Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/28442
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

O Direito e seu avesso no STF

O Direito e seu avesso no STF

Publicado em . Elaborado em .

O tratamento dispensado pelo presidente do STF aos réus do Mensalão petista não encontra fundamento na jurisprudência, na Lei 7210/84 ou na CF/88.

A CF/88 garante a todos brasileiros indistintamente o direito de trabalhar (art. 6o.). Ninguém pode ser privado de seus direitos por discriminação que atente contra os direitos e liberdades fundamentais (art. 5o. XLI, da CF/88), privado de liberdade sem o devido processo legal (art. 5o., LIV, da CF/88), nem tampouco poderá ser submetido a penas cruéis (art. 5o., XLVII, "e", da CF/88). Entre os objetivos da República Brasileira contra expressamente promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação (art. 3o., IV, CF/88).

 

A pena imposta ao réu deve ser cumprida nos termos em que foi imposta. A finalidade da execução é a ressocialização do condenado (art. 1o. da Lei 7210/84), sendo lhe assegurado todos os direitos não cassados pela sentença (art. 3o., da Lei 7210/84), dentre os quais se destacam aqueles que lhe foram conferidos pela CF/88. Durante o cumprimento da pena, distinções de natureza religiosa ou política são inadmissíveis (art. 3o., parágrafo único, da Lei 7210/84). O detento tem direito ao exercício das atividades profissionais dentro ou fora do presídio conforme suas aptidões e de acordo com os critérios estabelecidos pela Lei (art. 41, VI c.c. arts. 31 a 37, da Lei 7210/88), sendo necessário o respeito à igualdade de tratamento em relação aos demais condenados (art. 41, XII, da Lei 7210/84), o contato com o mundo externo é permitido, mas a posse de telefone é proibida (art. 41, XV, c.c. art. 50, VII, da Lei 7210/84).

 

Quando o réu é condenado ao regime semiaberto ele não precisa cumprir 1/6 da pena para ter direito a trabalhar fora da prisão. Nesse sentido:

 

"TJ-MG - Habeas Corpus HC 10000130200991000 MG (TJ-MG)

Data de publicação: 20/05/2013

Ementa: EMENTA: HABEAS CORPUS - PACIENTE CONDENADO AO CUMPRIMENTO DE PENA RECLUSÃO, EM REGIME INICIALMENTE SEMI-ABERTO- TRABALHO EXTERNO - PRESCINDIBILIDADE DO CUMPRIMENTO DE 1/6 DAPENA - ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA, PARA APRECIAÇÃO DO PEDIDO PELO JUÍZO DA EXECUÇÃO. 1. Aplicando a hermenêutica mais adequada à matéria, sob a ótica do ordenamento jurídico pátrio, tem-se compreendido que o trabalho externo faz parte da essência do regime semi-aberto, sendo prescindível o cumprimento de 1/6 da pena para sua concessão, se já se encontrar, o reeducando, no mencionado regime.2. Noutro norte, não se pode deslembrar que o reconhecimento efetivo do direito ao benefício, se sujeita, por imposição legal, a requisitos subjetivos, a serem avaliados pelo juízo da execução. 3. Assim, concede-se parcialmente a ordem determinando a análise do pedido pelo juízo da execução com afastamento do requisito objetivo decumprimento da aludida fração."

 

José Dirceu, José Genoíno e Delubio Soares foram condenados ao regime semiaberto, mas estão cumprindo pena em regime fechado. Na prática, a execução das penas impostas a eles tem sido exagerada desde a prisão dos três. Eles poderiam ficar no Estado em que estavam, mas foram inadvertidamente transferidos para Brasília. Ao segundo é negado o direito a prisão domiciliar por razões de saúde. Ao primeiro o direito de trabalhar foi negado, o terceiro teve revogado sua autorização para prestar serviços à CUT.

 

O presidente do STF cuida dos condenados como se eles não tivessem quaisquer direitos, como se eles pudessem ser tratados com mais rigor do que os outros detentos. Tudo faz para agradar a imprensa, que está sempre mais inclinada a bisbilhotar e crucificar os réus petistas do que a incomodar os suspeitos do Mensalão tucano. A imprensa é livre para escolher seus preferidos e desafetos, para aplaudir bandidos e exigir a punição de culpados. Mas o judiciário tem o dever de a todos tratar com equidistância, não pode ser transformado num instrumento público da vingança exigida pelos jornalistas. Em mais de uma oportunidade a OAB alertou a sociedade brasileira de que os abusos cometidos por Joaquim Barbosa contra os réus do Mensalão petista são inadmissíveis. Mesmo assim ele segue fazendo o que bem entende.

 

Na prática, JB não está apenas revogando o regime semiaberto imposto a José Dirceu, José Genoíno e Delubio Soares. A cada decisão que ele profere endurecendo o cumprimento da pena dos três ele está ignorando a jurisprudência e revogando a CF/88 e a Lei 7210/84. O que mais o presidente do STF fará para dar à imprensa o espetáculo de justiçamento seletivo que os jornalistas diariamente exigem (sempre contra os petistas, nunca contra tucanos): mandar os três mártires do PT serem chicoteados amarrados a um tronco, despedaçá-los na boca de um canhão? Coitados dos turistas que vem ao Brasil ver a Copa do Mundo. Se eles caírem nas mãos de JB nunca mais sairão de um presídio brasileiro. 

 

JB faria um grande bem ao STF e a si mesmo declarando seu impedimento ou suspeição para continuar vinculado aos autos deste processo. Outro juiz talvez tenha mais serenidade, tranquilidade e isenção para tocar a execução das penas destes condenados e resolver os incidentes que ocorrerem. Ao insistir em ficar vinculado ao caso, JB está comprometendo a instituição que preside - seu dever é justamente protege-la - proferindo decisões que não respeitam nem a Lei, nem o regime de cumprimento da pena imposta aos petistas, nem a jurisprudência dos tribunais brasileiros. Sua conduta profissional e insistência em seguir conduzindo este processo levantam sérias e justificadas suspeitas sobre suas motivações pessoais para negar a José Dirceu, José Genoíno e Delubio Soares direitos que são garantidos aos outros réus. 
 



Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelo autor. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi.