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Questões polêmicas dos exames de suficiência da OAB e do CRC, instituídos por leis infraconstitucionais

Questões polêmicas dos exames de suficiência da OAB e do CRC, instituídos por leis infraconstitucionais

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RESUMO

Neste artigo procuramos mostrar as questões polêmicas ocasionadas em relação aos Exames de Suficiência da OAB e do CRC, instituídos por meio da Lei nº 8.906, de 4/7/1994, e Lei nº 12.249, de 11/6/2010, buscando a legalidade das leis infraconstitucionais por meio dos Atos Administrativos do MEC e da AGU, Nota Técnica nº 053/2011 – CGLNES/GAB/SESu/MEC-ree, de 25/1/2011, e Nota AGU/CGU/JCBM nº 0001/2011, de 29/3/2011, respectivamente, doutrinas, decisões de nossos tribunais e da CF/1988, em que os referidos Conselhos Profissionalizantes, sustentando proposições jurídicas ideológicas por meio dos Exames de Suficiência, abstendo-se da dignidade da pessoa humana, normas e princípios constitucionais, em completa desarmonia com o sistema onde figuram como concorrentes com os demais Conselhos Profissionalizantes, inibem o Bacharel em Direito e o Bacharel em Ciências Contábeis da liberdade do livre exercício da profissão de advogado e contador, respectivamente, afrontando a nossa Carta Magna não observando aquilo que é mais belo na Constituição promulgada em 1988, ou seja, o Estado Democrático de Direito.

Palavras-chave: exames de suficiência, normas, educação, profissão, bacharel em direito, bacharel em ciências contábeis, advogado, contador.

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. O Curso de Direito e os Exames de Suficiência, considerando o entendimento do MEC, por meio da Nota Técnica nº 053/2011- CGLNES/GAB/SESu/MEC-ree, de 25/1/2011. 3. Inconformidade em razão da decisão da Nota Técnica do MEC nº 053/2011, submetida à Advocacia-Geral da União – AGU e a interpretação normativa exarada na Nota AGU/CGU/JCBM nº 0001/2011, de 29/3/2011. 4. Decisões Judiciais. 5. Questões polêmicas sobre a instituição dos Exames de Suficiência, considerando as normas constitucionais, administrativas, bem como os atos administrativos do MEC e da AGU. 6. Considerações finais. 7. Referências Bibliográficas.


1.Introdução

A Lei nº 8.906, de 4/7/1994, instituiu em seu inciso IV, art. 8º, a inscrição como advogado somente para aquele aprovado em Exames de Ordem, e a Lei nº 12.249, de 11/6/2010, art. 76, que alterou o art. 12 do Decreto-lei nº 9.295, de 27/5/1946, instituiu os Exames de Suficiência, condicionando os Bacharéis em Ciências Contábeis a exercerem a profissão de Contador uma vez aprovados nos referidos exames.

De sorte que procuramos mostrar, por meio da doutrina, Atos Administrativos do MEC e da AGU, normas constitucionais, decisões de nossos tribunais e leis infraconstitucionais, as questões polêmicas em relação aos exames de suficiência, tomando-se por base as interpretações constitucionais e administrativas em relação ao exercício da profissão, os conselhos profissionalizantes, teoria da recepção, eficácia jurídica das normas constitucionais.

Também, os referidos Conselhos Profissionalizantes, sustentando proposições jurídicas ideológicas por meio dos Exames de Suficiência, abstendo-se da dignidade da pessoa humana, normas e princípios constitucionais, em completa desarmonia com o sistema onde figuram como concorrentes com os demais Conselhos Profissionalizantes, inibem o Bacharel em Direito e o Bacharel em Ciências Contábeis da liberdade do livre exercício da profissão de Advogado e Contador, respectivamente, afrontando a nossa Carta Magna não observando aquilo que é mais belo na Constituição promulgada em 1988, ou seja, o Estado Democrático de Direito.


2.O Curso de Direito e os Exames de Suficiência, considerando o entendimento do MEC, por meio da Nota Técnica nº 053/2011- CGLNES/GAB/SESU/MEC-ree, de 25/1/2011

Assim, ao presenciarmos uma completa desarmonia em nosso ordenamento jurídico pátrio, atos discriminatórios praticados por instituições e pessoas contra os Bacharéis em Direito não-aptos a exercerem a função de advogado, também um corporativismo no meio jurídico ao exaltar a advocacia não como profissão e sim um múnus público, tão somente para justificar a suposta seleção obtida pelos Exames de Suficiência, resolvemos provocar o Estado por meio de um pleito sobre extinção do Exame de Suficiência e outras medidas no sistema educacional, protocolado no Ministério da Educação sob o nº 070355201046, em 26/10/2010.

No referido pleito procuramos mostrar os Exames de Suficiência no contexto educacional e profissionalizante com base no art. 205 e no art. 209, II, da CF/1988, combinado com art. 53, VI, art. 43, II, e art. 48 da Lei nº 9.394, de 20/12/1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, bem como o art. 8º, IV, da Lei nº 8.906/1994, e art. 76 da Lei nº 12.249/2010, que alterou os artigos 6º e 12 do Decreto-Lei nº 9.295, de 27/5/1946.

De fato, além da proposta de extinção dos Exames de Suficiência, outros aspectos relacionados à educação foram tratados, senão vejamos:

"Em vista disso, será que o trabalho com as leis, tribunais, ativo, passivo, contas de resultados, etc., são mais importantes do que cuidar de vidas humanas? Ou será que a residência médica para o médico recém-formado é mais importante do que os estágios nos juizados ou escritórios de advocacias a que são submetidos os acadêmicos de Direito? Acreditamos que não, todavia, o que presenciamos na prática é que o primeiro habilita o médico a exercer a profissão, o outro não (.......) "(ALMEIDA, 2010, p. 3)

"Também, o Poder Público ao eximir-se de sua competência transferindo-a à OAB e ao CFC, está deixando de cumprir normas constitucionais e a própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Ainda, o pior é que as referidas instituições ao aplicarem os exames de suficiência não estão colaborando para melhoria do ensino no país, muito pelo contrário elas colocam o bacharel reprovado num status de vexame, humilhação, discriminação, incapacidade, decepção e sem nenhuma perspectiva no mercado de trabalho no ramo da advocacia. De sorte que, face a essa realidade citada, vejamos os ensinamentos do Professor Luiz Flávio Gomes, publicados em seu artigo "Faculdades de Direito: O Problema Não é a Quantidade, Sim a Qualidade", disponível em : http://www.editoramagister.com. Acesso em 25/10/2010." (ALMEIDA, 2010, p. 3):

"A reprovação nos exames de ordem, naturalmente, é altíssima (cerca de 80%). Quantos bacharéis "descarteirados"! O despreparo do aluno e, muitas vezes, da faculdade, é patente. Autoridades do MEC e representantes da OAB criticam insistentemente as faculdades, que procuram jogar a culpa no desinteresse e na carência de base dos alunos. A verdade é que as faculdades não conseguem remunerar bem nem reunir professores preparados em todas as áreas do conhecimento jurídico. Elas se parecem com as velhas orquestras (todas falidas): muitos professores (desafinados) "tocando" (ensinando) para poucos alunos. Essa tradição do século XIX está na contramão da era comunicacional." (GOMES, 2010)

"Mídia, MEC e OAB, em geral, criticam a quantidade de faculdades de Direito existente no país (cerca de 1.100). O problema, no entanto, (por incrível que pareça), não é quantitativo, senão qualitativo (qualidade do ensino). Apenas 15% da faixa etária universitária (17 a 25 anos) estão frequentando um curso superior no Brasil. Esse percentual é vergonhoso e ridículo quando comparado com outros países (Argentina quase 20%, Chile 38%, Coreia do Sul mais de 60% etc.). Nosso problema, evidentemente, não é de sobra, e sim de falta de faculdades. Só não enxerga isso quem não quer ver." (GOMES, 2010)

Assim, Gomes finaliza o seu artigo:

"O mundo mudou radicalmente, a forma de ensinar se revolucionou, as tecnologias da informação e da comunicação romperam todos os paradigmas históricos da humanidade: e ainda continuamos apegados ao atraso, ao analfabetismo, ao obscurantismo, ao conservadorismo. Seguramente esse não é o melhor caminho para nossa nação." (GOMES, 2010)

Também, procuramos mostrar a nova ordem no Brasil e no mundo e seus reflexos nas faculdades, centros universitários e universidades públicas e privadas, senão vejamos:

"Desse modo, a globalização estimulou a formação de blocos econômicos, associações regionais de livre mercado derrubando barreiras protecionistas. Assim, a nova lógica do capitalismo globalizado veio intensificar as privatizações com as vendas de empresas estatais, ampliando os espaços econômicos, bem como a subordinação dos Estados minimizados à lógica do mercado internacionalizado. Por sua vez, o Estado mínimo envolve redução dos gastos públicos com saúde, educação e previdência social, o que veio a desmontar o Estado do bem-estar social nos países desenvolvidos. Já nos países em desenvolvimento agravou de forma geral o quadro social, gerando pobreza para a maioria e riqueza para uma minoria de pessoas. Por outro lado, a Terceira Revolução Industrial, onde o uso de alta tecnologia (robótica, informatização etc.) trouxe para o mundo a questão do desemprego, incluindo-se o remanejamento e demissão de funcionários e o enxugamento estatal." (ALMEIDA, 2010, p. 7)

"De sorte que o neoliberalismo através do domínio capitalista sobre os meios e modo de produção legitima as diferentes estratégias de dominação. Desse modo, na última década do século XX as organizações adotaram os paradigmas industriais e empresariais. Assim, os estabelecimentos de ensino não ficaram à margem da mencionada tendência. Pois são vistas como empresas, onde a educação é o seu produto mais significativo situada no modo de produção capitalista. Por essa razão, os estabelecimentos de ensino, ao estruturar-se para seu melhor desempenho e eficiência gerencial, assumiram uma postura onipotente, assumindo o paradigma industrial." (ALMEIDA, 2010, p. 7)

"Nesse contexto, Oliveira afirma:

"A chamada era da modernidade levou grupos, organizações e instituições a buscarem a naturalização da ideologia dominante na conscientização e no comprometimento dos seus componentes. Vinda da indústria, a ideologia da qualidade e da produtividade invadiu o Brasil há mais de uma década bancos, clubes, associações, hospitais e, é claro, escolas e universidades." (OLIVEIRA, 2001, p. 129-130)

"Por sua vez, houve uma ascensão do privado e uma queda do público, segundo Sidney Nilton de Oliveira: "instalou-se o dogma do privado e o público tornou-se maldito". Assim, Oliveira conclui o seu entendimento: "Em uma época de valorização do privado em detrimento do público a fantasia onipotente do neoliberalismo e a perversão da globalização parecem acentuar a hegemonia da ideologia dominante." (ALMEIDA, 2010, p. 7)

"De maneira que a educação nesse contexto do neoliberalismo também teve que adotar os novos paradigmas gerenciais. Por exemplo, a necessidade de avaliar-se usando alguns instrumentos, tais como: Plano Nacional do Ensino Médio (Enem), o Enade, etc. Enfim, a busca pela eficiência e eficácia no desempenho foi traduzida nas organizações, sociedade e na mídia pela "Qualidade Total". Entretanto, a Qualidade Total não se traduz apenas em diminuir custos, otimizar processo etc., ou seja, vai além do aspecto técnico, incorporando-se uma estratégia de controle psicossocial dos indivíduos. Segundo Oliveira, o objetivo de toda maximização do desempenho é o controle político, cognitivo e afetivo do desempenho. (ALMEIDA, 2010, p. 8)

Ele afirma:

"(...) A gestão da qualidade é desideologizada ao atribuir a origem de problemas como o fracasso escolar a administrações equivocadas (...). A partir daí afirmar-se que, na perspectiva da qualidade total em Ramos (1992, 1993, 1995), a definição do aluno como cliente não pode passar despercebida, pois existe nessa palavra um propósito e um desejo, isto é, uma ideologia. O termo cliente implica uma relação de dependência no contexto industrial capitalista, veiculado pela autora como modelo para aplicação da qualidade na escola. Há uma relação ideológica na definição do aluno como cliente, pois não existe um "acaso" léxico! (Lacan, 1985), ou seja, a palavra cliente indica, subjetivamente, uma condição de dependência ideológica... (grifos nossos)." (OLIVEIRA, 2001, p. 131)

"Além disso, os modismos adotados pelo capitalismo nada mais são que implantações de processos, data vênia, visando à mais-valia." (ALMEIDA, 2010, p. 8)

"Ainda, nas organizações, bem como nas instituições de ensino, a psicologia na educação esteve sempre ligada a problemas de aprendizagem, socialização, medidas de inteligência, adaptação, etc. Contudo, no sistema capitalista a dominação utilizou esse mecanismo com objetivo de reduzir os indivíduos, os grupos e organizações. Desse modo, o indivíduo afetivamente adere à cultura organizacional. Exemplificando, implica na conscientização e comprometimento cujo objetivo é a maximização do desempenho para alcance de metas, ou melhor, sobre a psicologia." (ALMEIDA, 2010, p. 8)

Oliveira afirma:

"Construir uma crítica efetiva da psicologia implica afastar-se de idealismos, palavras de ordem e dogmas paradoxais. Mas essa crítica só será levada a cabo se estiver comprometida com a busca de uma psicologia emancipadora. A relação da psicologia com a ideologia capitalista não pode se tornar o obituário da psicologia. A dialética da contradição é que permite transformar. Para isso, é necessário superar o reacionarismo de uma visão reprodutivista-pessimista da psicologia na educação." (OLIVEIRA, 2001, p. 134)

Ainda, procuramos argumentar no citado pleito que é possível conseguir educação gratuita por parte de empresários comprometidos com capitalismo, mas também com o social, a saber:

"Portanto, nota-se que as medidas tomadas pelas instituições de ensino são neoliberais, as quais proliferam nos estabelecimentos de ensino privado. Não obstante, não podemos generalizar o ensino privado como detentores de medidas neoliberais, pois alguns empresários são comprometidos com a educação, citamos, como exemplo, o empreendedor José Corgosinho de Carvalho Filho, com seu empreendimento consolidado no ramo de metalurgia e mineração, realizou a obra de seus sonhos, ou seja, a Fundação José Carvalho, esta oferece educação gratuita e de ótima qualidade, bem assim possibilita oportunidade de progresso para crianças carentes. Enfim, o engenheiro educador nos mostrou que é possível tornar os sonhos uma realidade, e nos ensina (ALMEIDA, 2010, p. 6):

"(....) A única maneira de fazer uma redistribuição de renda neste país é colocando ótimos professores nos locais mais pobres, porque eles vão ser agentes fortíssimos de mudanças. Se não existir educação, não teremos nada." (CARVALHO FILHO, 2007, p. 25)

"Se o homem é um bom cidadão do mundo, será um excelente patriota, pois não se negará a aceitar os margeamentos morais necessários ao progresso de sua pátria." (CARVALHO FILHO, 2007, p. 101)

"Não podemos deixar proliferar esse binômio terrível que é a ignorância e a miséria, porque ele mata qualquer país. O empresário tem essa responsabilidade adicional, que vai além de pagar impostos: contribuir para melhorar a qualidade de vida do país." (CARVALHO FILHO, 2007, p. 104)

De fato, nas comemorações do cinquentenário da Ferbasa, realizada em 19/5/2011, a opinião pública nacional e internacional constatou que o sonho do empresário educador tornou-se uma realidade, senão vejamos:

"O sentimento de amor à pátria e à educação constitui, a meu ver, uma meta intimamente ligada à finalidade da empresa. Uma nação tão ampla tem o direito de pedir ajuda a seus líderes empresariais e executivos que, embora obrigados a mergulhar no complexo emaranhado dos seus negócios, jamais se esqueçam de construir um Brasil mais livre. A educação é o caminho para essa liberdade, e a empresa pode realizar muito nessa área" (CARVALHO FILHO, 2007, p. 26)

Com relação às disciplinas propedêuticas integrantes das grades curriculares dos cursos de Direito, comentamos:

"Além do mais, notamos que o acadêmico de Direito dedica dois anos com disciplinas propedêuticas, tais como: filosofia, sociologia, psicologia, ciência política, economia, antropologia etc., todavia, tais disciplinas deveriam ser substituídas por aquelas voltadas para uma concepção profissionalizante cobradas no mercado de trabalho, possibilitando àquele acadêmico uma preparação profissional para que, no futuro, possa prestar exames de avaliações de qualquer natureza que são exigidas no mercado, inclusive nos exames da Ordem, que, segundo o Edital do Exame Unificado, 2010-2, são aqueles com base no conhecimento do candidato em disciplinas profissionalizantes obrigatórias e integrantes do currículo mínimo do curso de Direito, fixado pelo CNE/CES nº 9, de 29/9/2004, mas em nenhuma hipótese são mencionadas no citado edital as disciplinas propedêuticas." (ALMEIDA, 2010, p. 9)

"Enfim, em que pese o pensamento reflexivo oriundo das disciplinas propedêuticas, entendo que tal carga horária deve ser repensada substituindo-a por disciplinas profissionalizantes que efetivamente são cobradas nos exames da OAB e/ou concursos de qualquer natureza, isto é, desenvolver um aprendizado sistêmico voltado para o melhor desempenho na utilização dos códigos os quais são de fundamental importância para aqueles que lidam com o dia-a-dia das leis." (ALMEIDA, 2010, p. 9)

De maneira que o nosso posicionamento em relação às disciplinas propedêuticas deve-se ao fato de a carga horária se constituir num entrave à formação dos alunos de Direito sujeitos aos Exames de Suficiência da OAB e não à formação geral, humanística, reflexiva, axiológica e crítica, peculiares das disciplinas propedêuticas, conforme citamos filosofia, sociologia, psicologia e outras, indiscutivelmente contribuem para formação profissional do futuro Bacharel em Direito, dando-lhe capacidade de análise, domínio de conceitos e da terminologia jurídica, bem como adequada argumentação, interpretação e valorização dos fenômenos jurídicos e sociais.

De fato, os críticos que defendem as disciplinas propedêuticas nos cursos de Direito, a exemplo do autor Abili Lázaro Castro de Lima, em seu artigo: "A função e a importância das disciplinas propedêuticas nas estruturas curriculares dos cursos de Direito no Brasil" nos mostram com bastante sabedoria que os Exames de Suficiência da OAB são obstáculos para melhor formação do Bacharel em Direito, senão vejamos:

"Os críticos dessa concepção de ensino jurídico argumentam que os cursos de Direito devem ser voltados tão somente à formação profissional (especificamente à formação de advogados), bem como devem prioritariamente capacitar os estudantes para serem aprovados nos exames para ingresso na OAB. Alegam ainda que a carga horária dedicada às disciplinas propedêuticas que possibilitam a formação geral, humanística, reflexiva e crítica constituem um entrave para uma maior verticalização do ensino das disciplinas profissionalizantes, obstando um melhor desempenho dos bacharéis no exercício da advocacia e no exame da OAB". (LIMA, 2005, p.78-79)

"Outro argumento que não merece prosperar é que o curso de Direito deve estar voltado prioritariamente para capacitar os alunos para serem aprovados no exame de ingressos nos quadros da OAB". (LIMA, 2005, p. 81)

"Portanto, direcionar a formação dos alunos para serem bem- sucedidos no Exame da Ordem dos Advogados é cometer o mesmo equívoco que o ensino médio acabou incorrendo ao preparar prioritariamente os alunos para o vestibular, ou seja, conferir ao curso de Direito um caráter meramente instrumental ao invés de um caráter formativo (por meio da conjugação do conhecimento profissional e geral). O resultado da experiência do ensino médio foi um ensino meramente voltado à armazenagem de informação, descuidando-se do ensino formativo, que possibilita a capacidade de leitura, de interpretação e de reflexão, fazendo com que os alunos dele egressos tenham uma grande dificuldade de se adaptarem às exigências do ensino superior quando tais habilidades lhes são exigidas". (LIMA, 2005, p. 81)

Vale ressaltar que não é apenas a OAB que se preocupa com a inserção de faculdades indiscriminadamente no sistema educacional, mas todos educadores se preocupam, porém a pergunta é a seguinte: o que as instituições têm feito para melhoria do aprendizado no país, além das críticas?

Enfim, no pleito mostramos que não bastam os financiamentos concedidos pelo Governo baseados em critérios socioeconômicos, a exemplo do Fies (Financiamento Estudantil) e do ProUni (Programa Universidade para Todos), mas também construir mais escolas para o ensino fundamental, médio e do 3º grau para atender à demanda da sociedade e fortalecer a educação no Brasil, senão vejamos:

"Ainda, o Fies (Financiamento Estudantil) e o ProUni (Programa Universidade para Todos) são financiamentos concedidos pelo Governo baseados em critérios socioeconômicos; alunos de famílias de baixa renda que cursaram o ensino médio em escolas públicas e ainda não têm curso superior; seleção baseada a partir das notas obtidas no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio), aliada à qualidade e mérito dos estudantes com melhores desempenhos acadêmicos. De sorte que notamos que tais medidas refletem o neoliberalismo na educação onde se busca pela eficiência e eficácia no desempenho por meio da "Qualidade Total", a fim de justificar um financiamento educacional para cursos superiores em instituições de ensinos privadas, o qual acaba aniquilando o papel do Estado com a educação na adoção de investimentos em ensino básicos e superiores da rede pública". (ALMEIDA, 2010, p. 5)

"De fato, especialistas em educação superior durante o 8º Fórum Nacional de Educação Superior Particular, realizado em São Paulo, defenderam um maior investimento no ensino básico brasileiro para aumentar o acesso de estudantes no ensino superior, concluindo que o ProUni e o Fies são importantes mas não resolvem o problema. Aliás, um dos investimentos no ensino médio deveria ser a retomada dos cursos técnicos profissionalizantes, necessários ao mercado de trabalho e desprezado pelo Governo e pelas instituições de ensino sob a égide do capitalismo, interessadas apenas com aqueles cursos cujo retorno é satisfatório para conta de resultados daquelas instituições. Ademais, os cursos técnicos sob à responsabilidade do MEC proporcionam àqueles alunos do ensino médio uma prévia preparação no intuito de futuramente ingressar numa faculdade relacionada àquela área que foi cursada pelo aluno; por exemplo, o Técnico em Contabilidade terá teoricamente um melhor rendimento caso venha optar pelo curso de Ciências Contábeis". (ALMEIDA, 2010, p. 5)

Também, defendemos a retomada dos Cursos Técnicos Profissionalizantes sob a égide do Ministério da Educação com duração de três anos e não os cursos de pouca duração como vem ocorrendo no país, pois o pouco tempo de aprendizado não qualifica o técnico para o exercício da função como vem ocorrendo no mercado de trabalho, bem como implantar Curso Técnico Jurídico e Técnico de Saúde.

Ainda, propomos o aumento da idade para os dependentes de 24 anos para 27 anos, a exemplo do que ocorrem em alguns países da Europa, tais como: República Checa, Bélgica e outros, pois nada mais justo para preparação do recém-formado habilitando-o para inserção no mercado de trabalho, beneficiando sobremodo os responsáveis em relação aos aspectos previdenciários e tributários, de certa forma diminuindo os gastos com a educação. Aliás, por que no Imposto de Renda de Pessoa Física os gastos com educação não são deduzidos integralmente? Acreditamos que nem os especialistas em Direito Tributário e Contabilidade Tributária conseguem responder tal pergunta.

De sorte que buscamos mostrar que a questão não se limita apenas na extinção do Exame de Suficiência e sim na sua efetiva extinção visando à melhoria do aprendizado no contexto educacional, dando-lhe um caráter formativo. De fato, várias são as maneiras de colaboração que possa ser dispensada à educação por parte dos Conselhos profissionalizantes, por exemplo, ao invés de a OAB e o CRC se preocuparem em aplicarem Exames de Suficiência, pois, entendemos que sob suas lideranças, elas podem estimular criações de associações, nos termos do art. 53 do Código Civil e art. 5º, XVII, da CF/1988, denominadas, por exemplo, Associação Nacional de Advogados Residentes – Anar e Associação Nacional de Contadores Residentes – ANCR, seguindo o modelo adotado na residência médica, todavia, com objetivo de atender o desempenho profissional no contexto jurídico e contábil.

De maneira que em resposta ao pleito protocolado sob o nº 070355201046, de 26/10/2010, o Ministério da Educação, por meio da Nota Técnica nº 053/2011 – CGLNES/GAB/SESu/MEC, de 25/1/2011, emitida pela Coordenação-Geral de Legislação e Normas da Educação Superior, aprovada pelo Secretário de Educação, com o fulcro da Coordenadora-Geral de Legislação e Normas da Educação Superior, Dra. Simone Horta Andrade, que assim manifestou:

"O Poder Público exerce a regulação da educação superior por meio de atos autorizativos. Para as instituições de ensino superior, o credenciamento e o recredenciamento; para os cursos a serem oferecidos, a autorização, o reconhecimento e a renovação do reconhecimento. Uma vez concluído um curso autorizado e reconhecido em uma instituição devidamente credenciada pelo Ministério da Educação, poderá o graduado exercer a profissão para a qual foi formado, nos termos da regulação profissional respectiva." (ANDRADE, 2011, p. 2)

"O artigo 211 da Carta Magna determina a forma de organização e de execução das competências comuns e concorrentes voltadas para o ensino, estabelecidas, respectivamente, nos artigos 23 e 24 para União e para os Estados e Distrito Federal, no contexto da organização político-administrativa do Estado brasileiro." (ANDRADE, 2011, p. 2)

"Uma coisa é a atribuição da área educacional de definição de diretrizes para a organização, funcionamento e supervisão dos sistemas de ensino e das escolas, em termos de diretrizes para a estruturação curricular dos cursos, determinando condições de oferta, critérios e procedimentos de avaliação da aprendizagem, requisitos para matrícula e aproveitamento de estudos e de competências constituídas, bem como para a expedição de certificados e diplomas. Resta claro, pois, competir aos órgãos próprios do sistema educacional a autorização para a instalação e funcionamento de cursos, bem como a aprovação dos respectivos planos de cursos, a supervisão do seu funcionamento e o registro de seus diplomas, para que tenham validade nacional." (ANDRADE, 2011, p. 2)

"Outra coisa é a competência dos órgãos de fiscalização do exercício profissional, no que se refere às atribuições principais e à ética profissional. Não cabe ao órgão profissional definir condições de funcionamento de cursos e de programas educacionais. O que lhes compete é definir as atribuições profissionais correspondentes a partir da respectiva lei de regulamentação da profissão, considerando o diploma expedido e registrado por escolas autorizadas e supervisionadas pelos órgãos próprios do sistema educacional, como determinam as próprias leis referentes à regulamentação das profissões." (ANDRADE, 2011, p. 2)

"Em suma, os conselhos de fiscalização das profissões regulamentadas têm a atribuição de fiscalizar o exercício profissional que resulte de uma qualificação exigida por determinação legal; aos sistemas de ensino incumbe, nos termos do art. 43 da LDB, fornecer à sociedade esses profissionais, portadores da qualificação que a lei exige, comprovada, nos termos do art. 48, pelo diploma devidamente registrado." (ANDRADE, 2011, p. 2-3)

"As atribuições de um ou de outro sistema não são concorrentes, mas complementares. Um cuida da educação e outro cuida do exercício profissional. Para o cumprimento e implementação destes ditames constitucionais, o Estado brasileiro editou diplomas legais que explicitam a forma de execução destas competências." (ANDRADE, 2011, p. 3)

"Diante do exposto, conclui-se pela impossibilidade do atendimento dos requerimentos apresentados, por se tratar de matérias que não se encontra no âmbito de competência do Ministério da Educação." (ANDRADE, 2011, p. 3)

Enfim, em virtude do mencionado posicionamento do MEC, infelizmente o nosso objetivo não foi alcançado, todavia não desanimamos na busca sobre a constitucionalidade ou não dos Exames de Suficiência. Entretanto, foi um ato discriminatório de quem não deveria externá-lo que veio a me sensibilizar ainda mais sobre o tema. De fato, o próprio Presidente da OAB, Seccional da Bahia, Dr. Saul Quadros Filho, em seu artigo "O Exame de Ordem e os Cursos de Direito", de 3/2/2011 (disponível em: http://www.oab-ba.org.br. Acesso em 8/2/2011), manifestou-se de maneira discriminatória em relação ao Bacharel em Direito diplomado pelo MEC e devidamente qualificado para o exercício da profissão. Ora, quem é graduado: em medicina é médico; engenharia é engenheiro; enfermagem é enfermeiro, geologia é geólogo, etc. Todavia, quem é graduado em direito será bacharel em direito ou advogado, bem como quem é graduado em ciências contábeis será bacharel em ciências contábeis ou contador. Aliás, tal diferença funcional na profissão emanada pelos conselhos da OAB e CRC acaba criando uma distinção entre profissionais, o que é proibido pela CF/1988. Assim, o que percebemos é que a igualdade de tratamento é um direito apenas do advogado, conforme art. 6º e 7º da Lei nº 8.906/1994, sendo dado ao Bacharel em Direito um tratamento desigual como podemos observar no cotidiano, senão vejamos:

"O resultado do último EXAME DE ORDEM (2010.2), realizado pelo Conselho Federal (106.491 inscritos), não trouxe nenhuma surpresa. Serviu, mais uma vez, para atestar o baixo nível dos Cursos de Direito no Brasil. O índice geral de aprovação foi uma lástima! O resultado também não foi surpresa para a Seccional da Bahia, dos 4.796 inscritos somente 843 lograram aprovação! A situação tem sido a mesma em todo o País, a denunciar o estado pré-falencial dos cursos de Direito no Brasil." (QUADROS FILHO, 2011)

"Hoje, na Bahia, são 50 cursos em funcionamento e seis em processo de regularização. São Paulo, com 177, supera o número de Faculdades de Direito existentes nos EUA. No Brasil são 828 cursos, mais que no resto do planeta! Somos mesmo o País dos bacharéis... O estudante de direito não se forma ADVOGADO, cursa a Faculdade para se tornar BACHAREL EM DIREITO." (QUADROS FILHO, 2011)

"Entregar a possibilidade a um bacharel em direito, recém-formado, de exercer plenamente a advocacia, sem qualquer restrição, simplesmente porque possui diploma, guardadas as devidas proporções, seria o mesmo que possibilitar ao estudante em medicina, recém-formado, sem passar pela residência médica, poder se declarar especialista em ortopedia, obstetrícia, cirurgia geral, neurocirurgia, oncologia, pediatria, cardiologia entre tantas outras especialidades em medicina." (QUADROS FILHO, 2011)


3.Inconformidade em razão da decisão da Nota Técnica do MEC nº 053/2011, submetida à Advocacia-Geral da União – AGU e a interpretação normativa exarada na Nota AGU/CGU/JCBM nº 0001/2011, de 29/03/2011

De maneira que encaminhamos um pleito ao Advogado-Geral da União, demonstrando nossa inconformidade com a Nota Técnica nº 053/2011 – CGLNES/GAB/SESu/MEC-ree, de 25/1/2011, emitida pela Coordenação-Geral de Legislação e Normas da Educação Superior, da Secretaria da Educação do Ministério da Educação, solicitando, com base nas suas atribuições constantes no art. 4º da Lei Complementar nº 73, de 10/2/1993, que nos desse uma correta interpretação das leis instituidoras dos Exames de Suficiência no contexto da Constituição Federativa do Brasil, protocolado na AGU sob o nº NUP 00400.001900/2011-22, em 18/2/2011.

Assim, no referido documento procuramos mostrar os seguintes argumentos:

"Dessa forma, o que presenciamos é uma verdadeira anarquia no ordenamento jurídico pátrio pelo fato de as instituições sustentarem proposições jurídicas ideológicas, abstendo-se dos direitos e garantias fundamentais previstas na CF/1988, a exemplo dos princípios, tais como: a isonomia, dignidade da pessoa humana, legalidade, direitos à liberdade do livre exercício da profissão; enfim, as citadas instituições afrontam a nossa Carta Magna não observando aquilo que é mais belo na Constituição promulgada em 1988, ou seja, o Estado Democrático de Direitos (art. 1º), que na verdade é o antídoto a todo cidadão ou pessoa humana para o exercício pleno de direitos, que foram instituídos com muita sabedoria pela Assembleia Nacional Constituinte, representante do povo brasileiro." (ALMEIDA, 2011, p. 3)

Ainda, mostramos as normas no contexto da educação e dos conselhos profissionalizantes, expondo sob o título do direito os seguintes esclarecimentos:

"2. DO DIREITO

2.1 De sorte que convivemos num conflito de normas que prejudica a todos, isto é, enfraquece as instituições e aniquilam os Bacharéis em Direito e agora os Bacharéis em Ciências Contábeis, na medida em que os inibem de exercerem seus direitos e garantias constitucionais. De fato, a Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 5/10/1988, assim determina:

"Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela União indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I – a soberania;

II – a cidadania;

III – a dignidade da pessoa humana;

IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V – o pluralismo político.

"Art. 3º - Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;

IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação."

"Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

II – ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;

XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;"

"Art. 6º - São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição."

"Art. 7º - São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

I – ...........................................................................................................

XXXII – proibição de distinção entre o trabalho manual, técnico e intelectual ou entre os profissionais respectivos;

"Art. 22 - Compete privativamente à União legislar sobre:

I – ........................................................................................................

XVI – organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões;

XXIV – diretrizes e bases da educação nacional;"

"Art. 205 - A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho."

"Art. 214 - A lei estabelecerá o plano nacional de educação, de duração decenal, com o objetivo de articular o sistema nacional de educação em regime de colaboração e definir diretrizes, objetivos, metas e estratégias de implementação para assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades por meio de ações integradas dos poderes públicos das diferentes esferas federativas que conduzam a:

I – ....................................................................................................

III – melhoria da qualidade do ensino;

IV – formação para o trabalho;"

2.2 Ainda, as leis ordinárias sobre os exames de suficiências e a educação no contexto da OAB, MEC e CFC assim estabelecem:

Lei nº 8.906, de 4/7/1994

"Art. 8º - Para inscrição como advogado é necessário:

I – .......................................................................................................

IV – aprovação em Exame de ordem;"

Lei nº 9. 394, de 20/12/1996

"Art. 2º - A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos

princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho."

"Art. 3º - O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I – ...............................................................................

XI – vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as práticas sociais."

"Art. 43 - A educação superior tem por finalidade:

I – .......................................................................

II – formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua;"

"Art. 48 - Os diplomas de cursos superiores reconhecidos, quando registrados, terão validade nacional como prova da formação recebida por seu titular."

Lei nº 12.249, de 11/6/2010

"Art. 76 - Os arts. 2º, 6º, 12, 21, 22, 23 e 27 do Decreto-Lei nº 9.295, de 27 de maio de 1946, passam a vigorar com a seguinte redação, renumerando-se o parágrafo único do art. 12 para §1º:

"Art. 2º - ................................................................................"

"Art. 12 - Os profissionais a que se refere este Decreto-Lei somente poderão exercer a profissão após a regular conclusão do curso de Bacharelado em Ciências Contábeis, reconhecido pelo Ministério da Educação, aprovação em Exame de Suficiência e registro no Conselho Regional de Contabilidade a que estiverem sujeitos."

Também, argumentamos em relação aos Serviços Públicos que o Estado tem uma obrigação de fazer, segundo conceito de Celso Antônio Bandeira de Mello: "uma comodidade material prestada pelo Estado ou de quem lhe faça as vezes". Vale ressaltar que, observados os elementos norteadores dos Serviços Públicos, tais como essencialidade, vínculo com o Estado, e Regime Jurídico de Direito Público, tais serviços estão ligados à dignidade da pessoa humana; por esses motivos, o MEC, as instituições de ensino, as associações profissionalizantes, e outras pertinentes, devem estar em perfeita harmonia a fim de que prevaleçam os interesses públicos sob a égide das garantias fundamentais da CF/1988, senão vejamos:

"Portanto, numa interpretação imediata, todos os Conselhos Profissionalizantes, o Ministério da Educação, o Ministério do Trabalho e o Ministério de Previdência Social estão em harmonia com a CF/1988, principalmente no tocante ao art. 1º, IV, art. 3º, IV, art. 5º, caput, XIII, art. 6º, art. 7º, XXXII, art. 22, XVI, art. 205 e art. 214, IV. Por essas razões, é notório que os sistemas não são concorrentes, mas complementares, e um cuida da educação e outro cuida do exercício profissional, como afirma o MEC, lógico que os demais conselhos estão em harmonia com o sistema complementando-os, porém a OAB e o CFC são concorrentes, estando em total desarmonia com o sistema no contexto constitucional relacionado à educação e o exercício da profissão." (ALMEIDA, 2011, p. 8)

"De sorte que concluímos que a obrigatoriedade dos exames de suficiência fere o princípio da isonomia, previsto na CF/1988, notadamente o caput do art. 5º, art. 7º, XXXII, nas relações de trabalho sobre a igualdade trabalhista, pois faz uma diferença muito grande entre ser advogado e ser bacharel em direito, quer dizer, o primeiro exerce a advocacia e o outro não; contudo, tais distinções são proibidas, nos termos do art. 7º, XXXII, CF/1988. Assim, sobre o princípio da isonomia, bem como a proibição constitucional de distinção entre profissionais, o MEC deu uma explicação evasiva na Nota Técnica nº 053/2011, item 14, fls. 3: "Cabe ressaltar que o diploma de graduação não é específico para uma única área de atuação. Pelo contrário, a formação em curso superior abre um leque de possibilidades de atuação em diversas áreas." (ALMEIDA, 2011, p. 8)

De maneira que, em resposta à Demanda nº 000960/2011-31, da AGU/Ouvidoria-Geral, em relação ao pleito de manifestação de inconformidade em razão da Nota Técnica do MEC nº 053/2011, protocolado sob o nº NUP 00400.001900/2011-22, em 18/2/2011, a Consultoria-Geral da União respondeu por meio da Nota AGU/CGU/JCBM nº 0001/2011, de 29/3/2011, aprovada pelo Consultor-Geral da União, com o fulcro do Procurador-Federal Dr. Júlio Cesar Barbosa Melo, que assim manifestou:

"Edson Sebastião de Almeida requereu ao Excelentíssimo Senhor Advogado-Geral da União manifestação a respeito da constitucionalidade e legalidade dos exames de suficiência para exercício da profissão de advogado e de contador. A OAB e o Conselho Federal de Contabilidade estariam exercendo "atribuição que é exclusiva do Poder Público, que já cumpriu o seu papel por meio do diploma de graduação concedido ao bacharel nos termos do art. 205, da CF/1988, combinado com art. 43, II e art. 48 da Lei nº 9.394/1996". (MELO, 2011, p. 45)

"O conflito apontado pelo requerente não existe. O MEC trata da regulação do ensino superior e os Conselhos da OAB e o de Contabilidade do exercício profissional. Cuidam de aferir a qualificação profissional. Diz a CF/88 no art. 5º, inciso XIII que "é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer". No caso, o exercício da profissão do Advogado e do Contador é submetido ao prévio Exame de Suficiência com previsão nas Leis n. 8.906/94, art. 8º, IV e seu §1º e nº 12.249/2010." (MELO, 2011, p. 46)

"Não há sobreposição de atribuições com as outorgadas ao MEC pela Lei nº 9.394/96, uma vez que a OAB e o CRC atuam na regulamentação e fiscalização das respectivas atividades. Não atuam na formação acadêmica. Atuam na seara do exercício profissional. Campos distintos." (MELO, 2011, p. 47)

"Assim, considerando a inexistência de conflito entre as atribuições do MEC e dos entes de regulação profissional – OAB e CFC – e a plena vigência das Leis nº 8.906/94, art. 8º, IV e seu §1º e Lei nº 12.249/2010, Leis que autorizam exame de suficiência, resulta inviável o acolhimento do pleito." (MELO, 2011, p. 47)


4.Decisões Judiciais

"RELATOR : MIN. MARCO AURÉLIO

RECTE.(S): JOÃO ANTÔNIO VOLANTE

ADV.(A/S): CARLA SILVANA RIBEIRO D´ ÁVILA

RECDO.(A/S): UNIÃO

ADV.(A/S): ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

RECDO.(A/S): CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL

ADV.(A/S): MIRIAM CRISTINA KRAICZK E OUTRO (A/S)

PRONUNCIAMENTO

EXAME DE ORDEM – LEI Nº 8.906/94 CONSTITUCIONALIDADE ASSENTADA NA ORIGEM – RECURSO EXTRAORDINÁRIO E RECURSO ESPECIAL – TEMA ÚNICO DE ÍNDOLE CONSTITUCIONAL – REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA.

1. A Assessoria prestou as seguintes informações:

Submeto a Vossa Excelência o tema veiculado no Recurso Extraordinário nº 603.583/RS, para exame da oportunidade de incluir a matéria no sistema eletrônico da repercussão geral.

O Tribunal Regional Federal da 4ª Região rejeitou a alegação de inconstitucionalidade do artigo 8º, § 1º, da Lei nº 8.906/94 e dos Provimentos nº 81/96 e 109/05 do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil. Conforme a Corte, ao estabelecer que somente bacharéis em Direito podem participar do Exame de Ordem, o Conselho Federal da OAB observou os limites da competência prevista no mencionado preceito legal. Além disso, a exigência de aprovação no Exame de Ordem como requisito para o exercício da advocacia não conflitaria com o princípio da liberdade profissional – artigo 5º, inciso XIII, da Carta da República. Os embargos declaratórios interpostos contra o acórdão foram desprovidos.

No extraordinário interposto com alegada base na alínea a do permissivo constitucional, o recorrente articula com a ofensa aos artigos 1º, incisos II, III e IV, 3º, incisos I, II, III e IV, 5º, incisos II e XIII, 84, inciso IV, 170, 193, 205, 207, 209, inciso II, e 214, incisos IV e V, da Lei Maior. Inicialmente, afirma não haver pronunciamento do Supremo quanto à constitucionalidade do Exame de Ordem. Sustenta caber apenas à instituição de ensino superior certificar se o bacharel é apto para exercer as profissões da área jurídica. Reputa inconstitucional a autorização, constante do artigo 8º da Lei nº 8.906/94, para regulamentação do Exame de Ordem pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, consideradas a afronta ao princípio da legalidade e a usurpação da competência privativa do Presidente da República para regulamentar leis.

Conforme alega, a submissão dos bacharéis ao Exame de Ordem atenta contra os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade bem como do livre exercício das profissões e contra o direito à vida. Impedir que os bacharéis exerçam a profissão de advogado após a conclusão do curso universitário também representaria ofensa aos princípios da presunção de inocência, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Discorre sobre o valor social do trabalho, fundamento da República Federativa do Brasil, e diz que a exigência de aprovação no Exame de Ordem representa censura prévia ao exercício profissional. Por fim, relata ter sido editada norma federal específica com a finalidade de regulamentar, para todas as profissões, o artigo 205 da Carta da República: a Lei nº 9.394/96, denominada Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Sob o ângulo da repercussão geral, assevera que o entendimento a ser adotado por esta Corte norteará a aplicação do Direito Constitucional em inúmeros casos semelhantes. Afirma estar em jogo tema relevante do ponto de vista: a) moral, diante da frustração dos bacharéis impedidos de exercer a advocacia e dos respectivos familiares; b) econômico, pois a carteira de advogado viabilizaria o exercício da profissão e c) social, considerada a impossibilidade de o bacharel participar efetivamente da sociedade como conhecedor e aplicador do Direito. Diz da existência de vários projetos de lei a respeito da extinção do Exame de Ordem.

O Vice-Presidente da Corte de origem admitiu o extraordinário.

O trânsito do recurso especial simultaneamente protocolado foi obstado na origem. Não há notícia da interposição de agravo de instrumento dirigido ao Superior Tribunal de Justiça.

Brasília, 5 de novembro de 2009.

2. A ausência de interposição de agravo contra o ato que implicou a inadmissibilidade do recurso especial não prejudica o trânsito deste extraordinário. A razão é única: o acórdão impugnado tem fundamento estritamente constitucional, havendo a Corte de origem placitado a Lei nº 8.906/94.

No mais, está-se diante de situação concreta retratada em inúmeros processos. Bacharéis em Direito insurgem-se nos diversos órgãos do Judiciário contra o denominado Exame de Ordem, que, segundo argumentam, obstaculiza de forma setorizada, exclusivamente quanto a eles, o exercício profissional. O Supremo há de pacificar a matéria, pouco importando em que sentido o faça.

3. Manifesto-me pela existência de repercussão geral.

4. Incluam no sistema.

5. À Assessoria, para acompanhar o incidente.

6. Publiquem.

Brasília – residência – 14 de novembro de 2009, às 20h.

Ministro MARCO AURÉLIO – Relator"

"DECISÃO

SILVIO GOMES NOGUEIRA, MARCELLO SANTOS DA VERDADE, ALESSANDRA GOMES DA COSTA NOGUEIRA, MARLENE CUNTO MUREB, FABIO PINTO DA FONSECA e RICARDO PINTO DA FONSECA impetram o presente Mandado de Segurança contra ato do Ilmo. Sr. Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional do Estado do Rio de Janeiro, postulando seja deferida liminar para que o impetrado se abstenha de exigir submissão dos impetrantes a exame de ordem para suas inscrições nos quadros da autarquia, determinando que sejam imediatamente aceitas mediante o cumprimento das demais exigências do art. 8º da L. 8.906/94, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 para o caso de descumprimento. Requer ao final a confirmação da liminar reconhecendo-se incidentalmente que a exigência do exame foi revogada pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (L. 9.394/6, art. 43, inc. II e 48) e que o Estatuto da Ordem dos Advogados nesta parte é inconstitucional por ferir os arts. 5º, inc. XIII e 205 da Carta Magna. Inicial de fls. 02/33.

Informações de fls. 49/61 postulando pela denegação da segurança.

Decido.

Dispõe a Constituição Federal:

Art. 5º -

XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer;

A respeito do papel da OAB e do exercício da profissão de advogado dispõe a L. 8.906/94:

Art. 1º São atividades privativas de advocacia:

I - a postulação a qualquer órgão do Poder Judiciário e aos juizados especiais;

II - as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas.

§ 1º Não se inclui na atividade privativa de advocacia a impetração de habeas corpus em qualquer instância ou tribunal.

§ 2º Os atos e contratos constitutivos de pessoas jurídicas, sob pena de nulidade, só podem ser admitidos a registro, nos órgãos competentes, quando visados por advogados.

§ 3º É vedada a divulgação de advocacia em conjunto com outra atividade.

Art. 3º O exercício da atividade de advocacia no território brasileiro e a denominação de advogado são privativos dos inscritos na Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).

Art. 8º Para inscrição como advogado é necessário:

I - capacidade civil;

II - diploma ou certidão de graduação em direito, obtido em instituição de ensino oficialmente autorizada e credenciada;

III - título de eleitor e quitação do serviço militar, ser brasileiro;

IV - aprovação em Exame de Ordem;

V - não exercer atividade incompatível com a advocacia;

VI - idoneidade moral;

VII - prestar compromisso perante o conselho.

Art. 44. A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), serviço público, dotada de personalidade jurídica e forma federativa, tem por finalidade:

I - defender a Constituição, a ordem jurídica do Estado democrático de direito, os direitos humanos, a justiça social, e pugnar pela boa aplicação das leis, pela rápida administração da justiça e pelo aperfeiçoamento da cultura e das instituições jurídicas;

II - promover, com exclusividade, a representação, a defesa, a seleção e a disciplina dos advogados em toda a República Federativa do Brasil.

Ora, a Carta Magna limita o direito ao exercício da profissão à qualificação profissional fixada em lei. Qualificação é ensino, é formação. Neste aspecto, o exame de ordem não propicia qualificação nenhuma e como se vê das recentes notícias e decisões judiciais reconhecendo nulidade de questões dos exames (algumas por demais absurdas), tampouco serve como instrumento de medição da qualidade do ensino obtido pelo futuro profissional. Desta forma, a L. 8.906/94 no seu art. 8º, inc. IV é inconstitucional. A OAB por outro lado, não se constitui em instituição de ensino como disciplinada pela L. 9.394/96. Isto posto, DEFIRO A LIMINAR para determinar à autoridade coatora que se abstenha de exigir dos impetrantes submissão a exame de ordem para conceder-lhes inscrição, bastando para tanto o cumprimento das demais exigências do art. 8º da L. 8.906/94. Oficie-se e intime-se. Após, ao Ministério Público Federal voltando conclusos para sentença."


5.Questões polêmicas sobre a instituição dos Exames de Suficiência, considerando as normas constitucionais e administrativas, bem como os atos administrativos do MEC e da AGU

Não obstante a importância da formatação jurídico-constitucional da Consultoria-Geral da União, faz-se mister mostrar as questões que entendemos mais polêmicas sobre Direito Constitucional e Direito Administrativo, considerando a Nota Técnica nº 053/2011 – CGLNES/GAB/SESu/MEC, de 25/1/2011, Nota AGU/CGU/JCBM nº 0001/2011, Lei nº 8.906/1994, art. 8º, IV e §1º e Lei nº 12.249/2010, art. 76, Lei nº 9.394/1996, art. 53, VI, art. 43, II, e art.48, no contexto da CF/1988.

A primeira questão é em relação à Nota Técnica nº 053/2011, emitida pelo MEC, e à Nota nº 0001/2011, emitida pela AGU, cujo nosso entendimento trata-se de Atos Administrativos e, portanto, não há dúvida de que as Autoridades do MEC e da AGU como Agentes Públicos cumpriram sua competência, qual seja um poder-dever tendo como requisito para validade do Ato Administrativo os seus elementos, isto é, objeto, forma, motivo e finalidade.

No entanto em que pese o atributo da imperatividade da Nota Técnica e da Nota como Atos Administrativos, não há que se falar em coisa julgada em relação a Ato Administrativo, conforme o princípio do Controle Judicial. Pois todo Ato Administrativo é passível de ser reformado pelo Poder Judiciário, não há coisa julgada administrativa, ou seja, as decisões de méritos definitivas na esfera administrativa não transitam em julgado, por conseguinte, podem ser alterados pelo Poder Judiciário. Assim, o esgotamento na esfera administrativa é entendido como preclusão, isto é, esgota a matéria.

Também, outra questão é o disposto no art. 5º, XIII da CF/1988, que estabelece: "é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer." Ora, com base no citado dispositivo não apenas alguns tribunais do País estão sustentando a constitucionalidade da Lei nº 8.906/1994, mas também o MEC e a AGU com fundamentação legal baseados no item 4 da Nota Técnica 053/2011 e Nota 0001/2011, respectivamente, os quais possuem o mesmo entendimento sobre a legalidade dos exames de suficiência, contidos na regulação profissional, instituídos por leis infraconstitucionais.

Portanto, com relação ao citado dispositivo constitucional, existem duas polêmicas, uma em relação à Teoria da Recepção e outra em relação à Eficácia Jurídica das Normas Constitucionais. De fato, com a instituição da Lei nº 8.906/1994 e Lei nº 12.249/2010, supostamente estas estariam de acordo com o dispositivo legal citado (art. 5º, XIII), isto é, as citadas Leis são constitucionais na medida em que as leis infraconstitucionais restringem o livre exercício da profissão. Porém, discordamos com esse entendimento, pois, quando entrou em vigor a CF/1988, não existia vácuo normativo em relação às leis disciplinadoras dos Conselhos Profissionalizantes. Por essa razão, acreditamos que pelo princípio da recepção todas as Leis instituidoras dos Conselhos e ordens incumbidos da fiscalização das profissões, a exemplo da Lei nº 5.194, de 24/12/1966, do Conselho Federal de Engenheiro, Arquiteto e Engenheiro-Agrônomo (Crea), Lei nº 5.905, de 12/7/1973, do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), Lei nº 3.268, de 30/9/1957, do Conselho Federal de Medicina, Lei nº 4.215, de 27/04/1963, da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Decreto-lei nº 9.295, de 27/5/1946, do Conselho Federal de Contabilidade (CFC), etc., tacitamente foram recepcionadas pela CF/1988, em seu art. 5º, inciso XIII, pois as citadas leis já existiam naquela época, até mesmo algumas delas estão vigentes até hoje no ordenamento jurídico.

De sorte que, conforme nosso entendimento exposto no parágrafo anterior, quando da entrada em vigor da CF/1988, os Conselhos Profissionalizantes e de Ordem já possuíam naquela época seus Códigos de Ética, no caso a OAB a Lei nº 4.215/1963 e o CRC o Decreto-lei nº 9.295/1946, os quais foram recepcionados pela CF/1988. Por essa razão, naquele ano de vigência da CF/1988, em relação ao exercício da profissão não havia que se falar em norma de eficácia plena e sim de norma de eficácia redutível ou restritiva, isto é, nos termos em que foram estabelecidas as citadas leis, ou seja, não existia dispositivo legal do Exame de Ordem, nem tão pouco do Exame de Suficiência, respectivamente.

Enfim, em relação ao inciso XIII, art. 5º da CF/1988, quando entrou em vigor a Lei nº 8.906/1994, entendemos que ela foi interpretada equivocadamente para que justificasse uma alteração objetivando a inserção no Código de Ordem os Exames de Suficiência, os quais não existiam na época em que a CF/1988 entrou em vigor, estando o citado Conselho de Ordem sob a égide da Lei nº 4.215/1963. Aliás, com base na Teoria da Recepção, a mencionada lei, por economia legislativa, foi recepcionada, ou seja, a nova ordem recebeu o ordenamento jurídico anterior, no caso a Lei nº 4.215/1963, do Conselho de Ordem, o qual estava compatível com o texto constitucional, isto é, o dispositivo legal previsto no inciso XIII, art. 5º da Carta Magna. Vale ressaltar que não estamos reportando-nos às jurisprudências que não reconhecem a inscrição na OAB do Bacharel em Direito, sob a égide da Lei nº 4.215/1963, não considerando a pretensão do postulante como direito adquirido.

Finalmente, outra questão relevante que ressaltamos e que, pelo que parece, o MEC, AGU, OAB e alguns tribunais do País adotam conceitos de eficácia jurídica das normas constitucionais embasados numa linha doutrinária de José Afonso da Silva. De fato, em relação à espécie de norma contida, cuja aplicação constitucional fica restringida por uma legislação futura, isto é, uma lei infraconstitucional, dá-nos uma impressão de que necessariamente está restringida.

Todavia, acreditamos que os Conselhos Profissionalizantes, MEC, AGU e alguns tribunais do País, estão equivocados sobre os conceitos de normas contidas. Pois, até o autor José Afonso da Silva, mostra grande sabedoria ao afirmar:

"Tudo isso constitui modos de restrições das liberdades, que, no entanto, esbarram no princípio de que é a liberdade, o direito, que deve prevalecer, não podendo ser extirpado por via da atuação do Poder Legislativo nem do poder de polícia, Este é, sem dúvida, um sistema importante de limitação de direitos individuais, mas só tem cabimento na extensão requerida pelo bem-estar social. Fora daí é arbítrio." (SILVA, 2002, p. 268)

Não obstante, outra linha doutrinária é a de Michel Temer e Maria Helena Diniz, os quais não entendem a aplicabilidade da norma como norma contida e sim como normas constitucionais de eficácia redutível ou restringível ou normas constitucionais de eficácia relativa restringível, respectivamente. Pois, como nos ensina o Professor Marcelo Novelino, a eficácia não é necessariamente contida, ela poderá ser contida, possivelmente não integral porque existe a possibilidade de sofrer restrição. Assim, tal entendimento é aceito por outros doutrinadores, professores e profissionais do Direito que admitem como mais correta a linha doutrinária de Michel Temer e a de Maria Helena Diniz em relação à eficácia da citada norma jurídica. Ainda, Alexandre Moraes, entende que a norma de eficácia contida o legislador constituinte deixou margem à atuação restritiva por parte da competência discricionária do poder público, senão vejamos:

"Normas constitucionais de eficácia contida são aquelas "que o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a determinada matéria, mas deixou margem à atuação restritiva por parte da competência discricionária do poder público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais neles enunciados (por exemplo: art. 5º, XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer)". (MORAES, 2003, p. 41)


6.Considerações finais

Assim, entendemos que as revogações e as alterações dos Códigos de Ética da OAB e do CRC, acrescentando os Exames de Suficiência, por meio do inciso IV, art. 8º da Lei nº 8.906/1994 e art. 76 da Lei nº 12.249/2010, os quais não são de interesse da coletividade, dessa maneira não sendo compatíveis com atividade de Poder de Polícia no desempenho das suas funções constitucionais. Por sua vez, os demais Conselhos de fiscalizações dos exercícios das profissões mantiveram o objetivo constitucional, ou seja, são classificados de Administração Pública Indireta, como pessoas jurídicas de direito público, na espécie autarquias, nos termos do Inciso I, art. 5º do Decreto-lei nº 200, de 1967, combinado com art. 21, XXIV, da CF/1988, os quais exercem a tarefa de fiscalização atribuída ao Estado, ou seja, atividade de polícia fiscalizando as profissões de competência da União, baseadas na autoexecutoriedade, discricionaridade e coercibilidade, atinentes às características do poder de polícia. Aliás, somos sabedores de que a função do Estado é restringir o direito dos particulares em favor do interesse coletivo. Portanto, dar-lhes outras atribuições, incluindo dispositivos legais, alterando ou revogando normas de direito, tão somente para justificar a inserção de Exames de Suficiência, que não são de interesse da coletividade e sim dos Conselhos Profissionalizantes, sem o veto jurídico do Presidente da República, quando ele sancionou a mencionada Lei, entendemos que o Chefe do Executivo exorbitou do seu poder, o que a CF/1988 não permite.

De sorte que os demais Conselhos Profissionalizantes mantiveram suas funções constitucionais de Poder de Polícia, com seus respectivos Códigos de Ética, aprovados pelas leis instituidoras dos Conselhos. Tais leis foram recepcionadas pela CF/1988, com suas aplicabilidades de acordo com as espécies de eficácia jurídica das normas constitucionais, no tocante ao disposto no inciso XIII, art. 5º da CF/1988, sem nenhuma exigência de Exames de Suficiência. Enfim, os citados exames foram instituídos em 1994, pela OAB, como somos sabedores, sob o pretexto da má educação dos cursos de Direito no país, bem como do aumento das faculdades particulares de cursos de Direito na década de 1990. Aliás, o ensino superior no Brasil veio a retomar seu crescimento durante o Governo Fernando Henrique Cardoso, quando houve um substancial aumento de vagas nas faculdades privadas. Vale ressaltar que essa expansão ocorreu por meio de uma legislação que facilitou a abertura de cursos e instituições, bem como de faculdades, centros universitários e universidades; todavia, não existiam tantos cursos de Direito naquela época comparando-se com esta década.

Vale ressaltar que, ao finalizar o presente artigo, tomamos conhecimento do artigo de autoria do Professor Fernando Lima, denominado: Exame da OAB. O Projeto de Lei nº 1.284/2011, Ophir e os representantes de "organizações de reprovados no teste" (disponível em: http://jus.com.br. Acesso em: 23/5/2011), onde o autor mostra o posicionamento da OAB em relação ao projeto citado, enfim demonstrando o status de vexame, humilhação e discriminação em que os bacharéis em Direito são tratados, inclusive pelo próprio Presidente da OAB, Dr. Ophir Cavalcante.

Não obstante, a proposta constante do Projeto nº 1.284/2011, de autoria do Deputado Jorge Pinheiro, entendemos como demonstrado em nosso artigo que os Exames de Suficiência devem ser extintos, sejam aqueles impostos pela OAB e CRC, bem como por quaisquer Conselhos Profissionalizantes que venham adotá-los por meio de leis infraconstitucionais, pois os citados Exames de Suficiência devem ser analisados no contexto da educação em harmonia com nossa Carta Magna, observando o Estado Democrático de Direito.

Portanto, não temos nenhum conhecimento de que algum Conselho Profissionalizante que aplica Exames de Suficiência tenha colaborado para melhoria do ensino. Porém, fazem severas críticas aos cursos de Direito das faculdades particulares, bem como dos Bacharéis em Direito graduados pelas citadas faculdades, sustentando proposições jurídicas ideológicas, abstendo-se da dignidade da pessoa humana, inibindo o Bacharel em Direito da liberdade do livre exercício da profissão, afrontando a nossa Carta Magna não observando aquilo que é de mais belo na Constituição promulgada em 1988, ou seja, o Estado Democrático de Direito, que, na verdade, é o antídoto a todo cidadão para o exercício pleno de direitos instituídos na nossa Constituição. Enfim, ficamos na expectativa em relação às elucidações das questões polêmicas para o posicionamento do Poder Judiciário e/ou revogações dos dispositivos legais que introduziram os Exames de Suficiência da OAB e do CRC.


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ALMEIDA, Edson Sebastião de. Questões polêmicas dos exames de suficiência da OAB e do CRC, instituídos por leis infraconstitucionais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2945, 25 jul. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19627. Acesso em: 24 abr. 2024.