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A extinção da separação judicial do ordenamento jurídico brasileiro e as questões transitórias

A extinção da separação judicial do ordenamento jurídico brasileiro e as questões transitórias

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Atualmente, para a dissolução do vínculo conjugal, seja administrativa (via escrivania extrajudicial) ou judicialmente, somente é possível através do divórcio. Tornaram-se ineficazes todas as leis que tratam de separação judicial.

Resumo: Recentemente, mais precisamente em 13 de julho de 2010, houve a promulgação da PEC nº 28/2009, aprovada em 07 de julho de 2010, ensejando a publicação da Emenda Constitucional nº 66/2010, que alterou o artigo 226, § 6º da Constituição Federal. A citada Emenda Constitucional alterou as disposições existentes no ordenamento jurídico brasileiro, no que diz respeito a dissolução do vínculo conjugal, extinguindo-se a prévia separação judicial, a qual era um dos requisitos para a concessão do divórcio, além do lapso temporal de separação de fato entre as partes. Nesse sentido, considerando a existência de diversas normas legais no tocante a separação judicial dispostas em nossa legislação civil pátria, vislumbra-se a ineficácia de tais, diante da extinção da separação judicial. Destarte, atualmente, para a dissolução do vínculo conjugal, seja administrativa (via escrivania extrajudicial) ou judicialmente, somente é possível através do divórcio. Sobre este atual mecanismo para o rompimento do casamento é que será desenvolvimento a presente pesquisa, destacando-se tão somente a esfera judicial.

Palavras-chave: Separação. Divórcio. Processos em andamento.


1  INTRODUÇÃO

A idéia do novo assusta e causa tumultos. Foi assim com a Emenda Constitucional nº 66, publicada em 14 de julho de 2010, ao dar nova redação ao artigo 226 da Constituição Federal,[1] eliminando do nosso ordenamento jurídico pátrio o instituto da separação judicial.

Trata-se de grande avanço legislativo,[2] na tentativa de amoldar as normas jurídicas existentes à realidade fática vivenciada pelas pessoas na atualidade

Considerando os novos/velhos conceito de família,[3] bem como a facilidade quanto a sua formação física e, ainda, os desencontros e os desencantos após a união em um mesmo habitat, não mais se justificam os limites impostos pelo Estado, existentes na antiga legislação, na tentativa de preservação da entidade familiar que iniciou fadada ao insucesso.

Somente a lei ainda não havia sido modificada, vez que na vida fatídica pessoas trocam constantemente de relacionamento, bastando o fim do amor e do desejo para tal evento.

Por vezes, a inexistência de normas a atender os anseios sociais, causaram dificuldades àqueles que pretendiam regularizar a vida civil, seja com a dissolução da antiga união, na espera dos prazos fixados por lei para ocorrência do término do vínculo conjugal, seja pela demora do Poder Judiciário face os inúmeros feitos que tramitam nos cartórios das Varas das Famílias e Registros Públicos das Comarcas dos Estados brasileiros.

O direito à liberdade e autonomia das decisões quanto à vida amorosa do indivíduo estavam fadadas à vontade do Estado, laico como vivemos, sem qualquer atendimento ao princípio da dignidade da pessoa humana, sendo coagido a respeitar os limites e as imposições, somente no mundo das leis, vez que no mundo físico a realidade era diversa.[4]

Nesse contexto, com a extinção do instituto separação do ordenamento jurídico brasileiro, consequentemente, foram extintos os prazos para a dissolução da sociedade marital, a identificação dos culpados pelo término do relacionamento. “Enfim passou a ser respeitado o direito de todos de buscar a felicidade, que não se encontra necessariamente na mantença do casamento, mas, muitas vezes, com o seu fim” (DIAS, 2010).

Utilizando as palavras de Rodrigo da Cunha Pereira (2010, p. 07):

A moral condutora da manutenção deste arcaico sistema, assim como a da não facilitação do divórcio, é a preservação da família. Pensa-se que se o Estado dificultar ou colocar empecilhos, os cônjuges poderão repensar e não se divorciarem; ou, se apenas se separarem, poderão se arrepender e restabelecerem o vínculo conjugal. Em 1977, o argumento usado para se manter na lei o instituto da separação judicial como alternativa ao divórcio era puramente religioso. Tinha-se a esperança de que os católicos não se divorciariam, apenas se separariam judicialmente. A realidade, diferente do que se temia, foi outra: católicos se divorciam, não houve uma ‘avalanche’ de divórcios, e as famílias não se desestruturaram por isso. Ao contrário, as pessoas passaram a ter mais liberdade e conquistaram o direito de não ficarem casadas. Ora, o verdadeiro sustento do laço conjugal não são as fórmulas jurídicas o que garante a existência dos vínculos conjugais é o desejo.

Portanto, a partir de 14 de julho de 2010, foram extirpados prazos, causas ou motivos para a decretação do divórcio no Brasil,[5] causando grandes reflexos na sociedade, operadores do direito e religiosos,[6] facilitando a explicação quanto a extinção da sociedade conjugal a qual, anteriormente, era finda com a separação judicial, mas não extinta.

Resta, no mais, a solução para os feitos ainda em andamento.

Quanto aos processos de divórcio não há dúvidas a serem sanadas. Já quanto aos feitos afetos à separação judicial, várias são as questões pendentes,[7] as quais ainda estão sendo analisadas pelos operadores do Direito, sendo diversos e distintos os entendimentos e decisões nos diferentes Estados brasileiros que ora serão investigadas.


2  BREVE RELATO DA TRAJETÓRIA DO DIVÓRCIO NO BRASIL E O DIREITO COMPARADO

A história da legislação brasileira advém da necessidade de adequação as realidades, condutas e acontecimentos da sociedade, a fim de sanar os anseios e problemas sociais existentes.

Várias foram as transformações sociais e legais que passou a sociedade em que atualmente vivemos, seja no cotidiano físico ou no mundo das leis, sendo que tais modificações somente aconteceram em razão das situações fatídicas sociais em cada momento histórico.

No tocante ao direito das famílias,[8] em especial, quanto ao casamento e, especificamente, a possibilidade de sua dissolução, foi possível a ocorrência e aceitação, gradativamente no direito brasileiro.

Merece destaque que as mudanças foram, em tese, radicais no direito de família,[9] se considerarmos o estabelecimento legal do casamento civil no Brasil,[10] trazendo a distinção entre Estado e Igreja; a criação do Estatuto da Mulher Casada,[11] concedendo direitos às citadas na relação conjugal, retirando-as da lista dos relativamente incapazes no Código Civil; a lei do Divórcio,[12] permitindo a dissolução do casamento; a igualdade entre os cônjuges quanto aos direitos e deveres, a igualdade entre os filhos biológicos e afetivos, a proteção à união estável,[13] até a legislação atualmente em vigor (SIMÃO, 2010).

Antes da Emenda Constitucional nº 66/2010, que permitiu a dissolução do vínculo conjugal e a dissolução do casamento através de apenas um procedimento legal, consoante a antiga legislação em vigor até 1977, era impossível a efetivação do divórcio. Existia no Brasil o chamado “desquite”, através do qual se permitia a dissolução da sociedade conjugal e não do vínculo, impedindo a efetivação de novo casamento.

Referida nomenclatura utilizada para a dissolução da sociedade marital, porém não do vínculo conjugal, deu origem a conhecida separação judicial, após a introdução do divórcio no Brasil, em 1977, passando a ser uma etapa a ser preenchida para o fim do casamento, vez que, anteriormente, era indissolúvel.[14]

Portanto, restou caracterizada a separação judicial como um requisito necessário para a decretação do divórcio, preenchido através de um lapso temporal de 03 (três) anos, reduzidos, após, para 01 (um) ano,[15] para os casais que estivessem separados judicialmente.

Destarte, não havia possibilidade da extinção do casamento por simples vontade das partes, antes de preenchido o prazo fixado em lei, necessário para a reflexão dos cônjuges,[16] “presos um ao outro pelo vínculo do casamento, que não se rompia com a sentença que decretasse a separação judicial”.[17]

Rodrigo da Cunha Pereira (2010), citando os professores Cristiano Chaves de Faria e Nelson Rosenvald, menciona que os citados doutrinadores, mesmo antes da PEC do Divórcio, “já faziam ferrenha crítica ao sistema binário de dissolução do casamento. Exemplificando com os ordenamentos jurídicos da Áustria, Grã-Bretanha e Alemanha, que adotam apenas o divórcio”,”[18] realçando ser ilógica a manutenção do instituto separação.

Consoante destacado na exposição de motivos da referida emenda constitucional:

(...) De fato, deve-se ter em mente que o antigo desquite, hoje separação judicial, foi mantido no Direito brasileiro, possível a adoção do divórcio entre nós. Tratou-se de uma fórmula que agradasse àqueles frontalmente contrários à dissolução do vínculo matrimonial, e que, portanto, contentavam-se com a possibilidade de pôr termo, apenas e tão somente, à sociedade conjugal. Hoje, contudo, resta claro que a necessidade da separação dos cônjuges, seja judicial ou de fato, como pressuposto para o divórcio apenas protai a solução definitiva de um casamento mal sucedido.

É acrescentado ainda:

Deve-se sublinhar a necessidade de dois processos judiciais distintos apenas redunda em gastos maiores e também em maiores dissabores para os envolvidos, obrigados que se vêem a conviver por mais tempo com o assunto penoso da separação – penoso, inclusive, para toda a família, principalmente para os filhos. Não menos importante é a constatação prática de que apenas uma parcela realmente ínfima das separações reverte para reconciliação do casal.[19]

De outro norte, importante ressaltar que com a Constituição de 1988 o indivíduo passou a ser o centro das atenções, ocasião em que foi abolido o caráter “patrimonialista da separação, importando-se muito mais com a dignidade da pessoa dos cônjuges, ao possibilitar, inclusive, o divórcio direto, respeitando o princípio da autodeterminação e da deterioração factual” (LARA, 2010).

Consoante ressalta Maria Berenice Dias (2010, p. 24):

A dissolução do casamento sem a necessidade de implemento de prazos ou identificação de culpados tem também um efeito simbólico. Deixa o Estado de imiscuir-se na vida das pessoas, tentando impor a mantença de vínculos jurídicos quando não mais existem vínculos afetivos. Como bem refere Paulo lobo, a sobrevivência da separação judicial era de palmar inocuidade, além de aberto confronto com os valores que a Constituição passou a exprimir, expurgando os resíduos de quantum despótico: liberdade e autonomia sem interferência estatal.

De fato, atualmente, o sistema jurídico brasileiro conta apenas com uma única forma de dissolução do casamento, que é o divórcio, sem a necessidade de provas de culpa ou outros requisitos (prazos)[20] para o término no enlace marital, como ocorre na Suécia,[21] Finlândia e Espanha,[22] diferente da legislação italiana[23] e União Européia.[24]

Na Argentina, por exemplo, é possível a decretação do divórcio quando há comprovação da separação do casal por mais de 03 (três) anos, incluída no ordenamento jurídico do citado país em 1987, com o advento da Lei nº 23.515/87 (NETO, 2007, p. 48).

No citado país a separação pode ser litigiosa ou consensual, podendo ser culposa ou não, como assim o é para decretação do divórcio. Também é admitido o divórcio por conversão.[25]

No Uruguai há possibilidade e previsão legal quanto a dissolução do vínculo conjugal fundamentado na culpa,[26] na livre vontade das conviventes[27] e por vontade exclusiva da mulher.[28]

No Direito português, o divórcio foi introduzido pelo Decreto 1, de 03 de dezembro de 1910, podendo ser litigioso ou consensual. A dissolução do vínculo conjugal, quanto a separação trata-se de uma efetiva partilha de bens, enquanto o divórcio pode ser dissolvido após o casamento pelo lapso temporal de 03 (três) anos ou quando houver separação de fato por 06 (seis) anos (NETO 2007, p. 52/53).

Ainda, poderá ocorrer a reconciliação a qualquer tempo, por termo nos próprios autos, como também através de escritura pública, sujeita a homologação judicial ou do notarial.[29]

Quanto ao divórcio, pode ocorrer por conversão, transcorrido dois anos da separação, podendo, ainda, ser tal lapso temporal dispensado se o requerimento for consensual ou se um dos cônjuges cometer adultério depois da separação (NETO, 2007, p. 53).

No Direito alemão não se faz menção à separação, mas tão somente ao divórcio, que pode ser consensual ou litigioso,[30] requerido após 01 (um) ano de separação de fato se for consensual. Caso contrário, serão necessários 03 (três) anos de separação de fato (NETO, 2007, p. 53).

Curiosidade interessante a ser citada é a cláusula de dureza prevista no parágrafo 1568 do citado Código Civil alemão, proibindo o divórcio se a manutenção do casamento for necessária para os filhos ou para o cônjuge, como também a forma como pode se dar a separação de fato efetivada no mesmo lar conjugal (NETO, 2007, p. 53).

No Direito francês, através de recente lei promulgada (2004-439), é possível a efetivação do divórcio através da aceitação do princípio da ruptura do casamento e a alteração definitiva do laço conjugal, aceitando as partes “culpas recíprocas”, decorrido o prazo de 02 (dois) anos (NETO, 2007, p. 53).

Quanto à conversão da separação em divórcio, é admitida após 03 (três) anos, porém, se a separação houver sido consensual, a conversão também assim deverá ser (NETO, 2007, p. 69).

Observa-se que são várias as espécies de estruturas familiares existentes mundialmente, como também vasto o ordenamento jurídico que viabiliza, de diferentes formas, a dissolução, ou não, do vínculo matrimonial.

Para findar, importante o destaque efetivado por Ricardo C. Perez Manrique (2009),[31] no tocante a existência de leis que propiciem a dissolução do vínculo conjugal, quando reconhecida a inexistência do afeto mútuo.


3  revogação das leis referente à separação judicial

Vários e distintos são os comentários sobre a revogação ou não das leis infraconstitucionais, face a Emenda Constitucional nº 66/2010.[32]

A discussão em voga refere-se tão somente a expressão “pode”, contida no texto constitucional em vigor, ensejando alguns doutrinadores a afirmar, absurdamente, que em razão da citada palavra acima grafada, o instituto separação não desapareceu do ordenamento jurídico brasileiro (DIAS, 2010, p. 30).

Questões relevantes são enunciadas por Rodrigo da Cunha Pereira (2010):

O Direito Civil Constitucional, tão bem sustentado pelos juristas Luiz Edson Fachin, Gustavo Tepedino, Paulo Lobo, Maria Celina Bodin de Moraes, dentre outros, vem exatamente na direção que aqui se argumenta, ou seja, a legislação infraconstitucional não pode ter uma força normativa maior que a própria Constituição. Em outras palavras, se o novo texto do § 6º do art. 226 retirou de seu corpo a expressão ‘separação judicial’, como mantê-la na legislação infraconstitucional? É necessário que se compreenda, de uma vez por todas, que a hermenêutica constitucional tem que ser colocada em prática, e isso compreende suas contextualizações política e histórica.

Ainda, destaca:

A interpretação das normas secundárias, ou seja, da legislação infraconstitucional, deve ser compatível com o comando maior da Carta Política. O conflito com o texto constitucional atua no campo da não recepção. Essa é a posição de nossa Corte Constitucional, em julgamento de 2007, que traduz exatamente essa assertiva: ‘O conflito de norma com preceito constitucional superveniente resolve-se no campo da não recepção’. Vê-se, portanto, mais uma razão da desnecessidade de se manter o instituto da separação judicial, pois ainda que se admitisse a sua sobrevivência, a norma constitucional permite que os cônjuges atinjam seu objetivo com muito mais simplicidade e vantagem. Ademais, em uma interpretação sistemática, não se pode estender o que o comando constitucional restringiu. Toda legislação infraconstitucional deve apresentar compatibilidade e nunca conflito com o texto constitucional (PEREIRA, 2010).

Valéria Maria Sant’Anna (2010, p. 46), na obra, DIVÓRCIO, Após a Emenda Constitucional 66/2010: Teoria e Prática, entende que:

Sendo a Constituição federal a Lei maior, aquela que contém os elementos estruturais da nação e a definição fundamental dos direitos do homem como indivíduo e cidadão, sua alteração se deu em decorrência de manifestação da vontade nacional, tem sua vigência imediata, e como lei imperativa que é, impõe-se, obrigatoriamente, a todos os brasileiros. Pode-se tentar argumentar que a lei infraconstitucional não tenha sido revogada e a separação judicial permaneça já que o texto constitucional não a excluiu expressamente. Todavia esse pensamento não subsistirá: uma vez que a Constituição Federal suprimiu a terminologia ‘separação judicial’ quando reconhece que o casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, significa que ela não prevê mais esse requisito (a separação judicial) intermediando o casamento e o divórcio. Ou seja, qualquer norma que trate da separação judicial está revogada por absoluta incompatibilidade com a Constituição Federal.

No mesmo sentido os ensinamentos de Paulo Lobo (2009), quando menciona não sobreviver “qualquer norma infraconstitucional que trate da dissolução da sociedade conjugal isoladamente, por absoluta incompatibilidade com a Constituição, de acordo com a redação atribuída pela PEC do divórcio”.

Arnoldo Camanho de Assis (2010) acrescenta tratar-se de norma “constitucional de eficácia plena, que (...) torna desnecessária a edição de qualquer ato normativo de categoria infraconstitucional para que possa produzir efeitos imediatos”.

Consoante se manifestou o Supremo Tribunal Federal:

A Constituição sobrevinda não torna inconstitucionais leis anteriores conflitantes: revoga-as. Pelo fato de ser superior, a Constituição não deixa de produzir efeitos revogatórios. Seria ilógico que a lei fundamental, por ser suprema, não revogasse, ao ser promulgada, leis ordinárias. A lei maior valeria menos que a lei ordinária. Reafirmação da antiga jurisprudência do STF, mais que cinqüentenária (STF –ADI 02-DF).[33]

Em sentido contrário,[34] recente jurisprudência sobre o assunto:

SEPARAÇÃO JUDICIAL. VIABILIDADE DO PEDIDO. NÃO OBRIGATORIEDADE DO DIVÓRCIO PARA EXTINGUIR A SOCIEDADE CONJUGAL. 1. A Emenda Constitucional nº 66 limitou-se a admitir a possibilidade de concessão de divórcio direto para dissolver o casamento, afastando a exigência, no plano constitucional, da prévia separação judicial e do requisito temporal de separação fática. 2. Essa disposição constitucional evidentemente não retirou do ordenamento jurídico a legislação infraconstitucional que continua regulando tanto a dissolução do casamento como da sociedade conjugal e estabelecendo limites e condições, permanecendo em vigor todas as disposições legais que regulamentam a separação judicial, como sendo a única modalidade legal de extinção da sociedade conjugal, que não afeta o vínculo matrimonial. 3. Somente com a modificação da legislação infraconstitucional é que a exigência relativa aos prazos legais poderá ser afastada. Recurso provido (Agravo de Instrumento Nº 70039285457, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 29/10/2010).

Nesse contexto, destacam-se as explanações de Euclides de Oliveira (2010):

No mais, o Conselho rejeitou o pedido de supressão dos artigos da Resolução n. 35 que cuidam da separação consensual por escritura pública, por entender que ‘nem todas as questões encontram-se pacificadas na doutrina e sequer foram versadas na jurisprudência pátria, afirmando: Tem-se que, mesmo com o advento da Emenda nº 66, persistem diferenças entre o divórcio e a separação." Prossegue: No divórcio há maior amplitude de efeitos e conseqüências jurídicas, figurando como forma de extinção definitiva do casamento válido. Por seu turno a separação admite a reconciliação e a manutenção da situação jurídica de casado, como prevê o Código de Processo Civil vigente.’ Embora ressalvando as divergências nas interpretações doutrinárias quanto à supressão do instituto da separação judicial no Brasil, o CNJ ponderou ser razoável que ainda exista a busca por separações, ‘o que incide na vontade do jurisdicionado em respeito às disposições cuja vigência ainda é questionada e objeto de intensos debates pelos construtores do direito pátrio’, concluindo que, por tais razões, não acolhia na integralidade a proposição, assim mantendo os dispositivos da Resolução 35 que cuidam dos atos notariais relacionados especificamente à separação consensual. Enquanto não se alterem as disposições do Código Civil relacionadas à separação judicial, assim como a previsão do art. 1.124-A do Código Civil sobre a separação extrajudicial, e na expectativa de que se desanuvie o panorama tisnado de controvérsias doutrinárias, com a jurisprudência a firmar-se, a conclusão é pela subsistência, si et in quantum, dessa forma de dissolução da sociedade conjugal pela tradicional separação judicial ou extrajudicial, muito embora facultativa e certamente fadada a pouco uso, em face das manifestas vantagens de utilização do divórcio direto para finalizar de vez o casamento em frangalhos.

No time do meio, os esclarecimentos e a posição de Sérgio Gischkow Pereira:

A Constituição Federal não tratava da separação judicial, mas somente do divórcio. A separação judicial apenas foi elidida como exigência para o divórcio, mas permanece no sistema brasileiro, enquanto não revogado o Código Civil. Muitos pensam assim. A Constituição fala que o casamento é dissolvido pelo divórcio; ora, a separação não dissolve casamento, mas sim a sociedade conjugal. Alguns asseveram que ela é inútil. Não é bem assim. Desde que não atrapalhe o divórcio, pode continuar no Código Civil. A verdade é que pode ser o único caminho para aqueles cuja religião não admite o divórcio.

Vejamos com mera leitura da análise efetivada pelo Relator Demóstenes Torres, da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, sobre a proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 28, de 2009 (nº 413, de 2005, na origem), que deu nova redação ao artigo 226 da Constituição Federal, demonstra o desencontro com os entendimentos diversos quanto à inconstitucionalidade na emenda, ou a não revogação das leis infraconstitucionais.

Primeiramente, cabe ressaltar alguns pontos relevantes enfatizados na citada análise, quanto ao Estado e a sociedade:

(...) o Estado atual é bem menos tutelar que o de trinta anos atrás e, quanto à sociedade hodierna, as dúvidas e temores que acometeram diversos segmentos dos anos 70 do século passado estão, hoje, todos dissipados, inclusive o de que, ‘no dia seguinte à aprovação do divórcio, não restaria, no País, um só casamento’. O que se observa é que a sociedade brasileira é madura para decidir a própria vida, e as pessoas não se separam ou divorciam apenas porque existem esses institutos. Portanto, não é a existência do instituto divórcio que desfaz casamento, nem a imposição de prazos ou separações intermediárias que o impedirá. Acrescente-se que a exigência de prazo e a imposição de condição para a realização do divórcio desatendem ao princípio da proporcionalidade, que recomenda não cause a lei ao jurisdicionado ônus impróprio ou desnecessário. Ora, o prazo para a concessão do divórcio não é peremptório, tanto que pode retroagir à data da separação cautelar de corpos, e a condição não é essencial, porquanto a sociedade conjugal pode ser desfeita pelo casal, indiferente ao estado. Logo, as duas variáveis, sem nenhum prejuízo para o disciplinamento do tema, podem ser retiradas da norma, conforme preconiza a proposta de emenda.

Pois bem, não é a existência ou não de institutos jurídicos que farão a conduta social ser modificada, vez que, na atualidade, a realidade é o constante encontro e desencontro de pessoas, com interesses ou não afins, formando e dissolvendo relacionamentos, consoante a vontade dos pares. “O fim do casamento não é fruto da irreflexão, mas epílogo do desgaste continuado ou do erro de escolha do cônjuge, nada servindo prolongar esse sofrimento por imposição do Estado” LOBO, 2010).

Nesse contexto, importante, em cada caso in decisum, o julgador lembrar da teoria da intervenção mínima.[35] Afinal, o objetivo da Emenda em comento é “a de retirar a tutela do Estado sobre a decisão tomada pelo casal” (LOBO, 2010).

Paulo Lobo (2010), como conclusão, ainda assevera que não “se pode esquecer da antiga lição de, na dúvida, prevalecer a interpretação que melhor assegure os efeitos da norma, e não a que os suprima”.

A finalidade da norma é atingir os anseios sociais, bem como, utilizando-se de uma interpretação zetética, cabendo ao aplicador do Direito não restringir direito às partes, ainda mais levando em conta a coisa julgada, o direito adquirido e o ato jurídico perfeito.

Embora seja opinião contrária de alguns[36] a aplicabilidade imediata da Emenda nº 66/2010, as questões pendentes estão paulatinamente sendo resolvidas, sem maiores dissabores.

Deveras, continuar com a aplicação das normas infraconstitucionais em detrimento da Lei Maior seria desrespeitar a atual legislação, retornando ao passado, com a finalidade de persistência do sistema dual existente para a dissolução do vínculo marital.

Consoante afirma Maria Berenice Dias (2010), “talvez seja uma vã tentativa de garantir um nicho de mercado”, considerando a essencialidade de fazer-se representar em Juízo através de causídico, sendo evidente a contratação do profissional da advocacia, a propositura de dois procedimentos judiciais e, consequentemente, a lavratura de duas escrituras.

Nesse sentido, as partes ganharam, vez que com os dois procedimentos pagavam por duas vezes as custas processuais, cartorárias e os honorários advocatícios (VILELA, 2010).

É fato que a permanência, a união do casal, desde à época de Justiniano,[37] depende do afeto, isto é, da vontade dos nubentes em permanecerem juntos e formarem uma família.

Pensando na efetiva aplicabilidade e interpretação da norma mais benéfica, antecipando um pouco as questões pendentes, por lógica, pensando-se no caso das pessoas que possuem o atual estado civil “separado”, resta interessante esclarecer, considerando o disposto no artigo 5º, inciso XXXVI da Constituição Federal,[38] a possibilidade da conversão da separação judicial litigiosa em divórcio, não sendo necessário, as partes, ingressarem com ação de divórcio, propriamente dita, permanecendo vigente, portanto, o artigo 25, da Lei nº 6.515/1977.

De igual forma os casos dos casais que pretendem restabelecer a sociedade conjugal. Vigente, portanto, o artigo 1.577 do Código Civil, por exemplo.

Portanto, vislumbra-se que a Emenda Constitucional em comento não excluiu, consoante afirmam os doutrinadores anteriormente mencionados, a separação judicial do ordenamento jurídico brasileiro, tampouco incluiu um novo instituto. Somente disciplinou diversamente o já existente – o divórcio.

Prescreve a Lei de Introdução ao Código Civil, em seu artigo 2º, § 1º que a lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule a matéria de que tratava a lei anterior.

Pois bem, não houve revogação expressa do instituto da separação. No entanto, cabe ressaltar que tornou-se inapropriada a utilização das leis referentes à antiga forma de extinção do vínculo marital, o qual passava por dupla fase, advindo, o novo procedimento em vigor.

Nesse ponto específico destaca-se a necessidade da integração das formas de interpretação das leis existentes,[39]buscando não somente a intenção do legislador ao dar nova redação ao artigo 266, § 6º da Constituição Federal, mas, consoante já comentado, a necessidade da adequação das normas aos anseios sociais.

Embora exista a defesa pela não ocorrência da revogação das leis infraconstitucionais com o advento da Emenda Constitucional em comento, restaria infrutífero o ajuizamento de ação com a nomenclatura separação judicial, por impossibilidade jurídica do pedido, vez que o casamento se dissolve, atualmente, com o divórcio.


4  DAS QUESTÕES TRANSITÓRIAS

Diante da recente mudança legislativa e constitucional, cabe aos operadores do direito entenderem a sistemática atual para dissolução da sociedade conjugal, com coerente aplicação e observância.

No entanto, deparamo-nos com várias situações pendentes e que, pelas peculiaridades existentes, geram dúvida na prática forense.

Não somente quanto a aceitação e atual aplicação da lei pelos magistrados, como também os entendimento que os tribunais tem dado a diversas questões pendentes, tantos nos feitos em andamento como, também, quanto a conversão da separação judicial já decretada em divórcio.

Nesse sentido, algumas ponderações e análises serão efetivadas nos itens subseqüentes, sem questionamentos ou comentários em relação a existência ou inexistência da culpa, indenização, prestação alimentícia, entre outros temas importantes que necessitariam de outros tantos artigos para cada um dos temas elencados.

4.1  Dos processos de separação judicial em andamento

A realidade atual existente, evidencia vários processos em trâmite no poder judiciário brasileiro, tendo como contenda a separação judicial entre casais que manifestam a incompatibilidade de gênios, a desarmonia conjugal, ou outras nomenclaturas que aqui poderiam serem esposadas, a fim de desmistificar a única razão para o ajuizamento de ações da citada natureza: o desejo de não mais conviverem e coabitarem.[40]

Dentro desta sistemática, vislumbra-se que, na maioria dos casos e processos em andamentos, com as exceções existentes tão somente quanto ao desejo ou não pela separação conjugal, a maior parte dos processados ainda continuam tramitando, haja vista a discordância quanto a partilha de bens, guarda de filhos, visitas e alimentos em prol de filhos menores.

Resta clara a nova redação do § 6º do artigo 226 da Constituição Federal quanto à única possibilidade, na atualidade, para a dissolução do vínculo marital, que se dá com a decretação judicial ou administrativa do divórcio.

Nesse contexto, importa destacar que tais processos deverão ser adaptados, a fim de atingir o objetivo, sob pena de extinção do feito.

Sob tal adaptação, várias são as opiniões dos estudiosos do direito, quanto à conversão automática pelo Juízo ou a necessidade do pedido ser formulado pelas partes, consoante abaixo se transcreverá:

Com todo respeito à divergência doutrinária, entendemos que, com a supressão do instituto da separação judicial, atentando-se para a intenção do legislador em unificar no divórcio todas as hipóteses de separação dos cônjuges, sejam litigiosas ou consensuais, bem como a dos interessados, (entendendo-se aqui filhos e todos e tudo o mais envolvidos e atingidos em uma separação) estando claro e notório que o que se almejava quando da separação era atingir o divórcio (só que a legislação anterior não o permitia diretamente), os artigos regulamentadores da separação consensual devem ser considerados para o divórcio; ou seja, os feitos em andamento devem ser automaticamente convertidos em divórcio (SANT’ANNA, 2010).

Fundamenta-se a idéia, ainda, considerando o que segue:

Se a intenção do legislador é SIMPLIFICAR, concedendo diretamente e sem prazo algo que para ser atingido era necessário ultrapassar obstáculo, se essa ‘pedra’ foi retirada, e estamos pensando em economia processual; o bom senso deve prevalecer: o juiz deve determinar a conversão da ação de separação em ação de divórcio. Caso as partes interessadas não aceite, aí sim o feito deverá ser extinto sem julgamento de mérito (SANT’ANA, 2010).

Maria Berenice Dias (2010, p. 130) sustenta tal opinião:

Não há necessidade de a alteração ser requerida pelas partes, que nem precisam proceder á adequação do pedido. Cabe ao juiz dar-lhes ciência da alteração legal, deferindo um prazo para se manifestarem caso discordem do decreto do divórcio. Se os cônjuges silenciarem, tal significará concordância com a decretação do divórcio. A discordância de uma das partes – seja do autor, seja do réu – não impede a dissolução do casamento. Somente na hipótese de haver expressa oposição de ambos os separandos à concessão do divórcio deve ser decretada a extinção do processo por impossibilidade jurídica do pedido, pois não há como o juiz proferir sentença chancelando direito não mais previsto em lei.

Destarte, parece-nos estranho o fato do Juiz, subjetivamente, converter a ação de separação em divórcio, sem manifestação das partes, ainda mais se litigiosa a ação, haja vista que, se consensual, certamente, as partes, no intuito de dissolver o vínculo marital sem delongas, preferirão tal procedimento.

Nesse sentido, aparecem entendimentos contrários ao anteriormente reproduzido.

Newton Teixeira Carvalho (Juiz de Direito da 1ª Vara de família em Belo Horizonte (...) deixou as seguintes sugestões: com relação às separações em andamento, o juiz ou o Tribunal deverá facultar às partes, no prazo de 10 (dez) dias, requerer, nos próprios autos, a conversão da separação em divórcio, inclusive se já prolatada sentença, porém sem o trânsito em julgado. Caso não modificado o pedido, de separação para divórcio, os autos deverão ser extintos, por impossibilidade jurídica do pedido. Não há que se falar em direito adquirido contra a Constituição federal, mesmo em se tratando de Emenda Constitucional. Evidentemente que, se existirem pedidos cumulados, a ação prosseguirá, normalmente, com relação aos pedidos remanescentes e independentes, como por exemplo, alimentos, guarda, etc.; no que tange às separações já decretadas, com sentença transitada em julgado, a qualquer momento o divórcio poderá ser pleiteado, em apenso. Enquanto não pleiteado o divórcio, o estado destas pessoas continua como de separado; caso, a partir de hoje, haja pedido de separação, os autos deverão, de plano, ser extintos, por impossibilidade jurídica do pedido, eis que não mais há separação no direito brasileiro (SANT’ANNA, 2010).

No mesmo sentido, quanto a necessidade das partes formularem o pedido de conversão da ação de separação judicial para divórcio, as fundamentações de ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS[41]:

Há vozes a sustentar que, com a extinção da separação judicial, os processos que tenham esse objetivo devam ser igualmente extintos, por perda superveniente do seu objeto (art. 267, inciso VI, do CPC). Todavia, o princípio da razoabilidade permite ao juiz condutor do feito que conceda às partes (no procedimento litigioso) ou aos interessados (no procedimento de jurisdição voluntária) prazo para que adaptem seu pedido, postulando o divórcio no lugar da separação. Nesse caso, não seria jurídico impor às partes a restrição de inovação do pedido no curso do processo, em eventual desrespeito ao princípio da boa-fé objetiva. Cuida-se, a rigor, de supressão da base normativa que conferia sustentação jurídica ao pedido formulado, sendo desnecessário adaptar o pedido à nova ordem jurídico-constitucional a fim de que se dê ao processo máxima efetividade (SANT’ ANNA, 2010, p. 34).

Acrescenta o Excelentíssimo Desembargador, solucionando pela extinção do processo em caso de não adaptação do pedido de conversão da ação, pelas partes, com fulcro no artigo 267, inciso VI, do Código de Processo Civil), discorrendo, ainda, sobre a não possibilidade da conversão automática:

(...) Destaque-se que não é possível ‘dar por adaptado’ o pedido, automaticamente, porque quem formula o pedido é a parte, cabendo ao Juiz, apenas, aferir a relação de compatibilidade entre o pedido formulado e o ordenamento jurídico. A Constituição, ao suprimir o instituto da separação judicial, não disse estarem automaticamente convertidos em divórcio os pedidos de separação judicial feitos antes de a EC nº 66/2010 entrar em vigor, nem há permissão, no sistema processual civil, para uma tal ‘conversão automática’, que possa eventualmente ocorrer à revelia da vontade das partes (SANT’ ANNA, 2010, p. 34).

Maria Berenice Dias (2010, p. 130) entende que todos os processos de separação judicial em tramite perderam o objeto por impossibilidade jurídica do pedido, ocorrendo a superveniência de fato extintivo ao direito objeto da ação, devendo, portanto, ser reconhecido de ofício, pelo julgador, na forma do artigo 462, do Código de Processo Civil.

(...) no momento em que o instituto deixou de existir, em vez de extinguir o processo de separação deve o juiz transformá-lo em ação de divórcio. Eventualmente cabe continuar sendo objeto de discussão as demandas cumuladas, como alimentos, partilha de bens, etc. mas o divórcio deve ser decretado de imediato. Como o fundamento do pedido não cabe mais ser questionado, deixa de ser necessária qualquer dilação probatória. Nem sequer os aspectos patrimoniais carecem de definição, eis ser possível a concessão do divórcio sem partilha de bens (CC. 1.581) (DIAS, 2010, p. 130).

O procedimento exposto pela doutrinadora é menos burocrático, haja vista uma mera intimação para manifestação quanto a concordância ou não das partes quanto a conversão do feito para divórcio.

Sendo assim, independente de alguns doutrinadores entenderem como intimação para manifestação, ou mesmo emenda à inicial com conseqüente adequação do feito à nova sistemática para dissolução do vínculo conjugal em vigor, necessário o silêncio ou a concordância para que os feitos em tramite tenham legal e normal prosseguimento.

4.2  Possibilidade da conversão da ação de separação judicial em divórcio

Discussões pendem sobre a possibilidade da conversão da separação judicial em divórcio, haja vista a existência do estado civil “separado”, uma vez que fora decretada judicialmente a primeira ação acima em comento. Para alguns é possível a conversão, para outros não, consoante segue:

O pedido de divórcio por conversão deixou de existir. Dessa forma, dever-se-á apenas requerer o divórcio (judicial ou extrajudicialmente), fazendo reproduzir, se assim o desejarem, todas as condições estipuladas ou decididas na separação judicial. Esclarece-se a expressão ‘ se assim o desejarem’ diante do entendimento do Supremo tribunal Federal de que não existe direito adquirido a instituto jurídico (como o caso da separação judicial). Assim, as condições ajustadas ou decididas não são imutáveis, podendo os cônjuges colocar em discussão os pontos anteriormente acordados ou decididos, quando do divórcio, para decisão judicial, que pode ser diferente da que vinham adotando (SANT’ANNA, 2010, p. 48/49).

Maria Berenice Dias entende que desapareceu a possibilidade da conversão da separação judicial em divórcio, conjuntamente com o instituto.[42]

De forma diversa entende Rodrigo da Cunha Pereira (2010), apresentando entendimento favorável à conversão da separação em divórcio:

(...) Caso queiram transformá-lo em estado civil de divorciado, poderão, excepcionalmente, converter tal separação em divórcio ou simplesmente propor ação de divórcio, o que na prática tem o mesmo resultado. São exceções, necessárias e justificáveis, para compatibilizar com o respeito aos princípios constitucionais da coisa julgada e o ato jurídico perfeito.

Ainda,

(...) O novo texto constitucional, além de acabar com todo e qualquer prazo para o divórcio, pelas razões aqui já expostas, tornou a separação judicial e as regras que a regiam incompatíveis com o sistema jurídico. Entretanto, há quatro situações transitórias que devem ser consideradas em relação à situação daqueles que já estavam separados judicialmente (ou administrativamente) na data da entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 66/2010: se continua existindo o estado civil de "separado judicialmente"/ administrativamente; se eles ainda podem converter a separação em divórcio; se poderiam restabelecer o casamento; e se os processos judiciais ou administrativos de separação poderão continuar tramitando para se alcançar o seu objetivo proposto.(16) O estado civil daqueles que já eram separados judicialmente continua sendo o mesmo, pois não é possível simplesmente transformá-los em divorciados. Portanto, o estado civil ‘separado judicialmente administrativamente’ continua existindo para aqueles que já o detinham quando o novo texto constitucional entrou em vigor. É uma situação transitória, pois, com o passar do tempo, naturalmente, deixará de existir.

Fato que causou estranheza, foi a decisão exarada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul sobre o tema, entendendo estar em vigor o artigo 1.580, do Código Civil:

APELAÇÃO CÍVEL. SEPARAÇÃO JUDICIAL. PEDIDO DE CONVERSÃO EM DIVORCIO. IMPOSSIBILIDADE. EMENDA CONSTITUCIONAL 66/2010. NOVA REDAÇÃO AO § 6º do art. 226 da Constituição Federal. vigência da LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL (ART. 1.580 DO CÓDIGO CIVIL). REQUISITOS PRESERVADOS, POR ORA. 1. A aprovação da Emenda Constitucional nº 66/2010, ao dar nova redação ao § 6º do art. 226 da Constituição Federal, que dispõe sobre a dissolubilidade do casamento civil pelo divórcio, efetivamente suprimiu, do texto constitucional, o requisito de prévia separação judicial por mais de 1 (um) ano ou de comprovada separação de fato por mais de 2 (dois) anos . 2. Não houve, porém, automática revogação da legislação infraconstitucional que regulamenta a matéria. Para que isso ocorra, indispensável seja modificado o Código Civil, que, por ora, preserva em pleno vigor os dispositivos atinentes à separação judicial e ao divórcio. Inteligência do art. 2º, § 1º, da Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei nº 4.657/42).[43]

Destarte, apesar do entendimento acima vislumbrado, cabe ressaltar os fundamentos anteriormente esboçados, não somente quanto a revogação ou não da lei infraconstitucional, mas quanto a aplicação da lei mais benéfica as partes.

Nesse contexto, importante frisar a possibilidade das partes poderem ingressar com o pedido de divórcio como com o efetivo pedido de conversão da separação em divórcio, não havendo óbice para tanto, vez que o fim pretendido pelas partes é a dissolução do vínculo conjugal, independentemente da forma procedimental que será efetivada.

Cabe questionar se não seria uma vedação de acesso à Justiça, haja vista que o pedido formulado pelas partes do caso em análise não é impossível juridicamente.

Deveras, fora a única manifestação jurisprudencial encontrada no sentido contrário a conversão.

4.3  Do restabelecimento da sociedade marital

Quanto ao restabelecimento da sociedade conjugal, vislumbra-se não haver muitas discussões sobre o assento, tanto que poderá ser requerida pelas partes, considerando a separação judicial já decretada, através de simples petição encaminhada ao Juiz, na forma do artigo 1.577 do Código Civil atualmente em, vigor.[44]

No entanto, tratando-se de uma possível reconciliação na vida real, após a decretação do divórcio, a única possibilidade das partes é um novo casamento, vez que o restabelecimento da sociedade marital é possível, apenas quando há a decretação da separação e não do divórcio.

4.4 Da existência do estado civil de separado

Consoante afirma Maria Berenice Dias “o estado civil é um atributo da personalidade. A identificação do estado civil – que inclusive integra a qualificação da pessoa – tem significado tanto de ordem pessoa como social e patrimonial” (DIAS, 2010, p. 58).

Assim, o casamento é o ponto de referencia para a distinção entre o estado civil solteiro e o estado civil casado.

Há poucas diferenças neste sentido, no entanto, consoante afirma Rodrigo da Cunha Pereira (2010) “se o cônjuge separado judicialmente morre, o estado civil do sobrevivo é viúvo, ao passo que o divorciado continua sendo divorciado (...)”.

No mesmo sentido,

O estado civil daqueles que já eram separados judicialmente continua sendo o mesmo, pois não é possível simplesmente transformá-los em divorciados. Portanto, o estado civil ‘separado judicialmente administrativamente’ continua existindo para aqueles que já o detinham quando o novo texto constitucional entrou em vigor. È uma situação transitória, pois, com o passar do tempo, naturalmente, deixará de existir (PEREIRA, 2010, p. 13).

Deveras o citado estado civil tende a desaparecer com o desenrolar dos feitos em andamento, mas, momentaneamente continua em vigor e, havendo a morte de um dos cônjuges, ocorre a liberação do outro para novo casamento.


5  CONCLUSÕES

Vislumbra-se que a citada Emenda Constitucional em vigor que alterou a sistemática para a dissolução do vínculo marital, embora esperada por muitos e criticada por outros, foi tema de grandes discussões no campo social, político e religioso, gerando, ainda, algumas decisões surpreendentes.

Não bastasse o conformismo e/ou inconformismo gerados com a aprovação da citada Emenda Constitucional, destaca-se que é norma notória e sem qualquer possibilidade de retroagir.

Num primeiro momento, surgiram muitas dúvidas e questões a serem decididas. Fato é que os operadores do direito colocaram em prática a atual norma para dissolução do casamento, passando da indissolubilidade do casamento para o atual procedimento que permite casar e divorciar-se no mesmo dia.

Quanto aos processos em trâmite resta apenas uma solução, serão extintos por impossibilidade jurídica do pedido, na forma do artigo 267, inciso VI, do Código de Processo Civil, perdendo-se anos de tramite processual, instruções e atos processuais já realizados; se as partes não concordarem com a conversão da ação para divórcio.

Ainda, considerando na atualidade a inexistência dos prazos para concessão do divórcio direto ou para a conversão da separação judicial em divórcio, cabe as partes ingressar em Juízo, querendo a dissolução do vínculo marital através do divórcio.

Vislumbra-se, portanto, que a antiga norma prevista no ordenamento jurídico brasileiro, transformava as partes de um litígio ou da ação consensual em espectadores, ansiosos pela passagem temporal necessária para a dissolução de qualquer vínculo, mesmo que jurídico ainda existente, a fim de regularizar, porventura, novo estado civil que já se encontravam desfrutando, em face da constituição de nova família.

Quanto a conversão da separação judicial em divórcio, embora a surpreendente decisão em contrário do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, consoante acima destacada, ao menos em nosso Estado, através das pesquisas efetivadas junto ao Cartório da Vara da Família e Registros Públicos  de nossa Comarca, Cascavel – PR, vislumbra-se que estão sendo decretadas por sentença, sem observância do lapso temporal exigido na lei infraconstitucional.

Destarte, embora não fosse pugnado pela conversão, poderia as partes socorrer-se ao divórcio, com a finalidade de dissolução do citado vínculo em comento.

O estado civil de separado ainda perdura, tendendo a desaparecer ao passo que as ações em andamento forem sendo julgadas. Quando ao restabelecimento da sociedade marital, se ainda não decretado o divórcio, pode se efetivar através de petição dirigida ao Juiz competente para apreciação do pedido.

Ao contrário do mundo das idéias, conclusões subjetivas e rigorismos sociológicos, religiosos, filosóficos, políticos, necessário se faz a adequação das normas jurídicas existentes, com base nos anseios da sociedade em que se vive.

Buscam-se leis para soluções dos mais variados problemas fatídicos existentes. Nesse contexto, não podemos esquecer da transformação social das várias nomenclaturas familiares existentes na atualidade.

Conforme expõe Rodrigo da Cunha Pereira, “para estas possíveis resistências, basta lembrar os mais elementares preceitos que sustentam a ciência jurídica: a interpretação da norma deve estar contextualizada, inclusive historicamente” (DIAS, 2009) Destarte, não há solução diferente.

Foi possível observar através deste trabalho, que a presente modificação em comento do ordenamento jurídico pátrio foi a pontinha do iceberg para as futuras transformações legislativas pretendidas, ao menos, pelo Instituto Brasileiro de Direito de Família, vez que através das análises efetivadas por inúmeros estudiosos do direito, foi possível a elaboração de um único estatuto sobre o direito em comento, denominado Estatuto das Famílias, com a finalidade de reunir em um único livro todas as diretrizes legislativas afetas ao direito das famílias, sucessões, crianças e adolescentes, reconhecimento da união homoafeativa.[45] Mas, estes são tópicos interesses para outras pesquisas.


REFERÊNCIAS

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Notas

[1]“O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio”.

[2] Cristiano Chaves de Farias e Fernanda Carvalho Leão Barreto, mencionando Cristiano Chaves de Farias em A separação judicial à luz do garantismo constitucional, p. 145 e ss., mencionam: “A referida proposta tem como iluminado farol a necessidade de que a Constituição Federal reflita, de modo uníssono, o princípio que ela mesma elegeu para pautar o término do casamento: a facilitação do seu desfazimento. A possibilidade de que um dos membros do casal possa, no momento da falência do projeto afetivo, recorrer ao Judiciário para obter um pronunciamento sobre quem foi o culpado pelo insucesso do casamento soa ultrapassada e ofensiva a valores que a própria Lex Legum elegeu como fundamentais” (FARIAS, 2008, p. 134).

[3] Baseado no casamento romano, Eduardo de Oliveira Leite (1991), citando Pietro de Francisci (Sintesis Histórica del Derecho Romano, p. 458) afirma que “a base da família natural fica sendo o casamento, ou, segundo o direito romano, ‘a convivência do homem e da mulher com a intenção de ser esposo e esposa, de ter filhos e constituir uma sociedade íntima e perpétua’ (...)”.

[4] “O fim do instituto da separação insere-se em perspectiva humanista, apresentando-se como solução mais justa, eficaz e adequada ao objeto que pretende tutelar, que é a liberdade de autodeterminação, possibilitando a cada pessoa humana ir-se, quando o amor acaba, porque, como resumiu o poeta de Itabira ‘o primeiro amor passou, o segundo amor passou, o terceiro amor passou, mas o coração continua’” (FARIAS, 2008, p. 135).

[5] “(...) é o meio voluntário de dissolução do casamento (...)” (LÔBO, 2010, p. 154).

[6] “As outras possíveis argumentações são apenas de ordem moral e religiosa. Deve-se respeitar a religião, a crença e as convicções morais. Elas mais que fazem sentido, dão sentido á vida, ajudam a colocar limites, direcionam valores, alimentam esperanças e fé. Entretanto, não podemos misturar Direito com valores morais particulares e religiosos. A história do Direito de Família já nos mostrou todas as injustiças provocadas por esses valores, tais como a exclusão de determinadas categorias do laço social, ilegitimando filhos, famílias, em nome de uma moral sexual civilizatória. Não podemos continuar repetindo essas injustiças. E é por isso que os argumentos de ordem moral/religiosa não podem prescrever as regras jurídicas”. (PEREIRA, 2010, p. 09).

[7] Se os processos serão extintos ou não; se poderão ser convertidos para divórcio; se há possibilidade de converter a separação judicial já decretada em divórcio; o estado civil separado ainda existe, há questões que obstam a decretação do divórcio, entre outros.

[8] “Basicamente existem três tipos de legislação familiar. ‘O primeiro é o Direito natural, baseado no modelo europeu. O segundo é o Direito Consuetudinário. O terceiro é o Direito Canônico. Em alguns países, existem sistemas legislativos paralelos. Por exemplo, na malásia, os mulçumanos obedecem à lei islâmica, alguns grupos indígenas ao Direito Consuetudinário e a população em geral é governada segundo princípios legislativos derivados do Direito natural Inglês. (...) Quando o casamento está sob a alçada de um regime de Direito Consuetudinário, pode ser dissolvido, embora se desencoraje essa solução. É um assunto que diz respeito às famílias do casal, que farão à primeira tentativa de mediação. Costuma ser este o caso, nos sistemas em que a família da esposa terá que devolver a quantia paga pelo marido, caso o casamento se dissolva. As repetidas agressões do marido são aceitas como justa causa de dissolução, embora esta seja desencorajada, de um casamento sob o Direito Consuetudinário. Sempre que se trate de ligeiras agressões físicas ou emocionais, pode dar-se o caso de a dissolução não ser permitida. Nas jurisdições em que o casamento está sob a alçada do Direito Canônico, é permitido à mulher que sofreu actos de violência divorciar-se. Contudo, a situação não é a mesma sob o Direito Canônico Católico Romano, que proíbe o divórcio, embora permita a separação legal’. O regime brasileiro insere-se, ao terceiro regime, o do Direito Canônico Católico Romano, com algumas atenuações, pois o nosso regime permite o Divórcio e a separação legal com requisitos que extrapolam, unicamente à vontade dos cônjuges” (AGLANTZAKIS, 2009, p. 316/317).

[9] “(...) Durante muito tempo, a Igreja manteve o monopólio dessa jurisdição matrimonial. O casamento era exclusivamente reputado a um sacramento, acepção usual decorrente de um conjunto de leis e regras do Direito Canônico. No Código Canônico, o casamento pode ser tomado por um contrato, que, permitido para ungir as relações entre o homem e a mulher sob as bênçãos da admissibilidade carnal, pelas leis da Igreja é elevado à condição de sacramento. Essa é a concepção que fundou o monopólio da Igreja nessa questão e que a levou historicamente a chancelar as relações e a julgar as causas matrimoniais. O começo da idade Moderna manifesta a separação do poder da Igreja e o Estado. Repercute, mais tarde, no Brasil, quando, em 1890, o governo republicano, com a primeira Constituição, a de 1891, o estado assume o monopólio da celebração e da jurisdição matrimonial. Na proclamação formal da república no Brasil, o primeiro governo anunciava a separação entre a Igreja e o estado, Disposição de índole penal confirmatória dessa intenção: o ministro religioso que celebrasse casamento era punido. Alteração se dá com a Constituição federal de 1934, quando se instaura o regime da unidade pelo qual o casamento é civil, admitindo as formas do civil propriamente dito e do religioso com efeitos civis. As Constituições posteriores repetiram. A Lei n. 1.110 regulamentou o procedimento através do qual se realizava o casamento religioso para ter os efeitos civis, tendo perdurado até 1976 quando entra em vigor a Lei de registros Públicos promulgada em 1973. disciplina renovada, mas na essência esse aspecto estrutural não se alterou. Mais recentemente, a Constituição federal de 1988, através do artigo 226, §§ 1º e 2º, manteve essa dicotomia de formas e unidade de tipo em matéria matrimonial” (FACHIN, 2009, p. 337/338).

[10] Decreto nº 180 de 24 de janeiro e 1891.

[11] Lei nº 4.121 de 27 de agosto de 1962.

[12] Lei nº 6.515 de 26 de dezembro de 1977.

[13] Constituição Federal de 1988.

[14] Constituição de 1967, artigo 175, § 1º. O casamento é indissolúvel. Alterado pela Emenda Constitucional nº 9, de 1977: § 1º. O casamento somente poderá ser dissolvido, nos casos expressos em lei, desde que haja prévia separação judicial por mais de três anos.

[15] Constituição Federal de 1988.

[16] “(...) a regra do art. 1.574 do CC, pela qual os cônjuges só poderiam se valer da separação consensual após um ano de casamento, era adequada ao sistema constitucional que se valia de prazos (necessários ao divorcio) como forma de exigir uma reflexão dos cônjuges e evitar um fim precipitado e impensado do casamento” (SIMÃO, 2010).

[17] “Isso exigia que, após a separação, e eventualmente superadas possíveis dramas e traumas próprios do fim de um relacionamento, o casal se visse obrigado a se reencontrar para que fosse possível transformar o casamento em divórcio, reavivando, desnecessariamente, sofrimentos que já tinham sido vencidos” (ASSIS, 2010).

[18] “É evidente a dificuldade conceitual existente em compreender, com precisão, o caráter dualista do sistema de dissolução matrimonial. Não há justificativa lógica em terminar e não dissolver um casamento. Escapa à razoabilidade e viola a própria operalidade do sistema jurídico” (PEREIRA, 2010, p. 08).

[19] Parecer da Comissão Especial quando da análise da PEC 413/05 e 33/07, ministrado na Câmara dos Deputados, Diário da Câmara dos Deputados, quinta-feira, 29.11.07.

[20] “(...) algunos países exigem um prévio periodo de separación de hecho, caso de seis meses em Áustria, seis meses o um año según El caso em Dinamarca, cinco años em Chipre, dos años em Bélgica y 4 años em Irlanda por citar algunos ejemplos. La causa consistente em la apreciacón de uma ruptura irreparable Del matrimonio, aun em ausência de culpa em algunos casos, existe como Polônia, Eslováquia, Eslovênia, Holanda y Reino Unido, y existe em otros países junto a otras causas. El divorcio basado em la culpa como causa se regula em Bélgica, Francia, Luxemburgo, Áustria, Portugal, Dinamarca, Cipre y Lituânia” (MANRIQUE, 2009, p. 487).

[21] “(...) em Suécia y em Finlandia no existe ni separación ni nulidad, y solo se conoce El divorcio como forma de sissolución Del vínculo matrimonial. Em Finlândia desde 1987, la ley finlandesa se basa em El principio Del divorcio a demanda em El que cada esposo tiene derecho a obtener El divorcio sobre la base de uma petición ya individual o ya de los dos esposos y em Suécia la procedência Del divorcio ES igualmente Independiente de si los esposos están o no de acuerdo em El divorcio. Em Suécia y Finlândia no se requiere causa alguna para obtener el divorcio (...)” (MANRIQUE, 2009, p. 487/488).

[22] “Lo cierto, es que hay grandes diferencias todavia entre lãs legislações de los países miembros em esta matéria, donde la regulación de diferentes causas de divórcio va desde la admisión del divorcio por mutuo consentimento, passando por la admision del divorcio solo em casos de constatación de ruptura irrecuperable del matrimonio, hasta sistemas basados em el divórcio sanción, em la prévia separación de hecho y sistemas como el sueco, finlandês y español actual, que no requieren la concurrencia de causa alguma” (MANRIQUE, 2009, p. 487). Ainda, cita Inácio de Carvalho Neto (2007, p. 78), que não há previsão de prévia separação para a decretação do divórcio na Espanha.

[23] “Divorce in Italy may be obtained on one of the following grounds: After the court has approved consensual separation; after judicial separation; when one spouse has been sentenced for certain criminal offenses; when one spouse is a foreign citizen and has obtained a divorce or has married again abroad; or when the marriage has not been consummated”. “If the divorce is based on separation, it may only be obtained after three years of continuous separation beginning on the date the spouses appeared before the court in the proceedings for legal separation”. (Se o divórcio é baseada na separação, ela só pode ser obtido após três anos de separação contínua, a partir da data que casal compareceu perante o tribunal no processo de separação judicial). Disponível em  http://www.international-divorce.com/d-italy.htm. Ainda, na Itália a matéria está disciplina na Lei 898, de 1º de dezembro de 1970, modificada pela Lei 74, de 06 de março de 1987, enquanto a separação consta nos artigos 150 a 158 do Código Civil de 1942.

[24] “Em el ámbito de La Unión europea, se permite El divorcio salvo em malta (que sin embargo reconece las sentencias de divorcio pronunciadas por los órganos jurisdiccionales competentes de otros países), y existe uma tendência evidente em lãs situaciones de crisis familiar a dar mayor papel AL mutuo acuerdo o AL consentimento frente a los sistemas de divorcio culpa o sanción, siendo El caso de La recinte reforma francesa muy significativo em esta tendência, unto AL de La reforma española” (MANRIQUE, 2009, p. 487)

[25] “Art. 216. El divorcio vincular podrá decretarse por conversión de la sentencia firme de separación personal, em los plazoz y formas estabelecidos em El art. 238”.

[26] Lei nº 3.245, de 26 de outubro de 1907, artigo 148.

[27] Idem.

[28] Lei nº 4.802, de 9 de setembro de 1913, artigo 187 do Código Civil.

[29] Artigo 1.784 do Código Civil lusitano.

[30] BGB (Burgerliches Gesetzbuch (Código Civil), § 1564 [Schidung durch Urteil] Eine ehe kann nur gerichtliches urteil auf Antrag eins oder beider ehegatten geschieden warden. Die ehe ist mit der rechtskraft des urteils aufgelost. Die Voraussetzungen, unter denen die scheidung begehrt warden kann, ergeben sich aus den folgenden vorschriften (“[Divórcio por meio de sentença] o casamento somente pode ser dissolvido por sentença judicial, mediante requerimento de um dos cônjuges ou ambos. O casamento fica dissolvido quando a sentença tiver transitado em julgado. As condições nas quais o divórcio pode ser requerido decorrem do dispositivo seguir”) (NETO, 2007, p. 54.

[31] “Debe concluirse que tal reconocimiento impone legislar de manera que se permita y facilite la disolición del vínculo familiar cuando no exista ni afecto ni voluntad de viver em común” (p. 492).

[32] “A inovação constitucional, facilitadora do divórcio, reveste-se de eficácia imediata, pelo seu claro teor dispositivo, caso típico de autoexecutoriedade da norma. Enseja, assim, pronto cumprimento, em sobreposição às regras da legislação ordinária, que previam um escalonamento da prévia separação judicial ou da separação de fato por determinado tempo, como uma espécie de trampolim para a definitiva concessão do divórcio” (OLIVEIRA, 2010).

[33] DJ 21.11.1997.

[34] “As consideráveis opiniões divergentes que sustentam a permanência da anacrônica separação judicial, aplicando-se a legislação infraconstitucional, com todo respeito aos autores, não se sustentam diante da interpretação histórica e lógico-sistemática já demonstrada. O conceituado Luiz Felipe Brasil Santos, desembargador do TJRS, alerta que qualquer norma será formalmente constitucional pelo só fato de ser inserida na Constituição Federal, mas nem todas serão materialmente constitucionais. Ressalta que muitas regras não precisariam constar na Constituição, sendo nela inserida por simples conveniência do legislador, tratando-se de leis travestidas de Constituição ou normas constitucionais meramente formais. Ressalta que é esse exatamente o caso do texto modificado pela EC nº 66/2010, que mantinha como condição para o divórcio a existência de prévia separação judicial, um dispositivo de segurança inserido para atender as correntes conservadoras. Conclui que a eliminação das referências aos requisitos para a obtenção do divórcio na EC nº 66/2010 não eliminou aquelas condicionantes previstas na legislação ordinária, que não deixaram de ser constitucional, vigorando até serem modificadas.[4]” (CARVALHO, 2010).

[35]“Em sua nova e moderna perspectiva, o direito de família, segundo o princípio da intervenção mínima, desapega-se de amarras anacrônicas do passado, para cunhar um sistema aberto e inclusivo, facilitador do reconhecimento de outras formas de arranjo familiar. O princípio da intervenção mínima do Estado na vida privada, e melhor ainda, nas relações familiares, aliado ao da Deterioração factual, servirão de base para a aplicação do Direito, em se tratando de dissolução do matrimônio” (GAGLIANO, 2010).

[36] Daniel André Kohler berthold. O divórcio ficou mais rápido?; Gilberto Schafer, A Emenda Constitucional nº 66 e o divórcio no Brasil.

[37] “O que caracteriza essencialmente o casamento é o affectus ou affectio maritalis, isto é, ‘a vontade do marido de tratar uma mulher com a dignidade de esposa, de a elevar a seu nível e de a associar a todos os seus destinos’ (Apud P. Namur. Cours d’institutes ET Historie Du Droit Romain, p. 89)” (LEITE, 1991, p. 58).

[38] “A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.

[39] Gramatical, lógica, a teleológica, declarativa, extensiva, restritiva, entre outras.

[40] “As estruturas familiares frágeis constroem-se apoiadas exclusivamente nos afetos. Eis o drama de tantas uniões: não se pode cobrar dos afetos mais do que eles podem dar. Eles não trazem para a relação a força necessária para manter a adesão de um homem ao amor de uma mulher, sobretudo nos tempos que correm. Os afetos variam com o passar dos anos. Na sociedade hedonista, com oferta de milhares de estímulos, é mais difícil ainda. O individualismo faz que sequer se respeitem os casados: quando uma pessoa sente atração por outra, desconsidera o estado civil de quem atrai, pouco se importando se prejudicará ou não uma família. O número crescente de divórcios manifesta o individualismo das gerações recém-casadas e descasadas, que muitas vezes padecem de imaturidade afetiva e egoísmo: quando os afetos dominam sobre a capacidade de comprometer-se por amor, a pessoa vê-se, de fato, tolhida de ser melhor” (JUNIOR, 2009, p. 70).

[41] Desembargador do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios.

[42] “Não persiste a exigência temporal de um ano para tal ocorrer. Agora os separados judicialmente ou separados de corpos, por decisão judicial ou extrajudicialmente, podem pedir o divórcio, não havendo necessidade do implemento de prazo” (DIAS, 2010, p. 116).

[43] (http://www.patriotaecoutinho.adv.br/?p=125). Segue parte do voto do Excelentíssimo Desembargador: “(...) Ora, com a maior reverência a respeitáveis (embora, a meu sentir, apressadas) opiniões em contrário, no caso não se flagra manifesta incompatibilidade entre a atual redação do § 6º do art. 226 da Constituição Federal e o Código Civil, na parte que disciplina os requisitos para obtenção do divórcio e da separação (judicial e extrajudicial). Isso porque a nova regra constitucional limita-se a declarar (simplesmente repetindo, aliás, o que já constava no § 1º do art. 1.571 do Código Civil) que ‘o casamento pode ser dissolvido pelo divórcio’, nada dispondo quanto à dispensa, ou não, de qualquer outro requisito. Isso não impede, por evidente, que a lei ordinária estabeleça os requisitos para a obtenção do divórcio! Não há, para usar a feliz expressão de Espínola, qualquer ‘impossibilidade de aplicar, contemporaneamente, a uma relação jurídica, a lei antiga e a nova’. Diferente seria se o § 6º do art. 226 da CF contivesse a seguinte redação (ou assemelhada): Art. 226. (…) (…) § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, independentemente de qualquer requisito. Por fim, aqueles que sustentam ter sido revogada, no ponto, a legislação infraconstitucional trazem o argumento da “vontade do legislador”, que seria, como se vê na Exposição de Motivos do Projeto que deu origem à EC 66, direcionada à extinção dos requisitos temporais do divórcio e à abolição da figura da separação judicial. Embora reconheça ter sido essa, com efeito, a intenção dos autores do Projeto, é preciso ter presente que o critério exclusivamente subjetivista de interpretação (mormente quando não encontra respaldo na linguagem da norma, como no caso) representa fator de insegurança jurídica. Como assinala, com ênfase, Adelino Augusto Pinheiro Pires: Falar, no entanto, em interpretação conforme a vontade da norma, quando uma norma constitucional não tem desígnio em si mesma, é um disparate, convenhamos. Falar, então, em interpretar a norma constitucional segundo a vontade do legislador, mostra-se com mais razão um contrassenso. A norma constitucional diz o que quer dizer; quanto ao que não quer dizer, se cala (“lex quod volet dixit; quod non volet tacet”). (SEM GRIFO NO ORIGINAL). (...) Em conclusão – embora admita que a linha de pensamento que sustento representa uma visão “politicamente incorreta”, em um tempo em que a versão midiática, até do direito, tende a preponderar – penso que, por não haver qualquer incompatibilidade entre o novo texto do § 6º do art. 226 da Constituição Federal e os dispositivos correspondentes do Código Civil, estes últimos subsistem em sua inteireza, até que sejam objeto de modificação por lei específica. Fique claro, porém, que esta opinião não significa que me posicione ideologicamente contrário à evolução que se pretendeu com a Emenda Constitucional em foco, mas apenas que não aceito – só por ser favorável à tese – que sejam atropeladas regras comezinhas de interpretação do Direito. Correta, portanto, a sentença ao preconizar que cabe à norma infraconstitucional definir, doravante, o que seja divórcio e seus requisitos”.

[44] Nesse mesmo sentido as opiniões de Rodrigo da Cunha Pereira (idem, p. 06 e p.13);

[45] “Não é mais possível tratar questões visceralmente pessoais da vida familiar, perpassadas por sentimentos, valendo-se das mesmas normas que regulam as questões patrimoniais, como propriedades, contratos e demais obrigações. Essa dificuldade, inerente às peculiaridades das relações familiares, tem estimulado muitos países a editarem códigos ou leis autônomos dos direitos das famílias. Outra razão a recomendar a autonomia legal da matéria é o grande número de projetos de leis específicos, que tramitam nas duas Casas Legislativas, propondo alterações ao Livro de Direito de Família do Código Civil (...). Eis porque, também convencido dessas razões, submeto o presente projeto de lei, como Estatuto das Famílias, traduzindo os valores que estão consagrados nos princípios emergentes dos arts. 226 a 230 da Constituição Federal. A denominação utilizada, "Estatuto das Famílias", contempla melhor a opção constitucional de proteção das variadas entidades familiares. No passado, apenas a família constituída pelo casamento - portanto única - era objeto do direito de família” (http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=338). Projeto de Lei nº 2.285/2007.


TITLE: The extinction from the breakup judicial from the planning legal in Brazilian and the litigations transitors.

KEYWORDS: Breakup. Divorce. Processes underway.


Autor


Informações sobre o texto

Orientador: Alexandre da Silva Barbosa (Mestre em Direito Processual Contemporâneo e Cidadania. Professor do Curso Direito Civil e Direito Processual Civil da UNIVEL – Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas de Cascavel).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MATIELLO, Carla. A extinção da separação judicial do ordenamento jurídico brasileiro e as questões transitórias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3669, 18 jul. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24958. Acesso em: 19 abr. 2024.