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Reflexões sobre a responsabilidade judicial no Estado de Direito contemporâneo

Reflexões sobre a responsabilidade judicial no Estado de Direito contemporâneo

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Tão importante quanto falar na responsabilidade judicial pelos danos derivados do exercício da função judicante é apostar em uma formação de alto nível aos presentes e futuros juízes e magistrados.

Resumo

O artigo realiza uma abordagem sobre a responsabilidade judicial que consiste em uma importante garantia ao bom funcionamento do sistema de justiça. A crescente evolução da função judicante em vários países ocidentais durante o século XX e sua maior interferência no cenário político-social é tema que possui especial relevância, ainda mais ao considerar que juízes e tribunais dispõem de autonomia e independência para proferir decisões que impossibilitam seu posterior controle e revisão pelas instâncias políticas do Estado. Nesse sentido, é indispensável a criação de mecanismos legais com o fim de apurar a responsabilidade daqueles pelos atos praticados no exercício de suas funções, pois além de uma exigência do Estado de direito contemporâneo que prima pela excelência na prestação do serviço judicial, contribui para manter a confiança dos cidadãos na administração da justiça.

PALAVRAS-CHAVE: Estado de direito contemporâneo. Função judicial. Responsabilidade.


Introdução

A prestação da tutela jurisdicional no Estado se concretiza por meio da atuação do Poder Judiciário de acordo com a clássica teoria da separação dos poderes formulada por Barão de Montesquieu no século XVIII que influenciou, decisivamente, a organização política de uma grande quantidade de países ocidentais. Por detrás da complexa estrutura daquele poder estão juízes e tribunais competentes e empenhados no papel de julgar os casos que lhe são submetidos com total diligencia e submissão às diretrizes contidas nas Constituições e nas leis.

Entretanto, para que cumpram com excelência as funções que lhe foram designadas devem desfrutar de uma independência, a qual se apresenta como uma garantia fundamental de um Estado democrático e constitucional de direito. Além de independentes a toda e qualquer forma de interferência que atente contra a formação do seu livre convencimento no momento de decidir uma lide, os juízes são responsáveis pelas suas ações, devendo explicá-las e responder pelas mesmas.

Surge, por conseguinte, um debate a nível nacional e internacional em torno à responsabilização dos juízes pelos atos praticados no exercício de suas funções, posto que é inadmissível que a administração da justiça seja defraudada ou mesmo desprestigiada por aqueles indivíduos que ocupam o cargo de um dos cidadãos responsáveis pela manutenção da vida do Estado. Dessa forma, vários sistemas jurídicos contemplaram mecanismos que permitem apurar as suas responsabilidades e cominaram penalidades no sentido de reparar eventuais danos causados.

O presente artigo, então, promove uma abordagem sobre a tipologia da responsabilidade atribuída aos juízes em distintos âmbitos (civil, penal, político, disciplinar e social) para o fim de identificar de que modo eles podem incorrer na violação dos seus deveres funcionais. Ademais, o exame sobre regime de responsabilidade judicial aqui apresentado tem como referência o ordenamento jurídico brasileiro, não desconsiderando uma perspectiva comparada com outros sistemas jurídicos no que for pertinente sobre a matéria.

O aperfeiçoamento do aparelho de justiça é, portanto, uma condição inerente a todo país que busca um crescimento existencial e aspira a melhores condições socioeconômicas, assim como sucede nos países desenvolvidos. O fortalecimento institucional, precisamente no âmbito do Judiciário, requer a presença de agentes responsáveis que exerçam suas funções e que honrem os princípios que consagram um Estado de direito. O respeito à lei deve ser uma regra e jamais uma exceção sob o risco de um colapso no Estado com o consequente desgoverno da justiça.


1       A função judicial no Estado de direito contemporâneo

Os processos de consolidação da democracia no mundo ocidental durante o século XX, produto de uma reação contra os regimes autoritários de governo, foram marcados por importantes alterações no modo de organização de muitos países que coincidiu com um movimento de reconhecimento e concretização da força normativa da Constituição e, com ele, a remodelação dos princípios estruturais que regem os mais diversos órgãos e instituições estatais.

A partir desse instante, as constituições se converteram nas normas fundamentais do sistema jurídico e passaram a condicionar o sentido e validade das demais normas e atos normativos assim como dos seus respectivos processos de produção, além de imporem determinados limites jurídicos à atuação do poder político no Estado. Predomina, assim, o modelo de Estado de direito contemporâneo[1] construído sob o pressuposto da centralidade da Constituição onde a atividade dos órgãos jurisdicionais se encontra adstrita às regras contidas naquela e nas leis.

O texto constitucional representa, assim, um projeto de vida em comunidade que se divide em duas partes, as quais delineiam as principais funções de uma Constituição: a primeira consiste na declaração de direitos como limitação ao poder do Estado mediante um catálogo de direitos que ele não pode violar; a segunda reside na forma de governo que institui o poder político, conferindo aos órgãos ou conjunto de órgãos as três funções estatais que, a partir da doutrina de Montesquieu[2], se denominaram Legislativo, Executivo e Judiciário (BARBERIS, 2008, p. 127).

Ademais, o Estado de direito contemporâneo trouxe consigo uma importante inovação no labor jurisdicional mediante a instituição do procedimento de controle de constitucionalidade que contempla uma série de mecanismos que submetem as leis e atos normativos a uma revisão com o propósito de evitar e eliminar incompatibilidades com o texto constitucional. Com isso, se produziu uma expressiva transformação institucional com a criação dos Tribunais Constitucionais (primeiramente nos países europeus como Áustria, Tchecoslováquia e Espanha e, posteriormente, no continente americano), encarregados de velar pela correta interpretação e aplicação das normas constitucionais em toda a extensão territorial do Estado.

Nessa perspectiva, a expressão “jurisdição constitucional” indica a busca pela limitação da ação política e jurídica do Estado por meio da Constituição e, desse modo, exige que se alcance um fim comum nas diferentes instâncias de poder, qual seja o de materializar os princípios e valores presentes naquela. Tal circunstância contribuiu definitivamente para a ampliação da área de atuação dos juízes e magistrados e do discurso jurídico, configurando uma nova teoria do direito cujos pressupostos essenciais para Robert Alexy (1994, p. 160) são:

“(1) norma em vez de valor; (2) subsunção em vez de ponderação; (3) independência do direito ordinário em vez de onipresencia da Constituição; (4) autonomia do legislador democrático dentro do marco da Constituição em lugar da onipotência judicial com apoio na Constituição, sobretudo, do Tribunal constitucional federal”.

Como se pode inferir, o impacto da vida constitucional reclamou um novo perfil de juízes e magistrados que já não se circunscreve a uma mera ação mecanicista pautada pela aplicação rigorosa e silogística da lei como se concebia no modelo de Estado liberal[3], pois agora se admite um caráter criador da judicatura. As normas constitucionais acabam por assumir a função de leis orientadoras da realidade daqueles profissionais do direito, servindo como parâmetros fundamentais que orientam suas decisões no momento de resolver um caso posto à apreciação.

É certo que já não se pode ignorar a evolução do significado da função judicial que, em alguns países (como nos Estados Unidos), tem implicado em um forte ativismo[4] decorrente da concepção de um Estado de direito com um Poder Judiciário independente. De outro lado, se tem verificado em países (como o Brasil) uma crescente intervenção daquele poder na dinâmica do processo político através do controle e revisão dos atos executivos e legislativos[5], o que põe em evidência a necessidade de relegitimar a justiça e o direito nos diferentes setores sociais.

Portanto, a assunção do papel normativo da Constituição gerou, sem margem de dúvidas, um maior compromisso de atuação do Estado no âmbito social e econômico que procurou transformar os antagonismos jurídicos e políticos em conflitos resolúveis em um espaço determinado pela primazia dos valores e normas constitucionais. Como resultado dessa transformação na arquitetura jurídica estatal, se outorgou maior preponderância ao ramo judicial e ao tema do funcionamento do sistema de justiça, os quais estiveram amparados por uma linha de pensamento voltada para a preservação dos ideais democráticos e dos direitos fundamentais.


2      Responsabilidade judicial no Estado de direito contemporâneo: independência e legitimação democrática dos juízes

O Poder Judiciário, compreendido como uma superestrutura constitucional a quem lhe é atribuído em exclusivo o exercício da função jurisdicional no Estado, está conformado por um conjunto de órgãos providos de funcionamento autônomo, onde se encontram juízes e magistrados que desempenham suas potestades, administrando a justiça de acordo com as competências estabelecidas nas constituições e nas leis.  

A atual Constituição brasileira enuncia, no seu capítulo IIII - artigo 95, as garantias relacionadas ao exercício da judicatura (vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsidio) e também prevê uma série de condutas incompatíveis com a função de julgar (parágrafo único), ao passo que a Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar n° 35 de 14.03.1979) elenca, no capítulo II, as punições relativas aos comportamentos faltosos de juízes e magistrados contrários à missão de aplicar o direito e ministrar a justiça[6].

A exigência do fiel cumprimento dos deveres funcionais pelos membros da magistratura remete, por sua vez, a uma reflexão sobre a expressão “responsabilidade judicial”. O magistrado espanhol Juan Pedro Quintana Carretero (2008, p. 24) a define como sendo “aquela consequência sancionadora ou desfavorável, já operada em âmbito civil, penal ou disciplinar, que recai sobre os juízes e magistrados em razão da adoção de certas condutas no exercício de suas funções ou, com ocasião das mesmas, contrárias ao ordenamento jurídico”.

Com base no raciocínio anterior, a possibilidade de que juízes e magistrados sejam processados e posteriormente julgados pelos seus atos nas esferas civil, disciplinar e penal com a consequente determinação das suas responsabilidades leva a indeclinável obrigação de que atuem em coerência com as normas do ordenamento positivo, além de que mantenham uma estrita fidelidade com o sistema democrático que prioriza a adoção de uma conduta funcional exemplar em todas as esferas de distribuição de poder no Estado.

Para tanto, é necessário conferir-lhes independência para que a atividade de interpretação e aplicação do direito seja livre e desvinculada de qualquer autoridade e submetida unicamente à vontade da lei. Em outros termos a independência, como conceito jurídico e elemento essencial do Estado de direito contemporâneo, pode ser entendida como a ausência de subordinação de juízes e magistrados a toda e qualquer interferência de caráter interno ou externo que possa influenciar o desenvolvimento das suas funções e a sua sujeição ao império da legalidade[7].

É oportuno mencionar que o exercício da função judicial independente surge diretamente como uma consequência lógica do princípio da divisão dos poderes, ademais de figurar como importante exigência política do Estado de direito contemporâneo. Segundo o jurista alemão Karl Loewenstein (1976, p. 294): “a independência dos juízes no exercício das funções que lhe foram designadas e sua liberdade frente a todo tipo de interferência de qualquer outro detentor do poder constitui a pedra final no edifício do Estado democrático constitucional de direito”.

Dieter Simon (1985, p. 11), ao abordar o conteúdo e alcance da expressão, afirma que esta vai indissoluvelmente unida à concepção de Estado constitucional e que entre todas as instituições da nossa vida jurídica a ideia própria de Estado de direito celebra seu máximo triunfo na independência da decisão do juiz. O Supremo Tribunal Federal adota entendimento similar conforme se observa no discurso do ministro Celso de Mello proferido no julgamento da ação penal (Inq. 2.657-Agr/DF):

“O direito de o magistrado proferir decisões com independência e liberdade, sem o temor de sofrer, por efeito de sua prática profissional, abusivas instaurações de procedimentos penais ou civis, constitui pressuposto indeclinável ao exercício responsável e legitimo da jurisdição, além de traduzir requisito essencial à preservação dos direitos fundamentais e das franquias democráticas, pois, sem juízes independentes, não há sociedades livres”.[8]

Contudo, a independência judicial não pode conduzir a um perigoso estado de isolamento dos membros do Poder Judiciário que os torne imune a qualquer tipo de controle, isto é, o reconhecimento da independência de juízes e magistrados não pode provocar uma verdadeira irresponsabilidade judicial, inconciliável com os princípios e valores democráticos como sustenta G. Volpe (1974, p. 442):

“A valoração do bem da independência não pode chegar até o ponto de considerar a irresponsabilidade como aquele preço que a toda a coletividade tem que pagar pela existência de juízes independentes, este não pode ser tão alto como para que aqueles estejam imunes a todo e qualquer tipo de controle”. 

Por outro lado, deve-se levar em consideração que ela requer a instituição de normas e procedimentos aptos a protegê-la contra qualquer tipo de violação, visto que funciona em autêntica garantia dos indivíduos cujos direitos e liberdades são tutelados por aqueles que estão investidos na tarefa de aplicar a lei com imparcialidade. Na visão de Juan Luis Requejo Pagés (1989, pp. 116/117): “a independência como categoria instrumental é uma instituição funcionalmente dirigida a assegurar a efetiva realização do princípio da legalidade”.

No entanto, é importante estabelecer uma distinção entre independência e imparcialidade. Enquanto que a primeira reside em uma instituição jurídica encaminhada a eliminação de todo tipo de subordinação objetiva dos juízes e magistrados, a imparcialidade é um padrão ou modelo de conduta que deriva da exigência de que conservem uma posição equidistante frente às partes durante todas as fases do processo, pois do contrário o mesmo se converteria em um instrumento de iniquidades e distribuição de favores pessoais pois “para que se legitime a imperatividade dos atos e decisões estatais no exercício da jurisdição o primeiro requisito é a condição imparcial do juiz, o qual deve ser estranho à pretensão, ao litígio e aos litigantes” (DINAMARCO,1994, p. 185).

Outrossim, se entende que a responsabilidade judicial deve representar um real contrapeso da independência que, por conseguinte, se configura com diferente alcance em razão do tipo de processo de seleção de juízes previsto pelo ordenamento jurídico. Paralelamente a isso, o modelo de responsabilidade judicial a ser implantando em cada país individualmente vai depender, em certa medida, do grau de legitimidade democrática que têm os juízes e magistrados no sistema político.

A afirmação anterior adquire especial relevância na medida em que se reconhece a legitimidade democrática dos poderes estatais, principalmente ao referir-se ao crescente protagonismo experimentado pelo Poder Judiciário em vários Estados contemporâneos durante o século XX ao exercer: a) um controle sobre os atos emanados das instâncias representativas; b) a tutela dos direitos e liberdades individuais; c) a condição de garantidor da aplicação do ordenamento jurídico em cujo ápice está a Constituição.

Com respeito ao controle judicial sobre o processo decisório estatal (fenômeno da judicialização da política), este pôs em tela um novo exercício da função jurisdicional que implicou grandes avanços no quadro político institucional de muitos países. Dessa forma, o emprego de um novo método judicial de interpretação e aplicação da lei introduziu um debate sobre a atividade criadora da jurisprudência, ao mesmo tempo em que a consagrou como importante fonte do direito. Daí se observa que o resultado do trabalho judicial e a sua proeminência política e social contribuiu para que a noção de responsabilidade judicial se apresentasse como uma forte garantia dos direitos e liberdades dos cidadãos.

Em definitiva, em razão do modelo constitucional que se adote, este determinará a configuração do instituto da independência judicial e, por conseguinte, da responsabilidade judicial. O sistema jurídico brasileiro reconhece a importância desses dois bens para o bom desempenho da função judicial ao lado da estrita vinculação de juízes e magistrados ao império da lei. Portanto, somente cabe admitir que compete ao legislador constituinte definir as diretrizes sobre um concreto regime de responsabilidade judicial no Estado.


3       Responsabilidade e ética judicial: a disciplina como principio

Uma expressão intimamente relacionada com a responsabilidade judicial é a ética. Concebida como um conjunto de comportamentos necessários à satisfação de interesses comprometidos com o exercício da função judicial e à aceitação das decisões por parte de seus destinatários, a expressão inspira a figura de um juiz ideal que alcança um grau de excelência na prestação do seu trabalho.

A ética no direito é um componente essencial ao exercício do labor dos julgadores que se assenta em um conjunto práticas e valores que se somam aos deveres jurídicos impostos pela normatividade. É por isso que se considera que o mundo jurídico não se move somente por conhecimentos de caráter instrumental, mas também pela aplicação de princípios, valores, virtudes gerais que conformam o bom desenvolvimento da atividade judicante.

Para o magistrado da Suprema Corte de Justiça dos Estados Unidos Anthony Kennedy (1999), o código de conduta ética dos juízes pode ser resumido da seguinte maneira: em primeiro lugar, todo juiz deve adotar um código pessoal que se traduz na exemplar relação com sua família e com a sociedade, porquanto deve atuar com integridade, equidade e honestidade na qualidade de um cidadão que “transforma o certo, o incerto e o ambíguo em juridicamente definitivo” (CÁMARA, 2000, p. 450).

Ainda conforme Kennedy, o juiz deve manter uma atitude e caráter próprios de um alto funcionário judicial cuja conduta, posição e forma de proceder no curso do julgamento de um processo perante um tribunal popular devem inspirar profundo respeito e confiança sobre a sua pessoa evitando, assim, atitudes impróprias por parte de outros atores da justiça (advogados, promotores etc.). Por último, se menciona o dever de garantir um processo justo, rápido e eficiente através de um juízo independente, imparcial e vinculado às orientações legais.

Entretanto, toda reflexão sobre ética judicial invoca os princípios da independência, imparcialidade e motivação das sentenças que juntamente com a noção de responsabilidade judicial formam os pressupostos constitutivos de todo código que se propõe a regular o comportamento profissional de juízes e magistrados. Vários países de distintos continentes viram a necessidade de promulgar tais códigos, a exemplo de Turquia (1982), Itália (1994), Estados Unidos (1996), Bangladesh (2000), Kênia (1999), China (2003) e Argentina (2003).

A ideia central dessas codificações consiste em reforçar a independência, a imparcialidade e a transparência do sistema judicial. Dessa forma, enumera regras de conteúdo ético que são esperadas socialmente por aqueles profissionais do direito, define os valores que devem dirigí-los e, por fim, as penalidades de caráter disciplinar que não tem o condão de reformar o ato judicial, senão de repreender os comportamentos que atentam contra a correta administração e aplicação da justiça[9].  

No Brasil, a conduta da magistratura é regulada pela Lei Orgânica da Magistratura Nacional. Tal lei prescreve as punições para os casos de violações dos deveres disciplinares (art. 42), tanto na forma comissiva como omissiva, que podem ir desde uma simples advertência até a perda efetiva do cargo a serem aplicadas pelo Conselho Nacional de Justiça (órgão voltado ao controle da transparência da atividade administrativa e processual e instituído pela Emenda Constitucional n° 45 de 30.12.2004 que introduziu o artigo 103-B no texto constitucional)[10].

Na concepção do jurista italiano Mauro Cappelletti (1989, pp. 82/83), a questão da responsabilização disciplinar no campo da judicatura não é de modo absoluto “necessariamente repressivo (...), mas, ao contrário, constitui importante e necessário ingrediente para o correto equilíbrio entre independência e responsabilidade, justamente da responsabilização social”.

Assim, o Estado de direito contemporâneo reconhece a ética como um importante elemento que deve incidir sobre o teor das decisões proferidas pelos órgãos jurisdicionais. Ademais, ela não se esgota no plano meramente normativo, tendo em vista que o conceito de “bom juiz” ou de um “juiz justo” na terminologia utilizada por Karl Larenz requer o aperfeiçoamento profissional de certos traços de caráter ou também chamada de virtudes judiciais.    


3       Responsabilidade política no Judiciário: juízes responsáveis?

 O significado desse modelo de responsabilidade pode ser explicado, em linhas gerais, como aquele ocorre perante os órgãos políticos (Legislativo ou Executivo) através de procedimentos de natureza política que não se fundamentam em violações legais, senão em comportamentos (que inclusive podem ser extrajudiciais) avaliados com base em critérios igualmente políticos (CAPPELLETTI, 1988, p. 42).

  Os países de tradição do Commom Law (casos de Inglaterra e Estados Unidos), em geral, fornecem os melhores exemplos da manifestação da responsabilidade política judicial, onde juízes e magistrados podem ser destituídos de seus cargos quando não mantenham um bom comportamento no exercício de suas funções[11]. No entanto, se tem registro que países do sistema Civil Law (entre eles Argentina) também mostraram indícios da presença desse tipo de responsabilidade[12].

  No sistema jurídico brasileiro, seguindo a tradição do modelo Civil Law, a regra geral é a da ausência de responsabilidade política no âmbito da magistratura. Juízes e magistrados são imunes ao controle dos poderes políticos do Estado e por esse mesmo motivo não respondem perante a eles, haja vista que se submetem a um sistema de responsabilidade (penal, civil e disciplinar) exigível pelos órgãos internos que compõem o Poder Judiciário[13].

  Contudo, a exceção está no artigo 52 - inciso II da Lei Maior - que admite a responsabilização política dos ministros do Supremo Tribunal Federal pelos crimes de responsabilidade (ou crimes políticos) nos termos da Lei Federal n° 1.079 de 10.04.1950. Após definir os delitos de responsabilidade em que podem incorrer o Presidente da República e os Ministros de Estado com o respectivo procedimento competente, a lei dita as situações nas quais os ministros do STF responderão perante o Senado Federal, cujas penas podem ir desde a inabilitação para o exercício de qualquer função pública durante cinco anos até a perda do cargo[14].  

  Apesar de antiga, a legislação referida é a única que trata sobre o “impeachment” de magistrados, exclusivamente dos membros do Supremo Tribunal Federal. Mesmo assim, não passou despercebida aos comentários críticos de alguns autores como Paulo Bonavides (2011, p. 336) para quem o instituto do “impeachment” é “um processo de formas criminais (ainda que não seja um procedimento penal estrito), repressivo, a posteriori, seu manejo é difícil, lento, corruptor e condicionado à prática de atos previamente capitulados como crimes”. A continuação o autor cita:

“Sobre o impeachment, esse ´canhão de cem toneladas` (Lord Bryce), que dorme ´no museu das antiguidades constitucionais` (Boutmy) é ainda decisivo o juízo de Rui Barbosa, quando assevera que ´a responsabilidade criada sob a forma de impeachment se faz absolutamente fictícia, irrealizável e mentirosa`, resultando daí no ´presidencialismo um poder irresponsável e por consequência, ilimitado, imoral, absoluto`.

 Um exemplo prático que ilustra o tema da responsabilidade política dos ministros do Supremo Tribunal Federal foi o que envolveu a instauração de processo de “impeachment” contra Gilmar Ferreira Mendes. O pedido formulado pelo advogado Alberto de Oliveira Piovesan, com fundamento na lei n° 1.079/1950, foi apresentado perante o presidente do Senado Federal. A acusação que pesava sobre Mendes se referia, em síntese, a uma suposta relação de favorecimento pessoal que ele mantinha com alguns escritórios de advocacia.

Não obstante o referido processo ter sido arquivado pelo Senado, Alberto Piovesan impetrou a ação de Mandado de Segurança (MS n° 30672/DF) junto ao Supremo Tribunal Federal para o fim de decretar nula a decisão de arquivamento proferida pelo presidente daquela casa legislativa e o normal seguimento do pedido de “impeachment”. Contudo, em sessão do Pleno do STF o ministro relator Ricardo Lewandowski negou provimento ao mandado, o que resultou na posterior interposição de um agravo regimental contra tal pronunciamento.

Diante do clima desconfortável e tenso nos corredores do órgão de máxima instância do Poder Judiciário brasileiro em virtude da apuração de suposto crime responsabilidade praticado por Gilmar Mendes, uma solicitação de vista dos autos formulada por Marco Aurélio de Mello postergou uma decisão final sobre o assunto. Os ministros, então, se reuniram em outra oportunidade e com um julgamento marcado por votação unânime, entenderam pela manutenção da decisão do Senado e o encerramento definitivo do processo com o seu consequente arquivamento. 

Como se pode verificar, o caso anteriormente relatado torna evidente que o debate sobre a responsabilização política dos ministros do Supremo Tribunal Federal se encontra, efetivamente, sob um esquema de controle interno levado a cabo pelo próprio Poder Judiciário e não sob uma fiscalização externa realizada por um órgão político estranho a seara jurisdicional (no caso do Legislativo)[15].

A Constituição ainda se preocupou em determinar que os membros dos Tribunais Superiores serão julgados por crimes de responsabilidade pelo Supremo Tribunal Federal (art. 102, inciso I, CF); os desembargadores dos Tribunais de Justiça dos Estados e do Distrito Federal, assim como os membros dos Tribunais Regionais Federais, dos Tribunais Regionais Eleitorais e do Ministério Público da União pelo Superior Tribunal de Justiça (art. 105, inciso I, a, CF); os juízes estaduais, do Distrito Federal e os membros do Ministério Público respondem perante os Tribunais de Justiça (art. 96, inciso III, CF)[16].

A implantação de um sistema de responsabilidade político judicial no Brasil parece ser incompatível com a noção de um Estado democrático que preconiza a separação harmônica e equivalente das três funções estatais. Além disso, a ideia de responsabilizar politicamente juízes e magistrados se esbarra com o principio da independência judicial ao admitir um controle externo sobre a atuação deles e com o principio da inamovibilidade ao submetê-los a uma sanção de caráter política que prevê o afastamento temporário da função pública ou até a perda do cargo.


4       Responsabilidade penal: juízes no banco dos réus

          O fundamento desse tipo de responsabilidade versa sobre o abuso da função judicial e a violação dos pressupostos constitutivos do Estado de direito, entre eles a submissão ao império da lei. O desvio da finalidade institucional do Poder Judiciário por atos comissivos ou omissivos exercidos pelos seus funcionários abala não somente a estrutura política do Estado, como contribui imensamente para provocar um total descrédito dos cidadãos com relação à imagem da justiça.

  A responsabilização penal judicial surge a partir da comprovação do abuso ou exercício desviado da função de julgar com violação das leis penais e não se confunde em nada com o erro judiciário, que gera efeitos no campo civil. Sobre esse tema, Bacigalupo (2002, p. 1192) aduz que a responsabilidade penal se baseia na frustração do ideal de vigência efetiva do direito, ainda que existam frustrações que, por sua natureza, não desvirtuam o sistema jurídico como nos casos de aplicação errônea do direito derivado de falha humana.

  O tratamento dos códigos penais de vários países sobre os delitos cometidos pelos funcionários judiciais abrange um rol extenso de possibilidades. Entretanto, se pode muito bem distinguir duas classes comuns em praticamente todos eles: a) crimes de corrupção passiva que se configura por uma aplicação imprópria do direito; b) crimes que refletem o distanciamento de juízes e magistrados com a lei no momento de julgar um caso concreto (exemplo da prevaricação judicial).

No ordenamento jurídico brasileiro, esses dois delitos se encontram previstos no Código Penal (Decreto-lei n° 2.848 de 07.12.1940) nos artigos 317[17] e 319[18]. Ainda que esses dispositivos não estabeleçam de modo expresso que juízes e magistrados poderiam figurar como sujeitos ativos, ao inserir-lhes na categoria dos agentes que desempenham funções ou atribuições de caráter público (serviço da administração da justiça) lhes cabe a imputação pela prática dos mesmos[19].

  Não obstante a dificuldade em catalogar todos os delitos nos quais juízes e magistrados poderiam incorrer como sujeitos ativos, o estudo alude apenas aos crimes mais comuns atribuídos a eles tais como a corrupção passiva e a prevaricação, figuras que atentam contra a independência e imparcialidade judicial. A este respeito Cappelletti destaca que (1999, p. 62): “tudo o que a independência e a imparcialidade reclamam é o uso prudente, mas certamente não a total exclusão, das sanções penais contra juízes, que não podem ocultar atrás da toga de magistrado crimes pelos quais outros funcionários públicos estarão sujeitos à condenação”.


5        Responsabilidade civil dos juízes: o custo do erro judicial

  A responsabilidade civil dos juízes e magistrados ainda hoje suscita grandes discussões no âmbito da doutrina, jurisprudência e leis. A expansão do instituto nas democracias modernas se relaciona não só com o crescente do protagonismo adquirido pelo Poder Judiciário durante o século XX, mas também com a aceitação da responsabilidade do Estado quando do cometimento de danos ocasionados pela atuação dos agentes estatais e, finalmente, pela própria importância atribuída ao tema dentro do universo do direito privado.

  Inicialmente, a responsabilidade civil judicial dentro do contexto de um Estado de direito contemporâneo pode ser compreendida desde duas perspectivas: a) como um dos elementos-chave que compõe o estatuto dos juízes e magistrados ao lado da independência judicial no que diz respeito à configuração do Poder Judiciário e da função jurisdicional; b) como importante garantia que assegura o direito dos cidadãos à restituição integral dos prejuízos causados em decorrência do exercício de um trabalho judicial anômalo (aplicação de preceitos derrogados, inconstitucionais ou interpretações de lei insustentáveis).

  A instituição teve uma influência significativa nas legislações de vários países. Na realidade, o mundo ocidental esteve bem dividido quanto a regulação do assunto: enquanto que os países europeus aceitaram a existência do modelo de responsabilidade civil e somente se preocuparam em fixar a configuração e os limites do mesmo em observância à independência judicial e da atividade do Poder Judiciário, a cultura anglo-saxão consagrou a imunidade da responsabilidade de juízes e magistrados como mecanismo de proteção da independência judicial.

Na Legislação Brasileira, o fundamento constitucional que introduz o dever jurídico do Estado a reparar os danos injustamente causados pelos atos pelos de seus funcionários (onde se incluem os juízes) está no artigo 37, parágrafo sexto, da Constituição da República que tem a seguinte redação: “as pessoas jurídicas de direito público e as de direito de privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurando o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

  Diante da constatação da responsabilidade objetiva do Estado se nota que verbo “causar” antevê que só o comportamento positivo pode gerar o dever de indenizar, mediante a demonstração da relação de causalidade entre o ato levado a efeito pelo agente e do dano efetivamente produzido. Do contrário, se estaria em presença de uma responsabilidade do tipo subjetiva que se baseia na culpa do agente e requer a sua comprovação para que surja a obrigação de indenizar, pois não basta apenas o comportamento humano causador do prejuízo.

Em se tratando da responsabilidade dos juízes e magistrados em função das sentenças e providências injustas contrárias ao bom funcionamento do serviço de justiça, esta está regulada pelo Código de Processo Civil (Lei Ordinária n° 5.869 de 11.01.1973) que, no artigo 133 - caput preceitua: “Responderá por perdas e danos o juiz, quando: I) no exercício de suas funções, proceder com dolo ou fraude; II) recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deve ordenar de ofício, ou a requerimento das partes”[20].

A Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar n° 35/1979) também trata sobre o assunto da responsabilidade civil dos juízes e magistrados no artigo 49 - caput e o faz reproduzindo integralmente o texto do Código de Processo Civil de 1973: “Responderá por perdas e danos o magistrado, quando: I) no exercício de suas funções proceder com dolo ou fraude; II) recusar, omitir ou retardar, sem justo motivo, providência que deva ordenar de ofício ou a requerimento das partes”.

A partir do exposto, se pode afirmar que o ordenamento jurídico brasileiro experimentou uma real evolução na medida em que prevê alguns mecanismos tendentes a responsabilização civil da função judicial. Com base no princípio elementar da convivência social de que aquele que lesiona um direito alheio deve suportar as consequências dos danos ocasionados, os indivíduos que ostentam o cargo de juízes e magistrados, igual que aos demais funcionários do Estado, também são chamados a recompor os prejuízos originários das falhas ocorridas no processo de formação do seu livre convencimento sobre os fatos do processo e pela aplicação errônea do Direito no momento de solucionar uma controvérsia.


6        Responsabilidade social do Poder Judiciário e a influência dos meios de comunicação

 O controle e pressão exercidos pela sociedade sobre o Poder Judiciário propiciou o debate sobre uma importante modalidade de responsabilidade: a responsabilidade social de juízes e magistrados. A obrigação desses profissionais em responder perante o público pelos atos que pratica encontra amparo nas bases constitutivas do Estado democrático de direito, assim como nas garantias processuais da oralidade, publicidade, motivação e fundamentação das sentenças, além de cumprir com a missão de manter a confiança dos cidadãos na justiça.

A Carta Magna brasileira estabelece aos tribunais: a) a obrigatoriedade de motivar as decisões administrativas (art. 93, inciso X, CF), isto é, indicar os motivos que, com base na lei, autoriza tais decisões; b) que todos os julgamentos serão públicos como forma manter toda a coletividade informada das suas atividades (art. 93, inciso IX, primeira parte, CF); c) que todas as decisões devem ser fundamentadas e reveladas as razões que levaram os julgadores a proferirem suas sentenças sob pena de nulidade das mesmas (art. 93, IX, segunda parte).

Importante advertir que ainda que esse modelo de responsabilidade não gere a imposição de uma sanção jurídica, ele funciona como um indicador que serve para informar a opinião pública sobre o desempenho da função judicial. Enquanto ao seu fundamento, este está inserido no artigo 5° da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei n° 4.657 de 04.09.1942) que enuncia: “Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”.

  No entanto, se observa que na vida prática a responsabilidade social da magistratura é mais bem compreendida como a importância de que durante o processo de interpretação e aplicação da lei a um caso concreto, juízes e magistrados guardem uma conduta digna, honesta, recatada, humana e que sejam conscientes das implicações que suas decisões possam provocar sobre um dado setor econômico-social ou sobre a execução de um serviço público, sob o risco de sofrerem um violento juízo ético de reprovação.

  Além do mencionado anteriormente, merece especial atenção a questão da influência dos meios de comunicação no julgamento dos processos judiciais. Amparados pelo argumento do exercício de liberdade de manifestação de pensamento e informação constitucionalmente assegurados (incisos IX e XIV do artigo 5°, CF), eles muitas vezes emitem valorações sobre um assunto sub iudice, contribuindo para formar um juízo de inocência ou culpabilidade sobre o acusado com a consequente instalação de um poderoso estado de opinião pública.

No entanto, estas valorações ou pré-julgamentos emitidos principalmente por muitos programas de televisão do Brasil, onde os apresentadores se colocam no papel de verdadeiros especialistas e investigadores na discussão de casos judiciais de grande repercussão social[21] não se limitam a tecer apenas singelos juízos valorativos, pois como bem esclarece Quintana-Carretero (2008, p. 39):

“eles vão muito mais além tanto é que neles se procede à realização de investigações paralelas sobre a base da desconfiança, acompanhadas de um seguimento escandaloso do sumario e a busca de contradições no mesmo, duplicando-se o juízo, com a vontade de dirigir a opinião pública com respeito à determinada direção, como se ao lado da verdade judicial existisse uma verdade popular”.

 De tal modo, essa interferência dos meios de comunição não se coaduna com o direito à liberdade de expressão e informação do artigo 5° da Constituição. Isso porque, em muitas ocasiões ao fazerem uso de uma linguagem objetiva distinta do vocabulário jurídico, se valem de informações gratuitas e não contrastadas com aquelas presentes nos autos, o que acaba por afetar o direito do acusado a um processo com todas as garantias penais, além de comprometer o seu direito a presunção de inocência (art. 5°, inciso LVII, CF). Ainda que a influência dessas valorações não devesse causar um impacto sobre a conduta judicial no processo, realmente não se pode ignorar que nenhum tribunal ou juiz é absolutamente inatingível a um concreto estado de opinião pública, o que põe em dúvida a sua liberdade no momento de resolver um caso[22].

 Embora não haja no Brasil uma regulamentação específica com o fim de restringir a atuação negativa dos meios de comunicação, no momento em que se constata que o pressuposto da imparcialidade do julgador foi comprometido pelos juízos prévios paralelos dos veículos jornalísticos cabe, por força dos artigos 312 e seguintes do Código de Processo Civil, o traslado dos autos a um juiz substituto[23].

A jurisdição penal também adota a orientação de que ao reconhecer-se uma circunstância que afete o livre convencimento do julgador motivado pelas opiniões jornalísticas, o processo deve ser enviado a um juiz substituto legalmente estabelecido para que, desse modo, possa seguir o seu curso normal (artigo 97 e seguintes do Código de Processo Penal – Decreto-Lei n° 3.689 de 03.10.1941).

Nessa perspectiva, Lopes Jr (2005, p. 183) observa que:

“A atividade probatória, antes dirigida a formar uma convicção racional, também tem que derrubar uma esfera emotiva (pré-constituida) e também o pré-julgamento (forjado pela imprensa e seus juízos paralelos). É imenso prejuízo pelo pré-juizo gerado pela intermediação midiática, com patente comprometimento da imparcialidade e da independência do julgador”. 

Em decisão do Supremo Tribunal Federal em sede de Agravo Regimental no Agravo de Instrumento n° 690.841/SP, no intuito de regular o comportamento profissional da imprensa aquele tribunal firmou o entendimento de que não se caracteriza abuso da liberdade de informação a divulgação de opiniões mesmo em tom de crítica dirigidas a pessoas públicas (e a figuras notórias) por razões de interesse coletivo, conforme se desprende no voto do ministro relator Celso de Mello:

“(...) o conteúdo da matéria jornalística que motivou o ajuizamento da presente causa, longe de evidenciar prática ilícita contra a honra subjetiva do suposto ofendido (parte ora agravante) traduziu, na realidade, o exercício concreto, pelo profissional da imprensa (ora agravado), da liberdade de expressão, cujo fundamento reside no próprio texto da Constituição da República, que assegura, ao jornalista, o direito de expender crítica, ainda que desfavorável e mesmo que em tom contundente, contra quaisquer pessoas ou autoridades. Ninguém ignora que, no contexto de uma sociedade fundada em bases democráticas, mostra-se intolerável a repressão estatal ao pensamento, ainda mais quando a crítica – por mais dura que seja – revele-se inspirada pelo interesse coletivo e decorra da prática legítima, como sucede na espécie, de uma liberdade pública de extração eminentemente constitucional (CF, art. 5°, IV c/c o art. 220)”[24].

  Com referência ao direito europeu, países como Itália, Espanha e Portugal estabeleceram alguns instrumentos com o claro propósito de impedir um controle social desgovernado e abusivo por parte dos meios de comunicação sobre os processos judiciais e, com isso, evitar a vulneração dos valores basilares do Estado de direito contemporâneo, tales como a independência e imparcialidade judicial.

 No direito italiano existe uma proibição legal que veda a publicação das atuações dos juízes até que sejam finalizadas as diligências preliminares ou as audiências preliminares no processo criminal. Caso idêntico ocorre em Portugal, onde na fase de instrução criminal é defeso aos profissionais da comunicação realizar investigações paralelas e divulgar comentários ou pareceres sobre os resultados obtidos. Por último, o Tribunal Constitucional espanhol acompanhou o posicionamento do Tribunal Europeu de Direitos Humanos que admite a legalidade dos juízos paralelos dos meios de comunicação, desde que estes não atuem em desfavor do trabalho judicial (STC 136/1999, de 20 de julho).

 Em matéria de direitos humanos, a redação do artigo 10 do Convênio Europeu de Direitos Humanos adotado pelo Conselho da Europa no ano de 1950, confere proteção ao direito a liberdade de expressão e de opinião, mas por outro lado não descarta a possibilidade de que possa sofrer restrições ou limitações legais, entendidas como medidas necessárias concernentes à garantia da autoridade e imparcialidade do poder judicial.

 Vê-se, portanto, que as informações provenientes da imprensa jornalística que questionam fatos discutidos em juízo e causam óbices ao desenvolvimento regular do processo, mediante um sensacionalismo injustificado e com vistas a distorcer a realidade judicial, devem ser limitados a fim de garantir o respeito aos bens e valores constitucionais em conflito, o direito das partes a um processo justo e, por último, manter a confiança dos cidadãos no sistema de Justiça.

 Mesmo diante da ausência no sistema jurídico brasileiro de mecanismos específicos para limitar e sancionar os abusos de expressão e informação, assim como a cessação de qualquer tipo de valoração jornalística que possa influenciar negativamente a função de julgar, resta imperioso o compromisso ético e deontológico dos inúmeros profissionais de autorregularem o seu trabalho informativo com o propósito de não comprometer ou mesmo impedir o desenvolvimento natural dos órgãos e instituições estatais (entre eles o Judiciário).


Conclusão

A responsabilidade judicial reside em um dos elementos que configuram o estatuto jurídico de juízes e magistrados no Brasil, além de uma exigência de todo Estado constitucional e democrático de direito. Contudo, ela não pode ser considerada um componente que limite ou obstaculize a independência e a imparcialidade judicial, uma vez que deve guardar comunhão com outras garantias (inmovilibilidade e submissão à lei) com o fim de articular o modo de ser do Poder Judiciário e de fixar os contornos atinentes ao exercício da função jurisdicional.

A importância do papel judicial nas democracias contemporâneas é inquestionável, posto que a atividade de interpretação e aplicação das normas levada a cabo por pelos profissionais da justiça – seja nos litígios entre particulares como nos processos em que o Estado é parte - assegura que os direitos e obrigações descritos nas leis sejam reconhecidos e sancionados. Desse modo, o resultado do trabalho judicial provoca, indiscutivelmente, um forte impacto sobre a sociedade no geral.

Entretanto, os juízes e magistrados também são seres humanos passíveis de incidir em condutas reprováveis durante a difícil tarefa de julgar e, assim sendo não escapam a um controle realizado pelos órgãos internos do Poder Judiciário. Busca-se de toda forma evitar a chamada “ditadura ou governo judicial” que não é compatível com os valores que norteiam uma sociedade democrática e, com isso, eles devem responder pelos prejuízos causados como qualquer outro funcionário do Estado.

  Um dos principais problemas ao que se encontra a responsabilidade judicial se refere ao estabelecimento dos limites da mesma e nisso os diferentes sistemas normativos ocidentais divergem. No Brasil, existem normas sobre a matéria com o claro propósito de salvaguardar a independência e a submissão dos juízes e magistrados à lei, mas não se pode negar a dificuldade quanto à identificação e punição dos comportamentos nefastos que afetam o Judiciário, pois quase sempre são imperceptíveis e possuem um caráter reservado, ou seja, fora do domínio público.

 Portanto, tão importante quanto falar na responsabilidade judicial pelos danos derivados do exercício da função judicante é apostar em uma formação de alto nível aos presentes e futuros juízes e magistrados. Desse modo, é imprescindível que o Poder Público crie condições necessárias para que esses funcionários obtenham todos os conhecimentos práticos e teóricos e que conheçam com bastante profundidade a realidade jurídica brasileira para, assim, administrar e solucionar os conflitos e manter a confiança dos cidadãos no braço forte da justiça.


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Abstract

This article presents an approach to legal responsibility which represents an important guarantee for the proper functioning of the judicial system. The growing development of judicial functions in several western countries in the 20th century, with a greater interference in the political-social issue, has a particular relevance, especially when judges and courts have autonomy and independence to make decisions that preclude their subsequent monitoring and review by the political powers of the state. In this sense, it is quite essential to create efficient mechanisms in order to determine responsibility for acts committed in the exercise of judicial functions, as well as to demand a contemporary rule of law with a focus on the quality of judicial services. It is also important to contribute to the strengthening of public confidence in the administration of justice. 

KEYWORDS: Contemporary Rule of law. Judicial Function. Responsibility.


Notas

[1] A compreensão acerca da concepção de Estado de direito tem suscitado constantes divergências na doutrina devido ao fato de que o termo sofreu várias conformações no seu significado ao longo do tempo, como resultado da inserção de valores e conteúdos originários de concepções liberais, sociais, democráticas e constitucionais. Por isso, se adota tão somente o vocábulo “Estado de direito contemporâneo” para se referir ao atual estágio de evolução jurídica do Estado.

[2] A tradicional doutrina da divisão dos poderes, método de distribuir e controlar o exercício do poder político que serviu como repressão ideológica do liberalismo político contra o absolutismo monárquico, adquiriu um forte caráter dogmático não mais sendo concebida nos dias de hoje como uma formulação imutável de um pensador e tampouco como um sistema perfeito, senão como o mais adequado para a organização de um determinado tipo de Estado moderno (RODRÍGUEZ-AGUILERA, 1980, p. 28).

[3] Essa concepção puramente mecânica ou redutiva da função judicial se correspondia com o pensamento de Montesquieu sintetizado na frase de que os juízes são a boca que pronunciam as palavras da lei, isto é, seres inanimados que não podem moderar nem a força nem o rigor daquela, precursora por outra parte de um positivismo jurídico e do mais falso mecanismo da função de julgar.

[4] A expressão “ativismo judicial” denota a eleição de um modo específico e proativo de interpretar a Constituição pelos juízes e, assim, expandir o alcance e conteúdo das suas normas más além do estabelecido pelo legislador ordinário. Sua origem histórica se reporta ao período compreendido entre 1954-1969 nos Estados Unidos quando a Suprema Corte de Justiça, presidida pelo magistrado Earl Warren, se destacou pela intensificação e disseminação de práticas políticas conduzidas por uma jurisprudência progressista em temas de direitos humanos (BARROSO, 2011, p. 674).

[5] Tal fenômeno é conhecido no âmbito das ciências jurídicas e sociais como judicialização da política, o qual compreende uma maior inserção do Poder Judiciário no âmbito político para expressar o crescimento da sua importância e efetiva participação na vida social, econômica e política do Estado. Entre os casos que ilustram a presença do fenômeno no Estado brasileiro se pode citar aquele referente à proibição do nepotismo nos três poderes (ADC n° 12/DF), onde o Judiciário invocou uma nova responsabilidade para regulamentar um tema de caráter eminentemente político.

[6] A Espanha consagra o princípio da independência dos juízes no artigo 117.1 do seu ordenamento constitucional, ao igual que a Lei Fundamental da República da Alemanha (artigo 97) que determina que os juízes são independentes e somente submetidos ao império da legalidade.

[7]  Essas influências, tanto externas como internas e estranhas ao exercício da função judicial, podem ser provenientes de pressões exercidas pelos poderes Executivo e Legislativo, pelos próprios órgãos que integram o Poder Judiciário, o eleitorado ou a opinião pública.

[8] STF, Inq 2699 QO/DF, Tribunal Pleno, Rel Min. Celso de Mello, j. 12/03/2009, DJ 08-05-2009.

[9] Na verdade, o esquema de elaboração desses códigos possuem algumas dificuldades no campo prático. Uma delas é o conteúdo, pois a exposição dos critérios e princípios que devem nortear a atividade judicial quase sempre é feita de forma geral, abrindo margem para que cada profissional reflita sobre o que seria a ética de uma conduta.

[10] O Supremo Tribunal Federal, na ação direta de inconstitucionalidade n° 4.638, pôs fim a controvérsia sobre a competência do Conselho Nacional de Justiça para investigar e punir magistrados e servidores do Judiciário, sem depender das corregedorias locais. Por maioria de votos (6 a 5), os ministros decidiram manter os poderes do órgão e reconhecer a sua autonomia para levar a cabo investigações contra juízes e magistrados, consolidando o Estado de direito e enaltecendo os valores democráticos.  

[11] Na Inglaterra, os juízes dos Tribunais Superiores podem ser removidos pela Rainha por iniciativa das duas câmaras do Parlamento (Câmara alta e baixa), cujas decisões têm uma natureza essencialmente política e carece de conteúdo jurisdicional Nos Estados Unidos, o artigo II – seção 4 da Constituição preceitua que os juízes federais podem ser sancionados por intermédio de um juízo político (impeachment) quando incorrem em traição, suborno e outros delitos graves, mediante a acusação realizada pela Câmara de Representantes e julgamento pelo Senado. É imprescindível acrescentar que em alguns Estados americanos, a possibilidade o afastamento dos juízes estaduais eleitos através do “recall” é perfeitamente aceitável, apenas verificar a insatisfação dos cidadãos com a atuação daquele juiz e que, portanto, solicitem a remoção do mesmo antes do término do seu mandato.

[12] Na Argentina, o artigo 53 da Constituição (com a reforma de 1994) admite que os magistrados da Corte Suprema de Justiça possam vir a responder pelo desempenho irregular de suas funções ou pelo cometimento de delitos no exercício das mesmas, cuja acusação é formulada pela Câmara dos Deputados e julgamento levado a efeito pelo Senado. 

[13] Enquanto ao processo de seleção dos juízes brasileiros, o ingresso na carreira se dá obrigatoriamente por meio de concurso público de provas e títulos (artigo 93, inciso I, CF). O acesso aos cargos superiores ocorre de entrância para entrância, obedecidos aos critérios de antiguidade e merecimento (artigo 93, inciso II, CF), excluído qualquer ingerência das instâncias políticas do Estado.

[14] O artigo 39 da Lei n° 1.079/1950 enuncia expressamente que são crimes de responsabilidade dos Ministros do Supremo Tribunal Federal: 1) alterar, por qualquer forma, exceto por via de recurso, a decisão ou voto já proferido em sessão do Tribunal; 2) proferir julgamento, quando, por lei, seja suspeito na causa; 3) Ser patentemente desidioso no cumprimento dos deveres do cargo; 4) proceder de modo incompatível com a honra, dignidade, decoro de suas funções.

[15] Um dos frequentes argumentos utilizados para afastar a incidência da responsabilidade política de juízes e magistrados se baseia no fato de que eles não exercem funções de natureza política e que a sua investidura no cargo não se dá por meio de um procedimento político, o que não enseja o dever de responder perante as instâncias representativas do Estado.

[16] Para Ruy Rosado Aguiar Júnior (1997, p. 7): “a expressão ´crimes de responsabilidade` entrou para a Constituição brasileira sem o exato conceito técnico ou científico e decorre de defeito de linguagem que se insinuou na nossa legislação durante o Primeiro Reinado, servindo para designar indistintamente as infrações políticas, cometidas por autoridades políticas, e as infrações funcionais (crimes comuns) praticadas por funcionários públicos”.

[17] Artigo 317 – Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumí-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem – Pena de reclusão de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa”.

[18] Artigo. 319 – Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de oficio, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal – Pena de detenção de 03 (três) meses a 01 (um) ano e multa”.  

[19] A definição de funcionário público trazida pelo Código Penal (art. 327, caput) é simples, porém amplia como se pode perceber: “Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública”.

[20] Cabe esclarecer a diferença que entre a Constituição e as leis infraconstitucionais na regulação do da responsabilidade civil judicial: o texto constitucional trata sobre a tutela constitucional dos interesses de terceiros afetados por erros dos agentes estatais que relata a relação entre vítima e Estado (art. 37, § 6° CF); a legislação ordinária remete a relação entre vítima e juiz (Código de Processo Civil e a Lei Orgânica da Magistratura Nacional).

[21] Dois casos muito polêmicos e que tiveram grande repercussão tanto nacional como internacional, onde se pode muito bem constatar a evidente atuação dos veículos comunicativos sobre o Poder Judiciário foram os que envolveram: a) a disputa judicial, em 2009, pela guarda de Sean Richard Bianchi Carneiro Ribeiro Goldman entre seus parentes maternos e o seu pai norte-americano David Goldman que, inclusive, se converteu em um problema diplomático entre Brasil e Estados Unidos; b) e o assassinato da garota de cinco anos Isabela Nardoni, no ano de 2008, cuja autoria do crime foi atribuída a sua madrasta Anna Carolina Peixoto Jatobá e o seu pai Alexandre Nardoni.

[22] Em algumas situações, os magistrados e juízes chegam a receber fortes críticas pela sua atuação em um processo criminal, podendo estender-se até mesmo ao âmbito pessoal com o propósito de gerar nos cidadãos certa dúvida sobre a objetividade e imparcialidade daqueles profissionais.  

[23] Na Alemanha, não há registro de uma disposição constitucional ou legal que trate sobre o controle social dos meios de comunicação sobre o poder judicial, pelo que se analisa cada caso sempre levando em consideração o princípio da proporcionalidade e a ponderação dos interesses em conflito.

[24] STF, AI 690841 AgR/SP, 2ª Turma, Rel Min. Celso de Mello, j. 21/06/2011, DJ 05-08-2011.


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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FERNANDES, João Marcelo Negreiros. Reflexões sobre a responsabilidade judicial no Estado de Direito contemporâneo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3279, 23 jun. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22067. Acesso em: 19 abr. 2024.