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O juiz e o ato de julgar

alguns aspectos envolvidos na construção da decisão judicial

O juiz e o ato de julgar: alguns aspectos envolvidos na construção da decisão judicial

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Por mais que o Direito se sustente por estruturas teóricas, é necessário se preocupar com a figura humana do juiz, que não pode, a pretexto de uma segurança jurídica ou de uma força vinculante da jurisprudência, matar o que há de mais digno e louvável na atividade judicante: o sentimento.

Resumo: o presente artigo procura destacar a atuação do juiz diante do ato de decidir, momento em que inúmeros fatores se fazem presente, de maneira a influenciar de forma direta ou indireta a decisão do magistrado. Para tanto, a análise considera alguns desdobramentos que foram se seguindo na construção do conhecimento moderno, inserindo-se neste cenário, a figura do juiz, a função da jurisdição e a decisão judicial, destacando especialmente o dilema razão e emoção na decisão judicial e o mito da neutralidade do julgador.

Palavras-chave: Decisão judicial. Razão e emoção. Neutralidade e imparcialidade.

Abstract: This article seeks to highlight the role of the judge before the act of deciding, at which time a number of factors that are present in order to influence directly or indirectly the decision of the magistrate. To this end, the analysis considers some developments that were to follow in the construction of modern knowledge, inserting themselves in this scenario, the justice, the role of the jurisdiction and judgment, especially highlighting the dilemma reason and emotion in judicial decision and the myth of neutrality of the judge.

Sumário: 1. Introdução. 2. A ciência moderna, a crise do conhecimento e a decisão judicial. 3. O Juiz de Direito e a função da jurisdição no Estado Democrático de Direito. 4. A decisão judicial como construção de significantes, como ato humano e complexo. 5. A razão e a emoção e a parcialidade do julgador. 6. Considerações Finais.


1. Introdução

A atividade jurisdicional é uma função do Estado na busca pela resolução dos conflitos existentes na sociedade, a qual se organiza a partir de um determinado ciclo de conhecimento e desenvolvimento político, social e econômico. Isso permite pensar que as decisões judiciais interferem na estruturação social, estando o juiz de direito inserido numa conjuntura de alta complexidade, já que para poder decidir, o mesmo precisa considerar o direito, o próprio contexto em que está inserido, assim como sua natureza e limitação humana, que o torna não somente um ser racional, mas também emotivo.

Neste contexto, a motivação das decisões judiciais, que se apresenta como uma garantia constitucional (art. 93, IX, CF/88), não pode e não merece ser considerada apenas obra de uma racionalidade silogista e subsuntiva[1] até porque, muitas vezes as decisões judiciais manifestam uma verdade que não pode ser verificada com os meios metódicos da ciência do Direito.

Deste modo, como acentua Fabrício Dreyer de Ávila POZZEBON[2], é necessário considerarmos a decisão judicial não como obra de razão ou subjetividade, mas de razão e subjetividade, simultaneamente, sendo que o juiz não é parcial ou imparcial, mas parcial e imparcial. Segundo ele, por tudo isso, a decisão não é verdadeira ou falsa, mas verdadeira e falsa. É tudo isso. É humana.

Observa-se, portanto, que se mostra relevante uma análise, que, inicialmente, reconheça que estamos a enfrentar uma crise do conhecimento, que estruturado sobre a premissa da técnica e objetividade, cede ao subjetivismo e ao humano. E isso se reflete nas instituições do Direito, na função jurisdicional, no papel do juiz e nas decisões judiciais emanadas por ele.

Por isso, na perspectiva deste trabalho, será abordada inicialmente, uma contextualização em torno da crise do conhecimento moderno, seguindo-se uma análise sobre a função do juiz no exercício da jurisdição, para, assim, poder ser compreendido um pouco sobre o ato de julgar.


2. A ciência moderna, a crise do conhecimento e a decisão judicial

É possível reconhecer que na modernidade[3], a vinculação do conhecimento ao modelo de Galileu e Newton e a consideração da ciência como campo privilegiado para a revelação da verdade, fundam a matriz do conhecimento mais relevante da tradição ocidental moderna.

Essa verdade é ditada e revelada pela ciência, que através do método experimental científico, na sua preocupação de bem definir seus objetos, procurou bem delimitá-los. Essa potencialização da ciência trouxe progressos fantásticos no nível material, assim como a crença de que a lógica dos sistemas científicos poderia ser utilizada na maioria dos outros campos do conhecimento, que se pretendia utilitário e funcional. Por outro lado, a visão de uma ciência distanciada do subjetivismo, deve considerar-se uma ruptura previsível do modo como o cientificismo passou a ideia de que a subjetividade pertencia ao mundo da ilusão, sendo que só o saber científico era considerado apto a expressar a verdade das coisas[4].

O discurso científico da objetividade e da técnica fez com que fossem criadas condições para a instalação do projeto moderno que estava estruturado na ideia de progresso e deu abertura ao historicismo, sendo que a tradição científica criou condições para a implantação de um saber capaz de controlar. Essa tradição também serviu para construir os pilares da ciência jurídica que ainda sustenta a categoria fundante, isto é, o indivíduo construído a partir do direito natural moderno que deu possibilidade ao surgimento da impessoalidade e dos grandes Códigos[5].

Este novo conhecimento, cujas premissas eram a experimentação, objetividade, neutralidade e generalização, foi responsável por consolidar a supremacia da técnica, sendo que a objetividade sustentou o discurso da neutralidade do cientista e também do juiz. Por sua vez, a física clássica do século XIX, construída na ideia de continuidade, acabou por ser ocupada no século XX, pela física quântica[6], que trouxe uma visão de descontinuidade que foi lançada sobre as estrutura do saber. Como anota Pozzebon,

O conhecimento desta descontinuidade, que levou á ruptura com o conhecimento até então existente, como a objetividade pura e a existência de “verdades” absolutas, permitiu vislumbrar a existência do “entre-lugar”, de espaços entre o parcial e o imparcial, o “verdadeiro” e o falso, a certeza e a incerteza. Este novo conhecimento, com tal dimensão, que alterou toda uma visão de mundo, não pode mais ficar afastado do Direito e da forma de encarar as decisões judiciais. Assim, a decisão não é fruto de razão ou da subjetividade, mas da razão e subjetividade, simultaneamente. O juiz não é parcial ou imparcial, mas parcial e imparcial. A decisão não é “verdadeira” ou falsa, mas “verdadeira” e falsa. É tudo isso. É humana[7].

Diante desse quadro, podemos observar que não existe uma verdade totalizante, e que decisões sensatas não necessariamente provêm de uma cabeça fria e de que as emoções e razão se misturam[8]. Além disso, a complexidade que nos cerca, impede respostas prontas e acabadas, sendo necessário que o juiz saiba, que ao decidir, não estará sendo neutro nem puramente racional, pois sempre estará usando seus sentimentos, sua emoção e razão, sua pré-compreensão das coisas, sendo que não há outra saída, pois julgar é um ato humano e só pode ser entendido assim, pois somente o humano percebe o humano[9].


3. O Juiz de Direito e a função da jurisdição no Estado Democrático de Direito

O papel do juiz pode ser analisado juntamente com a função da jurisdição nos diferentes estágios de desenvolvimento do Estado de Direito. No primeiro modelo, tido como liberal, os direitos individuais estavam ligados à ideia de liberdade, merecendo destaque as declarações de direitos de 1776 (Declaração de Virgínia) e a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789, versando acerca dos direitos civis e políticos dos cidadãos em relação ao Estado, como forma de limitação do poder estatal. Neste modelo liberal, o formalismo dogmático se instalou no Direito pelo positivismo legal, cujo ideal era a normatização totalizadora, sendo que o juiz não podia criar o direito ou privar-se da atividade jurisdicional.

Essa concepção tradicional da função jurisdicional, explica Eugênio FACCHINI NETTO[10], é reducionista, não considerando a complexidade da atividade judicial. Neste modelo, o juiz é um mero aplicador mecânico de leis preexistentes, atuando de forma objetiva e neutra. A solução do litígio que o juiz deve resolver encontra-se formulada no próprio ordenamento jurídico, cabendo ao julgador apenas indicá-la, sem nenhuma contribuição pessoal. E, essa visão está ligada a percepção abrangendo a posição do poder judiciário dentro do Estado e da relação deste com a sociedade civil.

Segundo François OST[11], o sistema jurídico neste modelo liberal era visto como uma hierarquia de normas, superpostas umas às outras, sistema que atendia às exigências do Estado Liberal ou do Estado de Direito do século XIX, o qual pode ser denominado como o modelo de “Júpiter”, em que o magistrado estava vinculado à pirâmide de normas (juiz boca-da-lei), não se preocupando com a realidade social que o cercava.

Num segundo momento, o que se viu foi à incorporação dos direitos sociais ao discurso da cidadania, o que foi o aporte para o surgimento do Estado de bem-estar social, superando a visão liberal-individualista proposto pela classe burguesa. Desta forma, mediante o surgimento da cidadania social, o Welfare State busca suprir e conter os excessos individualistas do modelo liberal através da intervenção. Nessa perspectiva concede a passagem da cidadania liberal para a cidadania social como uma natural decorrência da insuficiência do liberalismo econômico.

O modelo do Welfare State, é denominado por François Ost pela figura do juiz Hércules, o juiz-assistencialista típico do Estado Social do século XX, ou ainda, o engenheiro social, que relativiza o mito da supremacia do legislador. Está presente em todas as frentes, é pretensioso, aconselha, orienta, previne, adaptando as suas decisões as circunstâncias e necessidades, passando a jurisprudência a adaptar o texto da lei às necessidades daquele tempo[12].

E, já na contemporaneidade, temos um cenário de complexidade em meio a não afirmação de uma proposta de transformação social encampada pelo capitalismo. Além disso, vive-se em sociedade de muitos riscos, os quais são efeitos indesejados do próprio processo de modernização, das novas tecnologias e da própria evolução científica.

No campo do Direito, o que se observa é que a interpretação das normas não pode ser monopolizada, sendo que dificilmente a resposta jurídica para uma tentativa de resolução dos conflitos, é dada com base em cima de uma única norma. Daí, que Júpiter e Hércules são opostos ao juiz Hermes, deus da comunicação e da intermediação, que se articula entre a ordem e a desordem, dando conta dessa racionalidade paradoxal, sendo que a clausura e o determinismo do discurso são substituídos pelo discurso jurídico hermenêutico e sistemático.

Neste cenário, só um juiz Hermes poderá ter sucesso em dirimir os conflitos sociais produzidos nessa complexa realidade, em que há uma multiplicação de atores e de papéis, e a circulação de significados ou informações não se dá dentro da ideia de um código, de uma lei fechada, mas sim como um grande banco de dados, sendo que é tendência o reconhecimento do ser humano como o centro e o fim do Direito. Essa inclinação, reforçada depois da traumática barbárie nazi-fascista, encontra-se plasmada pela adoção, a guisa de valor básico do Estado Democrático de Direito, da dignidade da pessoa humana, que possui no Direito uma função demarcatória e que precisa de constante afirmação.

Ao responder a seu próprio questionamento - O novo juiz (é possível?) – Amilton Bueno de CARVALHO[13] destaca que isso sim é possível, desde que não se veja o juiz como mero aplicador da lei, sugerindo pensar num juiz que chora, sofre, ama e que se contamina pela angústia de seu povo. Aduz, ainda, que é necessário que o juiz, além de conhecer a si próprio, conheça o todo social possível, ou seja, a realidade histórica com seus contornos: as forças em luta, a disputa hegemônica, as relações de poder.

Ademais, segundo ele, além de conhecer a si próprio, a situação em litígio e o todo social, deve, a partir daí, decidir com um pé na utopia, sentenciando com a perspectiva do amanhã na diretiva da utópica vida com dignidade para todos. Deve propor sempre o “ainda não”, mas que “pode vir a ser”. Decidir com os olhos no futuro e não no passado, como se as coisas não se alterassem. É fazer parte ativa na construção de novo modelo social, se inserindo com parte desse novo modelo, deixando de ser alienado ou conservador, para se tornar criativo e crítico do seu papel na sociedade.

Ainda, conforme refere Alexandre MORAES DA ROSA[14], enquanto sujeito do processo, o juiz deve ter o reconhecimento de que não é mero autômato, mas está vinculado às decisões proferidas no curso do procedimento e no seu final, no exercício de sua função jurisdicional, sem esquecer os princípios informadores de sua atuação, mormente se adotada a matriz eminentemente acusatória.

Assim, é que apesar dessa participação – sujeito do processo –, não se pode confundir a função do juiz com a das partes, eis que não assume a condição de contraditor, mas de terceiro, responsável, todavia, pela sua regularidade na produção dos significantes probatórios. Sua função é também a de expedir, em nome do Estado, o provimento com força imperativa, atendido o devido processo legal, levando em consideração os argumentos contruídos no procedimento, em decisão motivada, mesmo.


4. A decisão judicial como construção de significantes, como ato humano e complexo

Para Moraes da Rosa, a decisão judicial é um magistrado que(m) monta, a partir das pretensões de validade enunciadas pelas partes, o que se chama de verdade processual, lançando mão das provas, dos significantes produzidos validamente, manejando a técnica de ‘bricolage jurídica’[15], ou seja, construindo com o que tem à mão, sem o pretendido controle racional total. Atualmente a atividade do bricoler é o daquele que executa um trabalho sem que exista um plano rígido previamente definido, mas que se deixa levar pelos utensílios que possui à mão, construindo, remontando, colando, integrando, com o material disponível. Comparada à atividade do engenheiro com a do bricoler, o primeiro possui um projeto a ser executado, enquanto o bricoler cola os fragmentos que aparecem a sua frente[16].

No caminhar dessa construção da sua decisão, qualquer material pode ser importante, pois sua lógica é ‘isso sempre pode servir’, diversamente do engenheiro que está vinculado ao seu projeto, ou seja, não descarta os significantes que não conformam com sua prévia idéia. O elemento recolhido, conforme as regras do jogo, do fair-play, pois, deverá ser levado em consideração no momento do ato, tal qual o um-juiz que não pode desconsiderar qualquer significante validamente produzido na instrução processual, acolhendo ou rejeitando seu respectivo valor de maneira fundamentada somente no ato decisório. Aproxima-se, assim, do juiz do sistema acusatório e sua posição na ‘gestão da prova’, isto é, na instrução processual, uma vez que não há vinculação à acusação, devendo construir sua decisão consoante o que lhe for trazido pelas partes[17].

Nesse aspecto, aduz Moraes da Rosa que o ‘palco-processo’, suas etapas, seu tempo, são os limites dos significantes probatórios no espaço processual e a totalidade deles deve estar inventariada e apta, isto é, válida, a ser empregada no ato de bricolagem. Além disso, a ‘verdade processual’ acontece do imbricamento do manancial de significantes arremessados no processo como pretensões de validade intersubjetivas, articulados com o inconsciente do um-juiz – que fala pela ‘boca’ dele significantes deslizados na cadeia por metonímia – nunca chegando à solidez da verdade real, por ser inefável, ficando-se com o coágulo de sentido possível no tempo e espaço. Dito de outra forma, com os significantes produzidos desde a denúncia/queixa e apurados no decorrer da instrução e alegações, compete ao magistrado proferir motivadamente a decisão, explicitando, antes, a teoria e o método – sem um grande método – em que se fundamenta. Por fim, citando Dussel, refere que o juiz então realiza uma opção entre hipóteses possíveis, com a responsabilidade ética daí advinda[18].

É também a decisão judicial um ato do sentir humano e da sua complexidade enquanto ser humano. Conforme explica Nereu José GIACOMOLLI[19], o julgamento é um ato do sentire, de crença no que foi demonstrado no processo. O resultado está sujeito a variáveis projetadas sobre o processo (vivências pessoais do julgador, seus gostos e desgostos, suas paixões, seu eu, seu modo de ser no mundo), pois o sentido da compreensão não acontece sem o objeto a ser analisado, sem a vivência do ser, pousado na realidade, na interação com a existência (dasein). Por sua vez, as regras jurídicas e fatos recebem a carga de valores sociais, de paradigmas, sejam ideológicos, filosóficos, históricos ou psicológicos, inclusive da rede de elementos inconscientes que acabam dando causa à decisão.

No entendimento de Giacomolli, a decisão judicial é uma operação complexa, pois envolve aspectos cognoscitivos e valorativos, relacionados no âmbito criminal, especialmente à prova dos fatos e de suas circunstâncias, bem como da regra que incide no caso concreto. Assim, não é qualquer decisão, qualquer sentir, que encontra suporte constitucional, mas aqueles advindos da compreensão de determinado juiz quando da análise da prova no processo[20].

A decisão judicial não é uma declaração de verdade, mas uma declaração na qual se pode crer, com base no que está no processo. Podendo-se crer, submete-se ao duplo grau e ao controle das partes e interessados. Os dados cognoscitivos constantes dos autos serão valorados pelo juiz, um ser humano, um ser no mundo, com suas circunstâncias conscientes e inconscientes. Deste modo, se trata de uma avaliação puramente pessoal, de convencimento próprio, mas limitado à condição de ser humano e às regras jurídicas estabelecidas. Por fim, O julgar é uma reposta fragmentária, porque parcial é o que está nos autos e a totalidade é inatingível pelo humano[21].

Neste contexto, embora não seja de jurisdição penal, merece destaque pela carga valorativa empregada, a decisão judicial prolata pela desembargadora do trabalho Maria Cesarineide Lima, membro da 1ª Turma Recursal do Tribunal Regional da 14ª Região, que um voto inédito manifestado num processo judicial em 25 anos de história daquele Tribunal, elaborou o relatório em estilo de verso, reconhecendo a dor da mãe reclamante pela perda de um filho vítima de morte acidental no canteiro de obras da Usina de Jirau, no Estado de Rondônia.

Mesmo negando a pretensão de indenização por danos morais e materiais, a desembargadora reconhece a dor da mãe da vítima e encerra o relatório em estilo de verso, verbis:

Dói em mim, como relatora, ter que lhe dizer, mãe recorrente,que a decisão monocrática, infelizmente, não há como reformar, uma vez que não há nos autos elementos probatórios que possam comprovar o alegado em seu petitório.

Não! Não pense que a juíza de primeiro grau, que também é filha, ou nós, juízes integrantes da 1.ª Turma deste Regional, que somos também pais, sejamos insensíveis, frios ou máquinas de dizer o direito.

Não! Não é essa a nossa trilha, pois, além das leis dos homens, também rogamos a Deus sabedoria.

Todavia, não temos o dom para curar todos as males, todos os ais...

Somos apenas seres humanos, cuja missão, embora vocacionada, é árdua, é espinhosa, e necessita, ao julgar, ouvir, não apenas uma, mas todas as vozes que constam de um processo.

E sendo sabedores de sua imensa dor, pois, como disse Giuseppe Ghiaroni “perder o filho é como achar a morte, perder o filho quando grande e forte, quando já podia ampará-la e compensá-la,” recorremos nós, julgadores, mediante o recurso da oração, à Mãe de Deus, que assim como você, mãe recorrente, perdeu seu filho Jesus tão precocemente.

Que Ela possa aliviar os seus sofrimentos, ó mãe sofredora, E com você atravessar esse vale da morte, tornando-lhe uma mulher ainda mais guerrida, mais forte, apesar da dor e da saudade que habitam seu coração, que não calam no seu peito. Entretanto, você precisa seguir em frente, enxugue o pranto, saia do leito, há outros filhos que necessitam dos seus feitos, de sua devoção.

Que Deus lhe proteja, mãe recorrente, em todos os caminhos desta vida.

Às vezes sofrida, mas, sempre querida, e que Ele cure as suas mágoas, suas feridas[22].


5. A razão e a emoção e a parcialidade do julgador

A ciência, tradicionalmente, considerou como válida a premissa de que decisões sensatas advêm de uma “cabeça fria”, e de que a emoção e a razão são como a água e o azeite, isto é, não se misturam. Conforme explica Gabriel J. Chittó GAUER[23], as questões vinculadas à passagem da sensibilidade à racionalidade constituem-se no fundamento do paradoxo moderno, em que essa dualidade ainda permanece em muitos campos do saber. Deste modo, é que lembranças, percepções, emoções e esquecimentos não podem ser explicados racionalmente, pois são planos oriundos de consciência diferentes. A perspectiva largamente difundida era de que existiam sistemas neurológicos diferentes para a razão e para a emoção, sendo que muitas pesquisas foram e vem sendo realizadas objetivando comprovar diferentes hipóteses.

E neste cenário, destaca-se Antonio Damásio, médico diretor do Instituto do Cérebro e Criatividade, na Universidade do Sul da Califórnia. Famoso pela obra O Erro de Descartes, Damásio é um especialista em investigar a consciência humana, de modo a conhecer mais profundamente como funciona o cérebro. Em recente entrevista à Revista Ciência Hoje, Damásio esclarece que a razão a razão, embora seja um sistema incompleto e imperfeito, pode impor certo controle sobre sistemas automáticos irracionais. Aquilo que nós temos de fugir é da ideia falsa de que os sistemas racionais são sempre bons e que os sistemas emocionais são sempre maus. Porque há muitas pessoas que pensam que a emoção é uma coisa descontrolada e automática, é uma coisa ruim para o ser humano porque o aproxima dos animais. Isso, segundo ele, não é verdade, pois quando perdemos completamente a emoção, tomamos decisões piores[24].

Sobre um meio-termo entre razão e emoção, Damásio explica que existe sim esse meio-termo, sendo que a emoção tem coisas boas e más, o mesmo ocorrendo com a razão. Há certos aspectos da razão que são ótimos e nos permitem decidir sobre um problema de forma pensada e equilibrada. “Mas há tantos aspectos negativos na razão!”. Aquilo que precisamos saber é que somos uma mistura de sistemas, alguns que levam a bons resultados, outros que não levam. Assim, é preciso ter uma grande modéstia na forma como olhamos para os seres humanos. Estamos constantemente a fazer coisas que são completamente estúpidas, que nos machucam e machucam os outros. Ao mesmo tempo somos capazes de fazer coisas muito boas. E essas coisas não são pretas ou brancas, são uma mistura de qualidades.

Dito isso, devemos considerar que a razão e a emoção estão indissociáveis no ato de julgar, e que por mais improvável que possa parecer, o juiz não é imparcial e muito menos neutro. Como bem observa Pozzebon[25], o que Damásio descobriu em suas pesquisas médicas, é a indissolúvel e necessária presença da razão e do sentimento no ato de julgar, o que leva ao caráter mítico das ditas características da decisão judicial: imparcialidade, objetividade, segurança e a ilusão do efetivo controle através da fundamentação.

Segundo anotam Giacomolli e Duarte[26], o juiz pode até julgar de maneira formamente imparcial (não ser parte, não estar impedido ou suspeito), mas isso não suprime a sua neutralidade subjetiva no processo, aquela projetada sobre o processo,

que diz das vivências pessoais do juiz, seus gostos e desgostos, suas paixões, seu eu, seu modo de ser no mundo, pois o sentido da compreensão não acontece sem a sobreposição sobre o objeto a ser analisado, sem a vivência do ser com seu entendimento singular, pousado sobre a realidade. A verdadeira compreensão do sentido daquilo que nos é dado deve extrapolar uma mera exegese prática de afirmação literal do sentido, porquanto deve ocupar-se das próprias condições de possibilidade do horizonte do entendimento.

Não há como se exigir do juiz uma condição que o mesmo não pode dar, ou seja, que decida sem a sua subjetividade, que decida distanciado das suas vivências e experiências como ser no mundo, que o torno diferente de uma máquina, de um computador, sendo um atributo do ser no mundo o entendimento de si mesmo e o entendimento de si no contexto em que se vive, sendo que todo esse entendimento acaba por desaguar no ato de julgar.

Como bem explica Lídia Reis de Almeida PRADO[27] à dificuldade de integrar o sentimento na psique do coletivo do Ocidente, trouxe lesivas características culturais, como a rigidez mental, o racionalismo exagerado e uma supervalorização do pensamento em detrimento da emoção que passou a ser inferiorizada, aonde, citando Diderot, dar espaço a sentimento “é ser injusto, é ser louco”. E, segue, aduzindo que

O direito, como prestação jurisdicional, não apenas seguiu essa propensão (que se verificou em quase todos os ramos do saber), mas o fez de modo exacerbado. Explica-se: nas decisões judiciais a desqualificação do sentimento intensifica-se porque um dos instrumentos de trabalho dos magistrados é a lei – regra, abstrata de conduta imposta à observância geral –, que pertence ao mundo da racionalidade, muito distanciado da emoção.

 Entretanto, esse racionalismo exacerbado, já no decorrer do século XX, começou a ser questionado pelos outros ramos do conhecimento, como a física, a sociologia e a psicologia. E, a mais divulgada das concepções psicológicas foi formulada por Freud, que considerou o inconsciente como uma instância psíquica constituída do conjunto do material reprimido durante toda a história de vida do sujeito. E, essa concepção fez com que uma mudança ocorresse no valor que até então, era atribuído a razão, que passou a ser vista como menos poderosa do que se supunha, especialmente por estar subordinada a impulsos desconhecidos e de difícil acesso, sendo que essa ideia pôs em dúvida a crença dos racionalistas na premissa de que a verdade habita a consciência[28].

Por conseguinte, Lídia Prado anota que no entendimento Freud

“A Psicanálise propõe-se a mostrar que o Eu não somente é senhor na sua própria casa, mas também está reduzido a se contentar com informações raras e fragmentadas daquilo que se passa fora da consciência, no restante da vida psíquica”. De acordo, com tal abordagem “a consciência não constitui a essência da vida psíquica, mas apenas uma qualidade desta, podendo coexistir com outras qualidades e até mesmo faltar”.

Outra noção de inconsciente foi desenvolvida por Jung, conhecida como o inconsciente coletivo, representado como sendo uma estrutura psíquica herdada da evolução da humanidade, renascida em cada indivíduo e que contém padrões de funcionamento que dão à nossa espécie características específicas, conhecidas como arquétipos[29].

Tudo isso, leva ao reconhecimento de que é no convívio com o nosso mundo interno e suas divergências que vamos adquirindo meios para o entendimento das discrepâncias exteriores, sendo que o juiz, com suas experiências e individuais e sociais, assim como qualquer pessoa, não está imune ao seu inconsciente[30].

Ademais, admitir a emoção dos juízes na produção das sentenças não significa o abandono da racionalidade do direito, pelo contrário, representa o seu uso de forma equilibrada. O uso da emoção ao lado da razão, dará aos juízes condições de não serem inconscientemente levados pelas manifestações negativas do referido arquétipo, que podem provocar nos julgadores atos falhos, oscilação de humor, irritabilidade, com prejuízo para a própria solução da demanda. p. 52.

Segundo a compreensão de Facchini Neto[31], o juiz quando julga não faz servindo-se apenas do intelecto, não desenvolve uma operação de simples aplicação da lei, mas julga também com vontade, participa, escolhe, decide, E, continua, dizendo e indagando:

O juiz não é somente juiz: é um cidadão, isto é, um homem que vive em sociedade, que tem certas opiniões e certos interesses comuns como outros homens. Não vive só; está ligado por vínculos de solidariedade e de conivências: é inquilino, é locador, ou proprietário de sua casa; é solteiro ou casado; é filho de comerciante ou de agricultores; pertence a uma igreja ou talvez, embora não o diga, identifica-se com um partido. Seria possível que todas essas condições pessoais não repercutam de alguma forma sobre suas decisões? Seria possível que, no seu raciocínio, justiça e política não entrem jamais em contato?

Ao que parece, seria temerário e porque não, irracional, acreditar que o juiz decide de forma puramente objetiva, neutra, imparcial e sem emoção. Enquanto ser humano, está aberto a influências de toda ordem, que moldam a sua percepção das coisas e das pessoas, de modo a transferir toda a sua subjetividade para as suas decisões.

Citando Antonio Damásio, reconhece Aury LOPES JR.[32] que é chegado o momento de resgatar a subjetividade e compreender que a racionalidade é incompleta e resulta seriamente prejudicada quando não existe nenhuma ligação com o sentimento. Não existe racionalidade sem emoção, daí a importância da subjetividade e do sentir do juiz no seu ato decisório.

Por outro lado, é necessário frente a toda complexidade que envolve o ato decisório, que o juiz decida. Como bem conclui Pozzebon,

A interpretação no direito ou em outras áreas do conhecimento nunca será uma atividade discricionária, ou puramente mecânica. Ela sempre será o produto de uma interação entre o intérprete e texto, e seu produto final conterá elementos objetivos e subjetivos. E é bom que seja assim. Enquanto a objetividade traçará os parâmetros de atuação do intérprete e permitirá aferir o acerto de sua decisão à luz das possibilidades exegéticas do texto, das regras de interpretação (...) e do conteúdo dos princípios e preceitos que não se pode afastar, a subjetividade traduzir-se-á na sensibilidade e intuição do intérprete (acrescenta-se: nas suas emoções, sem a qual não poderá decidir como visto em Antonio Damásio; nos seus valores; enfim, na sua história de vida como um todo) que humanizará a norma para afeiçoá-la à realidade e permitirá que ele busque a solução justa, dentre as alternativas que o ordenamento lhe abriu[33].

E, diante disso, o que a decisão judicial vai revelar? O resultado será o convencimento do juiz, o que nem sempre (e não precisa ser) será a verdade[34].


6. Considerações finais

O momento em que vivemos é uma expressão de diversidades, riscos, problemas, mas que aceita sonhos, mudanças, novos modelos de pensamento, enfim, novas perspectivas. Neste cenário, o Direito é chamado para, quem sabe, não mudar nada, ou até mudar o jogo de forças que impulsionam os inúmeros conflitos do dia-a-dia. Ao mesmo, respostas prontas e versões únicas, dando corpo a um discurso silogista, não tem a possibilidade de fundamentar uma decisão judicial.

  Diante desses dilemas está o juiz, pressionado por uma cultura de segurança jurídica que vê na lei a única saída para as soluções dos casos concretos. E, essa cultura que se assenta na objetividade, na técnica, na neutralidade e na imparcialidade, pretendendo reduzir a atividade de julgar a um simples comando manual, acaba por reduzir o juiz a um automatismo cruel.

Essas ideias permitem pensar novos rumos para a jurisdição e para o direito, especialmente para reconhecer que nas decisões judiciais a segurança jurídica é aparente, e é um momento em que o juiz não decide só com base em um juízo racional, pelo contrário, a emoção, ou melhor, as suas emoções, constituem uma parte fundamental desse processo.

Assim sendo, por mais que o Direito crie e se sustente por estruturas teóricas, é necessário se preocupar com a figura humana do juiz, que não pode, a pretexto de uma segurança jurídica ou de uma força vinculante de outras decisões e da própria jurisprudência, matar o que há de mais digno e louvável na atividade judicante, isto é, o sentimento.

E por mais que se queira, não há decisão e normas construídas somente na lei. Quando o juiz julga, suas escolhas, sua ideologia, seus sonhos e o seu passado, suas emoções e frustrações ficam na decisão, pois a decisão judicial é um ato do sentir humano e da sua complexidade enquanto ser humano, sendo que a neutralidade e a racionalidade pura sofre interferência do inconsciente e de diversos outros fatores.

Como asseverado anteriormente, o juiz precisa reconhecer que, ao decidir, não estará sendo neutro nem puramente racional, pois sempre estará decidindo com seus sentimentos, sua emoção e razão, sua pré-compreensão das coisas, pois julgar é um ato humano e só pode ser entendido assim, pois somente o humano percebe o humano.


Referências

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Notas

[1] Ana Paula de Barcellos ensina que “O raciocínio subsuntivo aplicado ao direito pode ser descrito simplificadamente nos seguintes termos: em primeiro lugar, identifica-se uma premissa maior, composta por um enunciado normativo ou por um conjunto deles. A premissa maior incide sobre uma premissa menor (o conjunto de fatos relevantes na hipótese), e desse encontro entre as premissas maior e menor produz-se uma conseqüência: a aplicação de uma norma específica ao caso, extraída ou construída a partir da premissa maior. As técnicas tradicionais de solução de antinomia e a aplicação dos elementos sistemáticos e teleológicos, dentre outras fórmulas hermenêuticas, pretendem exatamente superar a antinomia, afastar a incidência de outras possibilidades normativas e isolar uma única premissa maior, para que a subsunção possa ter início”. BARCELLOS, Ana Paula.  Ponderação, racionalidade e atividade jurisdicional. Rio de Janeiro: Renovar, 2005, p. 30.

[2] POZZEBON, Fabrício Dreyer de Ávila. A crise do conhecimento moderno e a motivação das decisões judiciais. In: GAUER, Ruth Maria Chittó (Coord.). Sistema penal e violência. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 232.

[3] Segundo esclarece Ruth Maria Chittó Gauer “o termo modernidade significa a compreensão de uma época histórica que se estende do século XVI ao século XVIII. Este é um período muito longo para que pensemos em uma única modernidade. Nesta época instalou-se um fluxo contínuo de trocas culturais, formando uma rede cada vez mais densa de comunicações mundiais que vai da expansão colonialista à mundialização. Vista desta forma podemos pensar que existem várias modernidades. Tornou-se consenso, nos meios acadêmicos, que falar em modernidade, portanto, seria abranger um espaço de tempo além de longo, extremamente complexo”. GAUER, Ruth Maria Chittó. Modernidade, direito penal e conservadorismo judicial. In: SCHMIDT, Andrei Zenkner (Coord.). Novos rumos do direito penal contemporâneo. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, p. 597.

[4] GAUER, Ruth M. Chittó. Conhecimento e aceleração (mito, verdade e tempo). In: GAUER, Ruth M. Chittó (Coord.). A qualidade do tempo: para além das aparências históricas. Rio de Janeiro: Lumens Juris, 2004, p. 1-16.

[5] GAUER, Ruth Maria Chittó. Modernidade, direito penal e conservadorismo judicial. p. 606.

[6] Barasab NICOLESCU afirma que “O quantum de Planck mudou de maneira profunda nossa visão de mundo, ao permitir saber que entre dois pontos não há nada, nem objetos, nem átomos, nem moléculas, nem partículas”. Respondendo a seu próprio questionamento (Quem poderia negar que a ciência, pela sua consequência mais visível, a tecnologia, está transformando nossas vidas e nos deixando desarmados diante do dilema de um bem-estar exterior, acompanhado de um empobrecimento de nossa vida interior?), aduz que a ciência fundamental enterra suas raízes na terra nutridora das interrogações comuns a todo campo do conhecimento humano: Qual é o sentido da vida? Qual é o papel do homem no processo cósmico? Qual é o lugar da natureza no conhecimento? A ciência fundamental tem as mesmas raízes que a religião, a arte ou a mitologia. Entretanto, gradativamente, suas questões foram consideradas não-científicas e foram rejeitadas no inferno do irracional. A causa essencial desta mudança de paradigma foi o triunfo indiscutível, sobre o plano da materialidade direta, do pensamento analítico, reducionista e mecânico. Bastava postular leis vindas não se sabe de onde. Em virtude dessas leis, dessas equações de movimento, tudo podia ser precisamente predito, uma vez que as condições iniciais estivessem fixadas. Tudo estava determinado. Neste universo de falsa liberdade, era surpreendente que algo pudesse realmente acontecer. Testemunha de uma ordem absoluta, o cientista não podia mais ser um filósofo da natureza, ele era obrigado a tornar-se um técnico do quantitativo. Uma proliferação anárquica e caótica do mental invade inevitavelmente o mundo. Uma tecnociência sem direção produz um número cada vez maior de máquinas, verdadeiros prolongamentos dos órgãos dos sentidos. Este movimento destruidor da natureza engendra, necessariamente, uma aceleração da mecanização, da fragmentação, do aniquilamento e da interação. Os sinais da nova barbárie são perceptíveis no mundo inteiro. A fonte da nova barbárie me parece residir na mistura explosiva do pensamento binário, aquela do terceiro excluído (sim e não, verdade absoluta e falsidade absoluta), em oposição aos dados da ciência fundamental contemporânea e uma tecnologia sem nenhuma perspectiva humanista. NICOLESCU, Barasab. A lógica quântica e a transdisciplinaridade exigem a mudança de nossos hábitos mentais. Cadernos Instituto Humanistas Unisinos em Formação, São Leopoldo, n. 6, 2006, p. 73.

[7] POZZEBON, Fabrício Dreyer de Ávila. Op. cit., p. 232.

[8] GAUER, Ruth Maria Chittó. Modernidade, direito penal e conservadorismo judicial. p. 606.

[9] POZZEBON, Fabrício Dreyer de Ávila. Op. cit., p. 234.

[10] FACCHINI NETTO, Eugênio. “E o juiz não é só de direito...” (ou “a função jurisdicional e a subjetividade”). ZIMERMANN, David; COLTRO, Antônio Carlos Mathias (Coord.). Aspectos psicológicos na prática jurídica. Campinas: Milennium,  2002, p. 397.

[11] OST, François. Júpiter, Hércules, Hermes: três modelos de juez. Doxa. In: Doxa. Cadernos de Filosofia Del Derecho. Alicante, Universidade de Alicante, n. 14, p. 169-194, 1993.

[12] OST, François. Op. cit., p. 176-177.

[13] CARVALHO, Amilton Bueno. O juiz e a jurisprudência – um desabafo crítico. In: Revista de Estudos Criminais, ITEC, Porto Alegre, n. 7, 2002, p. 13-18.

[14] MORAES DA ROSA, Alexandre. Decisão no processo penal como bricolage de significantes. Tese (Doutorado em Direito). UFPR, Curitiba, 2004, p. 282. Disponível em: <http://alexandremoraisdarosa.blogspot.com.br>. Acesso em: 08 mai., 2012.

[15] A palavra bricolage possui diversos significados no frances. O bricoleur pode significar a pessoa que realiza todo tipo de trabalho manual; bricoler, empregado como verbo, quer dar a entender uma forma provisoria, de ziguezaguear, de jogar por tabela, utilizar meios indiretos, rodeios; ja como substantivo pode ser entendido como ricochete, engano, astúcia, trabalho inesperado, pequeno acessorio; bricolage como trabalho de amador, e, especialmente na antropologia, o trabalho onde a técnica e improvisada e adaptada ao material existente, as contingencias.

[16] MORAES DA ROSA, Alexandre. Op. cit., p. 367.

[17] MORAES DA ROSA, Alexandre. Op. cit., p. 368.

[18] MORAES DA ROSA, Alexandre. Op. cit., p. 370.

[19] GIACOMOLLI, Nereu Jose. Reformas (?) do processo penal: considerações críticas. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p.25-26.

[20] GIACOMOLLI, Nereu Jose. Op. cit., p. 27.

[21] GIACOMOLLI, Nereu Jose. Op. cit., p. 27.

[22] 14ª REGIÃO, Tribunal Regional do Trabalho. Acidente de trabalho. Nexo de causalidade. Inexistente. Danos morais e materiais indevidos. Evidenciando-se pelo conjunto probatório a inexistência de nexo de causalidade entre a morte do empregado e o acidente de trabalho sofrido nas instalações da empresa, em razão da força maior, improcede a condenação da empregadora ao pagamento de indenização por danos morais e materiais à mãe do obreiro falecido. Acórdão em Recurso Ordinário n. 00749.2010.008.14.00-1. Júlia Santos Amaral e Miranda Filho Construções Ltda. Relatora: Maria Cesarineide de Souza Lima. Disponível em <www2.trt14.jus.br>. Acesso em: 10 jun., 2012.

[23] GAUER, Gabriel J. Chittó. Transcendendo a dicotomia razão vs. Emoção. Memória, punição e justiça: uma abordagem interdisciplinar. Porto Alegre, 2011, p. 9-16.

[24] DAMÁSIO, António. Sem perder a humanidade jamais. Rio de Janeiro, 2012. Entrevista concedida a Thiago Camelo em abr. 2012.

[25] POZZEBON, Fabrício Dreyer de Ávila. Reflexos da crise do conhecimento moderno na jurisdição: fundamentos da motivação compartilhada no processo penal. Tese (Doutorado em Direito). Faculdade de Direito, PUCRS, Porto Alegre, 2005, p. 282.

[26] GIACOMOLLI, Nereu José; DUARTE, Liza Bastos. O mito da neutralidade na motivação das decisões judiciais: aspectos epistemológicos. In: Revista da AJURIS, Porto Alegre, n. 102, p. 288-307, jun. 2006.

[27] PRADO, Lídia Reis de Almeida. Racionalidade e emoção na prestação jurisdicional. In: ZIMERMANN, David; COLTRO, Antônio Carlos Mathias (Coord.). Aspectos psicológicos na prática jurídica. Campinas: Milennium,  2002, p. 44.

[28] PRADO, Lídia Reis de Almeida. Op. cit., p. 45.

[29] Explica Lídia Reis de Almeida Prado que os arquétipos representam predisposições humanas típicas para agir, pensar, sentir, sendo que cada pessoa pode vivenciá-las particularmente.

[30] PRADO, Lídia Reis de Almeida. Op. cit., p. 47.

[31] FACCHINI NETTO, Eugênio. Op. Cit., p. 406-407.

[32] LOPES JR., Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. V. II. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 330-331.

[33] POZZEBON, Fabrício Dreyer de Ávila. Reflexos da crise do conhecimento moderno na jurisdição: fundamentos da motivação compartilhada no processo penal. p.

[34] LOPES JR., Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. V. I. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 559.


Autor

  • Robson de Vargas

    Robson de Vargas

    Mestrando em Ciências Criminais – PUCRS. Especialista em Direito Constitucional – UNESA. Especialista em Ciências Penais – PUCRS. Professor na área de Direito Público no Centro Universitário Estácio de Sá – Santa Catarina. Advogado.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VARGAS, Robson de. O juiz e o ato de julgar: alguns aspectos envolvidos na construção da decisão judicial. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3708, 26 ago. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25142. Acesso em: 19 abr. 2024.