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Compensação financeira dos Municípios em face do art. 201, § 9º, CF

Compensação financeira dos Municípios em face do art. 201, § 9º, CF

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Com a elaboração da Carta Magna de 1988, ficou determinado no Título VII, que trata da Ordem Social, na Seção que disciplina as regras gerais sobre a PREVIDÊNCIA SOCIAL, no artigo 201, § 9º, que, in verbis:

"Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos sistemas de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei." (destacamos)


Este dispositivo, após a Emenda número 20, de 15 de dezembro de 1998, passou a figurar no § 9º do artigo 201, com a mesma redação anteriormente prevista.

Entretanto, após 10 anos de vigência da atual Constituição da República e após 20 emendas constitucionais, os critérios para a compensação financeira ainda não forma estabelecidos em lei, o que inviabiliza o exercício do direito do Município de João Pessoa garantido por este dispositivo constitucional, qual seja, o de receber o repasse da verba previdenciária dos servidores municipais que já averbaram seu tempo de serviço do regime Geral da Previdência Social.


DO DIREITO VIOLADO – AUSÊNCIA
DE NORMA REGULAMENTADORA

Conforme preceitua acima, o art. 201, § 9º, da Carta Magna, assegura a contagem recíproca de tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, estabelecendo que, nesta hipótese, os diversos regimes de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei.

Desta forma, o Município de João Pessoa tem assegurado o direito de receber o repasse da verba da contribuição de todos os servidores municipais que já averbaram tempo de serviço do Regime Geral da Previdência Social, além de poder receber o repasse de todo e qualquer tempo de serviço que então for averbado junto à Municipalidade, o que só não é possível devido à inexistência de norma legal que estabeleça os critérios em que deve ocorrer esta "compensação financeira".

E esta situação não pode continuar, eis que a compensação financeira entre os institutos, além de ser direito constitucionalmente garantido, vem causando grandes prejuízos ao erário municipal, que há dez anos vem averbando tempo de serviço da atividade privada para os seus servidores municipais, conforme determinado pela Constituição, sem nunca receber o repasse da verba a que teria direito.

Não há menor sombra de dúvida de que a averbação deste tempo de serviço da atividade privada sem o devido repasse da verba a que teria direito o Município onera demais o Tesouro Municipal, que no caso específico de João Pessoa - PB, por ter regime próprio de previdência, tem de arcar com todos os benefícios destes servidores, incluindo pensões e aposentadorias.

Sendo assim, certo está o direito do impetrante de ver efetivada e compensação financeira com Instituto Nacional de Seguro Social, assegurada no art. 201, § 9º, da Constituição da República, com redação dada pela Emenda n. 20, de 15/12/98, que só não ocorreu até hoje por ausência de regulamentação legal.

Importante transcrever manifestação exarada pelo ilustre Wander Paulo Marotta Moreira, que ao concluir seu artigo publicado no livro Mandado de Segurança e de Injunção, Coordenado pelo Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Saraiva, 1990, in verbis:

"A Constituição criou o mais importante e fundamental instrumento de defesa dos direitos constitucionais de que já se teve notícia. Em contrapartida, isso dá aos Juízes e responsabilidades de criar (à maneira dos antigos Editos do Protetor) a norma de proteção. E os mecanismos dessa criação farão renascer velhos sistemas de interpretação: o processo teleológico adquirirá importância (Paul Vander Eycken e Edmond Picard ressurgirão de empoeiradas estantes) e o Juiz não será mais o "ente inanimado" de que falava Montesquieu, mas o "artífice laborioso do direito novo", como preferiu Jean Cruet. Voltarão a ser lembrados Geny, hompel, Brütt e Gmür, além de Stammler. E Hüber, autor do Código Civil Suíço, será recordado pelo seu art. 1º:

          "Deve o Juiz, quando se lhe não depara preceito legal apropriado, decidir de acordo com o direito consuetudinário, e, na falta deste segundo a regra que ele próprio estabeleceria, se fora legislador".

O mandado de injunção é meio de realização do direito além da lei e não contra a lei. Por isso nunca foi tão oportuno o conselho de Paulo:

"Da regra se não extrai o direito; ao contrário, com o direito, tal qual na essência ele ´s, construa-se a regra".

E embora não seja corrente o uso da expressão "mandado de injunção" no direito brasileiro, que nem mesmo se utiliza da expressão injunção, o significado dela já traduz o objetivo do remédio instituído constitucionalmente. Injunção significa imposição, que pode ser tanto a de impor uma conduta positiva como uma conduta negativa. Sendo assim, pode-se concluir que o que fica decidido no mandado de injunção terá que ser executado mediante ordem para que a autoridade pratique um ato ou se abstenha de determinada conduta.


III.1 – O RESPEITO AO PRINCÍPIO FEDERATIVO

O princípio federativo está consagrado na Constituição Federal no art. 1º, que estipula que o Brasil é uma República Federativa, formada pela União indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal.

Em decorrência desse princípio, verdadeira coluna mestra de nosso sistema jurídico, ensina o mestre Roque Carraza (1) que convivem harmonicamente a ordem jurídica global (o Estado Brasileiro) e as ordens jurídicas parciais, central (a União) e periféricas (os Estados-membros). Esta múltipla incidência só é possível por força da cuidadosa discriminação de competências, levada a efeito pela Constituição da República.

Prossegue o Mestre citado, afirmando que "como, em termos estritamente jurídicos, só podemos falar em hierarquia de normas quando umas extraem de outras a validade e a legitimidade (Roberto J. Vernengo), torna-se onipotente que as leis nacionais (do Estado brasileiro), as leis federais (da União) e as leis estaduais (dos Estados - membros) ocupam o mesmo nível, vale consignar, umas não preferem às outras. Realmente, todas encontram seu fundamento de validade na própria Carta Magna, apresentando campos de atuação exclusivos e muito bem discriminados. Por se acharem igualmente subordinados à constituição, as várias ordens jurídicas são isônomas, ao contrário do que proclamam os adeptos das doutrinas "tradicionais."

          "Observamos que as leis nacionais – que encerram normas de caráter geral, obrigando os súditos da Federação e as próprias pessoas políticas – tanto podem ser veiculadas por meio de leis ordinárias (como se observa no inc. XXVII, do art. 22 da CF, que remete à União a competência para legislar sobre "normas gerais de licitação e contratos") ou de atos normativos de igual torpe jurídico (v.g. uma resolução do Senado fixando alíquotas máximas do ICMS, nas operações internas, ou um decreto legislativo, referendando um tratado internacional), quando por via de leis complementares (e.g. a prevista no art. 146 da Lei Magna)."

Consequentemente, forçoso concluir, que a união e os Estados-membros ocupam, juridicamente, o mesmo plano hierárquico, devendo receber tratamento jurídico-formal isonômico.

Importante transcrever, ainda, o pensamento de Roque Carazza (2) que entende que "laboram em erro os que vêem uma relação hierárquica entre o governo central e os governos locais. O que há, na verdade, é, para cada uma destas entidades políticas, campos de ação autônomos e exclusivos, estritamente traçados na Carta Suprema, que lei alguma pode alterar."

No mesmo sentido, o pensamento do eminente jurista Dalmo de Abreu Dallari (3), para quem "o reconhecimento desse poder de fixar sua própria escala de prioridades é fundamental para a preservação da autonomia de cada governo. Se um governo puder determinar o que o outro deve fazer, ou mesmo o que deve fazer em primeiro lugar, desaparecem todas as vantagens da organização federativas. Realmente, pode ocorrer que a escala de prioridades estabelecidas pelo governo central não coincida com o julgamente de importância dos assuntos feitos pelo governo regional ou local. Pode também ocorrer que um governo pretenda que outro cuide com tal empenho de certo problema, que cabe comprometendo grande parte dos recursos financeiros deste último, deixando-o sem poder cuidar de outros problemas que, no seu julgamento, deveriam merecer preferência."

Prossegue aduzindo que: "assim, pois, a decisão sobre as propriedades, dentro de sua esfera de competência e afetando seus recursos financeiros, é uma decorrência da autonomia e cabe entidade política, por preceito constitucional, não se podendo exigir comportamento diverso sob alegação de ser mais conveniente."

Geraldo Ataliba (4), por sua vez, sustenta que "Federação implica igualdade jurídica entre a União e os Estados, traduzida num documento (constitucional) rígido, cuja principal função é discriminar competências de cada qual, de modo a não ensejar violação da autonomia recíproca por qualquer das partes."

          "Portanto, sendo autônomo, cada Estado deve prover as necessidades de seu governo e sua administração. Para tanto, a Constituição conferiu a todos o direito de regular suas despesas, instituir e arrecadar tributos."

Depreende-se dessas premissas que os Estados-Membros mantém seu regime de previdência social, custeando-a com as contribuições de seus funcionários.

As contribuições previdenciárias dos funcionários Estaduais servirão de suporte, juntamente com a parcela decorrente do orçamento, para o custeio das aposentadorias e pensões destes funcionários.

Na medida em que estes funcionários, durante certo período de tempo, não tenham contribuído para a previdência estadual, mas para a nacional (INSS), e o Estado-membro tenha admitido a contagem recíproca de tempo de serviço, assumindo o compromisso de pagamento das aposentadorias destes mesmos funcionários, não estará ocorrendo correspondência entre (União – INSS) que promoveu a arrecadação das contribuições e o ente (Estado – Previdência Estadual) que terá que suportar este encargo.

Destarte, indiretamente, não está sendo respeitado o princípio federativo, pelo qual União, Estados-membros, Municípios e Distrito Federal, têm na Federação o mesmo tratamento isonômico, sem hierarquia.

Se os Estados-membros são obrigados a suportar o encargo financeiro decorrente de aposentadorias de funcionários estatutários que não tenham recolhido a integralidade de suas contribuições previdenciárias aos cofres municipais (mas aos cofres da União, em virtude de anterior vinculação à previdência nacional – INSS), estarão sofrendo um prejuízo econômico considerável contra um enriquecimento sem causa da União, que apesar de Ter recebido (por intermédio do INSS) daqueles funcionários as contribuições previdenciárias, não precisará custear suas aposentadorias.

Essa situação, sem dúvida alguma, causa uma instabilidade no equilíbrio federativo (consagrado no art. 1º, da constituição Federal de 1988) ocasionando ruptura da harmonia que deve prevalecer nas relações entre os entes federados, quebrando a autonomia dos Estados-membros (principalmente) no tocante à gerência de suas receitas e despesas.

Na medida em que há possibilidade de contagem recíproca de tempo de serviço prestado à Iniciativa Privada, ou para outro Ente da Federação (onde ocorreu pagamento de contribuição previdenciária à União), deve ser respeitado e consequentemente exercido pelo Estado o direito de compensação dessas importâncias ao ente (no caso, o Estado) que assumirá o ônus da aposentadoria do funcionário.

– Contagem Recíproca de Tempo para Aposentadoria e Compensação Financeira:

A contagem recíproca de tempo de serviço já vinha assegurada desde a Constituição de 1946, que no art. 192 disciplinava:

          "O tempo de serviço público, federal, estadual ou municipal, computar-se-á integralmente para efeitos de disponibilidade e aposentadorias."

A Constituição de 1967 também disciplinava a questão, no art. 101, par. 1º:

          "O tempo de serviço público federal, estadual ou municipal será computado integralmente para os efeitos de aposentadorias e disponibilidade."

A Emenda Constitucional n.º 01, de 1969, dispunha no art. 102, par. 3º, que:

          "O tempo de serviço público federal, estadual ou municipal será computado integralmente para os efeitos de aposentadorias e disponibilidade, na forma da lei."

A Constituição Federal de 1988 tratou da matéria no art. 40, par.3º, que dispõe:

          "Par. 3º - O tempo de serviço público federal, estadual ou municipal será computado integralmente para os efeitos de aposentadoria e de disponibilidade."

E, ainda, no art. 202, par. 2º, que dispõe:

          "Par. 2º - Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipotése em que os diversos sistemas de previdência social se compensarão financeiramente segundo critérios estabelecidos em lei."

A contagem de tempo de serviço foi regulada pela Lei n.º 807/60 e pelo regulamento do regime de previdência social (arts. 66 a 69 do Regulamento).

Foi regulamentada posteriormente pela Lei n.º 6.226, de 14 de junho de 1975, que no art. 5º dispunha:

          "Art. 5º - A aposentadoria por tempo de serviço, com aproveitamento da contagem recíproca, autoriza por esta Lei, somente será concedida ao funcionário público federal, de redução para 30 (trinta) anos de serviço, se mulher ou Juiz, e para 25 (vinte e cinco) anos, se ex-combatente.

"Parágrafo único. Se a soma dos tempos de serviço ultrapassar os limites previstos neste artigo, o excesso não será considerada para qualquer efeito."

E no artigo 8º previa:

          "As aposentadorias e demais benefícios de que tratam os artigos 1º e 2º, resultantes da contagem recíproca de tempo de serviço prevista nesta Lei, serão concedidos e pagos pelo sistema a que pertencer o interessado ao requerê-los e seu valor será calculado na forma da legislação pertinente.

"Parágrafo único. O ônus financeiro decorrente caberá, conforme o caso, integralmente ao Tesouro Nacional, à Autarquia Federal ou ao SASSE, à conta de recursos que lhe forem consignados pela União, na forma do inciso IV, do artigo 69, da Lei n. 3.807, de 26 de agosto de 1960, com a redação que lhe deu a Lei n. 5.890, de 8 de junho de 1973."

A Lei Federal 6.864, de 01 de dezembro de 1980, estendeu aos servidores estaduais e municipais a contagem recíproca de tempo de serviço para aposentadoria .

Nota-se claramente, pela análise das normas já citadas, que o direito à compensação está intimamente ligado ao direito à contagem recíproca de tempo de serviço, que prevê a contagem recíproca de tempo de serviços aos servidores municipais.


III.3 – REGIME JURÍDICO ÚNICO

Foram extintos todos os empregos públicos; consequentemente, as relações entre quaisquer servidores públicos municipais e a Administração Pública municipal, com exceção apenas dos empregos temporários, transmudaram-se em relações regidas pelo estatuto. Aboliu-se do cenário municipal as relações trabalhistas, regidas pelo regime celetista.

Em razão desta alteração, o tesouro municipal foi compelido a assumir o ônus financeiro relativo às aposentadorias destes empregados (hoje estatuários), o que garante ao autor o correspondente crédito pelas contribuições pagas ao INSS – Instituto Nacional do Seguro Social, durante a vigência do regime celetista antes exposto. O INSS recebeu as contribuições referidas, em alguns casos por anos a fio, e agora quem vai arcar com as aposentadorias destes servidores são os cofres públicos estaduais.

Em consonância com os ensinamentos de JOSÉ AFONSO DA SILVA, "no regime de previdência social a base da cobertura dos benefícios assenta no fator contribuição e em favor do contribuinte e dos seus" (op.cit. p. 272).

É, pois, princípio basilar da previdência social a existência da equação custo/benefício. Para que o servidor goze do direito constitucional da aposentadoria é preciso que haja contribuição para o sistema previdenciário que vai suportar o encargo financeiro decorre da inatividade remunerada deste mesmo servidor. Na hipótese vertente, houve o recolhimento de contribuições para o sistema previdenciário federal por todo o período em que o servidor público municipal esteve submetido ao regime celetista.

Verificou-se, desta forma, a quebra das regras norteadoras de qualquer sistema previdenciário: quem arca com o benefício é quem recebeu do contribuinte o pagamento da contribuição.

Em razão do art. 39 da Constituição Federal é que o Município de João Pessoa criou o regime único, transformando os empregos em cargos públicos.

Todo o contingente funcional submetidos a C.L.T. tiveram seus empregos absorvidos por cargos públicos, acarretando enorme volume de despesa aos cofres públicos.

Diante da violação da equivalência acima citada, o Legislador Constituinte, sabiamente, previu uma compensação financeira entre os diversos sistemas previdenciários, evitando, assim, prejuízos de ordem financeira irreparáveis, ainda que o tenha feito sob reserva de lei.

Em síntese, o Município possui crédito financeiro frente ao INSS, em virtude de expressa determinação constitucional, fazendo jus à compensação ora pleiteada.


III.4 – O DIREITO À COMPENSAÇÃO FINANCEIRA:

A Constituição Federal de 1988 tratou da contagem recíproca de tempo para aposentadoria e da compensação financeira, no art. 202, § 2º, que reza:

          "§ 2º. Para efeito de aposentadoria, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diversos sistemas de previdência social se compensarão financeiramente, segundo critérios estabelecidos em lei."

[sem grifo no original]

A Carta da República prevê o direito de compensação financeira entre os diversos sistemas de previdência social, na hipótese de contagem recíproca do tempo de contribuição na Administração, e este dispositivo tem imediata aplicabilidade, porque trata de direito dos entes da Federação, caso contrário, os Estados que instituíram o Regime Jurídico Único, por força de igual mandamento constitucional, estariam à mercê de legislação federal, cuja demora poderá causar prejuízos irreparáveis às finanças estaduais. O futuro prejuízo dos Estados está evidenciado pelo fato de terem assumido a aposentadoria de inúmeros funcionários (ante, principalmente, o Regime Jurídico Único), que teriam contribuído por longo período de tempo ao INSS e não aos cofres estaduais.

Em 1991 (3 anos após a Constituição Federal de 1988), foi finalmente editada a Lei de Planos e Benefícios da Previdência Social, Lei Federal n.º 8213, de 24 de junho de 1991, que no art. 94, "caput" estabelece:

          "Para efeitos dos benefícios previstos no Regime Geral da Previdência Social, é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição ou de serviço na administração pública e na atividade privada, rural e urbana, hipótese em que os diferentes sistemas de previdência se compensarão financeiramente."

          "Parágrafo único. A compensação financeira será feita ao sistema a que o interessado estiver vinculado ao requerer o benefício pelos demais sistemas, em relação aos respectivos tempos de contribuição ou de serviço, conforme dispuser o Regulamento."

Recentemente, em 30 de janeiro de 1997, foi editado o Decreto n.º 2.138, que dispõe sobre a compensação de créditos tributários com créditos do sujeito passivo decorrentes de restituição ou ressarcimento de tributos ou contribuições, a ser efetuada pela Secretaria da Receita Federal.

O art. 2º desse Decreto estipula:

          "O sujeito passivo, que pleitear a restituição ou ressarcimento de tributos ou contribuições, pode requerer que a Secretaria da Receita Federal efetue a compensação do valor do seu crédito com débito de sua responsabilidade."

E, o art. 3º do mesmo decreto estabelece que:

          "A Secretaria da Receita Federal, ao reconhecer o direito de crédito do sujeito passivo para restituição ou ressarcimento de tributo ou contribuição, mediante exames fiscais para cada caso, se verificar a existência de débito do requerente, compensará os dois valores."

O parágrafo único do art. 3º estabelece algumas condições que devem ser observadas.

A compensação ora discutida, no entanto, não se enquadra perfeitamente na norma contida no supracitado Decreto.

Entendemos que o pedido de compensação não poderia vir a ser dirigido administrativamente à Receita Federal, mas ao INSS, porque o Município de João Pessoa não é contribuinte de outros tributos federais, que possam ser objeto de compensação com a Receita Federal (a quem incumbe a cobrança e fiscalização dos demais tributos da União).

Como o INSS tem capacidade tributário ativa, e consequentemente, competência para cobrar e fiscalizar a contribuição previdenciária (cuja arrecadação tem destinação dirigida ao custeio da Seguridade Social), e como é somente sobre esta contribuição que versa a presente demanda, foi contra aquele Órgão, e não contra a União, ajuizado o presente pedido, afastando-se desde logo a integral aplicabilidade do supracitado Decreto Regulamentador, que no entanto, deve ser interpretado a favor do autor, no que couber, por tratar igualmente da compensação entre os sujeitos ativo e passivo tributário (INSS e Município de J.Pessoa), ainda que não tenha de modo explícito tratado da compensação entre os diversos regimes de providência.


III.5 – OS INSTITUTOS DA INDENIZAÇÃO E DA COMPENSAÇÃO

O Direito Tributário não cria todos os institutos que utiliza, ao contrário, vale-se de institutos do direito Administrativo, Direito Comercial, Direito Civil.

Sempre que uma lei de cunho tributário (da qual a previdenciária é parte) se refere a um instituto, como no caso presente a COMPENSAÇÃO, ou a INDENIZAÇÃO, busca sua definição, conteúdo e alcance no ramo do Direito que o instituiu, no caso, no Direito Civil, cabendo à lei tributária estabelece as condições e os limites de aplicabilidade desse instituto no âmbito tributário.

É o que se depreende do artigo 109 do CTN:

          "Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários."


III.5.1 – A INDENIZAÇÃO

          a) Enriquecimento sem causa

É um princípio geral do direito (art. 4º da Lei de Introdução) que a ninguém é lícito enriquecer-se causa justificada à custa de outrem.

O Código Civil não inclui o enriquecimento sem causa no elenco das fontes das obrigações, mas no capítulo do pagamento encontramos uma seção que trata do pagamento indevido (art. 964 e seguintes).

Considera-se pagamento indevido as prestações efetuadas em virtude de uma causa que deixou de existir (obrigação legal de contribuir para o INSS em virtude do regime celetista de trabalho dos funcionários públicos municipais, que tiveram seus empregos transformados em cargos públicos, passando então a contribuir para Previdência Estadual), ou as prestações previdenciárias visavam custear futura aposentadoria que em princípio deveria ser paga pelo INSS, e no entanto será custeada pelo Município de João Pessoa, em virtude do regime jurídico único).

São pressupostos da obrigação de restituir, por enriquecimento de alguém:

1 – o aumento do ativo patrimonial (o INSS teve um acréscimo patrimonial decorrente do recebimento das contribuições previdenciárias dos funcionários estaduais, e não terá que desembolsar a correspondente aposentadoria destes, ante o regime jurídico implantado no Município de João Pessoa), e a diminuição do passivo (o Município de João Pessoa está sofrendo prejuízo financeiro porque os funcionários que não contribuíram para a Previdência Municipal terão suas aposentadorias custeadas pelos cofres municipais, sem o correspondente ingresso de receita).

2 – O enriquecimento sem justificativa. Sem causa que dizer que não há conformidade do resultado da atribuição com a ordenação dos bens prescrita na lei. Não Ter causa quer dizer que nunca a teve, ou mesmo tendo tido inicialmente, a perdeu em momento posterior (no presente caso, inicialmente o INSS fazia jus ao recebimento das contribuições previdenciárias, porém, por dispositivo constitucional, acolhido na legislação estadual, o Estado do Paraná assumiu todo o ônus da aposentadoria dos funcionários que tiveram seus empregos transformados em cargos públicos, cessando a causa que existia inicialmente).

3 – Por derradeiro, o terceiro pressuposto refere-se ao enriquecimento obtido à custa de quem requer a restituição (o Município de João Pessoa deverá custear a aposentadoria dos funcionários beneficiados pelo regime jurídico único, sem que tenha dos mesmo recebido a correspondente contribuição previdenciária).

Presentes no caso em análise todos os pressupostos que confirmam o enriquecimento sem causa do INSS, em face da diminuição do patrimônio municipal, justificando o direito à indenização.

b) A obrigação de Indenizar

A obrigação de indenizar pressupõe um dano e a consequente causalidade entre o fato a que deu determinada pessoa e as consequências do seu ato prejudicado.

O dano, no presente caso, é patrimonial, e refere-se ao fato de que funcionários municipais que recolhiam contribuições previdenciárias ao INSS , terão suas aposentadorias pagas pelo erário municipal. O Município, que não recebeu em seu favor referidas contribuições, durante determinado período de tempo, terá que custear a aposentadoria desses funcionários, com numerário retirado de sua receita, sem a correspondente previsão de ingresso anterior.

Esse dano a que deu causa o INSS, e que merece ser indenizado, refere-se tanto a prejuízo já consumado, quanto a prejuízo futuro, ainda por consumar-se (relativamente às aposentadorias que serão no futuro concedidas aos funcionários que durante algum período de tempo contribuíram para o INSS e não para os cofres municipais). É evidente que o dano deve ser apurado com relação aos compromissos passados e apurável quanto aos futuros, como é o caso presente, já que é perfeitamente possível a previsão e o cálculo das aposentadorias futuras dos funcionários estaduais, levando-se em conta o período de tempo em que as contribuições previdenciárias verteram aos cofres do INSS (que já as recebeu) e o tempo de serviço necessário para a concessão do beneficiário de aposentadoria no Estado, partindo-se do número dos funcionários públicos municipais, como já demonstrado nos itens anteriores.

Sobre a possibilidade de reconhecimento de dano futuro, manifesta-se José Aguiar (5) aduzindo:

          "Na maioria dos casos, o dano não se ofereceu com caráter que estabelece a impossibilidade de alteração futura. Se, tendo isso em vista, se considera depois a irremediável limitação humana quanto ao conhecimento do futuro, então não se pode correr o risco de sustar a avaliação do dano até se feche o ciclo em que ele se desenvolve, ao influxo dos caprichos do futuro."

Para definir o dano, é preciso partir do conceito de patrimônio, que permite duas acepções: ampla e restrita.

No sentido amplo, patrimônio é o complexo de direito que reúne duas entidades, a "entidade patrimonial ativa" de Bekker, constituída do cômputo de direitos apreciáveis em dinheiro (patrimônio jurídico), e o passivo patrimonial (6).

Para Fischer (7), o conceito econômico do patrimônio correspondente a totalidade dos bens economicamente úteis que se acham dentro do poder de disposição de uma pessoa.

E o citado doutrinador ainda entende que "o inconveniente de aplicar ao problema do dano patrimonial as noções derivadas do conceito jurídico do patrimônio decorrente do fato de que este não tem conta o valor dos bens patrimoniais, pelo que deve ser deixado de parte, para utilizar-se, em seu lugar, o conceito econômico, de onde procede a ideia do valor. Daí a conclusão de que "o dano patrimonial pressupõe sempre ofensa ou diminuição de certos valores econômicos".

O dano se estabelece mediante o confronto entre o patrimônio existente após o dano e o que possivelmente existiria, se o dano não se tivesse produzido: o dano é expresso pela diferença negativa encontrada nessa operação.

Restou comprovado nos itens anteriores que os funcionários estaduais que tiveram seus empregos convertidos em cargos públicos, durante longo período de tempo, contribuíram para a Previdência Nacional (INSS) – porque havia a expectativa de que suas aposentadorias seriam custeadas pelo mesmo, e consequentemente o Município não fez previsão de receita para custear essas aposentadorias, que por força do regime jurídico único, serão suportadas pelos cofres municipais .

Não houve aos cofres públicos municipais ingresso de receita decorrente do pagamento de contribuições previdenciárias desses funcionários, que pudesse sustentar futuro pagamento de aposentadorias. Quebrou-se com isso a relação custo/benefício. A situação financeira do município será substancialmente alterada com esse fato, merecendo a imediata reparação, sob pena desse dano assumir proporções preocupantes a ponto de em futuro próximo inviabilizar o atendimento de outras necessidades públicas, igualmente relevantes.

E ainda há que se considerar que o dano a que nos referimos atingirá o município de João Pessoa refletindo nos direitos de terceiros, porque todos os funcionários públicos municipais que tiveram seus empregos convertidos em cargos públicos tem a expectativa e o direito de ver suas aposentadorias custeadas pelo município, o qual necessita de meios para custeá-la, e para tanto deve se invocar o que preconiza o mandamento constitucional descrito no art. 202, par. 2º da Constituição Federal, antes citado.

Da leitura do art. 202, par. 2º da Constituição Federal depreende-se que a indenização haverá de realizar-se por meio de compensação, entre os regimes de previdência, instituto do qual trataremos a seguir.


III.5.2 – A COMPENSAÇÃO

A compensação, segundo lembra Álvaro Villaça Azevedo, evoca "a imagem de uma balança, como se, em seus pratos, fossem pesadas as obrigações até o igualamento das posições." (8)

Estipula o Código Civil, no art. 1.009, que "se duas pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas obrigações extinguem-se até onde se compensarem".

Portanto, se duas pessoas se devem mutuamente, serão reciprocamente credor e devedor um do outro, solvendo-se a relação obrigacional até a concorrência dos valores das prestações devidas, de modo que, se um tiver de receber mias do que o outro, continuará credor de um saldo favorável e decorrente do balanço, entende Álvaro Villaça Azevedo (9).

A compensação, portanto, é um meio especial de extinção das obrigações, até onde se equivalem, entre pessoas que são, ao mesmo tempo, devedoras e credoras uma da outra. Seria o desconto de um débito a outro, ou a operação de mútua quitação entre credores recíprocos.

Para Maria Helena Diniz (10) a natureza jurídica da compensação equivale ao pagamento, ou de um mode especial de extinção da obrigação, por três motivos:

a) por exigir que os credores sejam concomitantemente devedores um do outro;

b) por extinguir as dívidas recíprocas antes de serem pagas, e

c) por permitir fracionamento de um dos débitos, representando exceção ao princípio geral de que o credor não pode ser obrigado a receber por partes.

Silvio Rodrigues (11) enumera os pressupostos e condições da compensação como sendo:

a) Reciprocidade das obrigações,

b) Liquidez das dívidas,

c) Exigibilidade das prestações,

d) fungibilidade dos débitos.

Caio Mário da Silva Pereira (12), por sua vez, compõe os requesitos da compensação da seguinte forma:

a) Cada um de ser devedor e credor por obrigação principal,

b) As obrigações devem Ter por objeto coisas fungíveis, da mesma espécie e qualidade,

c) As dívidas devem ser vencidas, exigíveis e líquidas,

d) Não pode haver direitos de terceiros sobre as prestações.

Entende o citado doutrinador que "o primerio requesito pressupõe, evidentemente, duas obrigações entre as mesma partes, ou dois vínculos, independentemente da apuração de suas origens, sejam estas a convenção (obrigações de natureza contratual) ou a lei (obrigações de fonte extracontratual), porque a compensação atua sobre débitos existentes, isto é, atuais."

Prossegue afirmando que "o segundo requisito é o fungibilidade das prestações..., o terceiro a exigibilidade, o vencimento e a liquidez (Código Civil, art. 1010). Para que haja compensação, os débitos hão de estar vencidos, pouco importando que sejam pelo escoamento do prazo, ou em razão de uma antecipação prevista na lei ou no título."

Quando à liquidez, alude o doutrinador que "não significa a menção de soma precisa nos respectivos títulos, mas que sejam uma e outra certas, isto é, tenham a sua existência positivada independentemente de qualquer processo de duração, e determinado o respectivo quantum".

Entende que não afeta a liquidez do débito o fato de opor-lhe contestação o devedor, fazendo-o litigioso.

Quanto à impossibilidade de compensação de natureza tributária, aduz o jurista que a mesma será possível quando houver previsão expressa em Lei Especial, consoante o disposto no art. 1017 do Código Civil.

No caso vertente, a compensação ora pleiteada encontra, como amplamente já discorremos, respaldo na Constituição Federal (art. 202), no Código Tributário Nacional (art. 156), na Lei 8213 (art. 94), e por consequência, é passível de aplicação o contido nos artigos 1009 a 1024 do Código Civil, que também versam sobre essa modalidade de extinção das obrigações.

O crédito que o autor pretende compensar é líquido, certo e exigível, verifica-se a reciprocidade das obrigações (o INSS possui um crédito contra o Município , e este possui um crédito contra o INSS), e a fungibilidade, porque trata-se de compensação de dinheiro, ambos são credores e devedores uns dos outros.

Forçoso concluir que a compensação mencionada no art. 202, par. 2º da Constituição Federal, é perfeitamente passível de aplicação, mediante a conjunção das diversas normas de direito público e de direito privado previstas no nosso ordenamento jurídico.


III.1 – DA EFETIVAÇÃO DO DIREITO

A tendência moderna da doutrina caminha no sentido de dar ao mandado de injunção um resultado mais prático, o que levaria à verdadeira efetivação do exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania, inviabilizados em virtude da falta de norma regulamentadora.

Em recente artigo publicado na DEL REY Revista Jurídica, dezembro/98, o advogado Sérgio Reginaldo Bacha, Mestre em Direito do Estado – Direito Constitucional pela PUC/SP e Coordenador do Curso de Direito da UNIVAP, assim se manifestou sobre o mandado de injunção:

"O mandado de injunção, como ação constitucional de garantia sumária, no direito anglo-americano, tem por objetivo singular um mandamento judicial de FAZER, um fazer multifacetário, podendo se resumir numa ordem estatal positiva ou negativa. O plexo de incidência das hipóteses fáticas é bem elástico. No Brasil, umtatis mutandis também o é, porém, no estágio atual, seu uso é ainda bem tímido.

Pelos consagrados processos de interpretação, defendemos a inserção do texto do inciso LXXI, do artigo 5º da Constituição Federal, à categoria de norma de eficácia plena e de aplicabilidade imediata. Consubstanciamos esta posição, principalmente, mercê da interpretação gramatical e teológica, provando a carga axiológica das palavras que compõem a norma criadora do mandado de injunção, bem como a mens legis, e "o resultado que a mesma precisa atingir em sua atuação prática" (Carlos Maximiliano, 1993, p. 151-2).

O preceptivo legal do artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil dá a exata medida da adequação do processo teleológico à norma criadora do mandado de injunção: "Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais que ela se dirige e às exigências do bem comum".

Qual o tipo de provimento que emanará do órgão judicial, na tutela jurisdicional requerida e devida? Respondemos confiantemente e sem deixar margem a quaisquer outras dúvidas: o Estado, através do Poder Judiciário (art. 5º, XXXV da CF), frente ao caso sub judice, prolatará decisão em favor do impetrante, com força de segurança, a tutelar-lhe o direito, a liberdade ou a prerrogativa inerente à nacionalidade, à soberania e à cidadania, que, explícita na Constituição, não seja exercitável por falta de norma regulamentadora, quer dizer, por omissão do legislador ordinário ou autoridade administrativa pública ou privada.

Em outras palavras, o Poder Judiciário deverá, a exemplo do que já ocorre com a função da sentença, formular uma norma para o caso concreto, viabilizando assim o exercício dos direitos constitucionais e das liberdades públicas.

"O mandado de injunção, por Ter caráter substantivo, faz as vezes da norma infraconstitucional ausente, e íntegra o direito ineficaz, em razão da ausência dessa norma infraconstitucional à ordem jurídica, assim na linha da lição de Celso Barbi, no sentido de que o juiz cria para o caso concreto do autor da demanda uma norma especial, ou adota uma medida capaz de proteger o direito reclamado". "E acrescenta o mestre mineiro que essa solução está de acordo com a função tradicional da setença, que é resolver o caso concreto levado ao Poder Judiciário, mas limitando a eficácia apenas a esse caso, sem pretender usurpar funções próprias de outros poderes" (Apud Carlos Mario da Silva Velloso, in As Novas Garantias Constitucionais, RDA, 177/14,24).

Também é certo, quando ao conteúdo do decisum em ação de mandado de injunção, ser inter partes, pois não fará coisa julgada erga omnes. As razões são óbvias, dadas as peculiaridades especiais da cada caso concreto levado à apreciação do Judiciário. Só as pessoas que ocupam o pólo ativo e que compõem a lide é que se beneficiarão da sentença, descaracterizando-a da eventualidade de vir a produzir efeitos ega omnes.

Qual o tratamento dispensado pelo Supremo Tribunal Federal às ações de mandado de de injunção? Compulsamos um número infindável de acórdãos da Suprema Corte, e constatamos que, a duras penas, o mandado de injunção vem galgando patamares num curso de desenvolvimento e evolução.

Graças às posições de algumas Ministros, nitidamente vanguardeiras, conseguiu-se disseminar moderadamente o verdadeiro objetivo do novel instituto, descortinado sua real finalidade: a de ser meio hábil a formular norma para o caso concreto.

Outrossim, não olvidamos daqueles Ministros que insistem em dar ao mandamus o mesmo objetivo da ação direta de inconstitucionalidade por omissão, ou seja, limitando-se a comunicar ao Poder Competente e responsável pela edição da medida para tornar efetiva a norma constitucional, dando-lhe ciência da omissão e, assinando ou não, prazo para a tomada de providências cabíveis. Assim, lamentavelmente, está se esvaziando todo o conteúdo desta nova garantia constitucional.

Temos serena e madura convicção das propriedades que contém o mandado de injunção. Auguramos por vê-lo traduzido na sua máxima expressão, coincidindo com os propósitos que inspiram o Legislador Constituinte de 1988.

Vem mui a calhar a lição do mestre Celso Agrícola Barbi, o qual revivemos na sua ensinaça: o êxito do instituto dependerá essencialmente da capacidade inventiva dos advogados e do sadio critério dos juízes para criação dos meios práticos adequados e para a precisa delimitação do campo do mandado de injunção (RT 637;7).

A constituição, Lei Básica, Lei Maior, Carta Política, Instrumento Fundamental de toda sociedade politicamente organizada, nos dotou de meios hábeis para garantirmos a concretização dos direitos sagrados do homem. Contudo, "o espírito estadista constrói as garantias; mas se não houver homens no manejo da máquina, quem garantirá as garantias? (Rui Barbosa)."

No mesmo sentido caminha, prematuramente, a jurisprudência da Corte Suprema, onde já existem manifestação de alguns Ministros que se posicionam no sentido de efetivar o direito dos impetrantes de mandados de injunção.

Trazemos à colocação votos dos Ministros Marco Aurélio e Carlos Velloso, quando do julgamento do Mandado de Injunção 448/RS, datado de 05/09/94, com publicação no DJ em 06/06/97, que demonstram com clareza esta tendência, ainda que bem prematura, de se dar o verdadeiro sentido à intenção do legislador constituinte ao inserir o Mandado de Injunção na Constituição da República de 1988.

O Sr. Ministro Marco Aurélio assim se manifestou, in verbis:

"Realmente, o Instituto Nacional do Seguro Social é parte ilegítima para figurar nesta impetração. A inicial, embora dirigida contra este último, consigna a competência desta Corte em face à omissão do Congresso Nacional. É o que se depreende do item 2, à folha 5, e das razões desenvolvidas pelos Impetrantes. Assim, preliminarmente, exclou o Instituto Nacional de Seguro Social.

Quando ao mérito da impetração, constata-se que o benefício previsto no inciso V do artigo 203 da Constituição Federal, ou seja, a garantia de um salário-mínimo de benefício mensal a pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família ficou jungido à vinda à batalha de lei regulamentadora. Nas informações que prestou, o Presidente do Congresso Nacional alude à tramitação de projetos, fato que, por si só, não afasta a pertinência deste mandado de injunção. É que, a teor do disposto no inciso LXXI do artigo 5º da Carta, a medida é cabível sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Tal como assentado no perecer da Procuradoria Geral da República, concluo pela mora do Congresso, porque inexistente a norma regulamentadora. No caso dos autos, a Carta assinou prazo para a edição desta ao estabelecer, no artigo 59 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, que os projetos de lei relativos à organização da seguridade social, a abranger as áreas de saúde, previdência a assistência social (Constituição Federal, artigo 194) seriam apresentados, no prazo máximo de seis meses da promulgação da Carta, ao Congresso Nacional, que teria seis meses para apreciá-los. Destarte, inexistente a lei prevista ao término do inciso V do artigo 203 do Diploma Maior, assento que os Impetrantes, detentores de deficiência física impeditiva de custearem a própria manutenção ou de tê-la suprida pelas respectivas famílias, têm jus à percepção de um salário-mínimo de benefício mensal, a ser satisfeito pela União Federal. Neste sentido é o meu voto, sem que esta decisão ganhe contornos de condenação. Simplesmente, fixo os parâmetros para o exercício do direito constitucional e estes dizem respeito à deficiência inviabilizadora de atividade econômico-produtiva, a falta de recurso para prover a própria subsistência, e a incapacidade econômico-financeira de a família vir a fazê-lo."

(destacamos os negritos)

O Sr. Carlos Velloso, também com entendimento de se conferir ao impetrante de mandado de injunção a efetividade do direito inviabilizado diante da inexistência da norma, assim se manifestou, in verbis:

"Sr. Presidente, o Tribunal conhece a minha posição a respeito do mandado de injunção. A Constituição Federal confere à Suprema Corte uma notável atribuição, qual seja a de viabilizar o exercício de direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania, exercício inviabilizado em razão da inexistência de norma regulamentadora (C.F., art. 5º, inc. LXXI). O mandado de injunção é uma garantia constitucional da maior importância, uma medida judicial que não tem similar em Direito Constitucional Comparado. Criada pelo constituinte originário, inscrita na Constituição, é ilegítima a reação ao notável instituto, ao argumento de que ele interfere na independência dos Poderes. Repito: quem a criou – o constituinte originário – poderia fazê-lo, motivo por que laborou legitimamente, inovando na ordem jurídico-constitucional.

Em casos como este, Sr. Presidente, fixo a norma para o caso concreto, vale dizer, faço aquilo que a Constituição quer que eu faça, fixo a norma que vai viabilizar o exercício do direito inviabilizado pela falta da norma regulamentadora, da norma inexistente em razão da omissão do legislador ordinário. Fixada a norma para o caso concreto, determino que o interessado vá ao juízo comum, comum ou trabalhista, onde serão comprovados, se necessário, os dados fáticos que comporão a relação fato-norma objetiva. No juízo comum, comprovados os fatos, se necessário, Ter-se-á o aperfeiçoamento da relação fático-jurídica da qual surgirá o direito subjetivo, o direito que a Constituição concede.

Para boa compreensão do meu pensamento, reporto-me ao voto que proferi por ocasião do julgamento do MI 361-RJ, do teor seguinte:

‘Sr. Presidente, o Tribunal conhece a minha posição a respeito do mandado de injunção, que considero uma garantia constitucional da maior expressão. A Comissão de Juristas que compõe o Grupo de Trabalho do Instituto de Estudos avançados da Universidade do Estado de São Paulo – USP, que temos a honra de integrar, o Ministro Pertence e eu, e que estuda as instituições judiciárias brasileiras, com a finalidade de apresentar sugestões com vistas à revisão constitucional, vai sugerir que a Constituição deixe explícito o que nela está implícito, no inciso LXXI do art. 5º: que o Tribunal, ao deferir o mandado de injunção, formule a norma para o caso concreto. Reporto-me ao voto que proferi, por exemplo, no MI n.º 95/RR, onde sustentei que a competência para o julgamento do mandado de injunção firma-se em razão do órgão ou autoridade incumbido de elaborar a norma regulamentadora (C.F., art. 102, I, ‘g’; art. 105, I, ‘h’) e que, deferindo o Tribunal o mandado de injunção, elaborará a norma para o caso concreto. Obtida a norma, o impetrante vai ao Juízo competente para a ação – Juízo comum ou trabalhista – onde haverá o aperfeiçoamento da relação fato-norma, com a comprovação, se for o caso, dos fatos. Assim o voto que proferiu no citado MI 95-RR:

‘O que sustento, e assim o fiz em trabalho doutrinário que escrevi sobre o tema – ‘As Novas Garantias Constitucionais’, em RDA 177/14 – e em votos que proferi no Superior Tribunal de Justiça e nesta Suprema Corte, é que a competência para julgamento da injunção firma-se em razão da pessoa ou órgão que deva suportar os efeitos da sentença, mas em razão da autoridade ou órgão incumbido da elaboração da norma regulamentadora. É isto o que está posto na alínea ‘g’ do inc. I do art. 102 da Constituição, em relação ao Supremo Tribunal Federal e na alínea ‘h’ do inc. I do art. 105 da Constituição, em relação ao Superior Tribunal de Justiça.

Quer dizer: o mandado de injunção pode ser requerido contra a pessoa física ou jurídica, públcia ou privada, que deva suportar os efeitos da sentença, que atuará em litisconsórcio com a autoridade ou entidade incumbida da elaboração da norma regulamentadora, fixando esta a competência do órgão julgador.

Figuremos em exemplo, que é aliás, a hipótese dos autos: a Constituição estabelece que o empregado tem direito a aviso prévio proporcional ao tempo de serviço, sendo no mínimo de trinta dias, nos termos da lei (CF, art. 7º, XXI). Um empregado de dez anos de casa tem direito, evidentemente, a aviso prévio superior a um outro de apenas um ano. A Constituição confere-lhe o direito, direito, entretanto, inócuo, dada a inexistência da lei regulamentadora prevista (art.7º, XXI). O mandado de injunção, pois, que tem caráter substantivo, fará as vezes da norma infraconstitucional ausente e integrará o direito ineficaz, ineficaz em razão da ausência da norma regulamentadora, à ordem jurídica. No trabalho que produzi a respeito do tema, escrevi:

‘Registra-se que o mandado de injunção tem caráter substancial, ao contrário do mandado de segurança que é mais instrumento processual de realização de direito líquido e certo, isto é, direito subjetivo, que decorre de uma relação fático-jurídica, fato-direito objetivo, em que os fatos devem estar comprovados de plano. O mandado de injunção, por Ter caráter substantivo, faz as vezes da norma infraconstitucional ausente e integra o direito ineficaz, em razão da ausência dessa norma infraconstitucional, à ordem jurídica, assim na linha da lição de Celso Barbi, no sentido de que o juiz cria "para o caso concreto do autor da demanda uma norma especial", ou adota ‘uma medida capaz de proteger o direito reclamado". Acrescenta o mestre mineiro: "essa solução está de acordo com a função tradicional da sentença, que é resolver o caso concreto levado ao Poder Judiciário, mas limitando a eficácia apenas a esse caso, sem pretender usurpar funções próprias de outros poderes.’ ("As Novas Garantias Constitucionais’, RDA, 177/14, 24).

Ou se entende assim, ou se esvazia a nova garantia constitucional.

Esta Eg. Corte entendeu que, com o mandado de injunção, obtém-se o mesmo que se obtém através da ação direta de inconstitucionalidade. Vale dizer, procedente a ação do mandado de injunção, simplesmente dá-se ciência ao órgão incumbido de elaborar a norma regulamentadora de que está ele omisso. Divirjo, data venia desse entendimento, entendimento que esvazia a nova garantia constitucional.

A diferença entre mandado de injunção e ação de inconstitucionalidade por omissão, lembrei no trabalho que escrevi a respeito e que está linhas atrás mencionado, está justamente nisto: na ação de inconstitucionalidade por omissão, que se inscreve no contencioso jurisdicional genérico, de competência exclusiva do Supremo Tribunal Federal, a matéria é versada apenas em abstrato e, declarada a insconstitucionalidade por omissão, será dada ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgãos administrativo, para fazê-lo no prazo de trinta dias (C.F., art. 103, § 2º). No mandado de injunção, reconhecendo o juiz ou tribunal que o direito que a Constituição comncede é ineficaz ou inviável, em razão da ausência de norma infraconstitucional, fará ele, juiz ou tribunal, por força do próprio mandado de injunção, a integração do direito à ordem jurídica, assim tornando-o eficaz e exercitável (C.F., art. 5º, LXXI).

O inc. LXXI do art. 5º parece-me claro quando estabelece que a concessão do mandado de injunção importa viabilizar o exercício de direito e liberdade constitucional ou de prerrogativa inerente à nacionalidade, à soberania e à cidadania. A disposição inscrita, a seu turno, no § 2º do art. 103 é noutro sentido: a procedência da ação para tornar efetiva norma constitucional resulta, simplesmente, no dar ciência ao Poder competente para a adoção das providências necessárias e, em se tratando de órgão administrativo, para fazê-lo em trinta dias.

A diferença se explica: é que, a ação direta de inconstitucionalidade tem por escopo a defesa da ordem jurídica; já o mandado de injunção tem por finalidade proteger direito subjetivo constitucional, direito individual ou prerrogativa inerente à nacionalidade, à soberania e à cidadania. A ordem jurídica, objeto da ação direta, tem caráter abstrato; a defesa de direito individual, entretanto, faz-se em concreto. E se o constituinte simplesmente estabeleceu, no art. 103, § 2º, que, declarada a inconstitucionalidade por omissão, seria apenas dada ciência ao órgão competente, assim procedeu porque criou ele, na mesma carta, o instituto do mandado de injunção, que, em concreto, preecheria o vazio que resulta da decisão despida de sanção, que a decisão proferida na ação direta de incostitucionalidade por omissão (C.F., art. 103, § 2º). O que acontece é que o mandado de injunção complementa e completa a ação direta de inconstitucionalidade.

Com tais considerações, Senhor Presidente, entendo que a competência, no caso, é mesmo desta Corte Suprema, já que o órgão incumbido da elaboração da norma regulamentadora é o Congresso Nacional (C.F., art. 102, I, ‘q’).

Prosseguindo no julgamento, faço o que, segundo penso, a Constituição quer que eu faça: para o caso concreto elaboro a norma a ser observada, nos seguintes termos: o aviso prévio será de dez dias por ano de serviço ou fração superior a seis meses, observando o mínimo de trinta dias (C.F., art. 7º, XXI).

Assim votei, Senhor Presidente, por ocasião do julgamento do MI n.º 369-DF.

Obtida a norma – e é isto o que o impetrante procura obter no mandado de injunção – retornam os autos ao Juízo Trabalhista, onde prosseguirá a reclamação trabalhistas já ajuizada. No Juízo Trabalhista, o reclamante comprovará os dados fáticos que comporão a relação fatos-norma objetiva, vale dizer, os fatos sobre os quais a norma obtida incidirá. Dessa incidência, poderá surgir o direito subjetivo perseguido, sendo tal desição do Juízo Trabalhista.

Reporto-me, também no ponto, ao voto que proferi no citado MI 369-DF.

Neste termos, julgo procedente a ação de mandado de injunção."

Aqui, neste mandado de injunção, quer o autor viabilizar o exercício do seu direito, conferido pela Constituição, no art. 192, § 3º, de pagar os juros reias de 12% ao ano. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADIn n.º 4-DF, decidiu que o § 3º do art. 192 não é auto-aplicável, já que demanda normatização ulterior, demanda norma infraconstitucional regulamentadora. Não comungo desse entendimento, data venia. No citado julgamento, fiquei vencido, na companhia honrosa dos Ministros Paulo Brossard, Néri da Silveira e Marco Aurélio. Estou, entretanto, diante de uma realidade; o Supremo Tribunal Federal decidiu, na citada ADIn 4-DF, que o exercício do direito inscrito no § 3º do art. 192 da Cosntituição está inviabilizado em razão da inexistência da norma infraconstitucional regulamentadora. A hipótese comporta, portanto, o mandado de injunção, cabendo ao Supremo Tribunal, julgando-o procedente, elaborar a norma para o caso concreto.

O Sr. Ministro Ilmar Galvão, no seu voto, formulou a norma para o caso concreto:

"...

Obtida a norma – reporto-me aos votos que proferi nos MMII 95-RR, 124-SP e 369 – o impetrante irá ao juízo comum, onde, na ação própria, pedirá a citação do credor. No Juízo comum haverám, então, o aperfeiçoamento da relação fato-norma. Lá, no juízo comum, na ação adequada, o impetrante provará, se for o caso, os fatos sobre os quais incidirá a norma aqui obtida.

Com essa considerações, peço vênia ao Sr. Ministro Relator para, acompanhando o voto do Sr. Ministro Ilmar Galvão, deferir o mandado de injunção."

Fixo, Sr. Presidente, para o caso sob julgamento, assim para o caso concreto, a seguinte norma:...

Com essas considerações, com a vênia dos eminentes Colegas que não pensam desta forma, defiro o mandado de injunção."

Conforme se depreende das transcrições acima, há entendimentos no sentido de se conferir ao Mandado de Injunção o seu verdadeiro objetivo, qual seja, o de decidir os casos concretos trazidos ao Poder Judiciário, conferindo-se a todo impetrante a efetivação de seu direito inviabilizado diante da inexistência de norma regulamentadora.

De notável expressão o entendimento do Ministro Ilmar Galvão, que descreve, com perfeição e clareza, o objetivo do novel instituto do Mandado de Injunção, além de explicitar como o Judiciário poderia resolver os casos concretos trazidos à sua apreciação. No MI 448-RS, assim ficou consignado, in verbis:

"Sr. Presidente, sem pretender alimentar a polêmica que sempre se renova nesta Corte toda vez que se põe em mesa um mandado de injunção, mas apenas para deixar registrada a minha posição sobre o assunto, esclareço que não vejo óbice a que se elabore, de pronto, nesta assentada, a norma para o caso concreto dos impetrantes, os quais embora portadores de deficiência, se encontram impossobilitados de exercer o direito ao benefício previdenciário de um salário mínimo, previsto no art. 203, V, da Constituição, em razão de manisfesta mora do legislador.

A meu ver, esse o objetivo do novel instituto. Não passa ele de uma autorização constitucional no sentido de que o Supremo Tribunal Federal decida tais casos por equidade, isto é, como legislador, para o caso concreto, postura que não constituiria novidade do Direito Brasileiro, onde, não raro, o juiz é autorizado a fazê-lo.

Com efeito, no art. 127 do CPC está dito: "O juiz só decidirá por equidade nos casos previstos em lei", valendo dizer que haverá hipóteses de autorizações da espécie.

No art. 1.109, do mesmo Código, está ainda previsto que o juiz decidirá o pedido no prazo de 10 dias, não sendo, entretanto ‘obrigado a observar critérios de legalidade escrita, podendo adotar em cada a solução que reputar mais conveniente ou oportuna." É mais um exemplo de integração do sistema por meio da equidade (elaboração, pelo juiz, da norma aplicável ao caso concreto), a demonstrar que o instrumento não constituí, realmente, nenhuma novidade entre nós.

Reconheço que o Supremo Tribunal Federal ficaria ainda mais assoberbado de trabalho se adotasse essa orientação, revelando que foi temerário o constituinte ao introduzir em nosso sistema jurídico o mandado de injunção. Todavia, já que o fez, como julgador, não poderia deixar de dar-lhe a devida consequência."

(destacamos)

Conforme bem esposado, se o legislador constituinte introduziu este instituto no ordenamento jurídico brasileiro, foi com um único e exclusivo objetivo: efetivar o direito daquele que dele não pode usufruir ou gozar em virtude da sua inviabilidade decorrente da ausência de norma regulamentadora de seu direito garantido pela própria Constituição, tornando-o EFICAZ e EXERCITÁVEL. Se não fosse esse o objetivo, não haveria necessidade de se Ter os institutos da ação de inconstitucionalidade por omissão e do mandado de injunção. Bastaria que existisse, apenas, a ação prevista no art. 103, § 2º, da Carta Magna. Aí reside a força do Mandado de Injunção: reconhecido, pelo juiz ou tribunal, que o direito que a Constituição concede é ineficaz ou inviável, em consequência da ausência de norma infra constitucional regulamentadora, fará ele, juiz ou tribunal, por força do próprio mandado de injunção, a integração do direito à ordem jurídica, tornando-o, assim, eficaz e exercitável.

Sendo assim, o Município de João Pessoa, diante da flagrante impossibilidade de efetivar seu direito constitucionalmente garantido no art. 201, § 9º (Emenda n. 20, de 15/12/98), por ausência de norma regulamentadora, espera que, acaso interponha o mandado de injunção na defesa dos seus direitos aqui esposados aufira o êxito essencial a manutenção da sua assistência previdenciária, determinando-se ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS que proceda ao repasse da verba correspondente aos serviços municipais que averbaram tempo de serviço do Regime Geral da Previdência Social junto ao Município de João Pessoa - PB, com efetivação do direito constitucional da compensação financeira, previsto no art. 201, § 9º, da CF/88. Como também, que o INSS, proceda ao repasse da verba correspondente a todo e qualquer servidor municipal que averbar tempo de serviço do Regime Geral da Previdência Social, sempre que o Município de João Pessoa comprovar a averbação e solicitar o repasse da verba respectiva.

          Posteriormente à elaboração deste artigo, entrou em vigor a Lei 9796, de 5 de maio de 1999, dispondo sobre a compensação entre o regime de Previdência geral e os dos entes federados, abaixo transcrita:

          LEI No 9.796, DE 5 DE MAIO DE 1999.

          Dispõe sobre a compensação financeira entre o Regime Geral de Previdência Social e os regimes de previdência dos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, nos casos de contagem recíproca de tempo de contribuição para efeito de aposentadoria, e dá outras providências.

          O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

          Art. 1o A compensação financeira entre o Regime Geral de Previdência Social e os regimes próprios de previdência social dos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, na hipótese de contagem recíproca de tempos de contribuição, obedecerá às disposições desta Lei.

          Art. 2o Para os efeitos desta Lei, considera-se:

          I - regime de origem: o regime previdenciário ao qual o segurado ou servidor público esteve vinculado sem que dele receba aposentadoria ou tenha gerado pensão para seus dependentes;

          II - regime instituidor: o regime previdenciário responsável pela concessão e pagamento de benefício de aposentadoria ou pensão dela decorrente a segurado ou servidor público ou a seus dependentes com cômputo de tempo de contribuição no âmbito do regime de origem.

          § 1o Os regimes próprios de previdência de servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios só serão considerados regimes de origem quando o Regime Geral de Previdência Social for o regime instituidor.

          § 2o Na hipótese de o regime próprio de previdência de servidor público não possuir personalidade jurídica própria, atribuem-se ao respectivo ente federado as obrigações e direitos previstos nesta Lei.

          Art. 3o O Regime Geral de Previdência Social, como regime instituidor, tem direito de receber de cada regime de origem compensação financeira, observado o disposto neste artigo.

          § 1o O Regime Geral de Previdência Social deve apresentar a cada regime de origem os seguintes dados referentes a cada benefício concedido com cômputo de tempo de contribuição no âmbito daquele regime de origem:

          I - identificação do segurado e, se for o caso, de seu dependente;

          II - a renda mensal inicial e a data de início do benefício;

          III - o percentual do tempo de serviço total do segurado correspondente ao tempo de contribuição no âmbito daquele regime de origem.

          § 2o Cada regime de origem deve pagar ao Regime Geral de Previdência Social, para cada mês de competência do benefício, o valor resultante da multiplicação da renda mensal do benefício pelo percentual obtido na forma do inciso III do parágrafo anterior.

          § 3o A compensação financeira referente a cada benefício não poderá exceder o resultado da multiplicação do percentual obtido na forma do inciso III do § 1o deste artigo pela renda mensal do maior benefício da mesma espécie pago diretamente pelo regime de origem.

          § 4o Para fins do disposto no parágrafo anterior, o regime de origem deve informar ao Regime Geral de Previdência Social, na forma do regulamento, a maior renda mensal de cada espécie de benefício por ele pago diretamente.

          § 5o O valor de que trata o § 2o deste artigo será reajustado nas mesmas datas e pelos mesmos índices de reajustamento do benefício pela Previdência Social, devendo o Regime Geral de Previdência Social comunicar a cada regime de origem o total por ele devido em cada mês como compensação financeira.

          Art. 4o Cada regime próprio de previdência de servidor público tem direito, como regime instituidor, de receber do Regime Geral de Previdência Social, enquanto regime de origem, compensação financeira, observado o disposto neste artigo.

          § 1o O regime instituidor deve apresentar ao Regime Geral de Previdência Social, além das normas que o regem, os seguintes dados referentes a cada benefício concedido com cômputo de tempo de contribuição no âmbito do Regime Geral de Previdência Social:

          I - identificação do servidor público e, se for o caso, de seu dependente;

          II - o valor dos proventos da aposentadoria ou pensão dela decorrente e a data de início do benefício;

          III - o tempo de serviço total do servidor e o correspondente ao tempo de contribuição ao Regime Geral de Previdência Social.

          § 2o Com base nas informações referidas no parágrafo anterior, o Regime Geral de Previdência Social calculará qual seria a renda mensal inicial daquele benefício segundo as normas do Regime Geral de Previdência Social.

          § 3o A compensação financeira devida pelo Regime Geral de Previdência Social, relativa ao primeiro mês de competência do benefício, será calculada com base no valor do benefício pago pelo regime instituidor ou na renda mensal do benefício calculada na forma do parágrafo anterior, o que for menor.

          § 4o O valor da compensação financeira mencionada no parágrafo anterior corresponde à multiplicação do montante ali especificado pelo percentual correspondente ao tempo de contribuição ao Regime Geral de Previdência Social no tempo de serviço total do servidor público.

          § 5o O valor da compensação financeira devida pelo Regime Geral de Previdência Social será reajustado nas mesmas datas e pelos mesmos índices de reajustamento dos benefícios da Previdência Social, mesmo que tenha prevalecido, no primeiro mês, o valor do benefício pago pelo regime instituidor.

          Art. 5o Os regimes instituidores apresentarão aos regimes de origem, no prazo máximo de dezoito meses a contar da data da entrada em vigor desta Lei, os dados relativos aos benefícios em manutenção nessa data, concedidos a partir da promulgação da Constituição Federal.

          Parágrafo único. A compensação financeira em atraso relativa aos benefícios de que trata este artigo será calculada multiplicando-se a renda mensal obtida para o último mês, de acordo com o procedimento determinado nos arts. 3o e 4o, pelo número de meses em que o benefício foi pago até então.

          Art. 6o O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS manterá cadastro atualizado de todos os benefícios objeto de compensação financeira, totalizando o quanto deve para cada regime próprio de previdência dos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como o montante devido por cada um deles para o Regime Geral de Previdência Social, como compensação financeira e pelo não recolhimento de contribuições previdenciárias no prazo legal.

          § 1o Os desembolsos pelos regimes de origem só serão feitos para os regimes instituidores que se mostrem credores no cômputo da compensação financeira devida de lado a lado e dos débitos pelo não recolhimento de contribuições previdenciárias no prazo legal.

          § 2o O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS comunicará o total a ser desembolsado por cada regime de origem até o dia trinta de cada mês, devendo os desembolsos ser feitos até o quinto dia útil do mês subseqüente.

          § 3o Os valores não desembolsados em virtude do disposto no § 1º deste artigo serão contabilizados como pagamentos efetivos, devendo o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS registrar mensalmente essas operações e informar a cada regime próprio de previdência de servidor público os valores a ele referentes.

          § 4o Sendo inviável financeiramente para um regime de origem desembolsar de imediato os valores relativos à compensação financeira, em função dos valores em atraso a que se refere o parágrafo único do artigo anterior, podem os regimes de origem e instituidor firmar termo de parcelamento dos desembolsos atualizando-se os valores devidos nas mesmas datas e pelos mesmos índices de reajustamento dos benefícios de prestação continuada da Previdência Social.

          Art. 7o Os regimes instituidores devem comunicar de imediato aos regimes de origem qualquer revisão no valor do benefício objeto de compensação financeira ou sua extinção total ou parcial, cabendo ao Instituto Nacional do Seguro Social - INSS registrar as alterações no cadastro a que se refere o artigo anterior.

          Parágrafo único. Constatado o não cumprimento do disposto neste artigo, as parcelas pagas indevidamente pelo regime de origem serão registradas em dobro, no mês seguinte ao da constatação, como débito daquele regime.

          Art. 8o Na hipótese de descumprimento do prazo de desembolso estipulado no § 2º do art. 6º, aplicar-se-ão as mesmas normas em vigor para atualização dos valores dos recolhimentos em atraso de contribuições previdenciárias arrecadadas pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.

          Parágrafo único. Na hipótese de o regime previdenciário próprio dos servidores da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios possuir personalidade jurídica própria, os respectivos entes federados respondem solidariamente pelas obrigações previstas nesta Lei.

          Art. 9o O Poder Executivo regulamentará esta Lei no prazo de sessenta dias contado da data de sua publicação.

          Art. 10. Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

          Brasília, 5 de maio de 1999; 178o da Independência e 111o da República.


NOTAS

(1) Roque Antônio Carrazza. Curso de Direito Constitucional Tributário. Malheiros. 1993.p.80/81

(2) Ob.cit.p.81.

(3) "Competências Municipais", in Estudos de Direito Público – Revista da Associação dos Advogados da Prefeitura do Município de São Paulo, 1983, n.4, p.7.

(4) Príncipio Federal – rigidez constitucional e Poder Judiciário, in Estudos e Pareceres de direito Tributário, v. 3, São Paulo, Ed. RT, 1980, pp.9 e 10.

(5) Da responsabilidade civil.,vol.II, Forense, 1994, p.717.

(6) Fischer, in José Aguiar Dias, ob.cit. p. 717.

(7) Idem.

(8) Ob.cit.in Curso de Direito Civil Brasileiro. Maria Helena Diniz, 2º vol., pag.250.

(9) Idem, p. 251 (citação de Maria Helena Diniz à obra "Compensação" de Àlvaro Villaça Azevedo).

(10) Curso de Direito Civil Brasileiro, Saraiva, 2º vol., 1995, p. 251.

(11) Direito Civil, vol. II, Ed. Max Limonad, p. 267.

(12) Instituições de Direito Civil, vol. II, Forense, RJ, 1996, p.169


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

AQUINO, Carlos Pessoa de. Compensação financeira dos Municípios em face do art. 201, § 9º, CF. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 35, 1 out. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/1472. Acesso em: 19 abr. 2024.