apesar de certa resistência inicial, doutrina e jurisprudência convencionaram o entendimento de que pode ser econômica ou técnica. Não precisa estar exclusivamente atrelada à noção de pobreza, conforme destacou o STJ: "[...] a hipossuficiência a que faz remissão o inciso VIII do art. 6º do CDC não deve ser analisada apenas sob o prisma econômico e social, mas, sobretudo, quanto ao aspecto da produção de prova técnica"9.

Ocorre a hipossuficiência técnica quando o consumidor não reúne condições de produzir a prova constitutiva do seu direito, mas o fornecedor sim. Nunes10 defende que apenas a hipossuficiência técnica, e não a econômica, pode fundamentar a inversão do ônus da prova, já que sua decretação não deve estar atrelada à proteção do mais pobre, pois a produção de prova está relacionada ao direito processual, enquanto a condição econômica ao direito substancial.

Nesse sentido, o TJRJ não decretou a inversão do ônus da prova fundamentada apenas na hipossuficiência econômica do consumidor11:

"A inversão, prevista no estatuto do consumo, não diz respeito à hipossuficiência econômica, mas sim à probatória, porque casos há em que isso se afigura muito difícil para o consumidor, sendo mais fácil para o fornecedor sua produção. Ela não alcança o fato constitutivo do direito do autor, cujo ônus probatório continua sendo seu".

Para parte da doutrina12, a situação de hipossuficiência deve ser demonstrada a partir de um juízo de verossimilhança, razão pela qual a conjunção alternativa "ou" do artigo 6º, inciso VIII, do CDC deve ser interpretada como a conjunção aditiva "e", o que torna necessária a presença dos dois pressupostos para proceder à inversão.

Alegação verossimilhante é aquela que à primeira vista parece verdadeira, sendo passível de comprovação no futuro, e o julgador, num primeiro momento, se convence de que realmente poderá acontecer. A situação sugere que a verdade foi descrita em alto grau de probabilidade, mas não peremptoriamente confirmada, pois, se assim o fosse, seria discutida a certeza, e não a verossimilhança. Por ser "medida extrema, deve o juiz aguardar a peça de defesa para verificar o grau de verossimilhança na relação" e só após analisar os elementos trazidos com a resposta, se for o caso, inverter o ônus13.

Nesse diapasão, a inversão do ônus da prova em favor de consumidor não hipossuficiente e cuja alegação não é verossímil, além de ofender o CDC, é inconstitucional, pois viola o devido processo legal e a isonomia, e ainda desequilibra a relação "inter partes".

2.1.2 Inversão do ônus da prova "ope judicis"

A inversão do ônus da prova de que trata o artigo 6º, inciso VIII, do CDC se opera "ope judicis", ou seja, a "critério" do julgador, após analisar as circunstâncias do caso concreto e verificar a presença de um dos requisitos autorizativos. A decisão deve estar devidamente fundamentada, pois a regra de inversão do ônus da prova não é de aplicação compulsória, mas extraordinária, vedado o reconhecimento indiscriminado da hipossuficiência do consumidor ou da verossimilhança do que ele alegou, conforme o STJ já deixou consignado14:

"[...] a mera aplicação do CDC não autoriza automaticamente a inversão do ônus da prova, pois não se pode atribuir hipossuficiência indiscriminadamente [...] Essa proteção somente pode ser concedida em circunstâncias especiais (art. 6º, VIII, do CDC), ou seja, quando efetivamente demonstrada a hipossuficiência caso a caso e não presumidamente, só quando houver efetiva desigualdade. Precedentes citados: REsp 541.867-BA, DJ 16/5/2005; REsp 701.370-PR, DJ 5/9/2005; AgRg no Ag 801.547-RJ, DJ 16/4/2007, e REsp 684.613-SP, DJ 1º/7/2005".

Segundo Theodoro Júnior15, o julgador, depois de constatar preliminarmente se restou evidenciado ao menos um pressuposto, deve verificar se ele é compatível com os princípios informativos do CDC e se foram preservadas as garantias constitucionais do devido processo legal e da ampla defesa.

Por fim, não se confunde a regra de inversão do ônus da prova "ope judicis" do artigo 6º, inciso VIII, do CDC, oriunda da teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, com a regra de inversão "ope legis" estabelecida pelo legislador, que atribui "a priori" o ônus de provar ao fornecedor, homenageando o princípio da adequação16.

Essa modalidade de inversão "ope judicis" decorre do princípio da igualdade, na medida em que trata os desiguais de forma desigual, conforme sinaliza o dispositivo.

2.1.3 A inversão do ônus da prova e o profissional liberal

Ao estabelecer a responsabilidade objetiva pelo fato do serviço no artigo 14, § 3º, do CDC, o legislador atribuiu ao fornecedor o ônus de provar (inversão "ope legis"). Entretanto, embora no fato do serviço a inversão em regra se opere "ope legis", e em desfavor do fornecedor, com relação ao profissional liberal algumas peculiaridades serão observadas. Se o profissional liberal assume obrigação de resultado, como na cirurgia estética, será objetiva a responsabilidade, e, nesse caso, a inversão também irá se operar "ope legis".

Por outro lado, como as regras de inversão "ope legis" estabelecidas no CDC são regras de exceção, devem ser interpretadas restritivamente, razão pela qual o artigo 14, § 4º, isenta o profissional liberal que não assumiu obrigação com final esperado e certo. O entendimento majoritário é no sentido de que, nesses casos, a inversão do encargo se opera "ope judicis", devendo o julgador intervir para restabelecer a igualdade entre as partes, se necessário17.

A responsabilidade do profissional liberal que realiza "atividade meio" não é objetiva, mas subjetiva (artigo 14, § 4º, do CDC18), e como o dever de reparar está ligado à culpa, cabe-lhe a demonstração de que agiu com cuidado ao cumprir a obrigação assumida.

Contudo, mesmo que a inversão "ope legis" não incida sobre as obrigações de meio, se for necessário para estabelecer o equilíbrio da relação e se presentes os pressupostos, cabe ao julgador determinar, de ofício ou a pedido do consumidor, a inversão "ope judicis", aplicando o artigo 6º, inciso VIII, do CDC. É que, na verdade, não se pode permitir que a vedação à inversão do ônus da prova nessas relações de consumo específicas acarrete prejuízos ao consumidor, promovendo verdadeiro desequilíbrio entre as partes e afiançando injustiças.


3 Teorias sobre o momento propício para determinar a inversão

Duas teorias fixam o momento ideal para o magistrado decretar a inversão do ônus da prova em desfavor do fornecedor nas relações de consumo: na fase instrutória e na sentença.

Houve, em período pretérito, quem apontasse como momento ideal o despacho da inicial, mas, ao que parece, com o tempo seus defensores aderiram aos demais entendimentos, razão pela qual fica apenas o registro.

3.1 Na sentença

É forte o entendimento de que a inversão do ônus da prova é uma regra de julgamento, sendo o momento mais oportuno para decretá-la o da prolação da sentença, quando é possível vislumbrar quem deve sofrer as consequências por não haver influenciado de forma satisfatória no convencimento do julgador. Para alguns doutrinadores, embora não haja obrigação, o julgador poderá alertar na decisão saneadora que, se não for convencido, irá inverter o encargo.

Filomeno (apud MATOS)19 defende que, como as partes podem dar o rumo que melhor lhes aprouver à atividade probatória, quem não quiser se preparar estará sujeito aos riscos decorrentes de sua própria inércia. Esse sistema não determina quem irá produzir a prova, mas quem assume o risco de não produzi-la.

Assim, o fornecedor sabe de antemão a possibilidade de inversão do ônus de provar, porque desde o início conhece as "regras do jogo", e por esse motivo, se for do seu interesse, deve provar tudo o que estiver ao seu alcance para não ser prejudicado na sentença.

Como a inversão do ônus da prova é um mecanismo que promove a facilitação da defesa do consumidor, parte vulnerável na relação de consumo, deve ser decretada após a valoração da prova, e por isso a ocasião ideal é o de prolação da sentença, quando é possível analisar todo o conjunto probatório contido nos autos.

Para Nery Junior e Nery20, o artigo 6º, inciso VIII, do CDC não fixou um momento exato para se decretar a inversão do ônus da prova porque "não se trata de [regra de] procedimento", mas de regra de julgamento, e por isso cabe ao magistrado, ao exarar sua decisão, julgar contrariamente a quem tinha o dever de produzir a prova e não o fez.

O STJ, inclusive, já decidiu nesse sentido21: "conforme posicionamento dominante da doutrina e da jurisprudência, a inversão do ônus da prova, prevista no inc. VIII, do art. 6º do CDC é regra de julgamento".

3.2 Na fase instrutória

Essa linha de pensamento se revela a partir de uma concepção distinta acerca da natureza das regras que tratam do ônus de provar. A inversão do ônus da prova decorre da teoria da carga dinâmica da prova, e é uma "regra de procedimento" porque altera as regras comumente aplicadas no momento da prolação da sentença, previstas no artigo 333 do CPC (regra estática do ônus da prova).

O instituto da inversão do ônus da prova é regra de procedimento porque altera a regra de julgamento; e permite ao julgador, se presentes os pressupostos autorizativos da inversão, vislumbrar o que deve ser provado no momento de fixar os pontos controvertidos. Logo, deve ser obrigatoriamente anunciada no período entre a resposta e a decisão saneadora.

Não fosse assim, a decretação da inversão do ônus da prova no exato instante da prolação da sentença configuraria "[...] a peculiar situação de, simultaneamente, se atribuir um ônus ao réu, e negar-lhe a possibilidade de desincumbir-se do encargo que antes inexistia" (Didier Júnior, Braga e Oliveira, apud GIDI)22.

O Ministro Menezes Direito, ainda no STJ, nos "esclarecimentos" do recurso especial nº 442.854/SP assim admitiu: "a minha sensação é a de que a inversão do ônus da prova deve ser no momento em que começa a dilação probatória. Se não for assim, a parte não tem como saber a quem cabe provar a culpa"23. O próprio Ministro destacou, em outro julgado, que: "não tem nenhum sentido o juiz deixar para apreciar na sentença o pedido de inversão do ônus da prova. Como é curial, a decisão alterará todo o sistema de provas no curso do processo"24.

A parte sobre quem recairá o encargo de produzir a prova deve ser cientificada em tempo hábil, para que a instrução corra sem transtornos e facilite a decisão final, conforme depreende da ilustrativa lição de Theodoro Júnior25 a seguir colacionada:

"Quando, porém, a regra geral é uma e, a seu respeito, pode sobrevir inovação dependente de ato do juiz, torna-se evidente que tal regra inovadora somente poderá ser estabelecida em tempo útil à defesa do litigante destinatário do novo encargo de prova. Há quem admite que possa o juiz decretar a inversão do ônus da prova já no despacho da petição inicial, outros que a consideram realizável no momento de proferir a sentença. As duas posições nos parecem extremadas e injustificáveis. Antes da contestação, nem mesmo se sabe quais fatos serão controvertidos e terão, por isso, de se submeter à prova. Torna-se, então, prematuro o expediente do art. 6º, nº VIII, do CDC. No momento da sentença, a inversão seria medida tardia porque já encerrada a atividade instrutória. [...] a regra do CDC deve ser entendida à luz do sistema do CPC, onde a definição dos fatos controvertidos e da necessidade de prova deve ser feita pelo juiz no saneador (art. 331, § 2º)".

Sanseverino27, no mesmo sentido, entende que o julgador deve permitir que o fornecedor se desincumba do ônus probatório.

O TJRJ editou o Enunciado nº 91 de sua Súmula26, segundo o qual "a inversão do ônus da prova, prevista na legislação consumerista, não pode ser determinada na sentença". E o STJ, inclusive, já se manifestou em vários julgados no sentido de que a inversão deve ser decretada antes do término da instrução processual, de acordo com o excerto a seguir:

"A inversão do ônus da prova, prevista no artigo 6º, inciso VIII, do Código de Defesa do Consumidor, como exceção à regra do artigo 333 do Código de Processo Civil, sempre deve vir acompanhada de decisão devidamente fundamentada, e o momento apropriado para tal reconhecimento se dá antes do término da instrução processual, inadmitida a aplicação da regra só quando da sentença proferida"28.

Como se viu, a inversão do ônus da prova se torna mais eficaz se decretada pelo julgador ao exarar a decisão saneadora, nos termos do artigo 331, § 2º, do CPC29. Nesse momento as partes já se manifestaram nos autos e apresentaram suas alegações, exercendo o contraditório e a ampla defesa, o que permite ao julgador verificar a pertinência das alegações do consumidor, se verossímeis ou não, ou se o mesmo se encontra num quadro de hipossuficiência.

Assim, exercido o juízo de admissibilidade da prova, e observada a presença dos requisitos autorizativos, o magistrado deve obrigatoriamente determinar a inversão do ônus da prova, uma vez que a regra contida no artigo 6º, inciso VIII, do CDC confere ao magistrado um poder-dever. A decisão deve ser devidamente fundamentada, esclarecendo o porquê de decretar a inversão e destacando os requisitos presentes.

Noutro giro, o magistrado também poderá perceber se a prova que se inverterá o ônus de produzir é difícil ou impossível de ser produzida, evitando a "prova diabólica", vedada porque imputa ao demandante a derrota antes mesmo do julgamento, já que se lhe atribui um encargo do qual jamais irá se desincumbir.


4 Princípios processuais relacionados à prova

A prova é um instituto que se submete a considerável número de princípios processuais, de cunho constitucional e infraconstitucional, a regularem seu cabimento, sua licitude, a forma e o momento de sua produção etc. A seguir, serão brevemente analisados os princípios mais próximos desse instituto, que de alguma forma estejam ligados ao objeto do presente trabalho.

4.1 Princípios processuais como direitos fundamentais

Antes de fazer alusão a alguns desses princípios, porém, é necessário deixar consignado que as pessoas jurídicas também são destinatárias dos direitos e das garantias fundamentais previstos no artigo 5º da CRFB/1988, sendo "[...] beneficiárias do extenso rol de prerrogativas nele fixadas, com as exceções detectadas pela simples leitura dos incisos constitucionais"30.

Cumpre destacar também que a livre iniciativa é um princípio fundamental estatuído no artigo 1º, inciso IV, da CRFB/198831.

Além desses prévios e devidos esclarecimentos, convém lembrar a evolução do Direito desde a supervalorização do individualismo pós-Revolução Francesa ao moderno conceito de interpretação, à luz da lei constitucional, do direito material – mormente as relações privadas – e do direito em seu aspecto formal. Pode-se apontar como marco principal os horrores da segunda guerra mundial, a partir do qual tomou fôlego a utilização da dignidade da pessoa humana como paradigma. Depois disso, os sistemas legislativos, de uma forma geral, passaram a privilegiar os direitos fundamentais, e não foi diferente em nosso ordenamento jurídico32.

Os direitos e as garantias fundamentais, mesmo aqueles estabelecidos em princípios meramente programáticos, vinculam o Poder Público, especialmente os órgãos encarregados da prestação jurisdicional. E porque possuem caráter principiológico, não estão expressos numa lista "numerus clausus". Pelo contrário. Além de incidirem sobre as normas já existentes, dão também sustentação à proteção e à preservação de direitos e de garantias não expressos. Enfim, os princípios fundamentais asseguram "[...] a unidade sistemática da constituição [e] atuam como vetores para soluções interpretativas [...]"33.

Por outro lado, tem-se o conjunto de normas processuais inseridos na CRFB/1988, o denominado "Direito Constitucional Processual". Esses princípios processuais são garantias fundamentais do processo, e devem ser efetivamente aplicados pelo julgador, já que, vistos sob a ótica da dimensão objetiva dos direitos fundamentais, se traduzem em valores que devem nortear a interpretação e a aplicação de todas as normas do ordenamento jurídico34.

Nesse diapasão, ainda que não se entenda a inversão do ônus da prova como regra de processo, sua decretação na sentença configura obstáculo desproporcional para a efetivação de direitos fundamentais do fornecedor, como a garantia do contraditório e da ampla defesa. Em razão disso, compete ao julgador evitar aplicar essa regra no momento de exarar a decisão.

Nem sempre os efeitos pretendidos pelas normas restam suficientemente evidenciados a partir de uma simples leitura de seu enunciado, mas sua identificação "é, provavelmente, o momento mais importante na construção de sua imperatividade"35. Por essa razão, é necessário, por vezes, investigar mais a fundo o sistema jurídico antes de aplicar a norma, para se ter a exata noção daquilo que pretende o seu enunciado.

Essa questão toma relativa importância quando envolve princípios constitucionais, pois, segundo Oliveira36, cuida-se de "direito constitucional aplicado". Logo, é dever do magistrado dar o máximo de eficácia aos direitos fundamentais (materiais ou processuais), afastando qualquer circunstância irrazoável que porventura atrapalhe sua efetivação.

Como visto, cabe ao julgador utilizar efetivamente as normas constitucionais processuais, não se atendo a tecnicismos, pois, se o processo é indispensável à realização da justiça e promove a pacificação social, deve ser considerado como ferramenta que realiza valores. Não se trata de mera conformação do processo às normas constitucionais, mas de sua utilização no exercício da função jurisdicional.

4.2 Devido processo legal

O devido processo legal é cláusula geral da qual decorrem todas as consequências processuais que garantem às partes um processo e uma decisão justos, dando supedâneo aos demais princípios processuais. Subdivide-se em devido processo legal processual e material. O devido processo legal processual, que ora interessa, é a "possibilidade efetiva de a parte ter acesso à justiça, deduzindo pretensão e defendendo-se do modo mais amplo possível", compreendendo o direito de defesa e o contraditório38.

Esse princípio retrata a garantia que a pessoa (física ou jurídica) possui de atuar num processo conduzido por normas previamente estabelecidas, sem desvio do que lhe é de devido. Então, não se concebe que uma decisão cause surpresa à parte ao alterar a regra de distribuição da prova numa fase já adiantada do processo, com o que concorda a jurisprudência39.

4.3 Princípio do contraditório

De acordo com Nery Junior40, o princípio do contraditório confere aos demandantes o direito de "[...] serem ouvidos paritariamente no processo em todos os seus termos". Com isso, nenhuma decisão judicial pode invadir a esfera jurídica de pessoa que: desconheça o que foi alegado contra si; não participou do processo; ou, ainda, não pôde influenciar de forma eficaz a formação do convencimento do julgador, conforme destaca Didier Júnior41:

"O processo é um instrumento de composição de conflito – pacificação social – que se realiza sob o manto do contraditório. O contraditório é inerente ao processo. Trata-se de princípio que pode ser decomposto em duas garantias: participação (audiência; comunicação; ciência) e possibilidade de influência na decisão. Aplica-se o princípio do contraditório, derivado que é do devido processo legal, nos âmbitos jurisdicional, administrativo e negocial".

O contraditório pressupõe o direito de fazer alegações, de produzir provas e de participar da produção das provas requeridas pelo adversário ou determinadas de ofício pelo julgador.

Mas, se porventura existirem desigualdades entre as partes, estas devem ser diminuídas, porque ao litigante é conferido o direito de "[...] exigir a adoção de todas as providências que possam ter utilidade na defesa dos seus interesses, de acordo com as circunstâncias da causa e as imposições do direito material"42, pois conforme Nery Junior, o contraditório decorre do "princípio da paridade de armas", e visa a conferir às partes mesmas oportunidades e mesmos instrumentos processuais43.

Entretanto, embora o consumidor goze de tratamento especial pelo Estado, proveniente da necessidade de corrigir uma desigualdade de fato na relação intersubjetiva mantida com o fornecedor, em princípio o magistrado não pode diminuir essa diferença conferindo outras prerrogativas que não as já estabelecidas, ou sobrecarregando a "parte mais forte" de forma indevida, sob pena de cometer injustiças.

Segundo Greco44 "[...] esse direito à prova não pode ser desvirtuado por ficções ou presunções jurídicas absolutas, nem tornar o acesso à prova excessivamente difícil ou impossível através de presunções legais, ainda que relativas".

Se o julgador inverte o ônus de provar na sentença, não há a entrega de uma tutela justa, sendo desrespeitado o contraditório porque não foi conferido à parte tempo hábil para se desincumbir do encargo. Por isso, o princípio do contraditório é melhor observado quando decretada a inversão na fase instrutória.

4.4 Ampla defesa

A ampla defesa decorre do contraditório e se constitui em garantia constitucional que confere ao demandante total liberdade de alegar fatos e de propor provas na defesa de seus direitos. Portanova45 ensina que a concessão do direito a uma defesa abrangente e a uma defesa técnica não configura ato de generosidade do legislador ou, em última instância, do julgador, mas garantia essencial de presença obrigatória num Estado democrático.

Para que o demandante exerça seu direito de defesa da forma mais ampla possível, deve ter permissão para provar os fatos que alega e a improcedência daquilo que lhe é imputado por seu "ex adverso", o que confere à prestação jurisdicional um caráter mais justo. Para Greco é vedado impor limites desarrazoados à manifestação da parte ou a utilização de tecnicismos que sejam obstáculos à apresentação da defesa – não pode a parte ser prejudicada no exercício de seus direitos e nem submetida a barreiras impostas contra sua vontade46.

A inversão do ônus da prova deve ser decretada "em momento que permita àquele que assumiu o encargo livrar-se dele"47, entendimento esposado pela jurisprudência48:

"REVISÃO CONTRATUAL. INSTITUIÇÃO BANCÁRIA. APLICABILIDADE DO CDC. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. ARTIGO 6º, VIII, DO CDC. [...] Fixação do momento da inversão do ônus da prova. O momento oportuno e tecnicamente correto para o juiz determinar a inversão probatória é o que antecede a instrução do feito. AGRAVO PROVIDO".

Como se vê, inverter o ônus da prova quando o fornecedor já não pode se manifestar é expediente flagrantemente contrário à garantia da ampla defesa, pois nessa etapa processual não é mais possível contraditar aquilo que lhe imputou o consumidor.

4.5 Acesso à justiça

O acesso à justiça, ou princípio da inafastabilidade, é garantia conferida a toda pessoa, física ou jurídica, que pretende levar à apreciação dos tribunais qualquer direito que, segundo seu entendimento, o faça merecer a tutela jurisdicional adequada49. Segundo Greco50, porém, essa garantia "[...] não se esgota no direito de provocar o exercício da função jurisdicional, [uma vez que também abrange o direito de] influir na atividade jurisdicional".

Para Godinho51, as regras que disciplinam a produção da prova assumem relevante papel no resultado final da demanda, já que "[...] se o cumprimento do ônus probatório pode significar a tutela do direito reclamado em juízo, parece-nos intuitivo que as regras que disciplinam sua distribuição afetam diretamente a garantia do acesso à justiça", pois há influência direta no convencimento do julgador.

Há que se considerar que o ato de julgar, em última instância, nada mais é do que a incidência de normas jurídicas aos fatos afirmados e provados (ou não) perante o Judiciário. E se a prova produzida em juízo influencia na formação do seu convencimento, o julgador não pode postergar para a sentença a decisão sobre a inversão desse ônus, argumentando que se trata de regra de julgamento, pois a parte sobre quem recair o encargo não mais poderá se manifestar. É necessário permitir às partes demandantes que produzam as provas em momento adequado, se assim desejarem. Do contrário, também será negado o direito de acesso à justiça.

O correto manejo da técnica processual não depende apenas de previsão formal na lei. Assim, se os instrumentos disponíveis para a regulamentação da instrução do processo não forem utilizados de forma a se adequarem às exigências necessárias à prestação de uma tutela efetiva do direito material, também restará violado o acesso à justiça52.

4.6 Princípio da adaptabilidade do procedimento

O princípio da adaptabilidade procedimental é espécie do gênero princípio da adequação, que tanto pode ser um princípio informador, a estabelecer de forma abstrata o procedimento a ser seguido; quanto, numa perspectiva instrumentalista, um princípio que permita a realização de um procedimento menos gravoso, a viabilizar uma melhora na consecução dos fins colimados, e a conformar o processo à situação concreta posta em juízo.

É sob esse último aspecto que desponta o princípio da adaptabilidade do procedimento, segundo o qual, o magistrado, em razão das peculiaridades apresentadas na demanda, deve efetuar reparações no procedimento com o intuito de adequá-lo ao caso concreto e evitar chancelar inconstitucionalidades, consoante depreende da lição de Didier Júnior53:

"Nada impede, entretanto, antes aconselha, que se possa previamente conferir ao magistrado, como diretor do processo, poderes para conformar o procedimento às peculiaridades do caso concreto, tudo como meio de mais bem tutelar o direito material. Também se deve permitir ao magistrado que corrija o procedimento que se revele inconstitucional, por ferir um direito fundamental processual, como o contraditório (se um procedimento não previr o contraditório, deve o magistrado determiná-lo, até mesmo ex officio, como forma de efetivação desse direito fundamental). Eis que aparece o princípio da adaptabilidade".

Se apenas no momento de prolatar a sentença o julgador vislumbra que deve inverter o ônus da prova, cumpre-lhe adaptar o procedimento e abrir prazo para o fornecedor produzir a prova necessária, sob pena de impor obstáculo à defesa da parte nos autos. Após, deve também abrir prazo para que o consumidor se manifeste sobre ela, observando o contraditório54.

Por outro lado, vale consignar, embora não possa se afastar totalmente das formalidades impostas pela lei, o julgador, verificando a ameaça de uma inconstitucionalidade, deve manejar o processo de forma a evitar a ocorrência do vício, preservando a finalidade maior do Direito, que é a realização da justiça.

Através da adaptabilidade o julgador cria técnicas que conformam ou corrigem o procedimento. É o caso da inversão da regra do ônus da prova estabelecida no artigo 6º, inciso VIII, do CDC, que representa um desvio do procedimento estabelecido originalmente.

Tal expediente, apesar de previsível e permitido, imputa ao julgador o dever de informar aos demandantes sua intenção, para que possam se comportar no processo de acordo com as novas regras, o que preserva o contraditório, uma vez que "pensar o contrário seria permitir surpresas processuais, em afronta direta aos princípios do contraditório e da cooperação"55. Sua atuação, porém, deve sempre respeitar os limites da razoabilidade.

4.7 Princípio da cooperação

Sem previsão expressa no ordenamento jurídico, a cooperação, que decorre da boa-fé e do contraditório, segundo Didier Júnior: "orienta o magistrado a tomar uma posição de agente-colaborador do processo, de participante ativo do contraditório e não mais a de um mero fiscal de regras".

O dever de cooperar possui como consectários os deveres de esclarecer, de consultar, e de prevenir56; e esses deveres são também aplicáveis ao juiz, que é um sujeito do contraditório, pois as partes do processo devem cooperar para a melhor prestação jurisdicional possível.

Nesse diapasão, o anúncio de que o ônus da prova será invertido deve ser feito em tempo hábil, para que as partes, prevenidas, não sejam surpreendidas e possam se armar para produzir provas. É nesse sentido a crítica de Theodoro Júnior57:

"A não ser assim, ter-se-ia uma surpresa intolerável e irremediável, em franca oposição aos princípios de segurança e lealdade imprescindíveis à cooperação de todos os sujeitos do processo na busca e construção da justa solução do litígio. Somente assegurando a cada litigante o conhecimento prévio de qual será o objeto da prova e a quem incumbirá o ônus de produzi-la é que se preservará ‘a garantia constitucional da ampla defesa’".

A preocupação com a surpresa no processo; a relação dessa surpresa com as normas processuais; e a vinculação dessas normas à Constituição não são atuais, pois Oliveira (apud MENDES JÚNIOR)58 lembra que no século XIX a doutrina brasileira antecipara entendimento que influenciaria a doutrina jurídica da Europa no século XX:

"As leis do processo são o complemento necessário das leis constitucionais; as formalidades do processo as atualidades das garantias constitucionais. Se o modo e a forma da realização dessas garantias fossem deixados ao critério das partes ou à discrição dos juízes, a justiça, marchando sem guia, mesmo sob o mais prudente dos arbítrios, seria uma ocasião constante de desconfiança e surpresas".

A inversão do ônus da prova estabelecida no artigo 6º, inciso VIII, do CDC atribui encargo não conhecido previamente pelos demandantes porque não deriva exclusiva e diretamente da lei. Há previsão apenas da mera possibilidade de inversão, a qual será definida a partir da manifestação do julgador nos autos acerca da presença ou não dos pressupostos.

Deixar para se manifestar sobre a inversão do ônus de produzir provas no momento de prolatar a sentença configura uma surpresa, que poderá inclusive prejudicar o consumidor, caso não seja decretada porque ausentes os requisitos necessários à inversão. Alertada em tempo hábil, a parte pode constatar falha do magistrado ao analisar os requisitos e tomar medidas em defesa de seus direitos para tentar reverter a situação ainda na primeira instância, e não apenas em sede de recurso. Logo, é dever julgador alertar aos demandantes qualquer medida que tome no sentido de alterar o andamento normal do processo.

4.8 Princípio da eventualidade

À luz do objeto do presente estudo, o princípio da eventualidade estabelece que as alegações, os requerimentos e a produção de atos e de provas devem ocorrer na fase processual a que estão subordinados59.

A importância desta norma está ligada à natureza do sistema processual brasileiro, que é dividido em fases: se ultrapassado o momento processual (fase) sem que o demandante realize os atos a ela atinentes, essa falta implicará necessariamente na preclusão, que nada mais é do que uma penalidade aplicada contra quem burla o sistema da eventualidade.

Como a prova deve ser produzida em fase processual apropriada – instrução do processo –, e o artigo 6º, inciso VIII, do CDC estabelece uma regra de processo60, não há que se atribuir ao fornecedor, já na fase da prolação da sentença, o ônus de provar algo que não estaria definido como encargo seu desde o início, pois restaria violado o devido processo legal e seu consectário, o princípio da eventualidade, porque encerrada a fase processual pertinente.

4.9 Princípio da motivação das decisões

Não se pode determinar a inversão do ônus da prova automaticamente, cabendo ao julgador demonstrar os motivos que o levaram a reconhecer a hipossuficiência do consumidor e/ou a verossimilhança de suas alegações.

As regras que distribuem o ônus da prova são importantes para a prestação jurisdicional e também para estabelecer a pacificação social. Ademais, a efetiva distribuição do encargo probatório guarda influência direta com o conhecimento do vencedor da demanda. Com isso, a decisão deve estar adequadamente fundamentada, pois, sabedor dos motivos que convenceram o julgador, o fornecedor insatisfeito e que se sentir lesado poderá utilizar o direito de recorrer.

4.10 Princípio da imparcialidade do juiz

Se o julgador inverte o ônus da prova sob o singelo fundamento de que a lei é favorável ao consumidor, em última análise, viola-se o princípio da imparcialidade do juiz, pela evidente ausência de equidistância em relação a uma das partes e aos interesses da mesma, conforme esclarece Greco61:

"A justiça não pode estar a serviço de uma classe, de um grupo, de um segmento ou de uma corrente de opinião existente dentro da sociedade, ainda que majoritária, mas a serviço da liberdade e da dignidade humana. O juiz não é o tutor do interesse público, mas o guardião dos direitos reconhecidos no ordenamento jurídico".


5 Implicações da inversão do ônus da prova na sentença

Se ao mesmo tempo em que inverte o ônus da prova na sentença, o julgador decide a demanda, o fornecedor será tolhido do direito de apresentar os elementos de convicção por meio dos quais poderá se desincumbir satisfatoriamente do encargo, o que altera diretamente o resultado final da demanda. Assim, bem se percebe que resta afastada qualquer possibilidade de reação, já que nessa fase a parte não pode mais se manifestar e produzir provas. Ademais, outros prejuízos serão imputados no âmbito das Cortes Superiores, onde é vedada a análise de matéria probatória.

Em decorrência disso, fatalmente restarão mitigados, entre outros, o contraditório, a ampla defesa, o acesso ao Judiciário e o direito a uma sentença justa, o que deve ser evitado.

5.1 Violação a garantias constitucionais do fornecedor

Conforme destacado no capítulo anterior, vários princípios constitucionais podem restar violados a partir de uma decisão que inverte o ônus da prova, se o momento ou a forma pela qual se dá sua decretação não forem propícios.

Embora a análise da prova, em si, seja matéria infraconstitucional, porque estabelecida no CC e no CPC, quando revelado o cerceamento de defesa, seu questionamento toma outros rumos. A questão se torna ainda mais grave porque as Cortes Superiores não se prestam à simples re-análise da prova, dada a natureza dos recursos extremos de sua alçada, que visam a controlar a higidez do direito objetivo. Tanto é assim que a matéria se encontra sumulada no STF, através do Enunciado nº 279, e no STJ, pelo Enunciado nº 7.

Vale ressalvar, desde que a solidariedade alcançou o "status" de objetivo fundamental (artigo 3º, inciso I, da CRFB/1988), atribuiu-se ao Poder Público, e também aos indivíduos e às empresas, o dever de agir em prol do bem comum. Nesse sentido, o Poder Público não pode permitir que a proteção conferida a determinada parcela da coletividade invada a esfera jurídica de outrem, pois ela não pode servir de anteparo para promover verdadeiro desrespeito aos direitos e às garantias fundamentais dos demais membros da sociedade.

Ainda que o CDC tenha sido concebido para proteger o consumidor, os operadores do direito em geral desconsideram que os fornecedores também gozam de proteção constitucional. Nesse sentido, Peixoto62 aponta alguns direitos e garantias fundamentais do fornecedor, e destaca a importância da iniciativa privada:

"[...] os fornecedores também gozam de proteção na CRFB/1988. Servem de exemplos a garantia da livre iniciativa e o livre exercício de qualquer atividade econômica lícita, previstos no artigo 170 "caput" e parágrafo único. Inclusive, há que se lembrar a importância da iniciativa privada para o nosso sistema econômico pelo pagamento de tributos, pela geração de empregos e de divisas etc. O próprio artigo 4º, inciso III, do CDC, ao tratar da Política Nacional de Relações de Consumo, determina que seus objetivos serão informados pelos seguintes princípios: i) harmonização dos interesses das partes; ii) compatibilização da proteção do consumidor com a necessidade de desenvolvimento econômico e tecnológico para promoção dos princípios informadores da ordem econômica; e iii) boa-fé e equilíbrio. Como se vê, prega-se a boa-fé, o equilíbrio e [principalmente] a compatibilização entre a proteção do consumidor e o desenvolvimento econômico, e não são desconsiderados direitos e garantias constitucionais dos fornecedores nas relações de consumo, pois a defesa desmesurada do consumidor evidencia ofensas à saúde desse setor. Logo, é necessário que se recorra à ponderação dos princípios, das regras, das garantias e dos direitos envolvidos, já que a norma infraconstitucional, ao reconhecer direitos de minorias, não pode afiançar que se cometam irregularidades [ou injustiças] contra os demais atores da sociedade".

Não se pode estigmatizar o fornecedor e, sem critério, obrigá-lo a arcar com o ônus de satisfazer às vontades e aos caprichos do consumidor porque é a "parte mais forte" da relação. Como sujeito de direitos e de garantias, deve ser comunicado em tempo hábil que irá produzir as provas que sabia de antemão serem de responsabilidade do consumidor. Caso contrário, não conseguirá reunir melhores condições para enfrentar o adversário com paridade de armas, e o direito de influenciar na decisão será tolhido, denotando claro cerceamento de defesa.

Há, por fim, clara ofensa ao princípio da moralidade (artigo 37, "caput", da CRFB/1988), de observância obrigatória pelos Poderes do Estado, pois se o mecanismo da inversão é utilizado sem que se confira ao fornecedor tempo hábil para cumprir o encargo, a decisão pode até estar envolta numa aparência de legalidade, mas jamais irá atender à moralidade.

5.2 Ocorrência nos Juizados Especiais Cíveis

O Enunciado 53 do Fórum Nacional dos Juizados Especiais (FONAJE), que pretende disciplinar a questão da inversão do ônus da prova no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, possui a seguinte redação: "deverá constar da citação, a advertência em termos claros, da possibilidade da inversão do ônus da prova".

Ocorre que o mecanismo não solucionou o problema que se propôs resolver, pois o artigo 6º, inciso VIII, do CDC torna despiciendo tal aviso, já que permite a inversão do ônus da prova nas relações de consumo ainda que não conste da citação. Basta ao julgador, a qualquer tempo, verificar a presença dos requisitos necessários – a hipossuficiência e a verossimilhança – para decretar a inversão.

De outro lado, se tal advertência não constar na citação, e posteriormente o julgador verificar a existência dos pressupostos, não poderá decretar a inversão?

Ainda que somente na audiência de instrução e julgamento se verifique ser caso de inversão do ônus da prova – o que é comum nos Juizados Especiais, porque muitas vezes é nesse momento que o julgador mantém o primeiro contato com os autos –, é possível tomar algumas medidas para evitar prejuízos às partes e eivar o processo com nulidades.

É importante lembrar, porém, que o artigo 5º da Lei nº 9.099/1995 (Lei de Juizados Especiais – LJE) confere ao magistrado, na direção do processo, "liberdade para determinar as provas a serem produzidas, para apreciá-las e para dar especial valor às regras de experiência comum ou técnica", ampliando os poderes conferidos pelo artigo 130 do CPC.

Ademais, o artigo 33 da lei determina que "todas as provas serão produzidas na audiência de instrução e julgamento, ainda que não requeridas previamente". Aqui, o próprio dispositivo estabeleceu como fase limite para a inversão do ônus da prova a data da realização da AIJ, impedindo sua decretação após esse ato. Contudo, vale à pena, por ora, contornar o assunto.

Se o magistrado percebe a presença dos requisitos para inversão do "onus probandi" já na audiência de instrução e julgamento63 ou no momento de prolatar a sentença, não lhe resta alternativa senão converter o julgamento em diligência e determinar que o novo responsável pelo encargo (fornecedor) produza a prova. Aplica-se tal mecanismo em razão da proibição do "non liquet" e também para que seja observada a realização da justiça.

Com efeito, nada o impede de adaptar o procedimento para determinar a abertura do prazo e realizar a atividade probatória, pois não causa prejuízo ao processo. Posteriormente, porém, conforme alertou Mazzilli64 ao tratar do procedimento ordinário, deve ser aberto prazo para o consumidor se manifestar, a fim de que seja devidamente observado o contraditório65. Após, os autos voltam conclusos para a sentença.

O destinatário direto das provas é o julgador, e nos termos do artigo 5º da LJE compete-lhe aferir a importância de determinar, de ofício ou não, a produção das provas que entender necessárias para a instrução. Predomina o entendimento de que o dispositivo reconhece amplos poderes instrutórios ao julgador, independentemente da relação jurídica discutida na demanda, sendo possível exigir a produção de qualquer prova para fundamentar seu livre convencimento, conforme a lição de Didier Júnior, Braga e Oliveira66.

Com efeito, apesar do artigo 33 da LJE estabelecer que "todas as provas serão produzidas na audiência de instrução e julgamento, ainda que não requeridas previamente", não há que se aplicar esse dispositivo quando houver inversão do ônus da prova, porque a lei não tratou dessa situação excepcional. Aliás, ao comentar o dispositivo, Chimenti67 assinalou que:

"a regra não impede que o juiz, de ofício (art. 5º da lei especial) ou a requerimento das partes, determine a realização de inspeções, trabalhos técnicos ou mesmo a prática de atos em outras comarcas (§ 2º do artigo 13 da Lei n. 9.099/95), em especial a inquirição de testemunhas residentes em outra localidade. De qualquer forma, independentemente da ordem prevista no artigo 452 do CPC, toda e qualquer prova disponível no momento da audiência deve ser colhida, já que tais elementos poderão ser suficientes para o julgamento da causa".

Se a inversão do ônus da prova configura uma exceção aos princípios tradicionais do processo civil, os demais princípios devem se adequar a essa realidade. Basta observar o supracitado artigo 5º e também o artigo 6º da LJE, segundo o qual "o juiz adotará em cada caso a decisão que reputar mais justa e equânime, atendendo aos fins sociais da lei e às exigências do bem comum".

Com relação à equidade, é pacífico o entendimento de que a mesma visa a uma prestação da tutela jurisdicional pautada na justiça, razão pela qual cabe ao julgador observá-la no exercício da jurisdição. Sendo assim, é mais justo e equânime se valer da maior gama de provas para dar sustentação ao seu convencimento, permitindo que o fornecedor apresente a defesa em juízo da forma mais elástica possível, do que inverter o ônus de provar na sentença e causar prejuízos, fulminando o exercício da ampla defesa.

Por fim, assunto contornado acima, se o legislador estabeleceu a AIJ como prazo limite para a produção da prova, consequentemente é vedada a decretação da inversão da prova em sede de sentença, porque de encontro com o dispositivo legal (artigo 33 da LJE). É naquele momento processual que obrigatoriamente o julgador deve se manifestar sobre o assunto.


6 Conclusão

A grande divergência então apresentada consiste na afirmação, de um lado, de que a inversão do ônus da prova é "regra de julgamento", que exige sua decretação no momento da prolação da sentença; e, de outro lado, que se trata de "regra de procedimento", que requer a alteração da regra de distribuição do ônus de provar ainda na atividade probatória, sob pena de serem maculadas várias garantias constitucionais. Esse último entendimento, defendido no corpo do presente trabalho, externa o pensamento da doutrina mais moderna.

Nosso sistema jurídico adotou como regra geral a teoria estática do ônus da prova, que distribui entre os litigantes, ao final do processo, a responsabilidade sobre os fatos não demonstrados nos autos. Trata-se de regra de julgamento que busca a evitar o "non liquet". Todavia, como resultado do dinamismo do Direito, a doutrina apresentou como contraponto a teoria da distribuição dinâmica da prova, que excepciona essa regra geral.

Essa teoria foi adotada pelo CDC em seu artigo 6º, inciso VIII, que prevê a inversão do ônus de produzir a prova a partir da manifestação do juiz ("ope judicis") quando verificada a presença dos requisitos necessários, valendo lembrar que em outros dispositivos do CDC, o próprio julgador estabeleceu previamente a inversão ("ope legis").

Enquanto o julgador não avalia se é caso de inversão, vigem as regras de distribuição da prova previstas no artigo 333 do CPC, cuja natureza é de regra de julgamento. Porém, por se tratar de exceção que altera a regra geral em razão das circunstâncias que envolvem o caso concreto, a inversão possui natureza de regra de processo.

O processo é formado a partir dos argumentos jurídicos das partes postos em juízo e da necessidade de reconstruir as situações fáticas. A atividade probatória busca levar ao julgador os elementos capazes de formar sua convicção e conduzi-lo para o acolhimento total, parcial, ou mesmo o desacolhimento, de algo que foi alegado. Logo, compete às partes, e também ao julgador, investigar os fatos em toda sua amplitude, respeitados os limites da cognição, para proporcionar o seu exaurimento e a melhor análise da causa, o que não necessariamente significa a busca da verdade real, mas a tentativa de subsidiar o livre convencimento motivado do magistrado para chegar à verdade possível.

No que toca à inversão do ônus da prova, uma regra de exceção, se o julgador não a decreta na fase instrutória, por questão de lógica, e pautado no sistema geral da carga da prova, o fornecedor não irá se preocupar em assumir o ônus do consumidor produzindo prova que é da responsabilidade desse último.

Por esse motivo, é evidentemente irrazoável inverter o ônus da prova em sede de sentença porque retira a oportunidade de esclarecimento dos pontos controvertidos segundo a ótica do fornecedor, cerceando o seu direito de influenciar na decisão final e impondo-lhe prejuízos. Se a lei não atribuiu ao fornecedor "a priori" o dever de produzir a prova, como fez nos artigos 12, § 3º; 14, § 3º; e 38 do CDC, não se pode cobrar do litigante o dever de antecipar o futuro e o pensamento do julgador. Tal expediente causa surpresa inaceitável.

A inversão do ônus da prova que se opera "ope judicis" não é um mecanismo que pode ser deflagrado de forma automática porque depende da constatação da presença de, ao menos, um dos requisitos autorizativos. Logo, carece da avaliação objetiva do caso concreto para observar a verossimilhança do alegado e/ou a presença de circunstâncias que determinem estar ou não envolvido um hipossuficiente, a partir da aplicação das regras de experiência. O julgador, em razão disso, deverá se manifestar nos autos e informar aos demandantes, previamente e com a devida fundamentação, o que observou, até para atender ao dever de cooperar, já que é uma das partes do processo.

O sistema garantista do CDC busca equilibrar a relação de consumo, e sua premissa básica é a vulnerabilidade do consumidor. Mas, não se pode confundir tal finalidade com o desrespeito a direitos constitucionais também conferidos ao fornecedor. Sendo também sujeito de direitos, nada mais justo do que, depois de acurada análise, decretar a inversão no período compreendido entre o oferecimento da resposta e a decisão que saneia o processo, já que o direito de acesso à justiça e a uma prestação jurisdicional adequada não pode ser frustrado por obstáculos irrazoáveis. Nesse mesmo diapasão, também seria concedido ao prejudicado o direito de tentar modificar a situação ainda no juízo "a quo" por meio de recurso.

Se o legislador introduziu a inversão do ônus da prova nas relações de consumo buscando o equilíbrio processual entre o consumidor-vulnerável e o fornecedor, a utilização desse mecanismo não pode ser transformado em instrumento que promova novo desequilíbrio, agora em desfavor do fornecedor, e com a chancela do Poder Público, porque não haveria justiça na prestação da tutela jurisdicional.

Com relação à LJE, por causa da concentração dos atos, se o julgador, após avaliar o caso concreto, verificar que é caso de inversão do ônus da prova, não importa a fase em que se encontra o processo, deve abrir prazo para a produção da prova e permitir o contraditório à outra parte, mesmo depois de realizada a AIJ, embora essa seja a fase limite.

Cabe ao julgador considerar de forma ponderada a relação entre os meios utilizados e o fim colimado para não permitir que excessivos rigorismos acabem frustrando o objetivo maior, que é prestar a jurisdição da forma mais justa e equânime possível.

Por fim, convém consignar que, embora a proteção ao consumidor seja uma garantia fundamental estatuída no artigo 5º, inciso XXXII, da CRFB/1988, o fornecedor também é sujeito de direitos e de garantias constitucionais, razão pela qual não pode ser impedido de exercê-los. Desta forma, o julgador, ao se deparar com uma relação de consumo, não pode simplesmente menosprezar garantias constitucionais conferidas aos fornecedores, que também são atores da coletividade, ao argumento de que em seu desfavor uma lei confere tratamento diferenciado a determinado segmento da sociedade, até porque se trata de um Estado democrático de Direito.

Por todo o exposto, então, o melhor momento para o julgador determinar a inversão do ônus da prova é o que compreende a atividade instrutória, mais especificamente na decisão saneadora do processo, porque ainda há prazo para: i) as partes exercerem o contraditório e a ampla defesa, exercendo o direito de interferir na formação do convencimento que irá embasar a decisão; ii) o julgador fundamentar sua decisão final sem que haja senões, sem abrir oportunidade para questionamentos acerca do bom andamento do processo; e, enfim, iii) que sejam preservados direitos e garantias de todos os demandantes.


NOTAS

1 FUX, Luiz. Curso de direito processual civil. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 594;

2 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria geral do processo. 15. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 1999, p. 349;

3 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. 11. ed. rev. e atual. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 248;

4 DIDIER JÚNIOR, Fredie; BRAGA, Paulo Sarno; e OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. Vol. 2. Salvador: JusPODIVM, 2007, p. 55;

5 Dias alertava, há cinquenta anos, que, nas demandas cujas circunstâncias impediam à vítima de fazer prova dos fatos, o dever de produzir essa prova seria presumido em desfavor do ofensor: "Sem dúvida nenhuma, o que se verifica, em matéria de responsabilidade, é o progressivo abandono da regra actori incumbit probatio, no sentido absoluto, em favor da fórmula de que a prova incumbe a quem alega contra a normalidade, que é válida tanto para a apuração de culpa como para a verificação da causalidade. À noção de normalidade se juntam, aperfeiçoando a fórmula, as de probabilidade e de verossimilhança que, uma vez que se apresentem em grau relevante, justificam a criação das presunções de culpa". (Grifos do autor). (DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. Vol. I. 3. ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1954, p. 105-106);

6 GODINHO, Robson Renault. A distribuição do ônus da prova na perspectiva dos direitos fundamentais. In: CAMARGO, Marcelo Novelino. Leituras complementares de constitucional: direitos fundamentais. 2. ed. Salvador: JusPODIVM, 2007. cap. XIII, p. 293-312;

7 DIDIER JÚNIOR, Fredie; BRAGA, Paulo Sarno; e OLIVEIRA, Rafael. Ob. cit., p. 57;

8 "Art. 6º São direitos básicos do consumidor [...] VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências";

9 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial N. 915.599/SP. Órgão Julgador: 3. Turma. Relatora Ministra Nancy Andrighi. Publicado no DJU de: 5 set.2008. Disponível em: <http://www.stj.jus.br>. Acesso em: 01 abr.2009;

10 NUNES, Luís Antônio Rizzato. Curso de direito do consumidor. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 782;

11 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Apelação Cível N. 2008.001.23221. Órgão Julgador: 15. Câmara Cível. Relator Desembargador Sérgio Lúcio Cruz. Publicado no DO de: 20 maio.2008. Disponível em: <http://www.tjrj.gov.br>. Acesso em: 02 abr.2009;

12 OLIVEIRA, Valéria Martins. A inversão do ônus da prova como meio facilitador da defesa dos direitos do consumidor. Revista Jurídica Cesumar. Maringá, ano I, n. 1. 2001, p. 379-387. Disponível em: <http://www.cesumar.br/pesquisa/periodicos/index.php/revjuridica/article/viewFile/466/238>. Acesso em: 31 mar.2009;

13 NUNES, Luís Antônio Rizzato. Ob. cit., p. 781;

14 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial N. 716.386/SP. Órgão Julgador: 4. Turma. Relator Ministro Aldir Passarinho Júnior. Publicado no DJU de: 15 set.2008. Disponível em: <http://www.stj.jus.br>. Acesso em: 01 abr.2009;

15 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Direitos do Consumidor: a busca de um ponto de equilíbrio... 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008, p. 178;

16 São exemplos de regra de inversão "ope legis": a cláusula de consumo contida no artigo 38 do CDC, que confere ao fornecedor o ônus de provar a verdade sobre a informação ou a publicidade do produto ou do serviço; e as cláusulas que estabelecem a inversão do ônus no caso de fato do produto e do serviço, dispostas nos artigos 12, § 3º, e 14, § 3º, do CDC;

17 SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Responsabilidade civil no Código do Consumidor e a defesa do fornecedor. 2. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 355-358;

18 Art. 14, § 4º, do CDC: "A responsabilidade pessoal dos profissionais liberais será apurada mediante a verificação de culpa";

19 FILOMENO, José Geraldo Brito et al. Código brasileiro de defesa do consumidor comentado pelos autores do anteprojeto. 7. ed. rev. e ampl. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001, p. 130;

20 NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação extravagante. 7. ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 723;

21 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial N. 422.778/SP. Órgão Julgador: 3. Turma. Relator Ministro Castro Filho. Relatora para acórdão Ministra Nancy Andrighi. Publicado no DJU de: 27 ago.2007. Disponível em: <http://www.stj.jus.br>. Acesso em: 31 mar.2009;

22 DIDIER JÚNIOR, Fredie; BRAGA, Paulo Sarno; e OLIVEIRA, Rafael. Ob. cit., p. 57-58;

23 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial N. 442.854/SP. Órgão Julgador: 3. Turma. Relatora Ministra Nancy Andrighi. Publicado no DJU de: 7 abr.2003. Disponível em: <http://www.stj.jus.br>. Acesso em: 31 mar.2009;

24 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial N. 598.620/MG. Órgão Julgador: 3. Turma. Relator Ministro Carlos Alberto Menezes Direito. Publicado no DJU de: 18 abr.2005. Disponível em: <http://www.stj.jus.br>. Acesso em: 31 mar.2009;

25 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Ob. cit., p. 186-188;

26 RIO DE JANEIRO. Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Enunciado N. 91 da Súmula. Disponível em: <http://www.tjrj.gov.br>. Acesso em: 31 mar.2009. No mesmo sentido Mazzilli, para quem a decisão de inverter o ônus probatório deve ser tomada no máximo durante a instrução, uma vez que a prolação da sentença não é o momento adequado porque "as provas já estarão feitas e as partes seriam surpreendidas com a inversão". (MAZZILLI, Hugo Nigro. A defesa dos interesses difusos em juízo. 18. ed. rev. ampl. e atual. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 166);

27 "O melhor momento para essa inversão, sem que cause surpresa para qualquer dos demandantes, é a fase de saneamento do processo, quando já se conhecem as alegações das duas partes e se cristalizaram os pontos controvertidos da demanda. O juiz, ao proferir a decisão saneadora do processo, de ofício ou a requerimento da parte, pode estabelecer que o ônus de comprovar determinado fato relevante do feito, que seria do consumidor, fica atribuído ao fornecedor. Nesse momento, o prejudicado pela decisão concessiva ou indeferitória da inversão poderá interpor agravo de instrumento, bem como estará devidamente alertado a respeito do novo encargo que lhe foi atribuído no processo. [A regra de inversão do ônus da prova do artigo 6º, inciso VIII, do CDC] não pode, porém, converter-se em um ato arbitrário, que sem qualquer advertência prévia, surpreendentemente, estabeleceria uma nova distribuição do encargo probatório apenas para efeito da decisão final". (SANSEVERINO, Paulo de Tarso Vieira. Ob. cit., p. 351);

28 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial N. 881.651/BA. Órgão Julgador: 4. Turma. Relator Ministro Hélio Quaglia Barbosa. Publicado no DJU de: 21 maio.2007. Disponível em: <http://www.stj.jus.br>. Acesso em: 01 abr.2009;

29 Artigo 331, § 2º, do CPC: "Se, por qualquer motivo, não for obtida a conciliação, o juiz fixará os pontos controvertidos, decidirá as questões processuais pendentes e determinará as provas a serem produzidas, designando audiência de instrução e julgamento, se necessário";

30 BULOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 75;

31 "Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa";

32 Na lição de Sarmento, a dignidade da pessoa humana é o paradigma dos direitos fundamentais em nosso ordenamento jurídico, uma vez que "[...] representa o epicentro axiológico da ordem constitucional, irradiando efeitos sobre todo o ordenamento jurídico e balizando não apenas os atos estatais, mas também toda a miríade de relações privadas". (SARMENTO, Daniel. Direitos fundamentais e relações privadas. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 85-86);

33 BULOS, Uadi Lammêgo. Ob. cit., p. 39-40;

34 Conforme destacou Didier Júnior: "Os direitos fundamentais têm dupla dimensão: a) Subjetiva: de um lado, são direitos subjetivos, que atribuem posições jurídicas de vantagem a seus titulares; b) Objetiva: traduzem valores básicos e consagrados na ordem jurídica, que devem presidir a interpretação/aplicação de todo ordenamento jurídico, por todos os atores jurídicos. [...] Encarados os princípios constitucionais processuais como garantidores de verdadeiros direitos fundamentais processuais, e tendo em vista a dimensão objetiva já mencionada, tiram-se as seguintes consequências: a) o magistrado deve interpretar esses direitos como se interpretam os direitos fundamentais, ou seja, de modo a dar-lhes o máximo de eficácia; b) o magistrado poderá afastar, aplicado o princípio da proporcionalidade, qualquer regra que se coloque como obstáculo irrazoável/desproporcional à efetivação de todo direito fundamental; c) o magistrado deve levar em consideração, ‘na realização de um direito fundamental, eventuais restrições a este impostas pelo respeito a outros direitos fundamentais’". (DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil. Vol. 1. 8. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: JusPODIVM, 2007, p. 26);

35 BARCELLOS, Ana Paula de. A eficácia jurídica dos princípios constitucionais. 2. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Renovar, 2008, p. 40-41;

36 OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro. O processo civil na perspectiva dos direitos fundamentais. Mundo Jurídico. Rio de Janeiro, 2003. Disponível em: <http://www.mundojuridico.adv.br/cgi-bin/upload/texto275.doc>. Acesso em: 05 abr.2009;

37 NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na Constituição Federal. 7. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 32;

38 NERY JUNIOR, Nelson. Ob. cit., p. 32;

39 "NULIDADE DO CONTRATO – SIMULAÇÃO – ÔNUS DA PROVA – INVERSÃO – MOMENTO ADEQUADO – SENTENÇA – IMPOSSIBILIDADE. – A Lei n. 8.078/90 não fixa o momento processual adequado para a possibilidade da inversão do ônus da prova, mas por certo deve ocorrer em fase anterior à sentença definitiva, sob pena de surpreender as partes, caracterizando, dessa forma, flagrante cerceamento do direito de defesa". (MINAS GERAIS. Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais. Apelação Cível N. 2.0000.00.442847-1/000. Órgão Julgador: 6. Câmara Civil. Relator Desembargador Elias Camilo. Publicado no DO de: 03 dez. 2004. Disponível em: <http://www.tjmg.jus.br>. Acesso em: 02 abr.2009);

40 Nery JUnior, Nelson. Ob. cit., p. 137;

41 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Curso de direito processual civil. Vol. 1. 8. ed. rev. ampl. e atual. Salvador: JusPODIVM, 2007, p. 42;

42 GRECO, Leonardo. Garantias fundamentais do processo: o processo justo. JURISPOIESIS – Revista Jurídica dos Cursos de Direito da Universidade Estácio de Sá. Rio de Janeiro, ano 7, n. 6, 2004, p. 16;

43 Nery Junior, Nelson. Ob. cit., p. 15;

44 GRECO, Leonardo. Ob. cit., p. 16-17;

45 PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 5. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2003, p. 125;

46 GRECO, Leonardo. Ob. cit., p. 11;

47 DIDIER JÚNIOR, Fredie; BRAGA, Paulo Sarno; e OLIVEIRA, Rafael. Ob. cit., p. 58;

48 RIO GRANDE DO SUL. Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento N. 599.098.845. Órgão Julgador: 16. Câmara Cível. Relator Desembargador Roberto Expedito da Cunha Madrid. Publicado no DO de: 5 maio.1999. Disponível em: <http://www.tjrs.jus.br>. Acesso em: 02 abr.2009;

49 "Acesso à justiça é a expressão máxima de reivindicação do cidadão pelos seus direitos, resolvendo seus litígios, numa ordem jurídica democrática de direito, cujo lema é a justiça social, onde todos têm o privilégio de reconhecer suas prerrogativas, podendo defendê-las adequadamente de possíveis lesões ou ameaças de lesões". (BULOS, Uadi Lammêgo. Ob. cit., p. 179);

50 GRECO, Leonardo. Ob. cit., p. 7;

51 GODINHO, Robson Renault. Ob. cit., 2007, p. 296;

52 GODINHO, Robson Renault. Ob. cit., 2007, p. 297;

53 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Ob. cit., p. 51;

54 Portanova (apud OLIVEIRA) discorre sobre a impossibilidade de se impor surpresas às partes e sobre a importância da ampliação do contraditório caso um fato dessa natureza ocorra no decorrer do processo: "Por princípio, as partes não podem ser surpreendidas por decisão que se apóie numa visão jurídica que não tinham percebido ou tinham considerado sem maior significado. Nesse sentido, mesmo o conhecimento de ofício, pelo juiz, deve ser precedido de prévio conhecimento da parte. Além disso, a parte deve tomar conhecimento de eventual novo rumo que o juízo irá tomar. Aqui dá-se a necessidade do contraditório para a liberdade de escolha do direito pelo juiz consubstanciada no iura novit curia". (Grifos do autor). (Portanova, Rui. Ob. cit., p. 162);

55 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Ob. cit., p. 51;

56 DIDIER JÚNIOR, Fredie. Ob. cit., p. 56;

57 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Ob. cit., p. 187;

58 OLIVEIRA, Carlos Alberto Alvaro. Ob. cit.;

59 PORTANOVA, Rui. Ob. cit., p. 130-131;

60 Nesse sentido, a lição de Nunes: "[...] os que entendem que o momento de aplicação da regra de inversão do ônus da prova é o do julgamento da causa, alinham o pensamento com a distribuição do ônus da prova do art. 333 do Código de Processo Civil e não com aquela instituída no CDC. É que as partes que litigam no processo civil, fora da relação de consumo, têm clareza da distribuição do ônus. Ou, melhor dizendo, os advogados das partes sabem de antemão a quem compete o ônus da produção da prova. [...] É, portanto, distribuição legal do ônus que se faz, sem sombra de dúvida. E, claro, nesse caso não precisa o juiz fazer qualquer declaração a respeito da distribuição do gravame. Basta levá-lo em consideração no momento de julgar a demanda. Não haverá, na hipótese, qualquer surpresa para as partes, porquanto elas sempre souberam a quem competia a desincumbência da produção da prova. Ora, não é essa certeza que se verifica no sistema da lei consumerista". (Grifos do autor). (NUNES, Luís Antônio Rizzato. Ob. cit., p. 783-784);

61 GRECO, Leonardo. Ob. cit., p. 21;

62 PEIXOTO, Fernando César Borges. Mitigação da reparação integral nas relações consumeristas. Jus Navigandi. Teresina, 2009. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/12995>. Acesso em: 28 jun.2009;

63 Segundo o artigo 455 do CPC, não sendo possível concluir a instrução num único dia, o feito poderá prosseguir num outro dia, o qual é perfeitamente aplicável de forma subsidiária aos processos que correm sob a égide da LJE, segundo o seu artigo. Segundo Chimenti, a despeito de não haver previsão expressa, o CPC é aplicável aos processos que tramitam sob o procedimento estabelecido na LJE e na Lei nº 10.259/2001, que regula os Juizados Especiais Federais (LJEF), pois embora não apontem nem mesmo a aplicação supletiva do CPC, com as exceções dos artigos 30 e 51 da LJE, nada impede utilizá-lo por analogia, nos termos do artigo 4º do Decreto-Lei nº 4.657/1942, a Lei de Introdução ao Código Civil (LICC). (CHIMENTI, Ricardo Cunha. Teoria e prática dos juizados especiais cíveis estaduais e federais. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 8);

64 MAZZILLI, Hugo Nigro. Ob. cit., p. 166;

65 Nesse sentido, Theodoro Júnior (apud ALVIM), para quem a fase probatória forçosamente será reaberta, mesmo que o juiz se convença de que é necessária a inversão após encerrar a instrução, para que o fornecedor se libere do encargo de provar conforme julgar conveniente. (Theodoro Júnior, Humberto. Ob. cit., p. 187);

66 "Nada obstante ainda se percebe, na doutrina, na jurisprudência e na própria legislação, certa resistência à iniciativa probatória do magistrado, fruto de reminiscência histórica de um tempo em que se tinha uma visão eminentemente privatista do direito processual, pode-se dizer que hoje, com o desenvolvimento de uma visão oposta, que enxerga o processo civil sob um ângulo mais publicista, a tendência é de se conferir ao Estado-juiz os mais amplos poderes instrutórios". (DIDIER JÚNIOR, Fredie; BRAGA, Paulo Sarno; e OLIVEIRA, Rafael. Ob. cit., p. 52);

67 CHIMENTI. Ob. cit., p. 188.


REFERÊNCIAS

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PEIXOTO, Fernando César Borges. Momento processual propício para determinar a inversão "ope judicis" do ônus da prova. Análise à luz da Constituição Federal de 1988. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2212, 22 jul. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/13202. Acesso em: 24 abr. 2024.