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Execução fiscal administrativa: análise da eficiência da cobrança do crédito público proposta pelo Projeto de Lei nº 5.080/09

Execução fiscal administrativa: análise da eficiência da cobrança do crédito público proposta pelo Projeto de Lei nº 5.080/09

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O projeto de lei, apesar de todas as suas propostas de modificação ao modelo de cobrança do crédito público, não traz a resolutividade necessária para o alcance da efetividade.

"Mas, buscai primeiro o reino de Deus, e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas." (Mateus 6,34)

RESUMO

O presente trabalho destina-se a discutir, sob a óptica da eficiência, as alterações trazidas pelo projeto de lei 5.080/09, que dispõe acerca da cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública. Os problemas vividos no processo de execução fiscal são apresentados, por meio de relatórios e vozes abalizadas no assunto, que expõem a situação do atual modelo de cobrança do crédito público. Compara os resultados obtidos da aplicação da Lei de Execução Fiscal, nestes mais de 30 anos de sua vigência, com os objetivos almejados quando de sua edição. Analisa dados estatísticos, expondo pontos de vista de várias autoridades acerca do tema. Explora a exposição de motivos que ensejou o supramencionado projeto de lei. Examina as inovações oferecidas pelo projeto de lei 5.080/09 e apresenta críticas e considerações que despontaram sobre o tema, concluindo se as modificações tornarão ou não célere, eficaz e eficiente a cobrança do crédito público.

Palavras-chave: Cobrança. Crédito Público. Dívida Ativa. Execução Fiscal. Penhora Administrativa. Eficiência.


ABSTRACT

This paper aims to discuss, from the viewpoint of efficiency, the changes introduced by the bill 5.080/09, which provides about the recovery of outstanding debt of the Treasury. The problems experienced in tax enforcement proceedings are presented through reports and authoritative voices on the subject, which reveal the situation of the current model of charging the public credit. Compare the results of the implementation of the Law Enforcement Committee, those over 30 years of its term, with the desired goals when editing. Analyzes statistical data, exposing views of various authorities on the subject. Explores the explanatory statement which caused the aforementioned bill. Examines the innovations offered by the bill and presents 5.080/09 and considerations that have emerged on the subject, concluding whether or not to make changes fast, efficient and effective recovery of public credit.

Keywords: Recovery. Public Credit. Debt. Tax Enforcement. Administrative Attachment. Efficiency.

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. CAPÍTULO 1. Execução Fiscal. CAPÍTULO 2. Importância da Eficiência na Execução Fiscal. CAPÍTULO 3. Objetivos da Lei de Execução Fiscal. CAPÍTULO 4. O Porquê das Mudanças na LEF . CAPÍTULO 5. Alterações Propostas pelo Pl 5.080/2009. Ato de Constrição. Sistema Nacional de Informações Patrimoniais do Contribuintes – Snipc. Parcelamento. Formalização da Exceção de Pré-Executividade. Crivo da Execução Fiscal. CAPÍTULO 6. Discussão dos Resultados Práticos. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS


INTRODUÇÃO

O processo de execução fiscal, atualmente regulado pela lei 6.830/80, tem por finalidade satisfazer o crédito da Fazenda Pública de forma ágil e eficaz, conforme se mostrará. Porém o feito executivo não tem se prestado a desempenhar seu papel principal, mostrando-se cada vez mais moroso e oneroso aos cofres públicos, pois além de não alcançar sua finalidade, o processo judicial de execução fiscal tem contribuído, e muito, para o congestionamento do Judiciário.

Investido deste espírito de insafisfação com o atual modelo de cobrança do crédito público, o projeto de lei 5.080/2009, que propõe alterações acerca da cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública, tramita na Câmara dos Deputados.

Importante ressaltar que o presente trabalho, não tem por objetitvo adentrar no debate acerca da constitucionalidade e/ou legalidade das alterações que causam polêmica.

Busca-se, mostrar, aqui, por meio de pesquisas estatísticas, relatórios e posições doutrinárias e jurisprudenciais, que o mencionado projeto de lei, apesar de todas as suas propostas de modificação ao modelo de cobrança do crédito público, não traz em sua bagagem a resolutividade necessária para o alcance da efetividade na execução do crédito público.


1 EXECUÇÃO FISCAL

Segundo Fredie Didier Jr., Leonardo José Carneiro da Cunha, Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira:

"Executar é satisfazer uma prestação devida, podendo a execução ser espontânea, quando o devedor cumpre voluntariamente a prestação, ou forçada, quando o cumprimento da prestação é obtido por meio da prática de atos executivos pelo Estado" [01].

Para Hugo de Brito Machado a execução fiscal consiste na "ação de que dispõe a Fazenda Pública para a cobrança de seus créditos, sejam tributários ou não, desde que inscritos como Dívida Ativa" [02].

Sendo a execução fiscal a ação de que dispõe a Fazenda Pública para a cobrança de seus créditos inscritos como Dívida Ativa, insta determinar e compreender o alcance do termo Fazenda Pública, bem como esclarecer em que consiste a inscrição como Dívida Ativa.

Conforme preceitua Leonardo José Carneiro da Cunha, o termo Fazenda Pública é expressão que guarda relação com finanças estatais:

"A expressão Fazenda Pública identifica-se tradicionalmente como a área da Administração Pública que trata da gestão das finanças, bem como da fixação e implementação de políticas econômicas. Em outras palavras, Fazenda Pública é expressão que se relaciona com as finanças estatais, estando imbricada com o termo Erário, representando o aspecto financeiro do ente público." [03]

O nobre professor Eduardo Sabbag esclareçe que quando não há o pagamento dos créditos da Fazenda Pública, em época própria, procede-se a sua inscrição no cadastro da Dívida Ativa:

"... o crédito tributário, se não for pago administrativamente às repartições arrecadadoras, dentro do prazo legal ou resultante de decisão do processo do qual ele provenha, converte-se-á em "Dívida Ativa" da Fazenda pelo procedimento de "inscrição" nos livros da repartição competente para isso." [04]

A inscrição em Dívida Atíva constitui procedimento que visa apurar e atribuir certeza e liquídez do crédito, determinando, de forma válida, a existência, a quantia e a responsabilidade principal e subsidiária pela quitação do mesmo. Após o procedimento de inscrição, a Fazenda Pública estará habilitada a promover a execução em juízo, mediante a emissão da Certidão de Dívida Ativa [05].

Nos termos do art. 586 do Código de Processo Civil, a execução para cobrança de crédito sempre será fundada em título de obrigação.

Conforme ensinamentos do célebre Humberto Theodoro Júnior, a Certidão de Dívida Ativa é o título que embasa a execução fiscal, sendo que a mera existência de tal título, faz nascer a presunção legal de certeza e liquidez [06], atributos do título executivo.

Assim, a Fazenda Pública, após concluir o procedimento de inscrição, tem à sua disposição título executivio (art. 585, VII do CPC) que a habilita a proceder ao ajuizamento da execução fiscal, para cobrança do crédito público devido.


2 IMPORTÂNCIA DA EFICIÊNCIA NA EXECUÇÃO FISCAL

Com o advento da Constituição Federal de 1988, os estatutos normativos vigentes e vindouros têm que se adequar aos princípios e objetivos constitucionais.

Do princípio constitucional do devido processo legal (art. 5º, inciso LIV da Constituição Federal de 1988), é possível extrair-se o princípio da efetividade, conforme preceitua a doutrina de Fredie Didier Jr., Leonardo José Carneiro da Cunha, Paula Sarno Braga e Rafael Oliveira. Afirmam, ainda, que "o princípio da efetividade garante o direito fundamental à tutela executiva" [07].

Marcelo Lima Guerra, juiz do trabalho e professor, leciona que a tutela executiva consiste "na exigência de um sistema completo de tutela executiva, no qual existam meios executivos capazes de proporcionar pronta e integral satisfação a qualquer direito merecedor de tutela executiva" [08].

Este posiconamento deve ser entendido como uma garantia a uma prestação jurisdicional célere, adequada e eficaz:

"Este posionamento é reforçado pela moderna compreesão do chamado "princípio da inafastabilidade", que conforme célebre lição de Kauzo Watanabe, deve ser entendido não como uma garantia formal, uma garantia pura e simplesmente, "bater às portas do Poder Judiciário", mas sim, como garantia de acesso à ordem jurídica justa, consubstanciada em uma prestação jurisdicional célere, adequada e eficaz." [09]

À luz do art. 170, inciso IV da Carta Republicana de 1988, verifica-se que a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem como um de seus alicerces o princípio constitucional da livre concorrência.

O princípio da livre concorrência, segundo, o professor Bernardo Gonçalves Fernandes, "atua na possibilidade dos agentes econômicos poderem exercer sem embargos jurídicos criados pelo Estado, dentro de determinado mercado, com fins à produção, à circulação e ao consumo de bens e serviços" [10].

Além disso, Fernandes afirma que a livre concorrêcia mostra-se como princípio fundamental, e que não deve ser encarada como uma liberdade negativa, em que se impõe ao Estado uma atitude não intevencionista na área econômica. Mas pelo contrátrio a livre concorrência deve ser vista como princípio que exige do Estado atuação com a finalidade de garantir que um agente não abuse do poder econômico de que dispõe, comprometendo a igualdade de liberdade [11].

Desta forma, uma execução fiscal eficiente harmoniza a livre concorrência, vez que propicia um equilíbrio entre um contribuinte que cumpre suas obrigações e um contribuinte inadimplente com o Fisco, colocando-os em igualdade de condições para atuarem no mercado, garantindo uma livre e justa concorrência, além de angariar recursos para o Estado, que poderão ser utilizados para a concretização de outros objetivos.

Ao passo que, uma execução fiscal ineficiente se constitui em vantagem competitiva no mercado, que desequilibra a concorrência, favorecendo contribuintes inadimplentes, e incentiva a sonegação e a impunidade [12].

Contudo, a eficiência no processo executivo deve ser tratada com cautela sob pena de acarretar a falência do executado, não sendo assim atingido o fim a qual se direciona a ordem econômica, qual seja "a garantia da vida digna, conforme os ditamos da justiça social" [13].

A ordem econômica, apoiada na livre iniciativa, garante condições de dignidade e de justiça social nas palavras do eminente professor Bernardo Gonçalves Fernandes:

"A noção de livre iniciativa, por sua vez, está coligada à liberdade de empresa e de contrato, como condição mestra do liberalismo econômico e do capitalismo. A livre iniciativa é reproduzida também no plano da ordem econômica (art. 170) e tem como finalidade assegurar condições de dignidade e de justiça social (distributiva)." [14]

A falência do executado, também pode ser entendida como afronta ao princípio da dignidade da pessoa humana, que, segundo, ainda, o nobre professor, exige que "a figura humana receba sempre um tratamento moral condizente e igualitário, sempre tratando cada pessoa como fim em si mesma, nunca como meio (coisas) para satisfação de outros interesses ou de interesse de terceiros" [15].

O insigne professor Kiyoshi Harada, enumera uma série de medidas que julga como sendo uma "manifestação da fúria fiscal", que dificultam o exercício da liberdade econômica, maculam a imagem das empresas executadas e em nada colaboram para o crescimento econômico e, consequentemente, para o aumento na arrecadação tributária do Estado:

"... a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional elaborou um anteprojeto de lei de execução fiscal administrativa, para tentar reduzir o tempo de tramitação dos processos judiciais e ultimar a rápida arrecadação tributária. (...) Representa mais uma manifestação de fúria fiscal ao lado de trantas outras: arrolamento fiscal; indisponibilidade universal de bens do devedor; exigência de certidão negativa de tributos para levanar valores depositados em juízo, bloqueio on-line de todas as contas bancárias, inscrição no Cadin, protesto da certidão de dívida ativa, proibição de obter talonários de notas fiscais; inabilitação do CNPJ como se criar ostáculos ao livre exercício da atividade econônica e denegrir a imagem das empresas em dificuldades financeiras momentâneas pudessem contribuir para o crescimento econômico e consequente aumento da receita tributária." [16]

O notável professor, analisando o uso do sistema de penhora on-line, lembra que "buscar agilidade e eficiência na execução é medida louvável, porém, sem matar a galinha dos ovos de ouro" [17].


3 OBJETIVOS DA LEI DE EXECUÇÃO FISCAL

Em análise à Exposição de Motivos 223, que acompanhou o anteprojeto que culminou na atual Lei de Execução Fiscal – LEF, o distinto Desembargador Antônio Souza Prudente apresenta a que se propõe o então anteprojeto de lei:

"... restou consignado que o anteprojeto da vaticinada lei, "a par de não revogar as linhas gerais e a filosofia do Código, disciplina a matéria no essencial, para assegurar não só os privilégios e garantias da Fazenda Pública em juízo, como também a agilização e racionalização da cobrança da dívida ativa", concluindo que aquele "anteprojeto, por outro lado, insere-se no Programa Nacional de Desburocratização, a que se refere o Decreto 83.740, de 18 de julho de 1979, uma vez que simplifica o processo da execução da dívida ativa, reduz substancialmente, o número de despachos interlocutórios do juiz, liberando-o de trabalhos meramente burocráticos em favor da atividade especificamente judicante, utiliza os modernos serviços dos Correios para a citação dos executados, cria condições para a melhor utilização do processamento de dados na execução fiscal, descongestiona as vias judiciais, nas duas instâncias, e adota outras medidas, tudo em consonância com os princípios constitucionais que regem os direitos e garantias individuais e as funções do Poder Judiciário"." [18]

Alinhado ao entendimento do nobre magistrado, o ilustre professor Humberto Theodoro Júnior, ensina que a Lei de Execução Fiscal – LEF foi editada com a finalidade precípua de imprimir agilidade à cobrança do crédito público, dando origem a um procedimento diferenciado do previsto no Código de Processo Civil. Theodoro Júnior afirma, ainda, que "o procedimento previsto na Lei n. 6830 (...) apenas se volta para a expropriação de bens do devedor para satisfação do direito do credor (CPC, art. 646)." [19]

O professor Sabbag também considera que "por meio da Lei n. 6.830 (Lei de Execução Fiscal), normatizou-se o trato da cobrança da dívida pública no Brasil, buscando-se a agilidade no processo executivo fiscal e na satisfação do direito fazendário" [20].

Destacam-se entre os objetivos apresentados: descongestionar as vias judiciais; agilizar e racionalizar a cobrança da dívida ativa; abreviar a satisfação do crédito da Fazenda Pública.


4 O PORQUÊ DAS MUDANÇAS NA LEF

Conforme já esplanado, a lei 6.830/80 foi editada com a finalidade precípua de dar tratamento diferenciado ao processo de cobrança do crédito público, fazendo com que fosse mais ágil. Porém os resultados da aplicação desta lei, nestes mais de 30 anos, são contestatos por várias autoridades e pelos números obtidos no relatório denominado Justiça em Números 2009 [21], elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ, que apresenta indicadores referentes ao Poder Judiciário Brasileiro.

No mencionado relatório constatou-se que dos 86,6 milhões de processos em tramitação na Justiça brasileira no ano de 2009, 26,9 milhões eram execuções fiscais, constituindo aproximadamente um terço do total. No mesmo ano ingressaram 21,9 milhões de processos, sendo que quase 6,9 milhões são relativos aos processos em fase de execução.

Outro dado relevante é o indicador da taxa de congestionamento, que visa aferir, em determinado ano, o percentual de processos em tramitação que ainda não foram baixados definitivamente.

O referido indicador apontou alta taxa de congestionamento nos processos de execução em 2009, atingindo, na primeira instância, o percentual de 86,6%, isto significa que de cada 100 processos que tramitaram, no ano em questão, aproximadamente 87 não tiveram sua baixa definitiva alcançada.

Dentre os principais resultados apresentados no Justiça em Números 2009, merece destaque especial o que se refere às execuções fiscais, onde se afirma que a luta contra a lentidão da Justiça brasileira deve necessariamente abranger a discussão acerca dos procedimentos de execução fiscal, vez que o enfrentamento deste assunto tem potencial de resolver este problema.

De acordo com a Exposição de Motivos Interministerial nº 186/2008 – MF/AGU, que acompanhou o projeto de lei, objeto deste estudo, menos de 1% do estoque da dívida ativa da União ingressam nos cofres públicos a cada ano pelos feitos executivos, sendo que este percentual cresce para 2,5% quando consideradas as medidas excepcionais de parcelamento (REFIS, PAES e PAEX) e a incorporação dos depósitos judiciais.

No que se refere ao tempo de duração dos processos executivos, estima-se que, no âmbito da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, em média, a fase administrativa dura 4 anos, enquanto a fase judicial leva 12 anos para ser concluída, conforme aponta a citada exposição de motivos.

O insigne mestre Antônio Souza Prudente registra sua visão acerca da execução regida pela lei 6.830/80:

"A Lei n. 6.830 fez da Justiça brasileira, na cobrança do crédito da Fazenda Pública, um verdadeiro depósito. Com a devida vênia daqueles que sonharam e tiveram ótimas intenções – e de boas intenções o inferno está pleno – de fazer, por meio da disposição desta lei, a ampliação das Varas de execuções fiscais, como solução para a cobrança desse crédito, a decepção é constatada no dia-a-dia forense.

A Justiça Federal brasileira de 1ª Instância, em setembro deste ano, atingiu o patamar de dois milhões, setecentos e dezesseis mil e sessenta e quatro feitos em tramitação. Agora vejam a espiral: em 1994, era um acervo de um milhão, quatrocentos e vinte e um mil, oitocentos e setenta e três feitos; em 1995, um milhão, quinhentos e sessenta e um mil e noventa e quatro; em 1996, um milhão, setecentos e setenta e três mil; em 1997, dois milhões, cento e dezesseis mil; em 1998, dois milhões, trezentos e trinta e um mil; em 1999, dois milhões, seiscentos e oito mil; e, no ano 2000, dois milhões setecentos e dezesseis mil feitos. Destes, em tramitação na Justiça de 1º Grau, um milhão, duzentos e sessenta e cinco mil, quatrocentos e quatro feitos são de execuções fiscais. E a tendência é aumentar este acervo." [22]

Robustecendo as críticas ao atual modelo de execução fiscal, o notável desembargador Mairan Gonçalves Maia Júnior, no exame do anteprojeto de lei, tece suas considerações corroborando os dados apresentados e confirmando a ineficiência do processo de execução dos créditos públicos.

"São muitas as razões para justificar a modificação proposta, e entre elas se destacam: ineficácia do processo executivo fiscal, em virtude da morosidade de sua tramitação, não obstante a baixa taxa de impugnação judicial; alto custo da cobrança judicial. Por força da excessiva formalização do procedimento, e, principalmente, o grande valor da dívida ativa a receber, aproximadamente R$ 400 bilhões, excluída a previdência social." [23]

Para o ministro Humberto Gomes de Barros, a cobrança do crédito público ainda é "lenta e ineficaz", apesar da iniciativa de criação, na Justiça Federal, de centenas de juízos especializados em execuções fiscais. Segundo o ilustre ministro, a raiz do problema está no fato de o Poder Judiciário, no caso dos executivos fiscais, exercer função administrativa, configurando desvio de finalidade [24].


5 ALTERAÇÕES PROPOSTAS PELO PL 5.080/2009

Diversas alterações foram propostas pelo projeto de lei 5.080/2009, no intuito de se dar maior celeridade e efetividade à cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública.

No que tange à eficiência destacam-se as seguintes pontos:

5.1 ATO DE CONSTRIÇÃO

Nas palavras do respeitável Leonardo José Carneiro da Cunha, o ato de penhora consiste na apreensão e depósito de bens de propriedade do devedor, nos termos do art. 591 do CPC, ou de propriedade de terceiros, nos termos do art. 592 também do CPC, os quais serão utilizados para o pagamento do débito do executado [25].

Muito se discute acerca da natureza jurídica da penhora, porém a corrente predominante entende que a penhora é ato "essencialmente executivo", por meio do qual ocorre a apreensão de bens do devedor, mesmo que insuficiente para o cumprimento da obrigação contraída junto ao credor. Este é o entendimento adotado por Enrico Tullio Liebman, Ovídio Baptista da Silva, Humberto Theodoro Júnior, Araken de Assis, Alexandre Freitas Câmara, Bruno Garcia Redondo, Mário Vitor Suares Lojo e outros [26].

De acordo com o respeitável Leon Frejda Szklarowsky, subprocurador-geral da Fazenda Nacional aposentado e co-autor do anteprojeto que originou a Lei de Execução Fiscal, "a penhora administrativa não figura atividade jurisdicional e, portanto, não necessita realizar-se sob as vistas do juiz, como ressalva enfaticamente o Min. Carlos Velloso" [27].

A prática de tal ato é reservada ao Poder Judiciário, nos termos da LEF, contudo, conforme dispõe o artigo 3º do projeto de lei, os atos constrição passariam a ser executados pela Fazenda Pública credora, ficando a cargo do Poder Judiciário somente o seu controle.

Este artigo incorporou, conforme aponta a EM Interministerial nº 186/2008 – MF/AGU, sugestões do anteprojeto de Lei da Penhora Administrativa, apresentado pelo ex-Senador Lúcio Alcântara em 1996 e 1999, e reapresentado pelo Senador Pedro Simon em 2005.

O ilustre professor Kiyoshi Harada, em linha de pensamento convergente à do nobre Leon Frejda Szklarowsky, firma entendimento de que não deve ser atribuição do juiz diligenciar em busca da localização do executado e de seus bens, e imputa, nestes casos, à Fazenda exequente a culpa pela morosidade:

"A penhora administrativa, portanto, é a medida que se impõe até mesmo para forçar a Administração a reaparelhar as Procuradorias, tanto para localização dos contribuintes devedores, como também para encontrar os bens penhoráveis. Não é, nem deve ser função do juiz ficar investigando o paradeiro do devedor. Sabe-se que a maior responsável pela paralisação dos autos em cartório é a espera de providências da exeqüente para localização do executado ou para indicar os bens penhoráveis. Em última análise, a morosidade, nestes casos, não é do Judiciário, mas da Fazenda exeqüente." [28]

Outro notável que defende que a cobrança dos créditos públicos seja feita pela própria Administração, e não pelo Poder Judiciário, é o eminente Ministro Humberto Gomes de Barros, que afirma:

"A modernização do Poder Judiciário, acredito, dará um passo decisivo quando a cobrança dos créditos estatais deixar de ser um encargo do Poder Judiciário, deslocando-se para a Administração, onde ganhará agilidade e rendimento econômico. Quando isso ocorrer – estou certo -, o Poder Judiciário respirará aliviado. Em paralelo, será reduzido o número de devedores contumazes." [29]

Segundo ainda Szklarowsky, a instituição da penhora administrativa objetiva desobstruir as vias do Judiciário, retirando deste, a realização de atos puramente administrativos, favorecendo a tramitação célere da cobrança da dívida ativa [30].

5.2 SISTEMA NACIONAL DE INFORMAÇÕES PATRIMONIAIS DOS CONTRIBUINTES - SNIPC

Por meio do artigo 4º, o Poder Executivo ficará autorizado a instituir o Sistema Nacional de Informações Patrimoniais dos Constribuintes – SNIPC, o qual conterá informações relativas ao patrimônio, aos rendimentos e ao endereço dos contribuintes, entre outras.

Nos termos do artigo 4º, § 2º, órgãos como os Detran’s e entidades como Cartórios de Registro de Imóveis serão alguns dos responsáveis por alimentar este sistema.

Este mecanismo tem como finalidade reunir as informações patrimoniais dos contribuintes, facilitando a verificação da existência de bens e/ou direitos dos contribuintes inadimplentes.

O procurador da Fazenda Nacional Joédi Barboza Guimarãe assevera que a criação de um banco de dados tal como proposto é "a racionalização da cobrança em seu grau máximo". Relata que, atualmente, as pesquisas acerca da existência de bens em nome dos devedores são realizadas de maneira individualizada, por meio de ofícios dirigidos aos órgãos, que tenham a finalidade de cadastro, registro e controle de bens e direitos, "gerando trabalho burocrático e inútil" [31].

O ilustre procurador afirma, ainda, que no mínimo 80% dos pedidos de informações junto aos órgãos, não apresentam resultado positivo, "chegando-se ao cúmulo de já se ter encaminhado ofício à Agência Nacional de Aviação Civil e à Capitania dos Portos para consultar se o sacoleiro flagrado pela Receita Federal com três sacolas de bugigangas não possuía, por acaso, uma aeronave ou um barco registrado em seu nome." [32]

5.3 PARCELAMENTO

A lei 6.830/80, em seu artigo 8º prescreve que o executado será citado para, no prazo de 05 (cinco) dias pagar a dívida ou garantir a execução, sendo as formas de garantia enumerada no artigo 9º:

Art. 9º - Em garantia da execução, pelo valor da dívida, juros e multa de mora e encargos indicados na Certidão de Dívida Ativa, o executado poderá:

I - efetuar depósito em dinheiro, à ordem do Juízo em estabelecimento oficial de crédito, que assegure atualização monetária;

II - oferecer fiança bancária;

III - nomear bens à penhora, observada a ordem do artigo 11; ou

IV - indicar à penhora bens oferecidos por terceiros e aceitos pela Fazenda Pública.

A proposta do projeto de lei em comento, em seu artigo 5º, retira a possibilidade do devedor nomear bens à penhora.

Porém, prevê a possibilidade do executado solicitar o parcelamento do débito por uma das formas previstas em lei. Dessarte, o projeto de lei já começa a evidenciar uma nova visão do legislador, que percebe a necessidade de flexibilização na cobrança do crédito público.

Também se verifica e se torna notória está intenção, no projeto de lei nº 5.082/2009, que dispõe acerca da transação tributária.

A inclusão do parcelamento previsto em lei, como uma das formas de garantia da execução, certamente é uma das alterações de maior relevância sob o prisma da resolutividade, tendo em vista o já mencionado índice de arrecadação.

5.4 FORMALIZAÇÃO DA EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE

O legislador também mostrou-se atento à doutrina e à jurisprudência, vez que reconheceu, positivando no ordenamento jurídico, o instrumento de ampla utilização para a defesa dos interesses dos executados, a exceção de pré-executividade ou objeção de pré-executividade.

"Na linguagem forense usa-se o nome de exceção de preexecutivdade, ou objeção de preexecutividade, para a arguição de nulidade do processo executivo mediante petição avulsa, fora dos embargos do devedor." [33]

A posição doutrinária a respeito do tema:

"Independentemente do exato nome a ser dado à alegação, tem-se pela "pré-executividade" a possibilidade do executado alegar determinadas questões, em execução, sem a prévia garantia do juízo e o ajuizamento dos embargos do devedor." [34]

"Como já afirmado, vigora no processo executivo a regra que determina o dever de conhecimento pelo juiz, a qualquer tempo e em qualquer grau de jurisdição, das questões de ordem pública (pressupostos processuais e condições da ação, nulidades absolutas). Se cabe ao juiz conhecer tais questões de ofício, nada impede ao executado que aponte ao magistrado a existência delas" [35]

"Cabível, portanto, a objeção ou exceção de pré-executividade como mais um meio de defesa do executado na execução fiscal, mediante a qual poderá ser alegada qualquer matéria de ordem pública que deva ser conhecida de ofício pelo juiz.

A exceção de pré-executividade é utilizada pelo executado para evitar a constrição em seu patrimônio, já trazendo ao conhecimento do juiz questões de ordem pública ou alegação de matérias já pré-constituída, antes mesmo da penhora." [36]

Acerca do assunto, segue entendimento jurisprudêncial já pacificado:

"PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO, CONTRADIÇÃO, OBSCURIDADE OU ERRO MATERIAL. EFEITOS INFRINGENTES. FUNGIBILIDADE RECURSAL. EMBARGOS RECEBIDOS SOB A FORMA REGIMENTAL. REDIRECIONAMENTO DA EXECUÇÃO FISCAL. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. CABIMENTO. DESNECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. ENTENDIMENTO NA ORIGEM DE QUE AS PROVAS PRÉ-CONSTITUÍDAS SÃO INSUFICIENTES. SÚMULA 7/STJ. RECURSO INCAPAZ DE INFIRMAR OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA. AGRAVO DESPROVIDO.

1. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento pacificado no sentido de que, em execução fiscal, a exceção de pré-executividade pode ser argüida no tocante às questões de ordem pública, como naquelas pertinentes aos pressupostos processuais e às condições da ação, bem assim nos casos em que o reconhecimento da nulidade do título puder ser verificado de plano, desde que não seja necessária dilação probatória.

2. Na hipótese dos autos, o Tribunal de origem, ao negar provimento ao agravo de instrumento oferecido pelos ora recorrentes, entendeu que a exceção de pré-executividade não poderia ser regularmente processada, porquanto não havia como se aferir de plano o implemento do prazo prescricional e o encerramento irregular da sociedade, sendo necessário, para tanto, dilação probatória.

3. É vedado a esta Corte Superior, em função da Súmula 7/STJ, avaliar se as provas pré-constituídas são suficientes ou não, para ensejar o conhecimento da exceção de pré-executividade.

3. Embargos declaratórios recebidos como agravo regimental, o qual, no entanto, deve ser desprovido." [37]

Por meio do enunciado nº 393, o Superior Tribunal de Justiça sumulou entendimento, de que a exceção de pré-executividade é admissível na execução fiscal relativamente às matérias conhecíveis de ofício que não demandem dilação probatória.

Contudo, o projeto de lei, ao regular a utilização desta peça de defesa, inovou ao estipular o prazo de 30 dias, contados da notificação, para arguir o pagamento, a compensação anterior à inscrição, matérias de ordem pública e outras causas de nulidade do título que possam ser verificadas de plano, sem necessidade de dilação probatória.

5.5 CRIVO DA EXECUÇÃO FISCAL

O art. 174, inciso I do Código Tributário Nacional – CTN reza que o despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal, interrompe a prescrição. Em razão disso, conforme descreve a exposição de motivos que acompanha o projeto de lei, a Fazenda Pública, no intuito de interromper a prescrição, ajuiza ações de execução fiscal indiscriminadamente, sem o necessário exame acerca da existência de bens do devedor.

Como consequência tem-se uma enorme quantidade de processos que não se consegue dar prosseguimento devido à insolvência do executado, ou porque o mesmo se encontra em local incerto ou não sabido. A exposição de motivos acima mencionada aponta, ainda, que a paralisação dos processos executivos se deve, ou à falta de citação do devedor que se encontra em lugar incerto e não sabido, ou à ausência de indicação, pela exequente, dos bens penhoráveis.

Todavia, na tentativa de mudar esta realidade, o art. 13 do projeto de lei 5.080/2009 inclui como um dos pré-requisitos para o ajuizamento da execução fiscal, a existência de constrição preparatória ou comprovação de funcionamento da empresa executada.

Segundo o professor Harada a exigência da penhora administrativa, que nada mais é que a constrição preparatória, como condição para a propositura da ação de execução fiscal é medida que impede o congestionamento do Judiciário e obriga a Administração a adotar critério seletivo na cobrança do crédito público:

"Com a exigência de instruir a inicial com o auto de penhora, a ser feito na forma da lei de regência (a lei de penhora administrativa), impede-se o congestionamento do Judiciário com propositura de milhares de execuções fiscais fadadas ao insucesso pela não localização do devedor ou de seus bens. É forma de obrigar a administração a aparelhar melhor o seu órgão de cobrança da dívida ativa (art. 37, XXII da CF) e, ao mesmo tempo, induzir a Administração a eleger critério seletivo na cobrança do crédito tributário priorizando a cobrança de créditos de monta e de devedores solventes e com endereços definidos.

Libera-se o espaço físico da repartição judiciária competente, bem como o tempo necessário aos juízes e servidores do Judiciário para cuidar apenas de execuções viáveis." [38]

Importante frisar que, o artigo 3º combinado com o artigo 9º do projeto de lei, retira e transfere do Judiciário para a Fazenda Pública a tarefa de localizar e bloquear, provisoriamente, bens destinados à garantia do juízo. Contudo este bloqueio, somente será definitivo, ou seja, convolado em penhora ou arresto com o despacho do juiz que determinar a citação (art. 13, § 7º, II do projeto de lei) [39].

Dessarte, nenhuma execução fiscal será distribuída sem que nela haja, ou a comprovação de funcionamento da empresa executada, ou a indicação de algum bem constrito preparatoriamente, aguardando, apenas, a convolação da constrição preparatória em penhora ou arresto.

Com estas alterações, no processo de execução fiscal, todos os atos até a constrição preparatória, ficará a cargo da Administração Pública, mais especificamente das Procuradorias dos respectivos entes exequentes.


6 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS PRÁTICOS

Várias posições foram tomadas a respeito dos efeitos que o projeto de lei surtirá, caso seja aprovado.

Em nota, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional informou que a proposta que altera a Lei de Execução Fiscal visa, principalmente, desafogar o Poder Judiciário, levando para a administração tributária as ações [40].

O desembargador Antônio Souza Prudente mostra-se favorável ao modelo de cobrança em que "a competência para processar a execução do crédito da Fazenda Pública é das Procuradorias Fiscais da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e de suas Autarquias e Fundações Públicas". E alega que "somente neste contexto, a dinâmica da execução fiscal torna-se-á uma realidade, no âmbito da tutela administrativa" [41].

Para o distinto magistrado Mairan Gonçalves Maia Júnior, a principal alteração resume-se na "concentração nas mãos do credor exequente de atos antes atribuídos ao juízo", e afirma que a proposta apresentanda permite a redução tanto da litigiosidade, quanto do congestionamento no judiciário, bem como proporciona condições favoráveis à busca de maior celeridade no julgamento de outros feitos, vez que possibilita a aplicação dos parcos recursos do Poder Judiciário para as demais ações:

"... com a execução fiscal administrativa propiciar-se-ia a diminuição da litigiosidade com a conseqüente redução do congestionamento da Justiça, obtendo-se maior celeridade no julgamento dos processos de naturezal cível e criminal, tanto no âmbito da Justiça Federal quanto estadual, inclusive com o maior direcionamento dos escassos recursos do Poder Judiciário para esses processos ... " [42]

Porém, o insigne magistrado assegura que as alterações apresentadas não são possíveis a curto prazo, em razão da falta de condições materiais e humanas em que se encontra a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional:

"A proposta apresentada transfere aos orgãos da administração imensa gama de tarefas e atribuições exercidas pelo Poder Judiciário, sem que estejam presentes as condições necessárias, recursos materiais e humanos, para possam ser desempenhadas ...

...

As mudanças propostas pelo anteprojeto da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional não se revelam factíveis em curto prazo, pela notória falta de condições – materiais e humanas – para a realização das atribuições que lhe são previstas, sem embargo de comprometer direitos constitucionalmente tutelados." [43]

O professor Kiyoshi Harada afirma que transferir a execução fiscal para o âmbito da Administração não terá o condão de solucionar o problema dos executivos fiscais e aponta a necessidade de aparelhamento da Procuradoria da Fazenda Nacional com recursos humanos e materiais suficientes para a realização de suas atribuições:

"Logo, se há morosidade nas execuções fiscais, a culpa não é apenas do Judiciário. Por isso, parece óbvio que transferir a execução fiscal para o âmbito da Administração não irá resolver o problema.

...

Como se vê, o exame crítico dos dados apresentados pela PGFN está a recomendar outro tipo de providência legislativa, qual seja, o melhor aparelhamento material e pessoal da Procuradoria da Fazenda Nacional à altura de suas atribuições constitucionais e com recursos financeiros prioritários como prescreve o inciso XXII do art. 37 da CF. E acima de tudo é preciso alimentar muita vontade política de resolver o problema, ao invés de esperar que medidas legislativas supram o laborioso trabalho do servidor público e a eficiência do serviço público, que é um dos princípios constitucionais que rege a Administração Pública (art. 37 da CF)." [44]

O respeitável Leon Frejda Szklarowsky além de defender a penhora administrativa, elege a arbitragem e a transação como ferramentas eficazes e rápidas:

"A arbitragem e outros meios alternativos de conciliação de conflitos, na área privada e na área pública, seja na esfera interna, seja na esfera internacional, constituem as ferramentas eficazes e rápidas, desnudas da burocracia e do formalismo deletérios.

...

Destarte, a penhora administrativa, como forma de suavizar, o congestionamento do Judiciário, e os meios alternativos de composição de litígios FISCO-CONTRIBUINTE, como a transação e a arbitragem; esta, nos moldes da Lei 9.307, de 1996, com as adaptações e correções propostas, sem dúvida proporcionarão uma melhora nas relações do Estado com o administrado." [45]

José Roberto Marques Couto, procurador da Fazenda Nacional, alega que o novo modelo de cobrança do crédito público, ta como proposto, resultará na simples transferência da morosidade do Judiciário para as Fazendas credoras, visto que as Procuradorias responsáveis pela cobrança encontram-se "desaparelhadas e carentes de estrutura física e humana". Para o distinto procurador, seja qual for o modelo de cobrança a ser adotado, este deverá encarar algumas situações, e cita entre outras: "ausência de recursos humanos para realizar atividades meio" e "ausência de políticas positivas de estímulo ao pagamento espontâneo" [46].


CONCLUSÃO

A partir da análise das informações colhidas, verificou-se que o processo de execução fiscal corresponde à parte signficativa das ações que tramitam (aproximadamente 31%) na Justiça brasileira.

Percebeu-se, também, que as ações de execução abarrotam as prateleiras do Judiciário, em razão de sua altíssima taxa de congestionamento (86,6% nos processos de execução).

Outrossim, observou-se que a paralisação dos feitos executivos se deve, ou à falta de citação do devedor que se encontra em local incerto e não sabido, ou à ausência de indicação, pela exequente, dos bens penhoráveis.

Desse modo, foi acertada, sob o prisma da eficiência, a medida introduzida pelo art. 13 do projeto de lei, que condicionou ao ajuizamento da execução fiscal, a realização de constrição preparatória (pré-penhora) ou pelo menos a comprovação de que a empresa devedora está em funcionamento. Assim as execuções fiscais que chegarem à fase de ajuizamento serão potencialmente mais eficazes, vez que serão, em tese, impetradas em face de devedores que titularizam patrimônio, já constrito de forma prévia e preparatória.

Para a realização da investigação patrimonial, descrita no art. 4, está prevista a criação de um sistema que reunirá todas informações do contribuinte referentes ao patrimônio, aos rendimentos e aos endereços, entre outras que se encontram espalhadas nos bancos de dados de orgãos e entidades públicas e privadas (Detran, Cartório de Registro de Imóveis, Banco Central do Brasil, etc.). A criação deste sistema, intitulado SNIPC – Sistema Nacional de Informações Patrimoniais dos Contribuintes, sem sombra de dúvida, será uma ferramenta de grande utilidade, tendo em vista que possibilitará à Fazenda Pública joeirar dentre a massa de processos, os que realmente tem possibilidade de ver satisfeito o crédito público ao final do feito executivo.

Conforme já exposto, o projeto de lei em comento transferirá, caso seja aprovado, boa parte das atribuições que hoje são do Judiciário para o Executivo, mais especificamente para as Procuradorias dos entes exeqüentes. Desta forma, urge a necessidade de estruturar os órgãos de representação judicial para comportar este aumento de atribuições, sob pena de se engessar as Procuradorias, atualmente bastante deficitárias.

A princípio, as medidas supra terão o condão de desafogar o Judiciário, obstando que sejam ajuizados executivos fiscais em que não forem encontrados bens de propriedade do executado ou os que não tiverem a comprovação de que a empresa executada está em funcionamento. Pórem, para que estas medidas possam ser efetivamente realizadas, será necessário investimento em recursos materiais e humanos voltados para as Procuradorias responsáveis pela cobrança do crédito público, vez que as mesmas terão suas atribuições ampliadas e, hodiernamente, se encontam sem o aparelhamento necessário para o cumprimento de suas obrigações.

Dessarte, é imprescindível vontade política e empenho com escopo de equipar as Procuradorias responsáveis pela cobrança do crédito público, sob pena da ocorrência de mera transferência de parte significativa dos problemas, já diagnosticados, para o âmbito dos orgãos de representação jurídica dos entes exequentes e consequente fracasso dos objetivos consubstanciados no projeto de lei 5.080/2009.

Entretanto, cumpre salientar que somente isto não basta, haja vista que de nada adianta uma execução forçada contra um devedor, que ao final do processo de execução, se encontrará sem condições de prosseguir no mercado, via de consequência, não terá como ser um contribuinte adimplente, o que vai de encontro aos princípios da dignidade da pessoa humana e dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, todos fundamentos da República Federativa do Brasil.

No intuito de se flexibilizar a cobrança do crédito público, foi apresentado no Congresso Nacional outro projeto de lei, de nº 5.082/2009, que dispõe acerca da transação tributária, dotando os procuradores de autonomia para negociar e celebrar acordos com os devedores.

Vislumbra-se no instituto da transação a capacidade de tornar eficaz e eficiente a cobrança do crédito público.

Conclui-se que, apesar de todas as alterações propostas pelo projeto de lei nº 5.080/2009, o mesmo não apresenta a resolutividade necessária.


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Notas

  1. DIDIER JÚNIOR, Fredie et al. Curso de Direito Processual Civil: Execução. Salvador: Jupodivm, 2009, p. 28.
  2. MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direito Tributário. 29ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 463.
  3. DA CUNHA, Leonardo José Carneiro. A Fazenda Pública em Juízo. 8ª ed. São Paulo; Dialética, 2010, p. 15.
  4. SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 1102.
  5. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Lei de Execução Fiscal. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 9.
  6. THEODORO JÚNIOR, op. cit., p. 18.
  7. DIDIER JÚNIOR, op. cit., p. 47.
  8. GUERRA, Marcelo Lima. Direitos fundamentais e a proteção do credor na execução civil. In: DIDIER JR., Fredie et al. Curso de Direito Processual Civil: Execução. Salvador: Jupodivm, 2009, p. 47.
  9. DIDIER JÚNIOR, op. cit., p. 47.
  10. FERNANDES, Bernardo Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2010, p. 1030-1031.
  11. FERNANDES, op. cit., p. 1031.
  12. MAIA JÚNIOR, Mairan Gonçalves. Considerações críticas sobre o anteprojeto da lei de execução fiscal administrativa. Revista CEJ, Brasília, a. XI, n. 38, p. 19, jul./set. 2007.
  13. FERNANDES, op. cit., p. 1025.
  14. FERNANDES, op. cit., p. 227-228.
  15. FERNANDES, op. cit., p. 222-225.
  16. HARADA, Kiyoshi. Exame do anteprojeto de lei que dispõe sobre a cobrança de dívida ativa apresentado pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional e seu substitutivo. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/9968. Acesso em: 29 jan. 2011.
  17. HARADA, Kiyoshi. Execução fiscal. Busca da eficiência a qualquer custo. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/12233. Acesso em: 29 jan. 2011.
  18. PRUDENTE, Antônio Souza. Execução administrativa do crédito da fazenda pública. Revista do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, Brasília, v. 13, n. 12, p. 12-21, dez. 2001.
  19. THEODORO JÚNIOR, op. cit., p. 3-8.
  20. SABBAG, op. cit., p. 1101.
  21. Conselho Nacional de Justiça. Departamento de Pesquisas Judiciária. Justiça em Números 2009. Disponível em: http://www.cnj.jus.br. Acesso em: 30 jan. 2011.
  22. PRUDENTE, Antônio Souza. Cobrança administrativa do crédito público da Fazenda Pública. Revista CEJ, Brasília, v. 5, n. 13, p. 66-72, jan./abr. 2001.
  23. MAIA JÚNIOR, op. cit., p. 19.
  24. DE BARROS, Humberto Gomes. Execução Fiscal Administrativa. Revista CEJ, Brasília, a. XI, n. 39, p. 5, out./dez. 2007.
  25. DA CUNHA, op. cit., p. 391.
  26. DIDIER JÚNIOR, op. cit., p. 534-535.
  27. SZKLAROWSKY, Leon Frejda. Cobrança administrativa do crédito da Fazenda Pública. Revista CEJ, Brasília, v. 5, n.13, p.59-65, jan./abr.2001.
  28. HARADA, Kiyoshi. Exame do anteprojeto de lei que dispõe sobre a cobrança de dívida ativa apresentado pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional e seu substitutivo. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/9968. Acesso em: 29 jan. 2011.
  29. DE BARROS, op. cit,, p. 8.
  30. SZKLAROWSKY, Leon Frejda. À luz da Constituição, é possível instituir validamente a execução do crédito tributário por autoridade diversa da jurisdicional?. http://jus.com.br/revista/texto/11794. Acesso em: 29 jan. 2011.
  31. GUIMARÃE, Joédi Barboza. A nova lei de execução fiscal e a efetividade na cobrança do crédito público. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/13390. Acesso em: 12 mar. 2011.
  32. Ibidem.
  33. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 3-8.
  34. SOARES, Lidiane Cristina Faleiro. Título Do Artigo. In: CASTRO, João Antônio Lima (org.). Direito Processual – enfoque constitucional: coletânea de artigos. Belo Horizonte: Puc Minas, 2008, p. 258.
  35. WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil: Processo de Execução.5ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 139-140.
  36. DA CUNHA, op. cit., p. 416-417.
  37. BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Matéria Processual Civil. Embargos de Declaração em Agravo de Instrumento 947.839. Rel. Ministra Denise Arruda. Brasília, 22 abr. 2008.
  38. HARADA, Kiyoshi. Exame do anteprojeto de lei que dispõe sobre a cobrança de dívida ativa apresentado pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional e seu substitutivo. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/9968. Acesso em: 29 jan. 2011.
  39. Associação dos Juízes Federais do Brasil. Exposição de motivos e anteprojeto de lei de execuções fiscais. Rio de Janeiro: Revista da SJRJ, 2008. n. 23, p. 317.
  40. Procuradoria Geral da Fazenda Nacional. Novo modelo de cobrança tributária. Disponível em: http://www.pgfn.fazenda.gov.br/noticias_importadas/novo-modelo-de-cobranca-tributaria. Acesso em: 21 mar. 2011.
  41. PRUDENTE, Antônio Souza. Execução administrativa do crédito da fazenda pública. Revista do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, Rio de Janeiro, n. 2, ano 20, p. 39-57, fev. 2008.
  42. MAIA JÚNIOR, op. cit., p. 19.
  43. MAIA JÚNIOR, op. cit., p. 19-21.
  44. HARADA, Kiyoshi. Exame do anteprojeto de lei que dispõe sobre a cobrança de dívida ativa apresentado pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional e seu substitutivo.Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/9968. Acesso em: 29 jan. 2011.
  45. SZKLAROWSKY, Leon Frejda. Arbitragem na área tributária. Disponível em: http://jus.com.br/revista/texto/11068. Acesso em: 28 jan. 2011.
  46. COUTO, José Roberto Marques. Execução Paliativa: Nova lei de execução sobrecarregará a PGFN. Disponível em: http://www.conjur.com.br. Acesso em: 29 jan. 2011.

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MARTINS, Gutenberg Gonçalves. Execução fiscal administrativa: análise da eficiência da cobrança do crédito público proposta pelo Projeto de Lei nº 5.080/09. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2961, 10 ago. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19728. Acesso em: 19 maio 2024.