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Análise do sistema de inclusão previdenciária instituído pela Lei Complementar nº 123/2006 e a exclusão da aposentação por tempo de contribuição à luz dos princípios da equidade na forma de custeio e da seletividade e distributividade na prestação de bene

Análise do sistema de inclusão previdenciária instituído pela Lei Complementar nº 123/2006 e a exclusão da aposentação por tempo de contribuição à luz dos princípios da equidade na forma de custeio e da seletividade e distributividade na prestação de bene

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RESUMO

A Previdência Social Brasileira tem como seu maior representante no sistema securitário o Regime Geral de Previdência Social – RGPS. Este regime apresenta cinco classes ou tipos de segurados obrigatórios: Empregado, Empregado Doméstico, Avulso, Contribuinte Individual e Segurado Especial, sendo os mesmos ligados a Previdência pelo Exercício de uma atividade remunerada. Há ainda a classe dos contribuintes facultativos, os quais não exercem atividade remunerada, entretanto contribuem para a Previdência Social com parcelas de rendas não oriunda do seu trabalho. Para cada tipo de contribuinte existe uma metodologia de contribuição, ou seja, a forma como tais segurados vertem cotizações para a previdência. Os contribuintes individuais e facultativos sempre tiveram uma sistemática contributiva diferente dos demais segurados, vertendo um percentual sobre o montante de rendimentos auferido durante o mês. Todavia a referida alíquota sempre fora considera elevada, ocasionando crescimento no número de trabalhadores informais. Para corrigir tal distorção no sistema contributivo dos segurados Contribuintes Individuas e Facultativos, a Lei Complementar n.º 123/2006 implantou um novo sistema de cotizações para tais segurados, reduzindo a alíquota e determinando sua aplicação sobre uma base fixa em atendimento aos parágrafos 12º e 13º do artigo n.º 201 da Constituição de 1988.

Palavras-chave: Previdência, Segurados, individual e facultativo.

SALES, Marciel Antonio de. Análise do sistema de inclusão previdenciária instituído pela Lei Complementar n. º 123/2006 e a exclusão da aposentação por tempo de contribuição à luz dos princípios da Equidade na forma de custeio e da Seletividade e Distributividade na prestação de benefícios. Pau dos Ferros, 2009, p. Monografia (Especialização em Direito Previdenciário), Universidade Gama Filho.

SUMÁRIO: 1.Introdução .2.Conceituação de previdência social . 3.Disposições constituições atinentes à Previdência Social . 3.1.- Noções Gerais . 3.2.- Princípios constitucionais . 3.2.1 - Universalidade da Cobertura e do Atendimento . 3.2.2 - Uniformidade e Equivalência dos Benefícios e Serviços às Populações Urbanas e Rurais.3.2.3 - Seletividade e Distributividade .3.2.4 - Irredutibilidade do Valor dos Benefícios .3.2.5 - Equidade na Forma de Participação no Custeio ..3.2.6 - Diversidade da Base de Financiamento .3.2.7 - Caráter Democrático e Descentralizado da Gestão Administrativa .3.2.8.- Preexistência do Custeio em Relação aos Benefícios ou Serviços .4.Regime Geral de Previdência Social .4.1.- Segurados Obrigatórios e Facultativos .4.2.- Contribuinte Individual e Facultativo .4.2.1 - Conceito e Classificação legal .4.3.- Sistema Contributivo e forma de arrecadação e recolhimento das contribuições.4.4.- Sistema de Inclusão instituído pela Lei Complementar n. º 123/2006 .4.4.1.- Aspectos Gerais .4.4.2 - O Sistema Contributivo diferenciado sob o enfoque do Principio da Equidade na Forma de Participação no Custeio .4.4.3.- A exclusão da Aposentação por Tempo de Contribuição à Luz do Principio da Seletividade e distributividade na prestação de benefícios .5.Conclusão .6.Bibliografia


1. Introdução

O direito previdenciário brasileiro sempre buscou por meio de instrumentos jurídicos alcançar o maior número de segurados possíveis, trazendo para o sistema securitário todos os que, direta ou indiretamente, estão expostos a riscos sociais. Com tal desiderato foram criadas normas que coercitivamente conduziam ao sistema previdenciário todos os que exercessem atividades remuneradas, ou seja, o trabalho foi erigido como o fato que filia o labutante à Previdência Social. Neste sentimento, temos o ensinamento do Professor Fábio Zambitte Ibhahim [01] em sua brilhante explanação sobre o tema:

Há algum tempo a inclusão previdenciária tem sido debatida no meio acadêmico, buscando-se formas de incentivo que venham a efetivar os mandamentos legais. Em verdade, toda pessoa que venha a exercer alguma atividade remunerada de natureza licita estará automaticamente filiada ao RGPS, salvo se participante, nesta condição, de RPPS.

O Sistema Previdenciário, por ser um sistema contributivo, exige dos trabalhadores a reversão de cotizações para ampará-los em situações de doença, invalidez, morte, idade avançada, desemprego, proteção à maternidade e outros riscos, conforme prescreve a Constituição Federal de 1988, oriundos diretamente do trabalho ou não.

A compulsoriedade não tem sido suficiente para equacionar o problema do grande número de trabalhadores que atuam na informalidade e que não contribuem para o sistema securitário, todavia, inevitavelmente, irão ser surpreendidos por algum ou alguns dos riscos elencados acima e, como não verteram cotizações para o sistema não poderão pelo mesmo ser amparados, conforme tem nos ensinado o Professor Fabio Zambitte [02]:

...a prática tem sido algo distante da norma legal. A maioria dos trabalhadores autônomos, legalmente definidos como segurados contribuintes individuais, não contribuem, em flagrante desrespeito aos preceitos legais e, o que é pior, gerando uma sobrecarga gigantesca na assistência social, pois tais pessoas serão excluídas da previdência social e poderão somente obter benefícios, na condição de necessitados.

Neste comenos, a Constituição Federal em seu artigo 201, §§ 12 e 13 prescreveu a criação, por meio de Lei Complementar, a criação de um Sistema especial de Inclusão Previdenciária para trabalhadores de baixa renda, o qual, dentre outros fatores, asseguraria alíquotas contributivas e carências previdenciárias reduzidas em relação aos demais segurados do Regime Geral de Previdência Social.

A Lei Complementar n.º 123 de 14 de dezembro de 2006, que instituiu o Estatuto Nacional da Microempresa e Empresa de Pequeno Porte, Lei do SIMPLES NACIONAL, regulamentou, por meio do acréscimo dos §§ 2º e 3º ao artigo 21 da Lei n.º 8.212/91 (Lei de Custeio Previdenciário), a disposição constitucional acima aludida, estipulando para os segurados Contribuintes Individuais e Facultativos a opção dos mesmos contribuírem por meio de uma alíquota de 11% (onze por cento) sobre a base de cálculo mínima, ou seja, um salário mínimo, abrindo mão do direito de aposentação por tempo de contribuição.

A análise deste Sistema Simplificado de Previdência Social à luz dos princípios constitucionais previdenciários da Equidade na forma de custeio e da Seletividade e Distributividade na prestação de benefícios revela a intenção do legislador ao estatuir um método, por meio da redução de aliquotas e fixação de base de cálculo, que busca trazer a formalidade securitária o maior o grupo de contribuintes obrigatórios da Previdência Social responsáveis pelas suas próprias cotizações, os Contribuintes Individuais, alcançando os segurados facultativos, entretanto, restringindo a estes o direito à aposentação por tempo de contribuição.


2. Conceituação de previdência social.

Pode ser entendida como um conjunto de normas de proteção e defesa do trabalhador a determinados riscos como a velhice, a invalidez, a doença e o desemprego, entre outros, mediante aposentadoria, pensão a seus dependentes, amparo nas doenças etc. Constitui assim a previdência social uma forma de cobertura de sinistros, que nada mais são do que a verificação de riscos, com o que se tem a dos prejuízos naturalmente advindos dos mencionados acontecimentos que independem da vontade humana.

Mozart Victor Russomano assim a define:

"Consiste na captação de meios e na adoção de métodos para enfrentar certos riscos (invalidez, velhice, acidente etc.) que ameaçam a segurança da vida humana e que são inevitáveis, por sua própria natureza, em toda a sociedade, por melhor organizada que seja." [03]

Tal definição compatibiliza-se com a postulada por Ivan Kertzman: [04]

Neste diapasão, Octávio Bueno Magano entende que:

"Previdência Social é o resultado da sistematização dos seguros sociais, mas abrange também as medidas assistenciais realizadas pelas instituições seguradoras, visando ao bem-estar dos seus segurados. (...) Pode ser definida, em conseqüência, como a instituição que congrega e sistematiza os seguros sociais e concede assistência aos respectivos segurados". [05]

Por fim, convém trazer à colação o entendimento de Wladimir Novaes Martinez [06], para quem a previdência social pode ser conceituada, sob o prisma de sua finalidade:

"Como a técnica de proteção social que visa propiciar os meios indispensáveis à subsistência da pessoa humana – quando esta não pode obtê-los ou não é socialmente desejável que os aufira pessoalmente através do trabalho, por motivo de maternidade, nascimento, incapacidade, invalidez, desemprego, prisão, idade avançada, tempo de serviço ou morte –, mediante contribuição compulsória distinta, proveniente da sociedade e de cada um dos participantes."


3. Disposições constituições atinentes à Previdência Social

3.1 - Noções Gerais [07]

No que concerne à Constituição da República de 1988, carta que novamente reconduziu o país ao regime democrático, certo é que o respectivo legislador constituinte não se revelou nada acanhado na estatuição sobre o tema referente à proteção social, porquanto ao mesmo reservou todo o Capítulo II do Título VIII – "Da Ordem Social", para tratar da Seguridade Social; isso sem prejuízo da existência de disposições esparsas contidas ao longo do Texto Constitucional.

Vê-se que no primeiro artigo do referido capítulo é fornecido o alcance constitucional da Seguridade Social, ficando assente que compreende "um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social" (art. 194). Destarte, fica claro que, ex vi constitutiones, Seguridade Social abarca os segmentos de proteção social respeitantes à saúde, à previdência e à assistência social.

Além de delimitar o alcance da seguridade social, houve por bem o referido constituinte também elencar, no parágrafo único do artigo 194, os princípios desse instituto, quais sejam: universalidade da cobertura e do atendimento (inc. I); uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais (inc. II); seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços (inc. III); irredutibilidade do valor dos benefícios (inc. IV); eqüidade na forma de participação do custeio (inc. V); diversidade da base de financiamento (inc. VI) e caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com participação da comunidade, em especial dos trabalhadores, empresários e aposentados (inc. VII).

No artigo 195, caput e incisos, vem assinalada a compulsoriedade do financiamento da seguridade social por toda a sociedade, de forma direta ou indireta, mediante recursos provenientes dos orçamentos das pessoas políticas (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), assim como mediante contribuições dos empregadores (incidentes sobre a folha de salários, o faturamento e o lucro) e dos trabalhadores, além de receitas oriundas de concursos de prognósticos. Anote-se, por oportuno, que, no parágrafo quarto desse mesmo artigo, também restou prevista a hipótese de instituição por lei de outras fontes destinadas a garantir a manutenção e a expansão da seguridade social. Além disso, o constituinte de 1988, objetivando preservar a arrecadação da seguridade social, estabeleceu a vedação de pessoa jurídica em débito com esse sistema contratar com o Poder Público, bem como dele receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios.

O constituinte de 1988 firmou, no artigo 195, § 5º, da lei Magna que "nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total". Tal disposição pretende impedir o legislador ordinário de instituir benefícios ou serviços sem o necessário, total e prévio aporte financeiro, ou, por outra, a correspondente fonte de custeio. Trata-se, pois, de norma com clara preocupação de natureza atuária, haja vista que essa última consiste em técnica relacionada com a teoria e o cálculo de seguros numa coletividade.

Ainda de par com essas disposições gerais sobre a seguridade social, cuida a Carta Política vigente da saúde em seus artigos 196 a 200, da previdência em seus artigos 201 e 202 e da assistência social em seus artigos 203 e 204.

No que tange especificamente à previdência, objeto deste trabalho, fica estabelecido na Constituição de 1988 que os "planos de previdência social", nos termos da lei, atenderão às seguintes contingências:

"I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte, incluídos os resultantes de acidente do trabalho, velhice e reclusão; II – ajuda à manutenção dos dependentes dos segurados de baixa renda; III – proteção à maternidade, especialmente à gestante; IV – proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; V – pensão por morte de segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes (...)".

Já nos parágrafos 7º e 8º do artigo 201, há previsão expressa à previdência complementar privada, cuja fiscalização e autorização para funcionamento, conforme o preceituado nos artigos 21, VIII, e 192, II, compete à União.

Por sua vez, a aposentadoria é assegurada no artigo 202, obedecidas as seguintes condições:

"I – aos sessenta e cinco anos de idade, para o homem, e aos sessenta, para a mulher, reduzido em cinco anos o limite de idade para os trabalhadores rurais de ambos os sexos e para os que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, nestes incluídos o produtor rural, o garimpeiro e o pescador artesanal; II – após trinta e cinco anos de trabalho, ao homem, e, após trinta, à mulher, ou em tempo inferior, se sujeitos a trabalho sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidas em lei; após trinta anos, ao professor, e após vinte e cinco, à professora, por efetivo exercício de função de magistério."

Ainda prevê o parágrafo único do mesmo artigo que é facultada aposentadoria proporcional, após trinta anos de trabalho, ao homem, e após vinte e cinco anos, à mulher.

No tocante à competência para legislar sobre a seguridade social, vem ela insculpida no artigo 22 da Carta Magna, que lhe comete privativamente à União. Já no que se refere à previdência social, o artigo 24 do Texto Maior a arrola dentre as matérias que se submetem à competência legislativa concorrente existente entre a União, Estados e Distrito Federal, cumprindo ao primeiro ente federado apenas o estabelecimento de normas gerais, com o advento destas não excluindo a competência suplementar das demais pessoas políticas.

Por último, todavia não menos importante, com relação à proteção social aos funcionários públicos, que já de há muito é tratada em sede distinta daquela destinada aos demais trabalhadores nas ordens constitucionais precedentes, vem ela traçada no artigo 40 da Constituição Federal. Nesse dispositivo é assegurada aposentadoria por invalidez permanente (inc. I); compulsória, aos setenta anos de idade, com proventos proporcionais ao tempo de serviço (inc. II); voluntária, sendo que esta poderá se verificar: a) aos trinta e cinco anos de serviço, se homem, e aos trinta, se mulher, com proventos integrais; b) aos trinta anos de efetivo exercício em funções de magistério, se professor, e vinte e cinco, se professora, com proventos integrais; c) aos trinta anos de serviço, se homem, e aos vinte e cinco, se mulher, com proventos proporcionais a esse tempo; d) aos sessenta e cinco anos de idade, se homem, e aos sessenta, se mulher, com proventos proporcionais ao tempo de serviço. Além da aposentadoria, também é garantido o benefício de pensão por morte, que corresponderá à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido (art. 40, § 5º). Quanto ao custeio da previdência do funcionário público, dispôs a Carta Magna, aludindo especificamente ao servidor federal, que os respectivos benefícios serão custeados com recursos provenientes da União e das contribuições dos servidores, diretiva essa que, de acordo com o princípio da simetria, também vale para os sistemas de previdência dos funcionários públicos estaduais, municipais e do Distrito Federal. Aliás, há preceptivo contendo disposição teleologicamente semelhante com relação a esses últimos servidores; trata-se do parágrafo único do artigo 149, que é assim redigido:

"Os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão instituir contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, de sistemas de previdência e assistência social". [08]

3.2 Princípios Constitucionais

3.2.1 - Universalidade da Cobertura e do Atendimento

Universalidade implica ampla proteção. A Seguridade Social deve dar proteção de cobertura e de atendimento em atendimento ao que determina a Constituição de 1988, cobrindo todos os eventos que causem estado de necessidade, tais como, idade avançada, morte, invalidez, deficiência física, maternidade etc.

Por este principio, então, cabe à Seguridade Social atender a todas as pessoas necessitadas e cobrir todas as contingências sociais, como afirma o Professor Fabio Zambitte Ibhahim: "qualquer pessoa pode participar da proteção social patrocinada pelo Estado [09] (...)".

Pelo caráter securitário da Previdência Social, o princípio da universalidade se dá pelo fato de o legislador não poder impedir o acesso das pessoas que queiram participar do plano previdenciário mediante contribuição. Assim, garante-se a universalidade na Previdência Social com a possibilidade de qualquer membro da comunidade poder participar dos planos previdenciários, desde que contribua para esse plano. Aqueles que exercem atividade remunerada já estão automaticamente filiados à Previdência Social, e aquelas pessoas que não trabalham, mas têm a intenção de participar da proteção previdenciária poderão participar mediante contribuição. O que não pode é na seara previdenciária benefícios previdenciários serem concedidos para quem não é segurado.

3.2.2 - Uniformidade e Equivalência dos Benefícios e Serviços às Populações Urbanas e Rurais

As prestações securitárias devem ser iguais para trabalhadores urbanos e rurais, posto que a Constituição de 1988, em seu art. 7º, prevê a uniformidade no tratamento dos direitos trabalhistas entre trabalhadores urbanos e rurais.

Até o advento da Lei n.º 8.213/91, havia dois regimes de previdência no âmbito privado no Brasil, quais sejam, o Regime de Previdência Urbano (RPU) e o Regime de Previdência Rural (RPR). No segundo, não existia a previsão de concessão de todos os benefícios da Previdência, diversamente do que ocorria no RPU. A Cata de 1988 buscou acabar com a diferença de tratamento que ocorria entre o urbano e o rural. A uniformidade está relacionada aos mesmos benefícios e serviços, às mesmas proteções, ou seja, o que é concedido ao trabalhador urbano é concedido ao rural.

A equivalência diz respeito ao valor, isto é, os trabalhadores urbanos devem ter os benefícios no mesmo valor dos benefícios concedidos ao trabalhador rural todavia a idéia de "mesmo valor" significa que os benefícios serão calculados da mesma forma e não que todos os benefícios concedidos aos urbanos e rurais terão o mesmo valor.

Esse princípio é mitigado quando se trata do segurado especial já que este tem direito ao benefício no valor de um salário mínimo e não terá direito a todos os benefícios da Previdência Social, porém, tal diferenciação está prevista na própria Constituição, em seu art. 195, parágrafo 8º, oriundo do Poder Constituinte Originário.

3.2.3 - Seletividade e Distributividade

A universalidade tem como desiderato atender a todos os fatos geradores de necessidades sociais, os quais devem ser cobertos, logo, todas as pessoas que se encontrem em estado de necessidade devem ser atendidas pela Seguridade Social. Entretanto, a capacidade econômica do Estado limita essa universalidade de atendimento e de cobertura visto que as necessidades são sempre maiores e renováveis do que as condições econômicas do País para contingenciar todas essas necessidades. Isto posto, deve-se otimizar os poucos recursos existentes, selecionando e distribuindo melhor as prestações.

Seletividade diz respeito à escolha das prestações que serão dispostas e dos riscos que serão cobertos em razão da disponibilidade econômico-financeira do sistema de seguridade social.

Com relação à distributividade, refere-se às pessoas que deverão ser protegidas prioritariamente pela Seguridade Social. O princípio da distributividade, inserido na ordem social, é de ser interpretado em seu sentido de distribuição de renda e bem-estar, ou seja, pela concessão de benefícios e serviços visa-se ao bem-estar e à justiça social.

Na seletividade, ocorre a escolha das prestações que melhor atendam aos objetivos da Seguridade Social ao passo que, na distributividade, há a preocupação de se estar atendendo, prioritariamente, aqueles indivíduos que estão em maior estado de necessidade.

A universalidade é mitigada pelo princípio da seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços. Só faz sentido falar em seletividade e distributividade se estiver presente a questão da limitada capacidade econômica para fazer face às contingências sociais que devem ser atendidas pela Seguridade Social.

3.2.4 - Irredutibilidade do Valor dos Benefícios

A essência deste princípio reside na preservação do poder aquisitivo do beneficio. Em face de se tratar de prestação de caráter alimentar, não seria razoável que aquele que por toda uma vida de trabalhos tivesse o seu poder de compra suplantado, especialmente quando não dispõe de outras fontes de renda para complementar o valor do beneficio previdenciário a fim de custear a sua subsistência. Isto posto, o Constituinte de 1988 assegurou, por meio de norma expressa e originária, o reajustamento dos benefícios para lhes preservar o seu valor real (art. 201, § 4º).

3.2.5 - Equidade na Forma de Participação no Custeio

A fim de se definir a participação no custeio da seguridade social, levar-se-á em conta a capacidade de contributiva de cada contribuinte. As contribuições sociais devem ser criadas, atentando-se para este principio. Visa este princípio, desta forma, implementar os princípios da igualdade – tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais na medida de sua desigualdade (artigo 5º, caput, da CF/88) e o da capacidade contributiva (artigo 145, parágrafo 1º, da CF/88). Assim, cada pessoa deve contribuir na medida de suas possibilidades, ou seja, quem tem maior capacidade econômica deve contribuir com mais.

Conforme ensina-nos o Professor Ivan kertzman [10], "Equidade, em bem apertada síntese, significa justiça o caso concreto. Logo, deve-se cobrar mais contribuições de quem tem maior capacidade de pagamento para que se possa beneficiar os que não possuem as mesmas condições".

O princípio da efetividade ou da suficiência afirma que a proteção da Seguridade Social não deve ser qualquer proteção, deve ser essa proteção suficiente de tal maneira que se possa debelar o estado de necessidade.

3.2.6 - Diversidade da Base de Financiamento

Este princípio tem por objetivo diversificar as fontes de recursos que financiarão a seguridade social. Para tanto, a Constituição de 1988 previu várias fontes que geradoras da obrigação de pagar contribuições sociais (salário, faturamento, lucro, folha de salários, renda de espetáculos esportivos, concursos de prognósticos, resultado da comercialização da produção rural etc).

Neste comenos, vale citar Keelly Hubach [11]:

O artigo 195 da Constituição Federal é um bom exemplo disso quando dispõe que a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, mediante recursos orçamentários e por meio das contribuições sociais, incidentes sobre a remuneração dos trabalhadores; a receita ou o faturamento; e o lucro das empresas; sobre a receita dos concursos de prognósticos; etc.

3.2.7 - Caráter Democrático e Descentralizado da Gestão Administrativa

O legislador constituinte estabeleceu o caráter democrático e descentralizado da administração mediante gestão quadripartite por meio de representantes:

a) do Governo: responsável direto pela administração do sistema;

b) Trabalhadores: os quais têm interesse em sólido e sustentável, para dele, futuramente, se beneficiar;

c) Empregadores: vertem boa parte dos recursos que compõem o orçamento da seguridade social, tendo, deste modo, interesse em saber em quer tais recursos estão sendo aplicados;

d) Aposentados: estes têm interesses em manter o sistema sólido e perene, pois é este que os mantém.

3.2.8 - Preexistência do Custeio em Relação aos Benefícios ou Serviços

Este princípio visa ao equilíbrio atuarial e financeiro do sistema securitário. Está alocado no artigo 195, parágrafo 5º, da Constituição Federal determinando como valor essencial a estabilidade financeiro-econômica da Seguridade Social.

Por esse princípio, busca-se tornar a Seguridade Social financeiramente equilibrada, na medida em que orienta a ação do legislador no sentido de que a toda despesa criada deve corresponder uma receita respectiva para fazer face ao gasto instituído.

Para a criação ou extensão de determinado benefício ou serviço da Seguridade social, é mister que exista previamente a correspondente fonte de custeio total, sob pena de inconstitucionalidade da lei ordinária. Em resumo: o benefício ou serviço não poderá ser criado sem que antes haja ingressado a receita correspondente, ou seja, definida a sua fonte de custeio total.


4. Regime Geral de Previdência Social.

O Regime Geral de Previdência Social – RGPS é o previsto na Lei n.º 8.213/91, especificamente em seu artigo 9º. Em nível constitucional a Previdência Social, vêm os seus contornos basilares delineados nos artigos 194, 195, 201 e 202 da Constituição, sendo os mesmos dispositivos normatizadores e norteadores do Regime Geral de Previdência Social.

Como visto alhures, no plano infraconstitucional, o Regime Geral de Previdência Social encontra atualmente a sua disciplina básica nas já citadas Leis nºs 8.212 e 8.213, ambas de 24 de julho de 1991, sendo que a primeira, denominada Lei Orgânica da Seguridade Social, dispõe sobre a organização da seguridade social e institui plano de custeio, enquanto a segunda versa sobre os planos de benefícios da previdência social. Ditas normas legais, aliás, nada mais constituem que mero cumprimento ao disposto nos artigos 58 e 59 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, uma vez que nesses artigos existe determinação, dirigida ao Executivo federal, no sentido de que apresentasse ao Congresso Nacional, no prazo máximo de seis meses a contar da promulgação da Carta Constitucional de 1988, projetos de lei relativos à organização da seguridade social e aos planos de custeio e de benefícios.

Acerca deste regime convém aclarar que se caracteriza por ser: a) universal, ou seja, destinado a todos os trabalhadores que não possuírem regime próprio de previdência (como, por exemplo, é o caso dos funcionários públicos não-integrados em regime próprio); b) básico, uma vez que busca oferecer o mínimo indispensável para a manutenção daqueles que dele dependam; c) obrigatório, já que compulsório, e d) administrado pelo Estado, haja vista que, como já referido, é gerido pelo INSS – Instituto Nacional do Seguro Social, uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Previdência Social.

Neste sentido está o ensinamento do Professor Fábio Zambitte Ibhahim [12]: "O RGPS é o regime básico de previdência social, sendo de aplicabilidade compulsória a todos aqueles que exercem algum tipo de atividade remunerada, exceto se esta atividade já gera filiação a determinado regime próprio de previdência".

4.1 - Segurados Obrigatórios e Facultativos

Os trabalhadores brasileiros contribuem mensalmente para a Previdência Social, logo, nesta condição, são chamados de segurados e tem direito aos benefícios e serviços oferecidos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), como a aposentadoria, a pensão por morte, o salário-maternidade, o auxílio-doença, entre outras.

Existem seis modalidades de segurados: Empregados, Empregados Domésticos, Avulsos, Contribuintes Individuais e o Segurado Especial, os quais são qualificados como segurados obrigatórios, posto que, conforme determina o § 2º do artigo 43 da Lei n.º 8.212/91 na redação dada pela Lei n.º 11.941/09, o fato gerador da contribuição previdenciária é o trabalho.

Na categoria dos empregados estão todos os trabalhadores que têm carteira assinada e que prestam serviço constante na empresa e recebem salário. Já os empregados domésticos são os trabalhadores com carteira assinada e prestam seu serviço no âmbito residencial e tem como empregador uma pessoa física ou a entidade familiar, que não desenvolva atividade lucrativa. Nessa categoria estão os domésticos, governantas, jardineiro, caseiro etc.

Os trabalhadores avulsos são aqueles que prestam serviços a diversas empresas, sem vínculo de emprego, e que são contratados por sindicatos e órgãos gestores de mão-de-obra, como estivador, amarrador de embarcações, ensacador de cacau, etc.

São consideradas contribuintes individuais as pessoas que trabalham por conta própria como empresário, autônomo, comerciante ambulante, feirante, etc. e que não têm vínculo de emprego, sendo os mesmos responsáveis pelo recolhimento de suas próprias contribuições.

Já os segurados especiais são os trabalhadores rurais e os pescadores artesanais que produzem individualmente ou em regime de economia familiar, e não utilizam empregados para essas atividades.

Além do grupo dos segurados obrigatórios, há a categoria dos segurados facultativos, que são todos aqueles que, maiores de 16 anos, não têm renda própria, mas decidem contribuir para a Previdência Social, como as donas-de-casa, estudantes, síndicos de condomínios não-remunerados, etc.

4.2 - Contribuinte Individual e facultativo

4.2.1 - Conceito e Classificação legal

Como dito alhures, o Contribuinte Individual é aquele que desenvolve o seu labor sem subordinação, podendo a desenvolver, inclusive, junto a pessoas jurídicas, ou seja, empresas, conforme capitulado pela lei de custeio previdenciário (8.212/91) em seu artigo 12, Inciso V, alienas de a-h; todavia, neste último caso, as empresas serão responsáveis pela arrecadação e o recolhimento das contribuições do Contribuinte Individual a seu serviço.

Diferentemente, o segurado Facultativo não exerce nenhuma atividade remunerada que o ligue a Previdência Social, restando a esse tipo de segurado a possibilidade de contribui facultativamente, logo contribuem com valores que não são oriundos do seu trabalho, podendo advir de outras fontes, tais como mesadas, bolsas de estágios quando de acordo com a legislação e afins.

Segundo o Professor Fábio Zambitte Ibhahim [13]: "a possibilidade de ser segurado facultativo existe em relação a todas as pessoas que não são vinculadas automaticamente ao sistema previdenciário, ou seja, não exercem atividade remunerada que deflagre filiação automática". (grifo nosso).

4.3 - Sistema Contributivo e forma de arrecadação e recolhimento das contribuições

Tanto o segurado Contribuinte Individual quanto o Facultativo são, em regra, responsáveis pelo recolhimento das suas contribuições previdenciárias, aplicando uma alíquota fixa sobre o montante da renda auferida durante um mês, podendo ser oriunda da prestação de serviços a um ou mais contratantes ou tomadores de seus serviços.

Segundo a Lei n.º 8.212/91 a contribuição destes segurados será de 20% (Vinte por Cento) sobre a renda auferida, tal alíquota criada com o intuito suprir a falta da contribuição patronal sempre foi objeto de questionamentos e debates que discutiam se pelo fato destes contribuintes serem responsáveis pelo recolhimento das suas contribuições os mesmos não seriam levados a informalidade e ao inadimplemento, principalmente pelo valor elevado da alíquota.

Este sistema de contribuição é chamado na doutrina de plano convencional, conforme preceitua Kerlly Hubach Bragança [14].

4.4 - Sistema de Inclusão instituído pela Lei Complementar n. º 123/2006.

4.4.1 - Aspectos Gerais

A emenda Constitucional nº 41/2003 se propunha basicamente a implementar mudanças nas disposições atinentes aos Regimes Próprios de Previdência Social dos Servidores Públicos – RPPS, entretanto carreou mudanças significativas no âmbito do Regime Geral de Previdência Social. Em sua redação original que acrescentou parágrafo décimo segundo ao artigo 201 criara sistema especial de inclusão previdenciária a ser regulamentado por meio de lei complementar.

A criação de tal sistema era fruto de muitos debates e reivindicações, posto que a prática revelava que, mesmo toda pessoa que exercesse atividade remunerada estivesse automaticamente filiado a previdência social, a maioria dos contribuintes individuais, destinatários do referido sistema especial juntamente com os segurados facultativos, não contribuíam, como asseverou Fabio Zambitte Ibhahim [15]: "... em flagrante desrespeito aos preceitos legais e, o que é pior, gerando uma sobrecarga gigantesca na assistência social, pois tais pessoas serão excluídas da previdência social e poderão somente obter benefícios assistenciais, na condição de necessitados".

O parágrafo décimo segundo acima aludido foi alterado pela Emenda Constitucional nº 47/2005, que lhe deu maior abrangência, incluindo entre os beneficiários do Sistema Especial aqueles trabalhadores que se dediquem exclusivamente ao trabalho doméstico. Atendeu ao clamor das donas de casas que se submetem a uma jornada árdua de trabalho em seu próprio lar, e vários outros segmentos de trabalhadores que estavam excluídos do Regime geral de Previdência Social não pela falta de exercício de atividade remunerada, mas pelo fato de não disporem de recursos suficientes para arcar com o elevado valor da contribuição sobre o salário mínimo, remuneração auferida, regra geral, por tais trabalhadores, apesar da labuta dos mesmos ser exagerada e muitas vezes desumana.

Lei disporá sobre sistema especial de inclusão previdenciária para atender a trabalhadores de baixa renda e àqueles sem renda própria que se dediquem exclusivamente ao trabalho doméstico no âmbito de sua residência, desde que pertencentes a famílias de baixa renda, garantindo-lhes acesso a benefícios de valor igual a um salário-mínimo.

Da leitura da norma supra extraímos várias premissas importantes e essenciais a solução para o sistema de contribuição previdenciária até então vigente que não se compatibilizava com o principio da capacidade contributiva de tais contribuintes, posto que é exclusiva e mal-versava a realidade financeira dos mesmos uma vez que para os forçava a contribuir com uma alíquota ad valorem elevada sobre uma base de incidência (salário-de-contribuição) insuficiente, na maioria das vezes de dignificar o trabalho e custar a própria subsistência do trabalhador dignamente.

A Lei Complementar n.º 123 de 14 de dezembro de 2006 incluiu o parágrafo segundo ao artigo 21 da Lei n.º 8.212 de 24 de julho de 1991 (Lei de Custeio Previdenciário), o qual trouxe a regulamentação infraconstitucional do Sistema Especial de Inclusão Previdenciária. A referida norma concentrou a inclusão previdenciária na redução da alíquota incidente sobre a remuneração auferida em uma ou mais empresas ou pelo exercício de sua atividade por conta própria, durante o mês, ou o valor declarado, sendo este o salário-de-contribuição do contribuinte individual e do segurado facultativo, respectivamente.

4.4.2 - O Sistema Contributivo diferenciado sob o enfoque do Principio da Equidade na Forma de Participação no Custeio

Para os contribuintes individuais e facultativos, categorias de segurados que englobam todos os trabalhadores que representam a grande massa dos excluídos ou afastados do Regime Geral de Previdência Social, tais como feirantes, vendedores ambulantes, moto-taxistas, camelôs e autônomos de forma em geral, a Lei n.º 8.212/91 previa uma única forma de contribuição, ou seja, vinte por cento do salário-de-contribuição, não podendo o referido salário-de-contribuição ser inferior ao salário mínimo vigente.

Com o advento da Lei Complementar 123/2006, houve a criação e inserção no seio da Lei n. 8.212/91, do Sistema Especial de Inclusão Previdenciária, outorgando as categorias de contribuintes individual e segurado facultativo a possibilidade de contribuírem sobre um salário-mínimo, base de cálculo fixa, com a alíquota reduzida de onze por cento. Logo, ao invés destes segurados só poderem contribuir com vinte por cento sobre a renda auferida ou declarada, poderem contribuir, facultativamente, com onze por cento sobre o salário-mínimo.

O desiderato da norma é a inclusão dos trabalhadores que estavam excluídos da possibilidade de contribuir ativamente para o sistema securitário em face da alta alíquota existente, sem possibilidade de aderir a outra maneira de contributiva. O trabalhador que em bases mínimas contribuir com uma alíquota de vinte por cento pagará, considerando o salário-mínimo vigente de R$ 465,00 (quatrocentos e sessenta e cinco reais), R$ 93,00 (noventa e três reais), enquanto se contribuir com a alíquota de onze por cento, pagará sobre o mesmo valor, R$ 51,15 (cinqüenta e um reais e quinze centavos), uma economia de R$ 41,85 (quarenta e um reais e oitenta e centavos), ou seja, o que se pagava atinente a um mês, atualmente quase que se paga dois, o que para um trabalhador significa muito.

Nestes termos, o propósito da lei é louvável e digno de créditos, pois permite trazer a formalidade previdenciária àqueles que mais precisam da cobertura securitária, posto que mais expostos e são segurados tanto quanto aqueles que vertem contribuições máximas, os quais são aproximadamente trinta milhões de trabalhadores em idade ativa que na estão escritos e não contribuem para o RGPS, segundo Társis Nametala Sarlo Jorge [16].

A análise do Sistema Especial de Inclusão Previdenciária sob o enfoque do principio da equidade na forma de participação no custeio revela extrema consonância legislativa, posto que, como se enunciara da oração aos moços de Rui Babosa [17]: "A regra da igualdade não consiste senão em quinhoar desigualmente aos desiguais, na medida em que se desigualam", é justo que o maior salário-de-contribuição, que conseqüentemente irá gerar um maior salário-de-beneficio para o segurado, seja tributado de modo a garantir os recursos futuros que assegurarão o seu maior beneficio.

Deve-se tratar desigualmente os contribuintes, posto que serão futuros segurados quando da percepção de benefícios previdenciários, e nesta condição, serão tratados diferentemente em termos de proventos, pois quem verteu valores maiores, regra geral, recebera benefícios melhores, relativamente àqueles que contribuíram valores menores, os quais receberão benefícios de menor valor pecuniário.

Todavia, a norma inclusiva não poderia desrespeitar o principio da antecedente fonte de custeio total. Ignorar tal premissa é tornar o sistema previdenciário em assistencialista, mitigando sua capacidade futura de custear a inatividade de seus segurados. Neste diapasão é salutar a critica de Fabio Zambitte Ibhahim [18]:

Não é compatível a concessão de benefícios previdenciários a trabalhadores, ainda que de baixa renda, sem o correspondente custeio. Para tanto, repita-se, existe a assistência social, a qual tem a função natural de preencher as lacunas deixadas pela previdência. De fato, a própria constituição somente autoriza a concessão de novos benefícios ou a ampliação de prestações já existentes com a previsão da fonte de custeio (art. 195, § 5º, CRFB/88), regra que, desgraçadamente, costuma ser ignorada pelo administrador público e mesmo pelo legislador.

4.4.3 - A exclusão da Aposentação por Tempo de Contribuição à Luz do Principio da Seletividade e distributividade na prestação de benefícios

O Sistema Especial de Inclusão Previdenciária trouxe regras contundentes para o optante em contribuir com a alíquota diferenciada, ou seja, onze por cento, como visto alhures. Em optando por contribuir pelo Plano Simplificado de Previdência Social - PSPS (nomenclatura dada por Kerlly Hubach Bragança [19]), o contribuinte só poderá o fazer sobre a base de cálculo, o salário-de-contribuição, mínimo, o que inevitavelmente o fará receber, quando em inatividade, um salário-de-beneficio igual ao salário-mínimo, nunca superior.

Todavia, a opção pelo PSPS não peremptório, ou seja, se o contribuinte facultativamente adere ao plano e posteriormente quiser retornar ao plano anterior, voltando a contribuir sobre valores superiores ao mínimo, aplicando a alíquota de vinte por cento, não será barrado pela norma. Entretanto, se quiser computar o tempo de contribuição enquanto era aderente ao PSPS para fins de obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição, deverá complementar cotização recolhendo a diferença de nove por cento, conforme preceitua o § 3º do Artigo 21 da Lei nº 8.212/91, in verbis:

O segurado que tenha contribuído na forma do § 2º deste artigo e pretenda contar o tempo de contribuição correspondente para fins de obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição ou da contagem recíproca do tempo de contribuição a que se refere o art. 94 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, deverá complementar a contribuição mensal mediante o recolhimento de mais 9% (nove por cento), acrescido dos juros moratórios de que trata o § 3º do art. 61 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996.

Essa é primeira desvantagem apresentada aos optantes pelo recolhimento simplificado, pois levando-se em consideração as intempéries da vida contributiva, um contribuinte pode ser compelido a contribuir nas bases do PSPS, o que o levaria a projetar sua aposentação apenas por idade. Todavia, se vier a contribuir na qualidade de empregado em bases mínimas, poderá repensar sua aposentação, agora por tempo de contribuição, contundo arcando com o ônus de pagar a diferença aludida no parágrafo citado, o que, dependendo do lapso temporal em que contribuiu pelo PSPS, será muito oneroso, salientando que o mesmo continua percebendo remuneração mínima.

As aposentadorias por idade e Por tempo de Contribuição são oriundas da conjugação de certos fatores, ou seja, o preenchimento cumulativo dos requisitos de Tempo de Contribuição e Idade mínima, para a primeira, e Tempo de Contribuição e Carência para a segunda. Logo, dependendo do caso concreto, o contribuinte poderá implementar as condições à obtenção de uma aposentadoria por tempo de contribuição antes do preenchimento dos requisitos para obtenção de uma aposentadoria por idade. De certo modo, a imposição desta condição caracteriza um impedimento à mobilidade do contribuinte dentro das classes de segurados obrigatórios e/ou facultativo.

A Lei complementar 123/06 regulou o § 12 do artigo 201 da Constituição Federal, instituindo o Regime Previdenciário de Inclusão, como visto, reduzindo alíquota e direcionando benefícios a tais segurados no valor de um salário mínimo, entretanto, como nos ensina Társis Nametala Sarlo Jorge [20], esqueceu de atender os requisitos elencados no § 13 do mesmo artigo, que deveriam ser atendidos cumulativamente com aqueles:

Ocorre, no entanto, que o § 13 do mesmo artigo 201 da Carta menciona expressamente – e com tempo verbal alocado no imperativo – que o sistema especial de inclusão previdenciária de que trata o § 12 deste artigo terá alíquotas e carências inferiores às vigentes para os demais segurados do regime geral de previdência social.

Ao que parece, o legislador complementar desobedeceu à ordem emanada da Carta da República. Isto porque, em primeiro lugar, conforme vimos no capitulo sobre aposentadoria, não houve redução da carência para a aposentadoria por idade, mas tão somente redução do valor das contribuições (e, também, como visto, carência não é volume, mais sim, quantidade de contribuições). E mais: também não houve redução de alíquotas, uma vez que continua a mesmo sendo de 11%. O que ocorreu foi somente alteração da base de cálculo, que é outro instituto, diverso da alíquota.

Esta leitura nos revela, (além da magnífica inferência feita pelo autor, considerando que houve violação ao § 13 do 201 da CRFB, asseverando que neste particular a norma padece manifesta inconstitucionalidade), que a exclusão ao direito a aposentação por tempo de contribuição do rol de prestações devidas aos beneficiários do Regime Contributivo Diferenciado implantado pelo Sistema Especial de Inclusão Previdenciária não poderia dar-se por meio de Lei Complementar, posto que a norma constitucional nos §§ 12 e 13 do artigo 201 não alude a tal possibilidade.

A exclusão a tal direito deveria ser feito por meio de norma constitucional, haja vista, a referida matéria não pertencer a reserva legal destinada a tal espécie normativa.


5. Conclusão

A Previdência Social, por meio da Lei Complementar n.º 123/2006, instituiu, nos dizeres de Kerlly Hubach Bragança [21], o Sistema Simplificado de Previdência Social, que implantou redução da alíquota reduzida para os Contribuintes Individuais e Facultativos, de 11% (onze por cento), sobre uma base de cálculo fixa igual ao piso contributivo previdenciário, ou seja, um salário mínimo, diferentemente dos demais segurados dessa classe que contribuem, quando não prestam serviços a empresas ou equiparados, com a alíquota de 20% (vinte por cento) sobre a renda auferida durante o mês respeitando apenas o limite máximo do salário-de-contribuição.

Andou bem o legislador ao instituir tal sistema buscando incentivar a todos os que exercem atividades remuneradas que se filiem ao Regime Geral de Previdência Social como Segurados Obrigatórios. Devido à alíquota elevada sobre uma renda insuficiente para atender as necessidades cotidianas, tais trabalhadores eram privados da proteção securitária. Com isso, buscou-se instrumentalizar meios para a operacionalidade da Lei do Custeio previdenciário que já os considera Segurados Obrigatórios pelo fato de exercerem atividade remunerada, como dispõe o § 2º do artigo 43 da Lei n.º 8.212/91.

Assim, aqueles que eram segurados obrigatórios na qualidade de contribuintes individuais e encontravam-se em situação de inadimplência geravam para o sistema da seguridade social uma sobrecarga, pois este, indubitavelmente, teria que arcar com os custos sociais demandados pelos eventos aos quais estão expostos os trabalhadores excluídos da previdência social, todavia que deveriam ser amparados pela assistência social.

Todavia, no contrapé da benfazeja novidade acima aludida, o legislador criou, como afirma a melhor doutrina, discrepâncias com a Constituição Federal de 1988, principalmente quando se analisa as referidas implementações à luz dos princípios constitucionais da seguridade social, especialmente os da Equidade na forma de custeio e da Seletividade e Distributividade na prestação de benefícios.

A exclusão do direito a aposentadoria por tempo de contribuição, não prevista no bojo da constituição, para os segurados optantes pelo Sistema Simplificado de Previdência Social, carreou dúvidas sobre a constitucionalidade de tal premissa, posto que a norma complementar já havia reduzido a base de cálculo para as cotizações, garantindo-se assim, o recebimento de um beneficio de valor nunca superior ao mínimo por parte de tais segurados, o que asseguraria o equilíbrio atuarial e financeira da Previdência Social, quanto a tais segurados.

Neste ínterim, vale citar Társis Nametala Sarlo Jorge [22] que em sua obra dedica o capitulo V, intitulado Aspectos Constitucionais da LC 123/06 – Sua duvidosa constitucionalidade e análise de questões intertemporais, a ponderar as questões de duvidosa constitucionalidade trazidas pela norma inclusiva, tais como:

Parece-nos que por violação direta do § 13º do artigo 201 da Carta da República, que é manifestação, juntamente com o § 12º do mesmo preceito, do princípio da inclusão previdenciária (bem como da igualdade material), a LC 123/06, neste particular, padece de manifesta inconstitucionalidade.


6. Bibliografia

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Notas

  1. IBHAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 12ª edição, revista e atualizada. Rio de Janeiro: Impetus, 2008. p. 32.
  2. IBHAHIM, Op. Loc. Cit.
  3. Curso de previdência social, 2. ed., Rio de Janeiro: Forense, 1983.
  4. Curso Prático de Direito Previdenciário, 2ª ed., Salvador: Edições Podivm, 2006, p. 1.
  5. Manual de Direito do Trabalho. 2. ed. São Paulo : LTR, 1984. v. I.
  6. A seguridade social na Constituição Federal. 2. ed. São Paulo: LTR, 1992.
  7. Baseado em Kertzman, Ivan Mascarenhas. Curso Prático de Direito Previdenciário. Salvador. JusPODIVM, 2006. p. 16-20 e Vitor Rolf Laubé. Previdência no Âmbito Municipal. Revista de Informação Legislativa. Brasília a.34 n. 133 jan./mar. 1997. Disponível em: http://www.senado.gov.br/web/cegraf/ril/Pdf/pdf_133/r133-28.PDF
  8. Art. 149, § 2º, Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.
  9. IBHAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 12ª edição, revista e atualizada. Rio de Janeiro: Impetus, 2008. p. 56.
  10. KERTZMAN, Ivan Mascarenhas. Curso Prático de Direito Previdenciário. Salvador. JusPODIVM, 2006. p. 27.
  11. BRAGANÇA, Kerlly Hubach. Direito Previdenciário. 6ª edição. Rio de Janeiro: Lumem Júris, 2009. p. 12.
  12. Op Cit. IBHAHIM, 2008. p. 144.
  13. Op. Cit. IBHAHIM, 2008. p. 172.
  14. Op. Cit. BRAGANÇA, 2009. p. 174.
  15. Op. Cit. IBHAHIM, 2008. p. 32.
  16. JORGE, Társis Nametala Sarlo. Segurado Contribuinte Individual. Configuração legal e regime jurídico previdenciário após a Lei Complementar 123/06. Curitiba: Juruá, 2007. p. 181.
  17. KURY, Adriano da Gama. Oração aos Moços. Edição Popular Anotada. 5ª edição. Disponível em: http://www.casaruibarbosa.gov.br/dados/DOC/artigos/rui_barbosa/FCRB_RuiBarbosa_Oracao_aos_mocos.pdf.
  18. Op. Cit. IBHAHIM, 2008. p. 33.
  19. Op. Cit. BRAGANÇA, 2009. p. 174.
  20. JORGE, Op. Cit, p. 182.
  21. BRAGANÇA, Op. Cit., p. 175.
  22. JORGE, Op. Cit., 2007.

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SALES, Marciel Antonio de. Análise do sistema de inclusão previdenciária instituído pela Lei Complementar nº 123/2006 e a exclusão da aposentação por tempo de contribuição à luz dos princípios da equidade na forma de custeio e da seletividade e distributividade na prestação de bene. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2898, 8 jun. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19288. Acesso em: 25 abr. 2024.