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União entre homosexuais:aspectos gerais e patrimoniais

União entre homosexuais:aspectos gerais e patrimoniais

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SUMÁRIO

1. Introdução 2. Do casamento 2.1 Conceito 2.2 Evolução histórica 3. Definição de homossexualismo 4. Projeto de Lei nº 1.151/95 4.1 Justificativa do projeto 4.2 Tramitação na Câmara dos Deputados 4.3 Quais os direitos protegidos 5. Análise comparativa entre o projeto e o substitutivo 6. Análise crítica do projeto 7. Direito estrangeiro 8. Conclusão 9. Bibliografia


1. INTRODUÇÃO

Ao iniciarmos a explanação do trabalho por nós desenvolvido, daremos um panorama geral sobre o que será tratado, bem como demonstraremos a importância dos tópicos abordados.

O direito, ao longo da história, sempre esteve, e ainda está, em constante evolução, deparando-se em diversas ocasiões com temas que causam controvérsia, mas que exigem sempre a atenção do legislador, seja por uma maioria da sociedade, ou por grupos minoritários.

É o que acontece com o tema ora desenvolvido, pois é polêmico, e na opinião da maioria das pessoas vai contra os princípios morais, ofendendo institutos que são a base da sociedade, como o matrimônio, e tantos outros aspectos.

Em razão disso, é que procuraremos, dar uma definição do que vem a ser casamento, bem como de uma breve evolução histórica, para somente depois passarmos a definir o que é o homossexualismo.

Uma vez abstraídos tais conceitos, poderemos então analisar o Projeto de Lei apresentado para votação, que regulamenta a união entre homossexuais, seu substitutivo, e como não poderíamos deixar de fazer, uma análise crítica.

Este tema, vem sendo tratado no direito brasileiro, há pouco mais de cinco anos, assim, não poderíamos deixar de citar o direito estrangeiro, pois esse assunto já se encontra regulamentado em diversos países.

Ao final do presente trabalho, poderemos demonstrar as conclusões a que chegamos, sem querer entretanto, influenciar a opinião dos leitores.


2. DO CASAMENTO

2.1 Conceito

No nosso Código Civil vigente, não encontramos uma definição para casamento.

No entanto, a igreja teve um papel importante na definição do casamento, por isso achamos interessante trazer aqui a definição que a igreja moderna tem do casamento, a qual encontramos no Código de Direito Canônico, cânon 1055, em seu parágrafo primeiro. Vejamos:

"Cân. 1055 - § 1. O pacto matrimonial, pelo qual o homem e a mulher constituem entre si o consórcio de toda a vida, por sua índole natural ordenado ao bem dos cônjuges e à geração e educação da prole, entre batizados foi por Cristo Senhor elevado à dignidade de sacramento.[12](1)"

Já na doutrina, são inúmeras as definições que encontramos para este importante instituto. Citaremos o conceito apresentado por Clóvis Bevilaqua, bem como por Washington de Barros Monteiro.

"O casamento é um contato bilateral e solene, pelo qual um homem e uma mulher se unem indissoluvelmente, legalizando por ele suas relações sexuais, estabelecendo a mais estreita comunhão de vida e de interesses, e comprometendo-se a criar e educar a prole, que de ambos nascer.[12](2)"

"União permanente do homem e da mulher, de acordo com a lei, a fim de se reproduzirem, de se ajudarem mutuamente e de criarem os seus filhos.[12](3)"

Não sendo objetivo deste trabalho estudar o casamento, mas sim a relação entre homossexuais, nos limitaremos a citar somente esses conceitos, pois como já dissemos anteriormente, são inúmeras as definições trazidas por diversos doutrinadores, os quais demonstram sempre a idéia que possuem de tal instituto.

O que queremos aqui no entanto salientar, é que, o casamento encontra sua estrutura na união entre homem e mulher, deixando claro, ser o casamento, um instituto incompatível com a união de pessoas do mesmo sexo.

2.2 Evolução histórica

Antes de fazermos as breves considerações sobre a evolução histórica do casamento, achamos interessante salientarmos, o que nos traz os ensinamentos religiosos, os quais dizem que deve o homem unir-se a uma mulher para assim constituírem uma família, e que ainda que não fosse o homem um ser transcendente, religioso, fixa ele seus princípios éticos na preservação da espécie.

Justifica-se assim, o porque desde os tempos mais remotos de sua existência, o ser humano, procura encontrar uma companheira para com esta estabelecer união, com o objetivo de procriação.

Ao longo da história, encontramos cinco sistemas dominantes, ou seja, o ocidental, soviético, muçulmano, tradicionalista chinês e hindu.[12](4)

Dentro desses sistemas que citamos, o Brasil filia-se ao sistema ocidental, visto que nosso código está baseado no Código de Napoleão, o qual, foi o principal grupo que se sobressaiu nesse sistema.

Em sua evolução história, o casamento, dentro do sistema ocidental, encontrou quatro etapas distintas, sendo elas:

Matrimônio consensual:Era este praticado pelos antigos povos, os quais não condicionavam a validade do casamento a qualquer formalidade, sendo necessário somente a vontade recíproca de se unirem, bastando para tanto, o mútuo consentimento.

Matrimônio exclusivamente religioso: a partir do século X, a igreja começou a afirmar ser o casamento entre os cristãos um sacramento, sujeitando-o às normas eclesiásticas.

É importante ressaltar neste aspecto, que quando da realização do Concílio Tridentino, estabeleceu este a doutrina do sacramento do matrimônio, o qual está ainda vigente, doutrina esta que influenciou em muito o atual sistema, pois tratou dos impedimentos, da indissolubilidade.

Matrimônio legal e eclesiástico: este regime passou a vigorar desde 1836, em diversos países, dentre eles o Brasil. Neste, facultou-se aos interessados, que poderiam contrair o casamento segundo as normas da legislação vigente no país, ou sob as prescrições da Igreja, subordinando o casamento na Igreja ao que dispõe a lei canônica.

Matrimônio civil obrigatório: abandonando a idéia do casamento religioso, a maioria das legislações passaram a dar validade tão somente ao matrimônio civil, sendo que o religioso, embora podendo ser realizado a critério dos interessados, não possui qualquer validade.

São essas as considerações que achamos interessante tratar, mesmo porque, se fossemos nos aprofundar no instituto do casamento, teríamos que faze-lo em trabalho exclusivo.

Diante de uma noção preliminar do casamento, sob o aspecto da sua conceituação e breve exposição de sua evolução histórica, temos condições de adentrarmos no tema que nos propomos.


3. DEFINIÇÃO DE HOMOSSEXUALISMO

Para conceituarmos o homossexualismo, nos remetemos a origem etimológica da palavra, a qual é formada pela junção de dois vocábulos, "homo" e "sexu". O vocábulo homo vem do grego "homos", o qual significa semelhante, e o vocábulo sexual vem do latim "sexu", que é relativo ou pertencente ao sexo. A junção dos dois vocábulos significa a prática sexual entre pessoas do mesmo sexo.

Encontramos a seguinte definição no vocabulário de língua portuguesa:

"homossexual: diz-se de, ou indivíduo que pratica o ato sexual com pessoas do mesmo sexo.[12](5)"

A Medicina Legal, define o homossexualismo como indicativo de anormalidade do indivíduo em relação aos seus instintos sexuais, possuindo atração sexual ou amorosa, entre pessoas do mesmo sexo, tendo as vezes repugnância ou aversão a pessoas do sexo oposto.

Temos ainda a seguinte divisão: homossexualismo feminino e o masculino, sendo o primeiro aquele em que a relação sexual é realizada por meio de práticas que podem provocar o orgasmo, também conhecido como safismo, tribadismo e lesbianismo, e o segundo sendo o que se caracteriza entre a relação de homem com homem, aonde encontram uma satisfação carnal, também conhecido como pederastia e uranismo.[12](6)

Importante esclarecermos que o homossexualismo era tido pela medicina como doença. Entretanto, a partir de 1985, o Conselho Federal de Medicina, tornou sem efeito o código 302 da Classificação Internacional de Doenças (CID), não mais considerando o homossexualismo como um desvio ou transtorno sexual.

Embora tenha a medicina desconsiderado o homossexualismo como uma doença, existem hoje diversas discussões a cerca do assunto, pois algumas correntes o consideram como um desvio genético, e outras já como um desvio de conduta, ou seja, o indivíduo torna-se um homossexual em razão do meio em que vive, da forma que foi criado, e por vezes até, por problemas familiares.

Não existe portanto uniformidade, pois cada corrente defende sua posição com fundamentos. Na nossa opinião, entretanto, é este um assunto que ainda terá muitas inovações, pois com os avanços da medicina, bem como dos estudos de psicologia, aparecerão muitos fundamentos, e quem sabe um dia uma definição da origem, ou seja, se é genética ou se advém razão do meio, da influência social.

Este assunto, no entanto, é de interesse da área respectiva, da qual não possuímos conhecimentos técnicos, sendo que para a área jurídica o que nos interessa é saber quais as conseqüências que podem gerar um relacionamento homossexual, bem como se uma possível legalização deste relacionamento viria de encontro com o que pede a sociedade ou se não traria problemas que contrariariam o objetivo do direito, que é a paz social.

Antes porém de avançarmos no estudo que nos propomos, salientamos aqui que o homossexualismo existe há muito tempo, e estudando a história podemos encontrar casos desde os povos primitivos. Entretanto, esta sempre foi uma questão que contrariou a moral e os bons costumes.

Uma das bases para podermos verificar a história, bem como de fácil acesso a todos os povos, é a Bíblia, a qual desde o início, no livro do Gênesis até o fim do Novo Testamento, condena a prática de homossexualismo.

É importante hoje salientarmos, que o homossexualismo vem sendo tratado de uma forma mais aberta, utilizando-se dos meios de comunicação disponíveis.

Entretanto, entendemos que a sociedade vem aparentando aceitar tão controvertida questão. Digo aparentando porque o que ocorre, é que se aceitam as opções sexuais dos outros, desde que não seja na sua própria família. Isto demonstra que a sociedade aparenta aceitar, mais no fundo ainda está enraizada por princípios morais e religiosos herdados de seus antepassados.


4. PROJETO DE LEI Nº 1.151/95

Demonstrarmos neste capítulo, as razões pelas quais se apresentaram este projeto de regulamentação da união civil entre pessoas do mesmo sexo, sua tramitação pela Câmara dos Deputados, bem como os direitos que busca proteger.

4.1 Justificativa do projeto

Em 26 de outubro de 1995, foi apresentado ao plenário da Câmara dos Deputados, o projeto da então deputada Marta Suplicy, o qual buscou disciplinar a união civil entre pessoas do mesmo sexo, tratando ainda de outras questões.

Iniciou sua justificativa com a seguinte assertiva: "O presente Projeto de Lei visa o reconhecimento das relações entre pessoas do mesmo sexo, relacionamentos estes que cada vez mais vêm se impondo em nossa sociedade.[12](7)"

Ao discorrer sobre suas justificativas, tratou da realidade e direitos, relação duradoura, violência, solidariedade, homossexualidade, diferenças e semelhanças entre união civil e casamento e aspectos jurídicos.

De forma sucinta, procuraremos demonstrar cada um destes itens, para em seguida apresentarmos nosso ponto de vista sobre a justificativa apresentada.

a) realidade e direitos

Trata da expressão dos direitos inerentes a pessoa humana, acrescentando ter os indivíduos direito à busca da felicidade. Esclarece que o projeto pretende tão somente fazer valer o direito à orientação sexual, hetero, bi ou homossexual.

b) relação duradoura

Neste aspecto, justifica que uma relação não discriminada, mas que se torne pública e protegida por lei, leva que as pessoas com este tipo de orientação sexual, possam assumir seu compromisso, saindo assim da clandestinidade, e conseqüentemente da angústia que esta causa nas pessoas.

c) violência

No nosso país, são freqüentes as violências contra os homossexuais, sendo que a legalização desta união, levaria à diminuição de comportamentos homofóbicos e via de conseqüência, a constantes agressões.

d) solidariedade

Ao tornar oficial a união homossexual, poderiam esses casais encontrar um maior apoio em suas famílias. Os casais heterossexuais, quando em crise, encontram forte apoio dos familiares, dos amigos, possuindo tratamentos os quais possibilitam a harmonia entre ambos, afastando a possibilidade de uma separação.

Já os homossexuais, por viverem na clandestinidade, freqüentemente são afastados de qualquer ajuda de amigos e familiares. Com isso, quando diante de uma crise de relacionamento, não encontrando o apoio adequado, acabam rompendo a união.

Justifica ainda que o projeto não resolveria todos os problemas, mas ao menos amenizaria a situação, levando às relações um efeito estabilizador.

e) homossexualidade

Explicita aqui algumas considerações gerais sobre o que vem a ser a homossexualidade e como esta é hoje encarada.

f) diferenças e semelhanças entre união civil e casamento

Este é um aspecto de relevante importância para o nosso estudo, pois ao trazê-lo para a justificativa, tentou-se deixar claro que não é objetivo do projeto equiparar a união civil ao casamento, justificando também a razão por que tratamos dos aspectos gerais do casamento em nosso trabalho.

Ficou claro na justificativa apresentada que não quer esta lei dar à união civil entre pessoas do mesmo sexo um status igual ao casamento, mesmo porque tem esse um status único. "Os termos matrimônio e casamento são reservados para o casamento heterossexual, com suas implicações ideológicas e religiosas"[12](8).

Com isso, ressaltamos que não se quer equiparar a união civil ao casamento, mas sim possibilitar que casais de gays e lésbicas, possam ser mais bem aceitos pela sociedade, bem como verem solucionados problemas relacionados as questões legais e financeiras.

g) aspectos jurídicos

É importante, salientarmos que o projeto de lei apresentado, não contraria a constituição, muito pelo contrario, pois entende que a Constituição Federal veda sim, em seu artigo 3º, inciso I e IV, a discriminação de origem, raça, cor idade, dentre outras, bem como garante a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, que promova o bem de todos.

No mais, o presente projeto, se transformado em lei, vem de encontro a uma situação que já existe de fato, há muito tempo, não podendo assim ser negado pelo direito.

Estas foram as justificativas apresentadas pela Deputada Marta Suplicy ao seu projeto de lei à Câmara dos Deputados.

Entretanto, a partir deste momento, passamos a manifestar nossa opinião pessoal quanto a justificativa apresentada para este projeto.

Antes de se falar em qualquer tipo de direito, seja ele natural ou positivo, salientamos que o homem (no sentido amplo da palavra), é um ser naturalmente ético, primando sempre pelos bons costumes.

A palavra ética, tem sua origem no grego, "ethos", que significa, costume, caráter, ou seja, a ética é a doutrina dos bons costumes. Já a palavra moral, deriva do latim, e também está ligada aos princípios, orientações.

Ousamos então dizer, que o direito é espécie, da qual a moral é o gênero, pois esta é muito mais abrangente, regrando não só os atos externos do ser humano, mas também os atos internos.

De uma forma bastante simples, podemos dizer que o direito natural, é inerente ao homem, faz parte de sua natureza, que no entanto traz regramento para regular a convívio social. Já o direito positivo, é a expressão legal desse direito natural.

Portanto, o direito positivo deverá sempre encontrar uma justificativa no direito natural, pois aquele deve vir de encontro, expressar o que este necessita.

Quando se diz que o homossexualismo existe desde o homem primitivo, e que assim, é um direito natural devendo ter a proteção do Estado e do Direito, pensamos que é uma justificativa precoce, necessitando um estudo mais aprofundado, mais acurado a esse respeito.

Pensamos então, que ao buscar disciplinar a união civil entre homossexuais, devemos deixar a superficialidade dos conceitos e buscar nos aprofundar, para saber se este projeto, antes de atender a um direito natural de um determinado grupo, atende aos princípios morais e éticos de toda uma sociedade. Trazemos uma questão para reflexão: poderá o individual prevalecer sobre o coletivo, deixando de lado todos os princípios deste ?

4.2 Tramitação na Câmara dos Deputados

Apresentaremos as principais fases deste projeto que se encontra ainda em tramitação.

Em 26 de outubro de 1995, foi o projeto apresentado em plenário pela autora, Deputada Marta Suplicy, sendo em seguida encaminhado à mesa para despacho inicial, tendo ainda tramitação pelas diversas comissões.

Em 01 de abril de 1996, foi novamente levado a plenário, o qual após leitura e publicação da matéria encaminhou à mesa, quando em 12 de junho de 1996, foi constituída uma comissão especial destinada a apreciar e proferir parecer sobre o projeto.

Em 26 de novembro de 1996, a comissão especial deu parecer favorável do relator, deputado Roberto Jefferson, o qual apresentou um substitutivo.

No dia 10 de dezembro de 1996, foi então aprovado o parecer do relator, opinando pela constitucionalidade, juridicidade e técnica legislativa, bem como sendo aprovado o substitutivo.

Atualmente, encontra-se o projeto em tramitação, tendo sido levado a votação no último dia 09 de maio de 2001, sendo novamente adiado, aguardando nova designação de data para discussão.

4.3 Quais os direitos protegidos

A principal proteção que busca o projeto de lei, vem especificado no artigo 1º, que trata além do reconhecimento da união civil, a proteção dos direitos à propriedade, sucessão, além dos outros assegurados no projeto.

Quanto aos outros direitos, são os relativos a previdência social, alimentos, imigração. Já o substitutivo, inovou os direitos acrescentando os seguintes: curatela, composição de rendas para financiamento de casa própria e direitos relativos a planos de saúde e seguro de grupo, e inscrição e dependentes para efeitos tributários.

Achamos interessante salientarmos a questão da sucessão, pois pelo que se observou do projeto apresentado, busca este incluir o parceiro na ordem da vocação hereditária, colocando-o em terceiro lugar, em pé de igualdade com o cônjuge ou companheiro sobrevivente.

Apresenta as seguintes soluções:

a)o parceiro sobrevivente, tendo o "de cujus" herdeiros filhos, tem direito ao usufruto da quarta parte dos bens deixados por este;

b)caso não tenha este herdeiros filhos, terá o sobrevivente direito ao usufruto de metade dos bens;

c)tem também direito na meação caso haja colaboração.

Outro ponto que entendemos importante é a questão da imigração, pois em se registrando uma união civil entre pessoas do mesmo sexo, o parceiro que não for brasileiro, passa a ter o direito de adquirir nacionalidade brasileira.

Não obstante os direitos conferidos por este projeto, o substitutivo apresentado vedou expressamente a possibilidade de adoção, tutela ou guarda de crianças ou adolescentes, união com mais de uma pessoa e também a alteração do estado civil pelos contratantes enquanto vigente o contrato.


5. ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE O PROJETO E O SUBSTITUTIVO

O substitutivo apresentado trouxe algumas alterações ao projeto original, sendo que estudaremos as que entendermos ser de alguma relevância.

A primeira delas diz respeito à matéria disciplinada, pois o projeto inicial tratava de "união civil entre pessoas do mesmo sexo", e o substitutivo passou a tratar como "parceria civil registrada entre pessoas do mesmo sexo"

Foi acrescentado pelo substitutivo, no artigo segundo, o parágrafo segundo, que no nosso entendimento é uma redundância com o citado artigo, uma vez que repetiu aquilo que já está disciplinado no "caput".

Temos ainda, um aspecto que entendemos ser de interesse, e também essencial para o projeto, quando vedou expressamente no artigo 3º, § 2º a adoção, tutela ou guarda de crianças ou adolescentes em conjunto, mesmo que sejam filhos de um dos parceiros.[12](9)

Além desses aspectos, foi o substitutivo que ampliou a questão da sucessão, bem como acrescentou o estabelecimento da curatela a favor do companheiro.


6. ANÁLISE CRÍTICA DO PROJETO

Pelo que pudemos observar, embora tanto o projeto como o substitutivo tenham tentado deixar transparecer que não objetivam dar à relação entre pessoas do mesmo sexo um status de casamento, não é o que está acontecendo, pois em uma leitura mais acurada do projeto, constata-se que de uma forma indireta, acaba por equiparando esse tipo de união ao casamento, que nas palavras da própria autora do projeto, são institutos divergentes, pois possui o casamento "implicações ideológicas e religiosas"[12](10) que lhe são próprias.

Demonstraremos nossas razões para chegarmos a tal conclusão.

Logo no artigo 1º, assegura o direito a propriedade e à sucessão. Quanto a propriedade não fazemos qualquer questionamento, pois como se sabe, o nosso atual sistema nunca proibiu que pessoas do mesmo sexo adquirissem em condomínio qualquer tipo de bem, seja ele móvel ou imóvel. O problema encontra-se na sucessão, pois somente o cônjuge ou companheiro é que entram na ordem da vocação hereditária. Assim, ao estender esse direito às relações entre pessoas do mesmo sexo, começaríamos a equiparar as duas instituições, oferecendo os mesmos direitos.

Quando trata dos requisitos necessários para o registro da união ou parceria em livro próprio do Cartório de Registro Civil e Pessoas Naturais, estabelece formalidades a serem cumpridas, da mesma forma que se exige para o casamento, embora de uma maneira mais simplificada.

O contrato deverá ainda versar sobre disposições patrimoniais, deveres, impedimentos e obrigações mútuas, as quais sabemos serem questões que o Código Civil preceitua para a realização do casamento. Mais uma vez dando os mesmos direitos a estes.

No caso da dissolução, assim como no casamento, o projeto estabelece que a extinção da união civil somente poderá ocorrer com decisão judicial da extinção dessa união. Sendo consensual, deverá ser homologada pelo juiz, caso contrario, deverá haver o pedido judicial de extinção da união.

Acrescentamos ainda, neste aspecto, que pode qualquer das partes requerer a extinção, caso demonstre a infração contratual em que se funda o pedido.

Vemos, com as observações feitas, que mais uma vez está estendendo os mesmos direitos e obrigações que nascem quando do casamento à relação homossexual, prevendo até casos de "separação consensual, litigiosa, fundada ou não na culpa do outro".

Assim, por essas razões, entendemos que o presente projeto busca equiparar essas uniões ao casamento, mas com outra denominação. "Data vênia", ousamos dizer que o projeto apresentado não podendo expressamente equiparar as relações entre pessoas do mesmo sexo ao casamento, pois levaria a paz social e a coletividade a rejeitar liminarmente a idéia, procurou faze-lo de forma mais branda, dando um outro nome, mas concedendo os mesmos direitos, e quem sabe até mais.


7. Direito Estrangeiro

Esse é tema vem sendo tratado nos mais diversos países, e das mais diversas formas, conforme veremos a seguir.

Em alguns países já existem leis regulamentando a união entre homossexuais, como é o caso da Groelândia, Hungria, Islândia, Noruega, Suécia, Holanda e Dinamarca, sendo que esta admite inclusive a adoção de filhos do seu parceiro.

Já a Hungria, reconhece tão somente a união de fato entre homossexuais.

No Brasil, Bélgica, Finlândia e República Checa, a lei está em discussão pelo Congresso.

A Espanha, Canadá, Bélgica, Estados Unidos e França (234 prefeituras), reconhecem o contrato de união civil.

Alguns países proíbem expressamente a discriminação por motivo de orientação sexual, como é o caso da África do Sul, Canadá, Dinamarca, Eslovênia, Espanha, França, Holanda, Noruega, Nova Zelândia, Polônia e Suécia. "No Brasil, a Câmara dos Deputados está apreciando a Proposta de Emenda a Constituição nº 139/95, da ex-deputada Marta Suplicy."[12](11)

Existe ainda países que concedem asilo político por motivo de orientação sexual: Alemanha, Áustria, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Estados Unidos, Finlândia, Holanda, Irlanda, Noruega e Suécia.

Outros concedem nacionalidade por motivo de união civil entre homossexuais, como quer fazer o Brasil, são eles, Austrália, Dinamarca, Holanda, Noruega, Nova Zelândia e Suécia.

Por fim, alguns países proíbem oficialmente que o homossexual sirva às forças armadas: Austrália, Bélgica, Canadá, Dinamarca, Estônia, Finlândia, Holanda, Israel, Nova Zelândia, Noruega e Suécia.

Embora tratando neste capítulo de direito estrangeiro, achamos interessante salientar que "no Brasil, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em julgamento datado de 13 de fevereiro de 1992, reputou legal a exclusão das fileiras da corporação de componente homossexual, por comprometer a honra e o decoro da classe."[12]


8. CONCLUSÃO

Ao terminarmos o estudo que nos propusemos, chegamos a uma conclusão provisória.

No momento, diante do contexto social em que vivemos, não pode ser o projeto apresentado convertido em lei, mesmo porque contrariaria os princípios morais e éticos de nossa sociedade.

As justificativas apresentadas, entendemos serem frágeis, pois o nosso ordenamento jurídico nunca proibiu a constituição de patrimônio comum, existindo formas legais de se resguardar tais direitos.

Quanto aos outros direitos que busca-se proteger, pensamos serem direitos inerentes ao matrimônio, não podendo serem estendidos a qualquer outro tipo de relação que não sejam as legalmente permitidas.

Retomo aqui o aspecto tratado anteriormente, pois o direito positivo não pode exclusivamente encontrar sua justificativa tão somente no direito natural, devendo ir além, perquirindo se antes de atender a direitos inerentes a uma dada coletividade, está indo de encontro aos princípios morais e éticos, não podendo nos valer, para legislarmos, somente de critérios políticos, estes jamais devem prevalecer sobre a justificativa que procura o direito positivo.

Finalmente, digo que esta é uma conclusão provisória, por não ser neste mundo nada definitivo, e a constante evolução do ser humano e da sociedade em que vivemos, pode levar a novas conclusões. No mais, não existe nenhum impeditivo que alguém venha a propor um projeto que seja adequado, atenda às reais necessidades dos homossexuais, e não fira institutos há muito protegidos.


Notas

1.Código de Direito Canônico, Codex Iuris Canonici, p. 465.

2.Clovis Bevilaqua, Direito da Família, p.34.

3.Washington de Barros Monteiro, Curso de Direito Civil – Direito de Família, p. 9.

4.Domingos Sávio Brandão Lima, in Enciclopédia Saraiva de Direito, verbete Casamento, p. 394.

5.Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, Minidicionário de língua portuguesa, p. 289.

6.De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico, vol. II, p. 390.

7.Deputada Marta Suplicy, Justificativa ao projeto de Lei nº 1.151, de 1995.

8.Deputada Marta Suplicy, Justificativa ao projeto de Lei nº 1.151, de 1995.

9.Substitutivo adotado pela comissão. Projeto de Lei nº 1.151, de 1995.

10.Deputada Marta Suplicy, Justificativa ao projeto de Lei nº 1.151, de 1995.

11.Luiz Salem Varella, Homoerotismo no direito brasileiro e universal – Parceria civil entre pessoas do mesmo sexo. p. 98.

12.Luiz Salem Varella. op. cit. p. 99.


9. BIBLIOGRAFIA

BEVILAQUA, Clóvis. Direito da Família. 7. ed. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1943.

Código de Direito Canônico. Codex Iuris Canonici. 7. ed. rev. e amp. São Paulo: Loyola, 1983.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário da língua portuguesa. 3. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1993.

LIMA, João Batista de Souza. As mais antigas normas de direito. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1983.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil. São Paulo: Saraiva, 1989-1990. v. 2.

MOTTA, José Barros. Casamentos nulos na Igreja Católica: nova dimensão explícita do atual Código de Direito Canônico. Rio de Janeiro: Forense, 1995.

SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1989. v. 1 e 2.

VARELLA, Luiz Salem. Homoerotismo no direito brasileiro e universal: parceria civil entre pessoas do mesmo sexo. Campinas, SP: Agá Júris, 2000.



Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ASSIS, Reinaldo Mendes de. União entre homosexuais:aspectos gerais e patrimoniais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/2432. Acesso em: 20 abr. 2024.