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Os limites da coisa julgada no processo civil brasileiro

Os limites da coisa julgada no processo civil brasileiro

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Os limites objetivos da coisa julgada ficam restritos à parte dispositiva da sentença, observando-se, todavia, que o raciocínio que levou a tal conclusão. A eficácia natural da sentença pode, eventualmente, atingir terceiros, mas a coisa julgada, em regra, tem como limites subjetivos aqueles a quem tiver sido regularmente oportunizado participar da lide.

Resumo: Trata dos limites objetivos e subjetivos da coisa julgada. Parte de uma breve análise das perspectivas formal e material do instituto. Investiga o fundamento político da previsão da coisa julgada em determinados ordenamentos jurídicos. Trata de algumas das principais teorias sobre os fundamentos e características jurídicas da coisa julgada. Analisa os limites objetivos do instituto, estabelecendo o que fica sujeito à autoridade da coisa julgada. Investiga os limites subjetivos da coisa julgada, distinguindo quem é atingido pela sua autoridade, com referências ao conteúdo do artigo 472, do Código de Processo Civil brasileiro. Procura demonstrar que, em hipótese alguma, na ordem constitucional brasileira, admite-se que alguém que não tenha tido oportunidade de intervir na lide possa ser limitado pela autoridade da coisa julgada.

Palavras-chave: Princípios Constitucionais – Coisa Julgada – Segurança Jurídica.

Sumário: Resumo; Palavras Chave; Resumé; Mots Clé; Introdução; 1 Coisa Julgada Formal e Material; 2 Finalidade da Coisa Julgada; 3 Teorias sobre a Coisa Julgada; 3.1 Chiovenda; 3.2 Carnelutti; 3.3 Liebman; 4 Limites da Coisa Julgada; 4.1 Limites Objetivos; 4.2 Limites Subjetivos; Conclusão; Referências.


INTRODUÇÃO.

O instituto jurídico da coisa julgada tem constituído, ao longo da história, tema que levanta sensíveis e relevantes controvérsias, mesmo no que se refere aos seus aspectos mais fundamentais – e que poderiam ser tidos, em uma análise superficial, mesmo, por singelos.

Muitas vezes, os estudiosos do Direito passam ao largo de uma reflexão razoavelmente aprofundada a respeito de tais características fundamentais, procurando analisar temas consideravelmente mais complexos – tais quais as propostas de relativização da autoridade da coisa julgada, por exemplo –, o que, no mais das vezes, implica importantes limitações – quando não verdadeiros equívocos – de compreensão.

É, assim, sobre estes temas mais fundamentais ligados ao instituto da coisa julgada que será dedicado este estudo.

Inicialmente, procurar-se-á estabelecer uma distinção clara entre as perspectivas formal e material de análise da coisa julgada.

Em seguida, passar-se-á à investigação das finalidades que podem levar à instituição da garantia da coisa julgada em uma determinada ordem jurídica – e que constituem, assim, em suma, o seu fundamento político.

Após, far-se-á uma breve menção a algumas das mais notáveis teorias que foram desenvolvidas, ao longo da história mais recente, a respeito dos fundamentos jurídicos e das principais características do instituto da coisa julgada.

Ao final, chegando ao tema, propriamente dito, deste resumido estudo, analisar-se-á os limites objetivos e subjetivos da coisa julgada, para que se possa compreender, em linhas gerais, “o que” e “quem” é atingido pela sua autoridade, especificamente nas ações individuais.

Nessa parte final, procurar-se-á demonstrar que a redação do artigo 472, parte final, do Código de Processo Civil brasileiro, é bastante tortuosa, e que pode induzir relevantes erros de interpretação, já que, ao que tudo indica, encontra-se, ela mesma, bastante equivocada.

É importante esclarecer, desde o início, que o estudo que ora se apresenta não tem pretensões exaustivas. O objetivo, antes e sempre, é chamar a atenção dos estudiosos das Ciências Jurídicas para a necessidade de análise de temas de destacada importância, em torno dos quais persistem relevantes controvérsias, com importantes desdobramentos de ordem prática.


1 coisa julgada formal e material.

O instituto da coisa julgada, em geral, pode ser aplicado e, portanto, também, compreendido, a partir de duas perspectivas distintas: a formal e a material.

Uma compreensão, ainda que superficial, das características de cada uma dessas perspectivas e dos aspectos que as diferenciam entre si mostra-se útil, para que se possa entender o instituto como um todo.

De acordo com Santos, “a coisa julgada formal consiste no fenômeno da imutabilidade da sentença pela preclusão dos prazos para recursos” (1999, p. 43).

Esse aspecto é também objeto de análise por Vitagliano, para quem

A coisa julgada formal identifica-se com a irrecorribilidade e decorrente impossibilidade de continuar-se a demandar sobre o mesmo objeto. Nesse sentido, a coisa julgada pode ser vista como preclusão – a última, a máxima e a mais abrangente das preclusões, a incidir sobre o processo mesmo e não sobre um ato dele (2004, p. 49).

É importante, todavia, a observação de que “a coisa julgada formal representa a estabilidade que a decisão adquire no processo em que foi proferida, quer tenha havido análise de mérito, quer não tenha ocorrido tal investigação” (VITAGLIANO, 2004, p. 47).

Vale dizer, portanto, que a coisa julgada formal implica a inviabilidade de modificação da decisão apenas no processo em que foi ela prolatada, não havendo impossibilidade – tão somente por conta da coisa julgada formal – de que sejam os fatos rediscutidos, inclusive entre as mesmas partes, em uma outra demanda judicial.[1]

Em suma, “a coisa julgada formal não impede que o objeto do julgamento  volte a ser discutido em outra demanda, haja vista que atua apenas dentro da relação processual em que a sentença foi prolatada” (MACHADO, 2005, p. 59).

A coisa julgada material, por sua vez, é referida no artigo 467, do Código de Processo Civil, como “[...] a eficácia, que torna imutável e indiscutível a sentença, não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário”.

Nas palavras de Vitagliano, a coisa julgada material “[...] representa a imutabilidade da decisão, não apenas no processo em que foi proferida, mas em qualquer outro onde as mesmas partes, com suporte na mesma causa de pedir, deduzem pedido idêntico. A decisão adquire o selo da imutabilidade” (2004, p. 49).

Alves, por sua vez, assevera que

O comando emergente da sentença, tornando imutável, adquire autoridade de coisa julgada, a impedir que a relação de direito material decidida, entre as mesmas partes, seja reexaminada e decidida, no mesmo ou outro juízo ou tribunal. Assim, fala-se em coisa julgada material, ou substancial, como autoridade da coisa julgada (2000, p. 5).

A distinção básica entre coisa julgada formal e coisa julgada material é digna de nota, na medida em que, conforme observa Silva, ao tratar da garantia fundamental encartada no artigo 5°, XXXVI, da Constituição Federal,

Dizemos que o texto constitucional só se refere à coisa julgada material [...] porque o que se protege é a prestação jurisdicional definitivamente outorgada. A coisa julgada formal só se beneficia da proteção indiretamente na medida em que se contém na coisa julgada material, visto que é pressuposto desta, mas não assim a simples coisa julgada formal. Tutela-se a estabilidade dos casos julgados, para que o titular do direito aí reconhecido tenha a certeza jurídica de que ele ingressou definitivamente no seu patrimônio (2000, p. 437).[2]

Idêntica opinião é compartilhada por Alves (2000, p. 4), para quem a garantia constitucional do artigo 5°, XXXVI, da Constituição Federal, não diz respeito à coisa julgada formal.

É de se salientar, diante daquilo dito até este ponto, que é, também, evidentemente, em torno da coisa julgada material que se instalam as maiores dificuldades científicas e, por via de conseqüência, as mais acirradas controvérsias doutrinárias.

Isto, inclusive, em virtude das características principais de cada uma das perspectivas de análise do instituto, tendo em vista que, segundo a observação de Furlan,

A coisa julgada formal consiste numa imutabilidade que se projeta nos limites – e somente nestes – do processo em que a sentença foi proferida, enquanto a coisa julgada material, ao contrário, diz respeito à imutabilidade para fora do âmbito do processo. Nesse sentido, no dizer de Liebman, a coisa julgada formal é a imutabilidade como fato processual, ou seja, no processo enquanto que a coisa julgada material é a imutabilidade fora do âmbito do processo (2000, p. 87).

Em síntese ainda mais apertada, segundo Câmara, é possível “[...] definir a coisa julgada como a imutabilidade da sentença (coisa julgada formal) e de seu conteúdo (coisa julgada material), quando não mais cabível qualquer recurso” (2008, p. 460).[3]

Definidas, ainda que de forma bastante panorâmica, as principais características e distinções entre os aspectos formal e material da coisa julgada, é necessário investigar sucintamente a finalidade a que se propõe o instituto, e os seus possíveis fundamentos.


2 finalidade da coisa julgada.

A coisa julgada, conforme já referido, apresenta-se como tema consideravelmente amplo e complexo, em torno do qual têm se instalado, ao longo da história, acalorados debates doutrinários.

É de se destacar, preliminarmente, que não há, sequer, consenso entre os doutrinadores a respeito da necessidade da existência de previsão do instituto da coisa julgada, como condição de configuração de um determinado ordenamento jurídico, como tal.

Guerra Filho, aliás, aponta que

Na família anglo-saxônica, regida pelo commom law, se desconhece o instituto tal como ele aparece em sistemas jurídicos como o nosso, já que o julgado tanto pode ser atacado em um mesmo processo, após seu pronunciamento, mediante “moções, como também em outro processo, pelo collateral attack: isso não importa, porém, em nenhum prejuízo ou inferiorização para a justiça norte-americana ou inglesa, que na verdade é, sob certos aspectos, até mais eficiente que a nossa, dos países da família romano-germânica (2002, p. 231).

Neste panorama, portanto, a previsão da coisa julgada apresentar-se-ia, em tese, como opção política[4] do poder que se manifesta em cada ordenamento jurídico;[5] sendo, assim, perfeitamente imaginável e aceitável a existência de um Estado de Direito em que não houvesse previsão do instituto da coisa julgada.

De qualquer forma, na ordem jurídica vigente no Brasil, especificamente, a opção política pela previsão do instituto da coisa julgada encontra-se consagrada tanto em nível constitucional – por meio da menção constante do artigo 5°, XXXVI – quanto na legislação ordinária – o que é atestado, inclusive, pelas disposições constantes dos artigos 467 a 475, do Código de Processo Civil.

Parece possível dizer que, embora haja alguma controvérsia a respeito dos fundamentos jurídicos da coisa julgada – conforme se procurará referir, brevemente, no próximo tópico –, são praticamente uníssonas as impressões que se tem a respeito de suas possíveis finalidades.

De toda sorte, é importante que não se perca de vista tais finalidades, para que não se proponham usos do instituto, em completo descompasso com os escopos a que se destina.

Assim é que, segundo Wambier e Medina,

A coisa julgada é instituto cuja função é estender ou projetar os efeitos da sentença indefinidamente para o futuro. Com isso, pretende-se zelar pela segurança extrínseca das relações jurídicas, de certo modo em complementação ao instituto da preclusão, cuja função primordial é garantir a segurança intrínseca do processo, pois que assegura a irreversibilidade das situações jurídicas cristalizadas endoprocessualmente. Esta segurança extrínseca das relações jurídicas gerada pela coisa julgada material traduz-se na impossibilidade de que haja outra decisão sobre a mesma pretensão (2003, p. 21 e 22).

Em síntese, pode-se dizer que:

[...] a garantia da coisa julgada encerra a proteção ao valor da segurança nas relações jurídicas, por meio da estabilidade conferida às decisões judiciais. O objetivo é impedir que as lides sejam estendidas ad eternum, isto é, que em algum momento tenham um ponto final (PINTO e SILVA, 2005, p. 3).

Há, portanto, uma relativa tranqüilidade da doutrina, no que se refere ao fato de que a principal finalidade do instituto da coisa julgada é garantir níveis razoáveis de segurança social e, provavelmente, também, institucional; evitando-se que as demandas possam se arrastar indefinidamente.[6]

Ocorre que – segundo os conceitos estabelecidos no capítulo anterior, de acordo com os quais, historicamente, a finalidade precípua do Direito tem sido, precisamente, garantir os níveis possíveis de segurança social e institucional – a coisa julgada, ainda que possa ser entendida como uma decisão eminentemente política, tem importância fundamental.

Dito de outro modo, pode-se dizer que o instituto da coisa julgada desempenha um papel extremamente útil no sentido de viabilizar que o Direito cumpra a sua principal finalidade: garantir os níveis possíveis de segurança social e institucional.[7]

Isto se dá, inclusive, por conta do fato de que se espera da função jurisdicional do Estado que seja dada, para as lides que são levadas à sua apreciação, em algum tempo, uma determinada solução que seja definitiva.

Segundo Canotilho, “[...] ao demandante de uma protecção jurídica deve ser reconhecida a possibilidade de, em tempo útil (adequação temporal, justiça temporalmente adequada), obter uma sentença executória com força de caso julgado [...]” (2003, p. 499).

Pode-se afirmar, aliás, que o direito de conhecer, em algum momento, o teor de uma determinação judicial definitiva cabe tanto ao demandante quanto ao demandado – mesmo por conta do escopo de se garantir os níveis possíveis de segurança.[8]

Neste sentido, aliás, interessante a observação de Marinoni:

Se o tempo é a dimensão fundamental da vida humana e se o bem perseguido no processo interfere na felicidade do litigante que o reivindica, é certo que a demora do processo gera, no mínimo, infelicidade pessoal e angústia e reduz as expectativas de uma vida mais feliz (ou menos infeliz). Não é possível desconsiderar o que se passa na vida das partes que estão em juízo (2002, p. 17).[9]

Não seria temerário dizer que, no mais das vezes, senão sempre, a impressão do condenado de que a decisão que lhe atingiu é, de alguma forma, injusta, soa muito menos angustiante do que a possibilidade de eterna modificação de tal estado de coisas, isto é, a perpétua dúvida.[10]

Nas palavras de Wagner Junior,

Os cidadãos, ao recorrerem ao Judiciário para que este possa resolver o conflito de interesses que os aflige, procuram, em especial, a segurança jurídica de uma decisão que, esperam, lhes seja favorável.

Favoráveis ou não, procedentes ou improcedentes, as decisões judiciais devem, em dado momento processual, se fazerem acompanhar da certeza de que não mais poderão ser alteradas (2008, p. 365).

A principal finalidade da adoção da coisa julgada, portanto, parece ser garantir que os cidadãos sujeitos[11] a um determinado ordenamento jurídico tenham a certeza – e, portanto, a segurança – de que um pronunciamento judicial que lhes atinge, positiva ou negativamente, será, em dado momento, definitivo, quer concordem com ele ou não.[12]


3 TEORIAS SOBRE A COISA JULGADA.

De um certo modo, pode-se dizer que a finalidade da coisa julgada constitui, precisamente, o seu fundamento político.

Isto porque – em tese, ao menos – os detentores do poder de instituir uma determinada ordem jurídica,[13] inclinados a que seja alcançada a finalidade a que se propõe o instituto, decidem, por meio de um exercício político, inseri-lo em seu ordenamento.[14]

Todavia, se é verdade, por um lado, que há um relativo consenso da doutrina no que se refere à principal finalidade da coisa julgada – e, portanto, ao seu fundamento político –, o mesmo não se pode dizer no atinente aos seus possíveis fundamentos jurídicos e a algumas de suas principais características.

Assim é que, ao longo da história, construíram-se diversas e importantes teorias que procuraram proporcionar a compreensão do tema.

Em virtude dos estreitos limites deste estudo, esta seção ficará restrita a uma breve menção às teorias de Chiovenda, Carnelutti e Liebman, sem que se tenha, obviamente, também a este respeito, uma pretensão exaustiva da matéria.

3.1 Chiovenda.

Segundo o entendimento de Chiovenda, a coisa julgada é um efeito da sentença, que encontra fundamento na própria natureza da decisão jurisdicional, que é resultado da atuação de um órgão do Estado, sob os auspícios da Lei.

Em suma, para Chiovenda “[...] a coisa julgada não tem em vista a afirmação da verdade dos fatos, mas da existência de uma vontade da lei no caso concreto” (2002, p. 409).

Assim, seria a sentença, “[...] unicamente a afirmação ou a negação de uma vontade do Estado que garanta a alguém um bem da vida no caso concreto [...]” e observava que “[...] só a isto se pode estender a autoridade do julgado [...]” (CHIOVENDA, 2002, p. 449).

Em um resumo um tanto quanto simplório, é verdade, pode-se afirmar que a teoria desenvolvida por Chiovenda identifica o fundamento da coisa julgada como a vontade do Estado, previamente expressada no ordenamento jurídico e aplicada pela sentença.[15]

3.2 Carnelutti.

A teoria que era desenvolvida por Carnelutti, antes das proposições de Liebman, considerava, ainda, a coisa julgada como um “efeito da sentença”.

Havia, portanto, entre os autores uma profunda controvérsia a respeito da coisa julgada, assim resumida por Dinamarco:

A discordância evidencia-se tão pouco verbal, quanto mais observamos que os dois autores partiam de premissas diametralmente opostas, com referência ao fundamental quesito metodológico da estrutura do ordenamento jurídico: enquanto Liebman, formado na escola de Chiovenda, manifestava uma sólida base dualística (isto é, para ele o ordenamento jurídico tem duas ordens diversas de normas, substanciais e processuais, e estas nada têm a ver com a produção do direito do caso concreto), fundava-se Carnelutti no pressuposto de que o direito positivo substancial emana normas genéricas incompletas, as quais só se tornam um círculo fechado, por obra da sentença (qualquer que seja esta, menos a dispositiva), a qual é em si um comando complementar (1987, p. 235).[16]

Para Carnelutti, a autoridade da coisa julgada decorre da declaração de certeza que pretende ser expressada pela eficácia imperativa da sentença, enquanto vontade do Estado (1960, p. 144).

De acordo com o autor, é, precisamente, a imperatividade da sentença que constitui o seu traço essencial – e não, propriamente, a sua imutabilidade, que só seria adquirida com o trânsito em julgado (CARNELUTTI, 1960, p. 143).

Aliás, segundo a teoria de Carnelutti, ao tratar dos aspectos material e formal da coisa julgada, a imperatividade da sentença e a sua imutabilidade ocorreriam em etapas diversas (1960, p. 143).

Este aspecto é pinçado pela doutrina, que observa:

É interessante a inversão dos momentos do fenômeno processual da coisa julgada na teoria de Carnelutti, visto que, enquanto para as demais teorias a coisa julgada material pressupõe a coisa julgada formal, para Carnelutti é esta que pressupõe aquela. Na certeza que a sentença produz está a imperatividade dela, e é esta imperatividade que constitui a coisa julgada material, a qual, pela preclusão dos recursos, se transforma em coisa julgada formal (BONFIM JÚNIOR et al., 2007, p. 261).[17]

Este posicionamento de Carnelutti foi fortemente combatido por parte bastante considerável da doutrina, que viu uma contradição inconciliável exprimida, principalmente, no fato de que “[...] haja coisa julgada formal de resoluções judiciais que não produzem coisa julgada material” (PONTES DE MIRANDA, 1974, p. 126).[18]

3.3 Liebman.

De acordo com Vitagliano, “o primeiro grande mérito da doutrina de Liebman é o de enxergar na coisa julgada não um efeito da sentença, como sustentado na doutrina tradicional, mas, sim, uma qualidade dos efeitos da sentença, qual seja, a sua imutabilidade” (2004, p. 57).

A construção do autor, como visto, contrasta sensivelmente com as teorias que lhe antecederam, que tratavam o instituto da coisa julgada como um efeito, propriamente, da sentença.

Segundo a interpretação de Furlan,

Em suma, para Liebman, a autoridade da coisa julgada é a imutabilidade do comando emergente da sentença, ou seja, a qualidade que reveste o ato em seu conteúdo, tornando-o imutável, assim como seus efeitos. Reconhece que a autoridade da coisa julgada não recai tão somente sobre os efeitos declaratórios, mas cobre igualmente os elementos constitutivos e condenatórios da sentença (2000, p. 102).

Liebman entende que

[...] a eficácia de uma sentença não pode por si só impedir o juiz posterior, investido também ele da plenitude dos poderes exercidos pelo juiz que prolatou a sentença, de reexaminar o caso decidido e julgá-lo de modo diferente. Somente uma razão de utilidade política e social [...] intervém para evitar essa possibilidade, tornando o comando imutável quando o processo teria chegado à sua conclusão, com a preclusão dos recursos contra a sentença nele pronunciada (1981, p. 53 e 54).

Assim, nas palavras do próprio doutrinador, a autoridade da coisa julgada pode ser definida,

[...] com precisão, como a imutabilidade do comando emergente da sentença. Não se identifica ela simplesmente com a definitividade e intangibilidade do ato que pronuncia o comando; é, pelo contrário, uma qualidade, mais intensa e mais profunda, que reveste o ato também em seu conteúdo e torna imutáveis, além do ato em sua existência formal, os efeitos, quaisquer que sejam, do próprio ato (LIEBMAN, 1981, p. 54).

É a partir da doutrina da Liebman, portanto, que se diferenciarão claramente as idéias de eficácia natural da sentença e de autoridade da coisa julgada, enquanto qualidade dos efeitos da sentença.

A visão inovadora foi possível, inclusive, porque “Liebman, partindo do ponto de vista de que a decisão judicial tem eficácia não só declarativa, mas também constitutiva,[19] afirma que tal eficácia da sentença pode produzir-se independentemente da coisa julgada” (FURLAN, 2000, p. 101).[20]


4 LIMITES DA COISA JULGADA.

Distinguem-se, basicamente, duas espécies de limites da coisa julgada: os objetivos e os subjetivos.

Os limites objetivos dizem respeito, em linhas gerais, à “matéria” que constitui objeto da coisa julgada; enquanto os limites subjetivos referem-se, em uma síntese bastante apertada, a “quem” poderia restar atingido pela coisa julgada.

Em conjunto, de certa forma, os limites objetivos e subjetivos traçam a área de atuação da coisa julgada, em cada caso concreto, enquanto qualidade dos efeitos da sentença.[21]

4.1 Limites Objetivos.

Conforme já referido, os limites objetivos da coisa julgada dizem respeito, em geral, à “matéria” ou ao “objeto” que é agasalhado pelo instituto.

Em outras palavras, na explanação de Oliveira Lima,

[...] o estudo dos limites objetivos da coisa julgada se presta a estabelecer o que da sentença se reveste daquela qualidade de imutabilidade e o que fica de fora. Ou por outra, se destina a separar, das múltiplas questões decididas pela sentença, aquelas que restam protegidas pelo manto da coisa julgada (1997, p. 30).

É de se destacar, preliminarmente, que, conforme a observação de Machado,

Não há que se confundir [...] o instituto da coisa julgada material com seus próprios limites objetivos, pois aquele se refere exatamente à capacidade que possui a decisão judicial de se tornar indiscutível perante demanda futura, ao passo que estes representam quais as questões decididas na sentença que adquirem essa imutabilidade e indiscutibilidade (2005, p. 61).[22]

Em que pese ser possível uma primeira impressão de que o tema seja desprovido de maior complexidade, Porto adverte, no que diz respeito aos limites objetivos da coisa julgada, que “a doutrina não navega em águas calmas” (1998, p. 68).

Pode-se mencionar, por exemplo, o entendimento defendido por Carnelutti, segundo o qual

Coisa julgada significa a decisão judicial de mérito que é obtida por meio do processo de conhecimento, ou, em outros termos, a sentença sobre as questões de fundo; as questões de fundo julgadas não são apenas as expressamente resolvidas, mas também aquelas cuja solução seja uma premissa necessária para a solução daquelas primeiras, e que, portanto, são resolvidas implicitamente (a chamada sentença implícita) (1960, p. 136 e 137, tradução nossa).

No ordenamento jurídico brasileiro, todavia, o artigo 468, do Código de Processo Civil, determina que “a sentença, que julgar total ou parcialmente a lide, tem força de lei nos limites da lide e das questões decididas”, mas o artigo 469, do mesmo diploma legal, dispõe, em termos expressos, que não fazem coisa julgada “os motivos, ainda que importantes para determinar o alcance da parte dispositiva da sentença”; “a verdade dos fatos, estabelecida como fundamento da sentença”; e “a apreciação da questão prejudicial, decidida incidentemente no processo”.[23]

A interação entre os aludidos dispositivos legais é explicada por Fux, para quem

Não obstante o legislador ter explicitado os limites objetivos da coisa julgada, adstringindo-os ao pedido com sua correspondente causa de pedir, posto que a causa petendi com outro pedido ou o mesmo pedido com outra causa de pedir diferencie as ações, ainda visou esclarecer o alcance da mesma, no artigo 469 do CPC, ao “retirar do âmbito da coisa julgada” os motivos [...] importantes e determinantes da parte dispositiva da sentença, a verdade dos fatos estabelecida como fundamento da sentença e a apreciação da questão prejudicial decidida incidentemente no processo (2004, p. 828).[24]

Merece destaque, contudo, a disposição constante do artigo 474, do Código de Processo Civil, segundo a qual “passada em julgado a sentença de mérito, reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido”.[25]

Neste diapasão, Liebman advertiu que

[...] é exata a afirmativa de que a coisa julgada se restringe à parte dispositiva da sentença. A expressão, entretanto, deve ser entendida em sentido substancial e não apenas formalístico, de modo que compreenda não apenas a frase final da sentença, mas também tudo quanto o juiz porventura haja considerado e resolvido acerca do pedido feito pelas partes. Os motivos são, pois, excluídos, por essa razão, da coisa julgada, mas constituem amiúde indispensável elemento para determinar o alcance do dispositivo (1976, p. 164).

Vale dizer, por determinação legal expressa, a motivação desenvolvida na sentença não fica agasalhada pelo manto da coisa julgada, mas os seus termos são, no mais das vezes, de suma importância para a fixação dos exatos limites objetivos, em cada caso concreto.

Assim, Grinover pondera que

[...] embora a autoridade da coisa julgada se limite ao dispositivo da sentença, esse comando pode e deve ser entendido – tanto mais quando exista alguma margem para dúvida – à luz das considerações feitas na motivação, ou seja, na apreciação das questões surgidas e resolvidas no processo. Assim, da mesma forma que, para a mais perfeita determinação do objeto do processo, se conjuga o pedido à causa de pedir, para determinação do objeto do julgamento – e da coisa julgada que sobre ele se forma – conjuga-se o mesmo aos motivos da decisão. [...] assim como o pedido deve ser visto à luz da causa de pedir (ambos compondo o objeto do processo, isto é, a pretensão), o dispositivo só pode ser interpretado à luz dos motivos, sendo todos eles [...] determinantes da extensão objetiva dos efeitos da sentença e da autoridade da coisa julgada (2001, p. 77).

Da mesma forma, de acordo com a síntese esclarecedora de Baptista da Silva,

Se é correto dizer-se que os motivos ainda que importantes não fazem coisa julgada (art. 469), não é menos certo afirmar-se que o dispositivo se há de entender e “dimensionar” em razão desses motivos, tanto que o legislador os considera importantes para “determinar o alcance da parte dispositiva da sentença” (1979, p. 53).

Todavia, é de se salientar que, no regime vigente, “[...] os argumentos apreciados pelo juiz na sentença somente se tornarão intangíveis (pela coisa julgada) nos limites em que serviram à apreciação e decisão da demanda concretamente proposta em juízo” (SANTOS, MATTOS e QUEIROZ, 2007, p. 94).

Cumpre lembrar, ainda, que, como sempre repetido, o pedido exordial fixa os limites gerais da lide, conforme, aliás, prevê o art. 128, do Código de Processo Civil.

Contudo, é de se destacar que contra uma sentença que decidir ultra ou extra petita, por exemplo, deve ser interposto o recurso adequado, no prazo assinado pelo ordenamento jurídico em vigor, sob pena de que haja inviabilidade de modificação de seus termos, que estarão, salvo melhor juízo, incluídos nos limites objetivos da coisa julgada material.[26]

Em síntese um tanto apertada, pode-se dizer que os limites objetivos da coisa julgada, em geral, estão restritos à conclusão do juiz, ou seja, à parte dispositiva da sentença – mas que o raciocínio que levou a tal conclusão, em que pese não restar atingido pela coisa julgada, dirige a verificação do teor da conclusão em si mesma, quando necessário.

4.2 Limites Subjetivos.

Referidas, ainda que de forma um tanto geral, as características principais dos limites objetivos da coisa julgada, cabe analisar, também, os seus limites subjetivos, para que reste minimamente vencida a tarefa inicialmente proposta para este resumido estudo.

Conforme anteriormente mencionado, os limites subjetivos da coisa julgada dizem respeito a “quem” restaria atingido por tal qualidade dos efeitos da sentença.

O ponto nevrálgico da questão está, na realidade, em se saber se a autoridade da coisa julgada estenderia o seu alcance apenas e tão somente às partes, ou se terceiros beneficiados ou prejudicados pelos efeitos da sentença poderiam ser por ela, igualmente, atingidos.

A regra geral que orienta o tema está encartada na primeira parte do artigo 472, do Código de Processo Civil, da seguinte forma: “a sentença faz coisa julgada às partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros”.

Tal disposição encontra-se, em princípio, em consonância com a ordem constitucional vigente, conforme observa Tucci, já que,

Realmente, nenhuma restrição de direitos pode ser admitida sem que se propicie à pessoa interessada a produção de ampla defesa (nemo inauditus damnari potest), e, conseqüentemente, esta só poderá efetivar-se em sua plenitude com o estabelecimento da participação ativa e contraditória dos sujeitos parciais em todos os atos e termos do processo (2006, p. 172).

Verifica-se, portanto, desde logo, dois fundamentos constitucionais para a regra geral contida no artigo 472, do Código de Processo Civil: os princípios da ampla defesa e do contraditório, desdobramentos da garantia fundamental do devido processo legal.

Dinamarco, ao comentar o dispositivo legal em questão, assevera que

A sentença faz coisa julgada entre as partes entre as quais é dada, não beneficiando, nem prejudicando terceiros. Os vocábulos partes e terceiros, neste texto, são empregados em sentido puro, para designar aquele que esteve e aquele que não esteve integrado à relação processual em que foi dada a sentença (2002, p. 317).

Novamente, poder-se-ia ter a impressão de que o tema não suscita quaisquer controvérsias ou dificuldades, quando não é bem esta a realidade.

Em primeiro lugar, é de se destacar que, conforme bem observado por Liebman, “a eficácia natural da sentença, que não se confunde com a autoridade da coisa julgada, sendo independente desta, estende os seus efeitos a todos (partes e terceiros)” (1981, p. 130).[27]

Situação diversa se daria com a coisa julgada, que ficaria, em geral, limitada às partes.

De acordo com a feliz síntese de Santos, “somente a eficácia natural da sentença alcança terceiros, e não a coisa julgada, estes, se prejudicados pela sentença, contra a mesma poderão opor-se, para demonstrar a sua injustiça ou ilegalidade” (1999, p. 73).

Poderia haver uma impressão equivocada, todavia, de que o próprio artigo 472, por exemplo, explicita uma primeira curiosa exceção à regra, ao dispor, em sua parte final, que “nas causas relativas ao estado de pessoa, se houverem sido citados no processo, em litisconsórcio necessário, todos os interessados, a sentença produz coisa julgada em relação a terceiros”.

Segundo o esclarecimento de Câmara, todavia,

Não há aqui nenhuma exceção à regra estabelecida pela primeira parte do mesmo art. 472, sendo certo que a matéria estaria melhor regulada como um parágrafo do art. 47 do CPC, onde se deveria ler algo como “nas questões de estado, formar-se-á o litisconsórcio necessariamente entre todos os interessados” (2008, p. 474).

Em suma, segundo os próprios termos do artigo 472, do Código de Processo Civil, mesmo nas ações de estado, se apenas um interessado não for regularmente citado, não se poderá falar em formação de coisa julgada em relação a terceiro; isto é, o interessado que não tiver sido citado não ficará, evidentemente, prejudicado pela autoridade da coisa julgada.

O que precisa ficar claro, de outro lado, é que, tendo sido citados todos os interessados, algum outro terceiro ficará impossibilitado de pretender promover nova discussão da matéria perante o Poder Judiciário, não porque tenha sido de qualquer forma prejudicado pela autoridade da coisa julgada – conforme equivocadamente prevê a redação do artigo 472, do Código de Processo Civil –, mas, sim, porque não tem interesse de agir e é, assim, carecedor de ação.

Seguindo a premissa estabelecida por Liebman,[28] contudo, conforme exposto, pode-se dizer, de forma mais adequada, que é a eficácia natural da sentença que é estendida, neste caso, a terceiros, e não a “coisa julgada” propriamente dita.

A experiência mostra, de toda forma, que é possível imaginar diversos casos em que terceiros poderiam ser atingidos pelos efeitos da sentença e, ainda, supostamente, em potencial, pela extensão da qualidade da coisa julgada.

Tucci, aliás, analisa diversas situações – inclusive em nível concreto – em que a extensão da coisa julgada poderia, supostamente, prejudicar ou beneficiar terceiros (2006, p. 208 a 303).

O autor salienta a existência, em geral, de legitimidade e de interesse processual do terceiro prejudicado pela eficácia da sentença, ponderando:

Todo aquele que não participa do contraditório em processo pendente inter alios é considerado terceiro. Se o grau de dependência entre a relação jurídica decidida e aquela que tem o terceiro como titular for de tal sorte elevado, a produzir-lhe prejuízo jurídico, poderá ele reagir contra a sentença.

Essa insurgência, contudo, pode ser por via indireta, ou seja, como o terceiro não está adstrito à autoridade da coisa julgada, o direito objeto de decisão no procedente processo pode ser submetido à (re)apreciação judicial. [...]

Mas, em determinadas situações, o terceiro poderá impugnar diretamente a sentença, com o escopo de demonstrar que ela é ilegal ou injusta. E, para tanto [...] deve ter legitimidade e interesse processual para propor a medida judicial adequada à espécie concreta (2006, p. 209 e 210).[29]

Vale dizer, por conta das garantias constitucionais vigentes, e inclusive por dever de observância ao princípio da segurança jurídica, não se pode admitir que terceiros que sejam estranhos à lide restem prejudicados pela coisa julgada.

Isto não significa que terceiros nunca serão atingidos pela eficácia natural de uma sentença, conforme, aliás, já mencionado; mas sim que, quando tal eficácia lhes implicar em prejuízos juridicamente relevantes, será admitida a impugnação da decisão judicial, ainda que ela tenha transitado em julgado entre as partes propriamente ditas.

Situação diversa ocorreria, supostamente, nas hipóteses em que a extensão da coisa julgada beneficia terceiro, quando, segundo o entendimento de Tucci, “a coisa julgada [...] fulmina o potencial interesse de agir de alguém que, embora não tenha integrado o contraditório travado num determinado processo, acabou sendo privilegiado pelo respectivo desfecho” (2006, p. 210).

Parece, todavia, mais adequado supor que, nestes casos, o terceiro resta juridicamente inviabilizado de se opor à sentença que transitou em julgado entre as partes não propriamente por conta da autoridade da coisa julgada em si mesma, mas pela própria inexistência de interesse de agir, ou seja, pela falta de condição da ação.

Furlan sintetiza a questão dos limites subjetivos da coisa julgada, da seguinte forma:

A eficácia natural da sentença pode atingir terceiros, enquanto a coisa julgada, somente as partes. Sendo a coisa julgada uma qualidade dos efeitos da sentença – a imutabilidade desses mesmos efeitos – não atinge terceiros, isto é, para estes não é imutável (2000, p. 115).

Vale dizer, enquanto qualidade dos efeitos da sentença, a coisa julgada estende-se às partes, mas subsistirá ao terceiro juridicamente interessado e prejudicado a possibilidade de insurgência, ainda que em outra demanda.[30]


CONCLUSÃO.

Procurou-se, ao longo deste resumido estudo, demonstrar que é absolutamente necessária uma compreensão razoável dos temas mais fundamentais ligados ao estudo da coisa julgada, para que se possa fazer uma análise mais adequada de importantes e complexas controvérsias que se apresentam, provavelmente, como desdobramentos naturais.

Assim, após estabelecer uma distinção entre as perspectivas formal e material da coisa julgada, procurou-se demonstrar que a sua finalidade e, assim, também, o seu fundamento político, é garantir que os cidadãos sujeitos a um determinado ordenamento jurídico tenham a certeza de que um pronunciamento judicial que lhes atinge, positiva ou negativamente, será, em dado momento, definitivo, quer concordem com ele ou não – o que se encontra, ademais, em consonância com a finalidade precípua do Direito, que é garantir os níveis possíveis de segurança social e institucional.

Pelo exame de algumas das principais teorias sobre os fundamentos jurídicos do instituto e de suas principais características, procurou-se estabelecer que a coisa julgada é uma qualidade dos efeitos da sentença; e que existe uma importante distinção entre a autoridade da coisa julgada e a eficácia natural da sentença.

No que se refere aos limites objetivos da coisa julgada, concluiu-se que ficam restritos à conclusão do juiz, isto é, à parte dispositiva da sentença, observando-se, todavia, que o raciocínio que levou a tal conclusão, em que pese não ser atingido pela autoridade da coisa julgada, dirige a verificação do teor da conclusão em si mesma, quando necessário.

Ao final, a respeito dos limites subjetivos, firmou-se a convicção de que a eficácia natural da sentença pode, eventualmente, atingir terceiros, mas que a coisa julgada somente estenderá a sua autoridade àqueles a quem tiver sido regularmente oportunizado participar da lide; sendo, assim, completamente inadequada a atual redação do artigo 472, do Código de Processo Civil.


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Notas

[1] Para que se uma determinada ação judicial é idêntica a outra, analisa-se os seus “elementos identificadores”, isto é, quem são as partes, e qual é a causa de pedir e o respectivo pedido. A compreensão adequada do tema é fundamental para que se compreenda, também, as hipóteses de incidência da autoridade da coisa julgada. Para uma explicação sucinta e bem organizada a respeito dos “elementos da ação”, cf. Donizetti (2012, p. 46 a 49).

[2] Aliás, segundo Didier Júnior, a imutabilidade decorrente da coisa julgada material “significa que a conclusão a que chegou o juiz, ao proferir uma sentença de mérito, não poderá mais ser discutida em outro processo que envolva as mesmas partes, com idêntica causa de pedir e com o mesmo pedido. Se, mesmo tendo o comando final da sentença adquirido imutabilidade e indiscutibilidade, ainda assim houver nova decisão sobre a questão, haverá ofensa à coisa julgada, cabendo ação rescisória” (2008, p. 372) – o que, ademais, encontra-se expressamente previsto no artigo 485, IV, do Código de Processo Civil.

[3] O autor, em explanação mais detalhada, esclarece que “a coisa julgada formal [...] só é capaz de pôr termo ao módulo processual, impedindo que se reabra a discussão acerca do objeto do processo no mesmo feito. A mera existência da coisa julgada formal é incapaz de impedir que tal discussão ressurja em outro processo. Por tal motivo, as sentenças definitivas, as quais contêm resolução do objeto do processo [...], devem alcançar também a coisa julgada material (ou substancial). Esta consiste na imutabilidade e indiscutibilidade do conteúdo (declaratório, constitutivo, condenatório, da sentença de mérito, e produz efeitos para fora do processo” (2008, p. 462).

[4] Cabe a observação, porém, de que a classificação do instituto da coisa julgada enquanto “opção política” não é uma tentativa de abalo de sua importância. Pretende-se, tão somente, demonstrar que a previsão do instituto da coisa julgada não é elemento indispensável de configuração de um determinado ordenamento como jurídico. Além do mais, parece possível dizer que a “opção política” que se poderá fazer em torno da previsão ou não do instituto da coisa julgada, em um determinado ordenamento específico, será dirigida pela cultura jurídica do respectivo povo. Assim é que, por exemplo, o instituto da coisa julgada tenderá a ser tratado de forma sensivelmente diversa nos países que compõem o ramo da Commom Law, quando comparados ao ramo dito romano-germânico.

[5] É bem assim que entende Câmara, segundo quem “a impossibilidade de modificação da sentença a qualquer tempo, com a previsão de um número limitado de recursos, todos sujeitos a prazos de interposição, e a conseqüente imutabilidade da sentença a partir do momento em que a decisão se torne irrecorrível são uma opção política legislativa, que surge pelo fato de o ordenamento ser voltado à preservação da segurança jurídica, a qual seria impossível de se alcançar se as questões submetidas ao crivo do Judiciário pudessem ser discutidas ad infinitum” (2008, p. 461).

[6] Bueno, por exemplo, considera o instituto da coisa julgada, também, uma opção política, mas observa que tal opção “[...] realiza o princípio da segurança jurídica [...]” (2007, p. 390).

[7] Para considerações mais delongadas a respeito da afirmação de que a função primordial do Direito é, exatamente, promover os níveis possíveis de segurança social e institucional – e não de promover mudanças sociais –, cf. Antunes (2009).

[8] A este respeito, pontua Gidi que a garantia de estabilidade “[...] é anseio não somente da parte vencedora, como da parte vencida e da população como um todo [...]” (1995, p. 8).

[9] Marinoni e Arenhart também afirmam que “[...] de nada adianta falar em direito de acesso à justiça sem dar ao cidadão o direito de ver o seu conflito solucionado definitivamente” (2007, p. 668).

[10] Neste sentido, aliás, Costa pondera que a incerteza a respeito da justiça de uma determinada decisão constitui “mal menor” do que a incerteza eternizada a respeito das relações no mundo jurídico (1982, p. 218). Assim também entende Barbosa Moreira, para quem a indefinida possibilidade de remoção dos efeitos da coisa julgada implica a completa insegurança das relações sociais (1998, p. 214). Do mesmo modo Jauernig, que assevera ser “[...] mais suportável que uma sentença incorrecta exista e deva aceitar-se, que qualquer sentença possa ser impugnada a todo momento” (2002, p. 336).

[11] Não apenas enquanto soma de indivíduos, mas também enquanto sociedade propriamente dita. Tucci observa que a “ordem descortina-se essencial tanto à vida individual como ao convívio no seio da coletividade. [...] Conhecida é, a propósito, a exortação de Goethe, no sentido de que é preferível alguma injustiça à desordem, numa significativa demonstração de que ao seu sagaz espírito não passou despercebido que a existência normal do ser humano impõe uma estabilidade que só a ordem permite proporcionar” (2006, p. 36)

[12] É certo que se pode formular assertivas acerca de uma série de outras finalidades acessórias ou reflexas, que podem ser alcançadas ou viabilizadas pela coisa julgada. Assim é que, por exemplo, garantindo o ordenamento que a estrutura do Poder Judiciário não deverá – salvo nas estreitas exceções expressamente previstas pela própria ordem jurídica – ser movida novamente, para decidir casos específicos que já tenham transitado em julgado, permite ele que se procure viabilizar que tal estrutura trabalhe com a eficiência possível. Parece evidente que não haveria estrutura judicial capaz de atender às necessidades de um sistema que pudesse, ao livre alvedrio da parte vencida, ingressar novamente com demandas anteriormente decididas, inclusive porque, segundo observa Monteiro, “os vencidos nunca serão convencidos” (1912, p. 220).

[13] No caso dos Estados Democráticos, é válido ressaltar que os detentores do poder são o próprio povo (possivelmente por meio de seus representantes eleitos, conforme disposto no artigo 1º, parágrafo único, da Constituição Federal brasileira, por exemplo).

[14] Isto se dá, aliás, com todos os institutos e mecanismos que não constituem o cerne fundamental e indispensável que caracteriza um determinado ordenamento como genuinamente jurídico, como visto. Assim é que, por exemplo, a previsão ou não da possibilidade de recorrer de decisões é uma opção política, que, sob certa perspectiva, não prejudica o caráter jurídico de uma determinada ordem. Situação diversa se dá com a coercibilidade, que é um elemento fundamental de caracterização do Direito. Ou seja, ainda que resulte de um exercício político puramente democrático o estabelecimento de uma ordem que não tenha a característica de coercibilidade, tal ordenamento não poderá ser tido como propriamente jurídico (cf. KELSEN, 2000, p. 26 a 28).

[15] Para uma compreensão mais aprofundada do tema, cf. as considerações do próprio autor (CHIOVENDA, 2002, p. 446 a 464).

[16] Alguma noção básica a respeito das proposições de Liebman será referida no subitem imediatamente subsequente a este.

[17] Nas palavras do próprio doutrinador, “a coisa julgada formal pressupõe a coisa julgada material, no sentido de que somente quando a decisão está dotada de imperatividade pode passar a ser imutável [...]” (CARNELUTTI, 1960, p. 143, tradução nossa).

[18] Carnelutti, a este respeito, afirmava que, em seu entendimento, “[...] não se pode falar de trânsito em julgado de uma sentença no que se refere às questões de ordem, as quais não são objeto de coisa julgada material; pode ocorrer que sobre uma determinada questão de ordem não seja lícito renovar a discussão, razão pela qual a sua solução seja ou venha a ser imutável, mas a imutabilidade não provirá, neste caso, das normas que tratam da coisa julgada formal, mas sim, se existirem, de outras normas [...]” (1960, p. 143, tradução nossa).

[19] Sobre a distinção entre as concepções sobre a natureza constitutiva ou declaratória da decisão judicial – que se fundam em distintas concepções sobre a própria natureza unitária ou dualista do ordenamento jurídico –, vale uma menção à esclarecedora síntese feita por Marinoni: “As concepções de ‘justa composição da lide’, de Carnelutti, e de ‘atuação da vontade concreta do direito’, elaborada por Chiovenda, são ligadas a uma tomada de posição em face da teoria do ordenamento jurídico, ou melhor, à função da sentença diante do ordenamento jurídico. Para Chiovenda, a função da jurisdição é meramente declaratória; o juiz declara ou atua a vontade da lei. Carnelutti, ao contrário, entende que a sentença torna concreta a norma abstrata e genérica, isto é, faz particular a lei para os litigantes. Para Carnelutti a sentença cria uma regra ou norma individual, particular para o caso concreto, que passa a integrar o ordenamento jurídico, enquanto que, na teoria de Chiovenda, a sentença é externa (está fora) ao ordenamento jurídico, tendo a função de simplesmente declarar a lei, e não de completar o ordenamento jurídico. A primeira concepção é considerada adepta da teoria unitária e a segunda da teoria dualista do ordenamento jurídico, sendo que essas teorias também são chamadas de constitutiva (unitária) e declaratória (dualista)” (2006, p. 21).

[20] Isto ocorre, por exemplo, em relação à possibilidade de execução provisória – caso em que a decisão judicial ainda não transitou em julgado, mas que já pode produzir alguns efeitos previstos no ordenamento jurídico. Um entendimento mais abrangente das convicções do autor a respeito do instituto da coisa julgada pode resultar da consulta à sua própria obra (LIEBMAN, 1981, p. 37 a 63).

[21] Vale repisar o esclarecimento, já constante da introdução deste artigo, que o estudo que ora se apresenta limitar-se-á a analisar os limites da coisa julgada aplicada a decisões judiciais proferidas em ações individuais (inclusive aquelas em que se verifica litisconsórcio multitudinário). Para um estudo específico sobre os limites da coisa julgada, no atinente às ações genuinamente coletivas, cf. Antunes e Bellinetti (2010).

[22] Nas palavras de Câmara, no estudo dos limites objetivos da coisa julgada “trata-se da verificação do alcance da imutabilidade e indiscutibilidade da sentença transitada em julgado, vista em seu aspecto objetivo. Em outras palavras, o que se busca aqui é saber o que transitou em julgado” (2008, p. 468).

[23] É de se mencionar, contudo, que o artigo 470, do Código de Processo Civil, dispõe, logo em seguida, que “faz, todavia, coisa julgada a resolução da questão prejudicial, se a parte o requerer (arts. 5° e 325), o juiz for competente em razão da matéria e constituir pressuposto necessário para o julgamento da lide”.

[24] Isto deve ocorrer, segundo Chiovenda, porque “o raciocínio sobre os fatos é obra da inteligência do juiz, necessária como meio de preparar a formulação da vontade da lei. [...] Atingido o objetivo de dar formulação à vontade da lei, o elemento lógico perde, no processo, toda a importância. Os fatos permanecem o que eram, nem pretende o ordenamento jurídico que sejam considerados como verdadeiros aqueles que o juiz considera como base de sua decisão; antes, nem se preocupa em saber como se passaram as coisas, e se desinteressa completamente dos possíveis erros lógicos do juiz; mas limita-se a afirmar que a vontade da lei no caso concreto é aquilo que o juiz afirma ser a vontade da lei. O juiz, portanto, enquanto razoa, não representa o Estado; representa-o enquanto lhe afirma a vontade” (2002, p. 449).

[25] Sobre o artigo 474, do Código de Processo Civil, Câmara salienta que, em seu entendimento, “[...] uma vez alcançada a sentença definitiva pela autoridade de coisa julgada, tornam-se irrelevantes todas as alegações que poderiam ter sido trazidas a juízo e que não foram” (2008, p. 470).

[26] Ressalvada, por óbvio, exclusivamente, a possibilidade de impugnação da coisa julgada, quando viável, pelos meios especificamente previstos no ordenamento jurídico com tal finalidade: ação rescisória, impugnação ao cumprimento de sentença por inconstitucionalidade e embargos à execução contra a Fazenda Pública por inconstitucionalidade. É de se salientar, contudo, por honestidade acadêmica que Câmara compõe uma numerosa corrente doutrinária defende a tese de que “[...] o que não tiver sido objeto do pedido, por não integrar o objeto do processo, não será alcançado pelo manto da coisa julgada” (2008, p. 468).

[27] Segundo a observação de Tucci, “não se confunde a eficácia própria do ato que tende à extinção da fase de conhecimento do processo com a imutabilidade do conteúdo decisório da sentença que é alcançada com o trânsito em julgado” (2006, p. 167). O autor também observa que “a sentença, como ato de autoridade proveniente de um órgão do Estado, que põe termo a um conflito de interesses, destina-se a manifestar eficácia entre as partes. Estas são as destinatárias imediatas dos efeitos típicos ou programados do provimento. Contudo, nada obsta a que terceiros também venham a sofrê-los em caráter excepcional” (TUCCI, 2006, p. 172).

[28] As concepções de Liebman a respeito da autoridade da coisa julgada e da eficácia natural da sentença já foram brevemente referidas no capítulo anterior deste mesmo estudo.

[29] O autor, aliás, menciona quais seriam as medidas adequadas abstratamente previstas pelo ordenamento jurídico para a impugnação da sentença, por parte do terceiro prejudicado: embargos de terceiro, recurso de terceiro prejudicado e mandado de segurança – antes do trânsito em julgado da sentença (TUCCI, 2006, p. 178 a 186) –; ação rescisória, embargos de terceiro e, ainda mais especialmente, o mandado de segurança – após o trânsito em julgado da sentença (TUCCI, 2006, p. 189 a 191).

[30] Os meios de insurgência do terceiro, contra uma sentença que tenha transitado em julgado entre as partes e cujos efeitos lhe prejudiquem, em que pese constituam tema de notável importância, não serão, de qualquer forma, abordados, por se encontrarem completamente fora dos estreitos limites deste estudo.


RESUMÉ: Cette étude traite des limites objetives et subjectives de la autorité de la chose jugée. Il commence par une brève analyse des perspectives formelles et matérielles de cet institut. Il étudie les bases politiques de la prédiction de la chose jugée dans certaines systèmes juridiques. Il fait référence à certaines des principaux théories sur les fondements et les caractéristiques juridiques de la chose jugée. Il analyse les limites objectives de l’institut, en établissant ce qui est soumis à l’autorité de la chose jugée. Il étudi les limites subjectives de la chose jugée, en distinguant qui est frappé par sa autorité, et il fait références au contenu de l’article 472 du Code de Procédure Civile brésilienne. Il tente démontrer que, en aucun cas, lé système constitutionnel brésilienne admet que quelq’un qui n’a pas eu l’occasion d’intervenir dans procès peut être limitée par l’autorité de la chose jugée.

Mots Clé: Principes Constitutionnels – Chose Jugée – Securité Juridique


Autor

  • Thiago Caversan Antunes

    Graduado em Direito pela Universidade Estadual de Londrina (UEL), Especialista em Direito Civil e Processo Civil (UEL) e Mestre em Direito Negocial (UEL). Doutor em Direito pela Universidade de Marília (UNIMAR). Professor do curso de graduação em Direito da Universidade Positivo (UP Londrina), e de diversos cursos de pós-graduação. Membro da Associação Brasileira de Direito Processual (ABDPro) e da Associação Brasileira de Direito e Economia (ABDE). Autor de livros e artigos científicos. Atua como advogado.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANTUNES, Thiago Caversan. Os limites da coisa julgada no processo civil brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3559, 30 mar. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23966. Acesso em: 18 abr. 2024.