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O crime de estupro de vulnerável e o direito à autodeterminação sexual do menor

O crime de estupro de vulnerável e o direito à autodeterminação sexual do menor

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Para aferir se o comportamento do agente é adequado socialmente, é necessário levar em consideração os usos e costumes da população, na época e local em que ocorreu a conduta, investigando-se o sentimento da maioria da sociedade a respeito da capacidade de autodeterminação do adolescente na esfera da sexualidade.

SUMÁRIO: INTRODUÇÃO..1 O CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. 1.1 A PROTEÇÃO PENAL DO MENOR NOS CRIMES SEXUAIS..1.2 O BEM JURÍDICO TUTELADO.. 1.3 ASPECTOS RELATIVOS À CONDUTA TÍPICA..1.3.1 Sujeito ativo..1.3.2 Sujeito passivo.. 1.3.3 Verbo típico.1.3.4 Elementos normativos.1.3.5 Elemento subjetivo..1.3.6 Objeto material .1.3.7 Consumação1.3.8 Qualificadoras1.3.9 Aspectos processuais.  1.3.10 A possibilidade de estupro bilateral 2 A CONTROVÉRSIA ACERCA DA PRESUNÇÃO DE VIOLÊNCIA..2.1  PANORAMA ANTES DA ALTERAÇÃO LEGISLATIVA PROMOVIDA PELA LEI 12.015/092.1.1 Presunção de violência: correntes doutrinárias e posições jurisprudenciais . 2.1.1.1 Teoria absoluta2.1.1.2 Teoria relativa2.1.1.3 Teoria constitucional2.1.1.4 Posições jurisprudenciais2.2 O NOVO TIPO PENAL (ART. 217-A): ESTUPRO DE VULNERÁVEL.. 2.2.1 A nova roupagem da discussão acerca da relatividade da presunção de violência. 2.2.2 Aplicação da nova legislação nos Tribunais. 3 A POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL AO CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. 3.1 O PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL.. 3.2 A INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL NO CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL.. 3.2.1  A mudança no contexto sexual do jovem... 3.2.2 Redução da idade da primeira relação sexual .3.2.3 Gravidez na adolescência3.2.4 Os reflexos das mudanças sociais no direito penal .3.2.5O direito ao livre exercício da sexualidade pelo menor e a capacidade de consentimento na prática de atos sexuais3.2.6 Incidência do princípio da adequação social: parâmetros de aplicação. CONCLUSÃO.


INTRODUÇÃO                           

O objetivo desse trabalho é propor uma discussão a respeito da possibilidade de aplicação do princípio da adequação social ao crime de estupro de vulnerável. Trata-se de tema relevante e hodierno para a ciência jurídica, uma vez que a evolução da sociedade impõe crescentes e constantes questionamentos a respeito das condutas tipificadas pelo legislador como crimes, bem assim da aplicação de princípios e institutos a fim de privilegiar decisões justas.

O bem jurídico tutelado nos crimes sexuais é a dignidade sexual, e, especificamente em relação à vítima menor, a proteção ao desenvolvimento livre da personalidade sexual. A proteção penal no que tange ao crime sexual praticado contra criança e adolescente tem gerado muita polêmica, especialmente em face das mudanças sociais verificadas em relação à moral sexual e do direito à autodeterminação sexual do menor.

De acordo com a presunção legal de violência para os menores no âmbito dos crimes sexuais, os indivíduos abaixo de determinada idade não possuem capacidade para consentir à prática da relação sexual. Não obstante, a fixação de limite etário como marco da aquisição da capacidade de autodeterminação sexual da pessoa é passível de críticas, uma vez que o alcance da liberdade sexual é um processo dinâmico e gradativo, insuscetível de determinação exata pelo legislador.

Nesse sentido, antes da alteração legislativa promovida pela Lei nº 12.015/09, vigorava uma controvérsia doutrinária e jurisprudencial quanto à natureza da presunção de violência no crime de estupro da vítima menor de 14 (quatorze) anos, se absoluta ou relativa. Com o advento do novo tipo penal estupro de vulnerável (artigo 217-A do Código Penal), aboliu-se a expressão “presunção de violência” e referiu-se à idade do menor como elemento da conduta típica, sendo necessário avaliar a atual posição doutrinária e jurisprudencial sobre o tema.

Delimitado o alcance da controvérsia, cumpre examinar a possibilidade de aplicação do princípio da adequação social no crime de estupro de vulnerável. Nesse particular, devem ser objeto de consideração as mudanças sociais quanto à sexualidade, a relevância do consentimento do menor à prática sexual e a existência de ofensa ao bem jurídico protegido. A proposta do estudo é, assim, abordar os diversos aspectos a respeito do tema, especialmente em face dos princípios penais e das disposições constitucionais e legais.

Para a elaboração do trabalho, além de revisão bibliográfica também foi realizada análise de decisões judiciais sobre a matéria, o que corrobora a relevância da discussão proposta.

A monografia, intitulada “A possibilidade de aplicação do princípio da adequação social ao crime de estupro de vulnerável”, foi dividida em três capítulos. O primeiro capítulo, “O crime de estupro de vulnerável”, propõe um breve estudo acerca do crime de estupro de vulnerável, no que diz respeito à proteção penal do menor nos crimes sexuais, o bem jurídico tutelado e outros aspectos relativos à conduta típica.

O segundo capítulo, “A controvérsia acerca da presunção de violência”, tem por objeto situar a discussão doutrinária e jurisprudencial acerca da natureza da presunção de violência nos crimes sexuais contra menonres, antes e depois da alteração legislativa promovida pela Lei nº 12.015/09.

O terceiro capítulo, “A possibilidade de aplicação do princípio da adequação social ao crime de estupro de vulnerável”, pretende esclarecer o princípio da adequação social e em seguida avaliar a possibilidade de aplicação ao crime de estupro de vulnerável. Para tanto, merece relevo discussões a respeito da mudança no contexto sexual do jovem e os reflexos dessas mudanças no direito penal. A abordagem prossegue quanto ao direito ao livre exercício da sexualidade pelo menor e a capacidade de consentimento na prática de atos sexuais. Por fim, propõe a definição de parâmetros de aplicação no que tange à incidência do princípio da adequação social ao crime de estupro de vulnerável.

O tema relativo à aplicação do princípio da adequação social ao crime de estupro de vulnerável é relevante, pois procura atenuar o rigor da norma penal às situações socialmente adequadas. Portanto, destaca-se a relevância e originalidade da pesquisa, que busca acrescentar a discussão acerca da aplicação do princípio da adequação social à antiga controvérsia que assumiu novo contorno com a alteração legislativa promovida.


1 O CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL

O crime de estupro de vulnerável está previsto no art. 217-A do Código Penal, introduzido pela Lei n. 12.015/09, que assim dispõe: “Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de (catorze) anos”. A pena cominada para o delito é reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

O tipo penal objetiva proteger a dignidade sexual do menor de 14 (quatorze) anos, considerado vulnerável.

1.1 A PROTEÇÃO PENAL DO MENOR NOS CRIMES SEXUAIS           

A proteção penal no que tange ao crime sexual praticado contra criança e adolescente possui respaldo constitucional e legal. O artigo 227, §4º, da Constituição Federal determina que a lei punirá severamente o abuso, a violência e a exploração sexual da criança e do adolescente.

O Estatuto da Criança e do Adolescente, nos artigos 4° e 5°, atribui à família, ao Estado e à comunidade o dever de proporcionar a proteção à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, no que tange à liberdade, à dignidade, ao respeito, à exploração, à violência e à crueldade.

Quanto aos indivíduos maiores e capazes, a norma penal incide para garantir que as relações sexuais sejam consentidas, ou seja, a preocupação é com a liberdade sexual. Assim, é punida no âmbito penal a prática de atos sexuais quando houver violência ou grave ameaça.

Por outro lado, em relação aos menores, a tutela penal no campo sexual leva em consideração a situação particular dos indivíduos em desenvolvimento, razão pela qual se considera que há uma coação psicológica à prática da relação sexual, diante da impossibilidade de compreensão do ato praticado. [1]

Criou-se, assim, a presunção legal de violência para os menores no âmbito dos crimes sexuais, que prescreve que indivíduos abaixo de determinada idade não possuem capacidade para consentir à prática da relação sexual, considerada violenta por disposição legal.

A presunção legal de violência nos crimes sexuais contra menores remonta ao Direito Romano, segundo o princípio “Qui velle non potuit, ergo noluit”, formulado por Carpsovio na obra “Practica Nova Rerum Criminalium” a partir de passagens do Digesto. De acordo com esse critério jurídico-penal, adotado em vários ordenamentos jurídicos, quem não pode querer, não quer, quem não pode consentir, dissente. [2]

Com efeito, no Brasil, o legislador optou por estabelecer a presunção de violência nos delitos sexuais contra menores mediante a fixação de um limite etário da vítima. Essa técnica permite a tipificação de condutas como crime sexual ainda que ausente o emprego de violência ou grave ameaça, uma vez que a idade da vítima passa a ter natureza de elemento integrante da tipicidade penal.

O Código Imperial previa no artigo 219: “Deflorar mulher virgem, menor de 17 anos.” O aviso 512 de 05.11.1862 entendeu que o crime dessa natureza deveria ter uma pena mais grave, subrogando o artigo 222: “Ter cópula carnal por meio de violência, ou ameaças com qualquer mulher honesta”. Em outros termos, no caso da prática do ato com vítima menor de 17 (dezessete) anos, considerava-se ter ocorrido violência, já que a adolescente não possuía entendimento para consentir. [3]

A presunção se tornou relevante com o advento do Código Penal de 1890, no qual estava prevista expressamente a presunção da violência contra menores de 16 anos. No Código Penal de 1940, vigente até os dias de hoje, a presunção de violência contra menores de 16 anos foi reformulada para 14 anos.

Na reforma promovida pela Lei n. 12.015/09, a idade de 14 anos foi mantida, mas foi criado tipo penal autônomo denominado “estupro de vulnerável”, tendo sido revogado o art. 214 do Código Penal, que dispunha expressamente acerca da presunção de violência.

A idade de 14 anos foi fixada nos ordenamentos jurídicos português, brasileiro, alemão e Italiano (no qual era de 12 anos sendo ampliado para 14 anos em sua última reforma). Outros ordenamentos fixam a faixa de 12 anos, quais sejam: argentino, paraguaio, mexicano, chileno. O código espanhol, que fixava a idade de 12 anos, passou para os 13 anos em sua última reforma. [4]

Uma grande parcela dos profissionais da área de saúde e cientistas define que o menor teria capacidade para decidir sobre a vida sexual na faixa etária acima dos 14, uma vez que esta idade é a fase da puberdade, em que se expressam transformações psicológicas que estabelecem a maturidade. Nesse sentido, esclarece Adelina de Cássia Bastos Oliveira Carvalho:

Boa parte dos profissionais da área de saúde e das ciências humanas tem definido a faixa etária acima de 14 anos de idade como a fase da puberdade conceituada esta como o conjunto de transformações psicofisiológicas ligadas à maturação sexual, daí a escolha desta idade como marco a partir do qual se instala, no terreno sexual, a capacidade de consentir, pelo legislador brasileiro. [5]

Não obstante, há críticas quanto à fixação de limite etário como marco da aquisição da capacidade de autodeterminação sexual da pessoa, uma vez que o alcance da liberdade sexual é um processo dinâmico e gradativo insuscetível de determinação exata pelo legislador.

Ademais, há inegáveis influências pessoais, culturais, éticas que determinam relevantes diferenças em cada indivíduo quanto à obtenção da capacidade para decidir, com liberdade, a vida sexual. “Não deixa de ser, a nosso ver, no mínimo extravagante pensar que em uma determinada data a pessoa adquire plena consciência da atividade sexual, não a possuindo, todavia, até a véspera da mesma.” [6]

Por outro lado, o critério adotado pelo sistema penal soviético, da maturidade sexual, a ser definido pelo juiz, caso a caso, é criticado pela doutrina, diante do perigo de deixar à apreciação do julgador, sendo certo que a capacidade de consentir do ofendido não pode ser aferida tão somente pela maturidade fisiológica.[7]

A presunção legal de violência foi fortemente criticada por Carrara, que questionava por qual motivo também não se presume a violência em relação a outros delitos, como no furto. Atualmente, essa questão está sendo debatida em face do conflito entre o interesse em se proteger os menores e o reconhecimento de interesses individuais do próprio vulnerável. [8]

Destarte, diante das grandes mudanças no contexto social e moral, discute-se no âmbito nacional e internacional qual o melhor critério a ser adotado, porquanto os menores vêm adquirindo consciência sobre a sexualidade antes das faixas etárias adotadas pelos legisladores.

1.2 O BEM JURÍDICO TUTELADO

A tutela penal dos bens jurídicos deve observar o princípio da intervenção mínima, segundo o qual o direito penal só deve intervir quando a ordem jurídica não possuir outros meios para prevenir a ocorrência do dano, ou seja, apenas incide subsidiariamente, quando necessário.

A finalidade do direito penal é proteger os bens juridicamente fundamentais à satisfação das necessidades humanas para propiciar a convivência entre os indivíduos.[9]

É, assim, decorrência do princípio da intervenção mínima o princípio da ultima ratio e fragmentariedade do direito penal, que prescreve que o direito penal deve ser afastado sempre que existir outros mecanismos menos lesivos para se impor, no controle social, o respeito à dignidade da pessoa humana, de forma mais eficaz e menos agressiva.[10]

Nos crimes sexuais, o bem jurídico tutelado pela norma é a dignidade sexual, ou seja, objetiva-se garantir o livre exercício da sexualidade do indivíduo.

A liberdade sexual, em seu aspecto positivo ou dinâmico, significa a livre disposição do sexo ou do próprio corpo conforme desejos e opções do indivíduo, tanto quanto à forma de manifestação sexual quanto ao destinatário desta, observando-se os limites definidos pela tolerância e pelo respeito da liberdade sexual alheia. Em seu aspecto estático ou passivo, a liberdade sexual se concretiza na faculdade que o indivíduo possui de não suportar de outrem a realização de atos de natureza sexual contra a sua vontade.[11]

Nesse sentido, a Lei nº 12.015/09 alterou o título VI do Código Penal, de “dos crimes contra os costumes” para “dos crimes contra a dignidade sexual”, expressão relacionada à liberdade e ao desenvolvimento sexual da pessoa. Essa alteração, elogiada pela doutrina, “[...] aproxima o direito penal dos padrões contemporâneos de moralidade política vigentes nas democracias liberais [...]” [12].

Destarte, houve uma modificação do objeto protegido pela norma penal, que anteriormente tutelava a moralidade, o considerado aceitável pela sociedade em matéria de comportamento sexual, passando à tutela da dignidade sexual, com ênfase na liberdade sexual, entendida como a faculdade de livre escolha ou livre consentimento nas relações sexuais.[13] A esse respeito, Alamiro Velludo Salvador Netto destaca:

A substituição da alcunha significa – ao que parece – a quebra de um paradigma e, ao mesmo tempo, uma visão mais temporal e laica da questão, privilegiando e protegendo, enfim, a autodeterminação sexual. [14]

No caso da vítima menor, o bem jurídico tutelado é também a dignidade sexual, mas especialmente a proteção ao desenvolvimento livre da personalidade sexual das crianças e adolescentes.[15] Ao estabelecer como crime a prática de ato sexual com menor, ainda que sem violência ou grave ameaça, a norma penal visa impedir que a criança e o adolescente sofram traumas psicológicos em razão de uma atividade sexual precoce, conforme realça Cezar Roberto Bitencourt:

Na realidade, na hipótese de crime sexual contra vulnerável, não se pode falar em liberdade sexual como bem jurídico protegido, pois se reconhece que não há a plena disponibilidade do exercício dessa liberdade, que é exatamente o que caracteriza sua vulnerabilidade. Na verdade, a criminalização da conduta descrita no art. 217-A procura proteger a evolução e o desenvolvimento normal da personalidade do menor, para que, na sua fase adulta, possa decidir livremente, e sem traumas psicológicos, seu comportamento sexual. [16]

Com efeito, um precoce despertar sexual pode causar pertubações fisiológicas e psicológicas, tais como traumatismos, bloqueios de afetividade e promiscuidade, justificando uma tutela especial em relação aos jovens. [17]

Considera-se, assim, que o indivíduo que não completou a idade determinada em lei ainda não possui o discernimento necessário para decidir com liberdade a respeito da prática de atos sexuais. A proteção penal objetiva a preservação de condições básicas para que crianças e adolescentes possam alcançar um desenvolvimento livre de sua personalidade sexual.

Cumpre salientar, contudo, que em determinadas hipóteses o adolescente, embora não tenha atingido a idade fixada em lei, possui discernimento para decidir pela prática de ato sexual, sem ofensa à sua dignidade. Nessas hipóteses, inexiste violação ao bem jurídico tutelado e a disposição penal atua como circunstância repressora do exercício da sexualidade.

1.3  ASPECTOS RELATIVOS À CONDUTA TÍPICA

1.3.1     Sujeito ativo

A norma do art. 217-A não estabelece expressamente o sujeito ativo do crime de estupro de vulnerável, razão pela qual pode ser praticado por qualquer pessoa, homens e mulheres, inclusive contra pessoa do mesmo sexo, “[...] com a ressalva de que, quando se tratar de conjunção carnal, a relação deverá, obrigatoriamente, ser heterossexual” [18].

Trata-se, pois, de crime comum quanto ao sujeito ativo, admitindo-se a coautoria e a participação. [19]

1.3.2     Sujeito passivo

O sujeito passivo do crime de estupro de vulnerável é a criança ou o adolescente menor de 14 anos. “Assim, até zero hora do dia em que a vítima de estupro completa catorze anos, independentemente de sua vontade, o Estado pune aquele que lhe fizer qualquer ato libidinoso ou conjunção carnal” [20].

Ao completar 14 anos, eventual vítima estará protegida pelo crime de estupro, previsto no art. 213 do Código Penal, se for constrangida a praticar conjunção carnal ou ato libidinoso mediante violência ou grave ameaça. Se, porém, a prática do ato sexual for consentido, o fato será atípico.

O § 1º do art. 217-A amplia o rol do sujeito passivo do delito, dispondo que “Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.”

A causa referida no dispositivo “[...] pode ser permanente ou transitória, pode ser induzida ou criada pelo agente ou pode ser inerente à condição da pessoa. [...]”[21] Há, assim, uma equiparação legal, porquanto essas situações também são consideradas de vulnerabilidade.

Portanto, quanto ao sujeito passivo, o crime é próprio, somente podendo figurar como vítima pessoa vulnerável ou equiparada, ou seja, o menor de 14 anos, o enfermo ou o deficiente mental, que não tem o necessário discernimento para a prática do ato, e todos os que, por qualquer motivo, não podem oferecer resistência.

Ademais, podem ser sujeitos passivos do crime de estupro de vulnerável tanto pessoas do sexo feminino quanto do sexo masculino, restando caracterizado o crime em relação a hetero ou homossexual. [22]

Porém, cumpre salientar que o objeto do presente estudo cinge-se à análise do delito de estupro de vulnerável contra os menores de 14 anos, razão pela qual será afastada qualquer discussão relativa às demais possíveis vítimas do delito.

1.3.3     Verbo típico

O crime de estupro de vulnerável possui dois verbos típicos: “ter” conjunção carnal e “praticar” outro ato libidinoso.

O verbo típico ter significa conquistar, possuir, adquirir. O verbo típico praticar significa fazer, realizar, levar a efeito, executar. Ambos afastam a ideia de violência, de forma que basta ter conjunção carnal ou praticar ato libidinoso com menor de 14 anos para configurar a tipicidade formal do delito. [23]

Os verbos típicos ter e praticar pressupõem o comportamento positivo por parte do agente, razão pela qual se trata, em regra, de crime comissivo. Porém, é possível a caracterização da omissão imprópria, caso o agente se encontre em uma das hipóteses de garantidor previstas no § 2º do artigo 13 do Código Penal. [24]

Nesse particular, o delito em análise diferencia-se do crime de estupro, previsto no art. 213 do Código Penal, que possui “constranger” como verbo típico, que significa forçar, obrigar, subjugar a vítima ao ato sexual.

1.3.4     Elementos normativos

A norma contida no art. 217-A prescreve dois elementos normativos de índole jurídica, quais sejam, “conjunção carnal” e “ato libidinoso”. Conjunção carnal refere-se à introdução do pênis na vagina, que pode ser completa ou incompleta. Ato libidinoso é toda manifestação física que possui como finalidade satisfazer a lascívia, exigindo-se o efetivo contato corporal com a vítima. [25] Tais elementos normativos também estão presentes no crime de estupro, previsto no art. 213 do Código Penal.

Há, ainda, um elemento normativo de índole cultural, qual seja, “menor de catorze anos”, relacionado à prova documental da idade da vítima.

1.3.5     Elemento subjetivo

O elemento subjetivo do delito previsto no art. 217-A é o dolo específico, pois o ato praticado deve possuir o fim libidinoso, de satisfazer a lascívia.

Para a caracterização da tipicidade penal do crime de estupro de vulnerável é necessário que o dolo do agente abranja a idade da vítima. Se o agente pratica conjunção carnal ou ato libidinoso com menor de 14 anos desconhecendo essa circunstância, caracteriza-se erro de tipo, afastando-se o dolo e a própria punição da conduta, porquanto inexistente a forma culposa. [26]

Destaca-se, outrossim, que na hipótese de erro de tipo em razão do desconhecimento da idade da vítima, pode subsistir o crime de estupro, previsto no art. 213 do Código Penal, caso praticada a conduta com violência ou grave ameaça, conforme esclarece Rogério Greco:

No que diz respeito à idade da vítima, para que ocorra o delito em estudo, o agente, obrigatoriamente, deverá ter conhecimento de ser ela menor de 14 (quatorze) anos, pois, caso contrário, poderá ser alegado o chamado erro de tipo que, dependendo do caso concreto, poderá conduzir até mesmo à atipicidade do fato ou à sua desclassificação para o delito de estupro, tipificado no art. 213 do Código Penal. [27]

O erro de tipo pode ocorrer, na prática, em face das compleições físicas precocemente desenvolvidas da vítima, que aparenta possuir idade superior ao limite legal. Alessandra Orcesi Pedro Greco e João Daniel Rassi também tratam da hipótese em que o indivíduo possui de fato mais de 14 anos, embora a certidão de nascimento conste data de nascimento posterior:

Situação peculiar é a de o menor ter certidão errônea, de que consta ser menor de 14 anos, mas, na verdade, por questões não incomuns no grande Brasil, ter idade mais adiantada. Constatada essa circunstância a hipótese é de atipicidade ou crime impossível, porque o que vale para a condenação penal é a realidade concreta e não a documental. [28]

Por outro lado, em caso de dúvida do agente sobre a idade da vítima, prevalece a tipicidade do crime, porquanto caracterizado o dolo eventual.

1.3.6     Objeto material

O objeto material do crime é a pessoa menor de 14 anos com quem se pratique conjunção carnal ou ato libidinoso. Como se trata de delito contra a dignidade sexual da pessoa, “[...] a norma, sensível ao sentimento humano, confunde o objeto material com o sujeito passivo” [29].

1.3.7     Consumação

A consumação do crime de estupro de vulnerável ocorre com a prática de qualquer ato libidinoso onde haja contato corporal. Em outros termos, ainda que a intenção do agente seja a prática da conjunção carnal, o crime se consuma com o primeiro ato libidinoso. [30]

A tentativa do crime é possível, desde que antes de iniciado o contato sexual, que não ocorre por circunstâncias alheias à vontade do agente.

1.3.8     Qualificadoras

Os parágrafos 3º e 4º do art. 217-A estabelecem crimes qualificados pelo resultado ou preterdolosos. Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave, a pena é de 10 a 20 anos de reclusão. Se resulta morte, é de 12 a 30 anos de reclusão.

Da leitura dos dispositivos, conclui-se que as lesões leves integram o crime de estupro de vulnerável e são por ele absorvidas.

Os resultados lesão grave ou morte podem decorrer de dolo ou culpa, mas devem necessariamente estar relacionados com o contexto do crime de estupro de vulnerável. Por outro lado, se a lesão grave ou a morte ocorrem em contexto diverso do crime sexual, haverá concurso de crimes.

1.3.9     Aspectos processuais

A ação penal no crime de estupro de vulnerável e pública incondicionada, conforme previsto no art. 225, parágrafo único, do Código Penal, com a redação conferida pela Lei n. 12.015/2009.

De acordo com o art. 234-B do Código Penal, inserido pela Lei n. 12.015/2009, os processos em que se apuram o crime de estupro de vulnerável deverão ser tramitados em segredo de justiça.

O crime é considerado crime hediondo, nos termos do art. 1º, inc. VI, da Lei n. 8.072/1990. Por essa razão, incidem as respectivas disposições processuais, quais sejam, o cumprimento da pena no regime inicialmente fechado e o prazo diferenciado para o livramento condicional.

Em razão da pena cominada ao delito, é incabível proposta de transação penal e a suspensão condicional do processo, conforme a Lei n. 9.099/1995.

1.3.10   A possibilidade de estupro bilateral

É importante destacar que a partir da Lei n. 12.015/2009, vislumbra-se possível a caracterização, em tese, da figura do estupro bilateral. Destarte, se dois indivíduos menores de 14 (quatorze) anos relacionarem-se sexualmente, ainda que sem violência, estariam praticando ato infracional correspondente a estupro de vulnerável, um contra o outro. Essa possibilidade é criticada por parte da doutrina, pois afasta por completo a autodeterminação sexual dos jovens. [31]


2 A CONTROVÉRSIA ACERCA DA PRESUNÇÃO DE VIOLÊNCIA

2.1 PANORAMA ANTES DA ALTERAÇÃO LEGISLATIVA PROMOVIDA PELA LEI 12.015/09

Antes da alteração legislativa promovida pela Lei 12.015/09, a proteção penal da dignidade sexual do menor era realizada, no Código Penal de 1940, mediante o recurso ao artigo 224, que sob a rubrica “Presunção de violência”, previa na alínea “a” a disposição “se a vítima não é maior de catorze anos”.

Assim, vigorava na legislação penal a presunção legal de violência em razão da idade da vítima, presumindo-se a violência nos crimes de estupro e atentado violento ao pudor caso a vítima não possuísse quatorze anos completos.

2.1.1     Presunção de violência: correntes doutrinárias e posições jurisprudenciais

A presunção de violência em razão da menoridade guarda seu fundamento em uma ficção jurídica, no sentido de que a vítima, só pelo fato de ser menor de 14 (quatorze) anos, não possui capacidade para consentir ou não pode fazê-lo validamente, em razão do desconhecimento dos atos sexuais e de suas consequências (innocentia consilii). [32]

Dificuldades práticas na aplicação da presunção de violência prevista no art. 224 do Código Penal deram origem ao surgimento de teorias discutidas na doutrina e na jurisprudência, que buscaram identificar a natureza da presunção pela idade da vítima, quais sejam, a teoria absoluta, a teoria relativa e a teoria constitucional.

2.1.1.1        Teoria absoluta

De acordo com a teoria absoluta, a presunção de violência é absoluta (juris et de jure), não sendo possível ser afastada por qualquer prova em contrário. Esse entendimento possui como embasamento um positivismo legalista, não se admitindo concessão quanto à liberdade sexual da criança e do adolescente. [33]

Assim, considerando-se a teoria absoluta, há crime ainda que haja consentimento do menor à prática do ato. Argumenta-se que eventual consentimento é inválido, porquanto o menor de 14 (quatorze) anos é incapaz de consentir.

A teoria absoluta inicialmente defendia, inclusive, que prevalecia a presunção de violência mesmo que o agente desconhecesse a idade da vítima na data do fato, o que, em realidade, poderia caracterizar hipótese de exclusão de tipicidade por erro de tipo.

Ressalte-se que esse posicionamento adequava-se à moral pública sexual existente à época de elaboração do Código Penal de 1940, razão pela qual prevaleceu à época, com minoritária posição divergente. Nesse sentido, a lição de Adelina de Cássia Bastos Oliveira Carvalho:

Tal posicionamento, inclusive, mostrava-se coerente com a ideologia patriarcal da época, fundada nas relações de dominação do homem sobre a mulher, e que, em matéria sexual, se expressava através do controle da sexualidade feminina, com a previsão de tipos penais cm vitimização exclusiva da mulher, utilização dos elementos normativos “mulher honesta” e “mulher virgem”, diferenciação legal acentuada entre os delitos de estupro e atentado violento ao pudor, dentre outros.  [34]

Não obstante, a rigidez interpretativa da teoria absoluta sobre a presunção de violência gerou uma série de decisões judiciais injustas e incoerentes, especialmente considerando a mudança de realidade social quanto à moralidade pública.

Ademais, conforme ressalta Tadeu Antônio Dix Silva, a teoria absoluta é sujeita a inúmeras críticas, pois a presunção absoluta em matéria penal pode conduzir à responsabilidade objetiva, vedada pela Constituição Federal. [35]

2.1.1.2        Teoria relativa

De outra parte, a teoria relativa da presunção de violência preconiza que a presunção é de natureza juris tantum, permitindo prova em contrário. [36]

A relatividade da presunção justifica-se diante da necessidade de se adequar o rigor formal da legislação às mudanças sociais quanto ao tema da sexualidade, indicando maior ou menor discernimento ou experiência da vítima no âmbito sexual.

A evolução da sociedade quanto ao tema da sexualidade tem sido apontada como fator que deve ser levado em consideração no enquadramento típico da conduta, reforçando os fundamentos da teoria relativa. Isso porque a partir das modificações nos padrões sexuais comportamentais dos jovens, não seria possível negar ao adolescente que já adquiriu consciência ética do ato sexual o direito de exercer sua sexualidade, sob pena de ofensa ao direito de livre determinação sexual. Esse aspecto é abordado com clareza por Adelina de Cássia Bastos Oliveira Carvalho:

É inegável a ocorrência de uma revolução sexual, nos últimos anos, que determinou profundas modificações nos padrões sexuais comportamentais dos adolescentes e que influiu decisivamente para o alcance de uma maturidade sexual precoce por parte desses, de modo que a negação da capacidade de autodeterminação sexual estabelecida na alínea ‘a’, do art. 224, CP, de forma irrestrita, a toda pessoa menor de 14 anos de idade, se mostra afastada do momento histórico-cultural experimentado, merecendo séria reflexão.[37]

Com efeito, a facilidade de obtenção de informações e esclarecimentos sobre a matéria sexualidade favorece uma maior experiência teórica a respeito dos atos sexuais, e, consequentemente, o discernimento necessário para consentir ou negar validamente a prática sexual.

Assim, em face da relatividade da presunção, afastar-se-ia o crime quando a vítima menor de 14 (quatorze) anos já se mostra experiente para assuntos sexuais ou praticou o ato outorgando seu consentimento em contexto de relação de afeto, entre outros casos. Nesse sentido, Mirabete exemplifica:

Não se caracterizaria o crime, por essa razão, quando a menor de 14 anos é destinada à prostituição em logradoutros públicos (RT 794/58); não tem vida recatada (RT 782/561); se mostra experiente em matéria sexual (RT 713/380, 666/335, 564/378, 542/322, 430/319); já havia mantido relações sexuais com outros indivíduos (RT 714/343, 481/403); é despuradora e sem moral (RT 436/325, 695/355); é corrompida (RT 433/376, 557/322, 647/278); apresenta péssimo comportamento (RT 534/344). [38]

De acordo com Alamiro Velludo Salvador Neto, a expressão “presunção de violência” estabelecida na legislação revogada constituía um elemento normativo, sujeito a interpretação, ou seja, passível de um juízo hermenêutico diante do caso concreto, especialmente diante das diferenças culturais existentes em um país de dimensões continentais.

Quando o ambiente de operatividade jurídica significa um país de dimensões continentais, ridiculamente desigual em termos econômicos e de vastíssima heterodoxia cultural, parece consequente e natural que a presunção abandone gradativamente sua lógica jurídica absoluta e alcance uma dimensão especificada, de avaliação pontual, ou, como preferem os juristas, juris tantum. [39]

Os defensores da teoria relativa argumentavam, ainda, com fundamento em Nelson Hungria, que o legislador teria afastado o caráter absoluto da presunção quando suprimiu do projeto de Alcântara Machado, que constituiu a base para o Código Penal de 1940, a expressão “não se admite prova em contrário”, no artigo referente à presunção de violência. [40]

2.1.1.3        Teoria constitucional

Os defensores da teoria constitucional defendiam, por sua vez, que o dispositivo que previa a presunção de violência era inconstitucional, por violar o princípio da presunção de inocência. Isso porque a presunção de violência afirmada pelo legislador desobriga o órgão acusador de comprová-la no caso concreto, possibilitando uma condenação sem que tenha ocorrido violência na prática do ato sexual. Adelina de Cássia Bastos Oliveira Carvalho explicita as repercussões do princípio da presunção de inocência no âmbito criminal:

[…] A presunção de inocência é princípio fundamental de preeminência no Direito e que não pode ser restringida ou eliminada por presunções legais em sentido contrário. Principalmente no âmbito criminal, em que a vontade da lei é a manifestação da vontade real e onde se lida com um dos mais importantes direitos fundamentais do homem, a liberdade; não se pode obrigar o juiz a tomar como base para julgamentos fatos presumidos, relegando a multiplicidade de circunstâncias que acompanham a vida humana. [41]

Ademais, a teoria constitucional também indica outras desconformidades entre a presunção de violência e os princípios e valores constitucionais, como a violação à garantia da ampla defesa e ao contraditório, ao princípio da reserva legal, princípio da responsabilidade pessoal, entre outros.

Destarte, a presunção de violência implica a responsabilidade penal do agente recaísse sobre um fato presumido pelo legislador, e não sobre o fato que realmente ocorreu no plano concreto.

2.1.1.4        Posições jurisprudenciais

A jurisprudência acompanhou a discussão doutrinária, ora entendendo se tratar de presunção absoluta, e ora entendendo ser possível a relativização no caso concreto:

PENAL. ESTUPRO CONTRA MENORES DE 14 (QUATORZE) ANOS. CONDUTA ANTERIOR À LEI Nº 10.215/09. VIOLÊNCIA. PRESUNÇÃO ABSOLUTA. RELATIVIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. CONDIÇÃO E CONSENTIMENTO DA VÍTIMA. IRRELEVÂNCIA. RESSALVA DO ENTENDIMENTO DO RELATOR. RECURSO PROVIDO.

1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que o consentimento da vítima menor de 14 (quatorze) anos é irrelevante para a configuração do delito de estupro, devendo a presunção de violência, antes disciplinada no art. 224, 'a', do Código Penal, ser considerada de natureza absoluta.

2. No caso, a aquiescência da vítima menor de 14 (quatorze) anos com o ato sexual, não afasta a ocorrência do crime de estupro.

3. Ressalva do entendimento deste relator, no sentido de que tal presunção de violência é de natureza relativa.

4. Recurso provido para reconhecer a natureza absoluta da presunção de violência e, assim, determinar que o Tribunal a quo prossiga no julgamento da apelação. [42]

RECURSO ESPECIAL. PENAL. ESTUPRO. ABSOLVIÇÃO. PRETENDIDA REFORMA. INVIABILIDADE. VIOLÊNCIA PRESUMIDA. CONDUTA ANTERIOR À LEI Nº 12.015/2009. RELATIVIZAÇÃO. POSSIBILIDADE DIANTE DAS PECULIARIDADES DA CAUSA.

1. O acórdão recorrido encontra-se em harmonia com a nova orientação da Sexta Turma desta Corte, no sentido de que a presunção de violência pela menoridade, anteriormente prevista no art. 224, "a", do Código Penal (hoje revogado pela Lei nº 12.015/2009), deve ser relativizada conforme a situação do caso concreto, quando se tratar de vítima menor de quatorze e maior de doze anos de idade.

Precedentes.

2. O Tribunal de origem, ao preservar o decisum absolutório de primeiro grau, fundou suas razões no fato de que a vítima, então com 13 anos de idade, mantinha um envolvimento amoroso de aproximadamente 2 meses com o acusado. Asseverou-se que a menor fugiu espontaneamente da casa dos pais para residir com o denunciado, ocasião em que teria consentido com os atos praticados, afirmando em suas declarações que pretendia, inclusive, casar-se com o Réu.

3. Acrescentou a Corte de origem, que a menor em nenhum momento demonstrou ter sido ludibriada pelo Réu, bem como não teria a inocência necessária nos moldes a caracterizar a hipótese prevista na alínea "a" do art. 224 do Código Penal.

4. Diante da inexistência de comprovação de que tenha havido violência por parte do Réu, plausível o afastamento da alegação de violência presumida.

5. Ressalte-se que as conclusões acerca do consenso da vítima e demais circunstâncias fáticas da causa são imodificáveis, em sede de recurso especial, em razão do óbice da Súmula 7 desta Corte.

6. Recurso ao qual se nega provimento. [43]

Quanto às condutas praticadas na vigência da legislação revogada, na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça prevaleceu o entendimento de que a presunção de violência pela idade da vítima é relativa. Confira-se:

PENAL E PROCESSO PENAL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL.ESTUPRO COM VIOLÊNCIA PRESUMIDA. MENOR DE 14 ANOS. REVOGADO ART. 224, "A", DO CP. PRESUNÇÃO RELATIVA. DIVERGÊNCIA CARACTERIZADA. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA ACOLHIDOS.

1. A violência presumida prevista no revogado artigo 224, "a", do Código Penal, deve ser relativizada conforme a situação do caso concreto, cedendo espaço, portanto, a situações da vida das pessoas que demonstram a inexistência de violação ao bem jurídico tutelado.

2. Embargos de divergência acolhidos. [44]

Por outro lado, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, pacificou-se em sentido diverso, qual seja, de que a presunção de violência pela idade da vítima é absoluta, não cedendo em face do consentimento da vítima ou de suas experiências anteriores:

EMENTA HABEAS CORPUS. ESTUPRO. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. PRETENSÃO À ABSOLVIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO PROBATÓRIO. VÍTIMA MENOR DE CATORZE ANOS. PRESUNÇÃO ABSOLUTA DE VIOLÊNCIA. CRIME COMETIDO ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI 12.015/09. CONTINUIDADE DELITIVA. MAJORAÇÃO MÁXIMA DA PENA. COMPATIBILIDADE COM O NÚMERO DE CRIMES COMETIDOS. PRECEDENTES. 1. O habeas corpus não se presta ao exame e à valoração aprofundada das provas, não sendo viável reavaliar o conjunto probatório que levou à condenação criminal do paciente por crimes de estupro e atentado violento ao pudor. 2. O entendimento desta Corte pacificou-se quanto a ser absoluta a presunção de violência nos casos de estupro contra menor de catorze anos nos crimes cometidos antes da vigência da Lei 12.015/09, a obstar a pretensa relativização da violência presumida. 3. Não é possível qualificar a manutenção de relação sexual com criança de dez anos de idade como algo diferente de estupro ou entender que não seria inerente a ato da espécie a violência ou a ameaça por parte do algoz. 4. O aumento da pena devido à continuidade delitiva varia conforme o número de delitos. Na espécie, consignado nas instâncias ordinárias terem os crimes sido cometidos diariamente ao longo de quase dois anos, autorizada a majoração máxima. [45]

Portanto, diante da intensa controvérsia e dos debates doutrinários e jurisprudenciais sobre o tema, verifica-se que não se firmou um posicionamento consolidado ou pacífico a respeito da natureza da presunção de violência prevista no revogado artigo 244 do Código Penal.

2.2 O NOVO TIPO PENAL (ART. 217-A): ESTUPRO DE VULNERÁVEL

Com o advento do novo tipo penal estupro de vulnerável (artigo 217-A do Código Penal), acrescentado na reforma penal promovida pela Lei n. 12.015/09, a idade do menor de 14 (quatorze) anos passou a ser elemento da conduta típica. O crime de estupro contra menor passou a ser tipo penal autônomo e o artigo 224, que continha as hipóteses de presunção de violência, foi revogado pela legislação alteradora.

Destaca-se que o crime de estupro de vulnerável, tipificado no atual art. 217- A do Código Penal, possui uma carga punitiva – oito a quinze anos de reclusão – significativamente mais rigorosa do que as penas cominadas para o tipo básico de estupro comum, previsto no art. 213 do Código Penal – seis a dez anos de reclusão.

2.2.1     A nova roupagem da discussão acerca da relatividade da presunção de violência

Diante da alteração legislativa, parte da doutrina passou a entender encerrada a discussão e caracterizado o crime de estupro de vulnerável desde que a vítima possua idade inferior ao limite de 14 (quatorze) anos, sendo irrelevantes circunstâncias do caso concreto. Esse é o entendimento de Renato de Marcão e Plínio Gentil, nos seguintes termos:

Como a discussão gira em torno de se tratar de presunção absoluta ou relativa, a fórmula do novo art. 217-A, criando um tipo penal autônomo, do qual não consta o elemento constranger, aparentemente elimina a dúvida sobre ser necessário o dissenso do vulnerável: tendo conjunção carnal ou com ele praticando outro ato libidinoso, o agente estará cometendo essa modalidade de estupro, alias apenada mais severamente do que o estupro simples, previsto no art. 213. [46]

Conforme esclarecem João José Leal e Rodrigo José Leal, a inclusão do limite da idade da vítima no próprio tipo penal e a ausência de referência à presunção de violência seriam fundamentos suficientes para sustentar a intenção do legislador de positivar a teoria absoluta e encerrar definitivamente a discussão doutrinária e jurisprudencial.

A dicção dada ao conteúdo do art. 217-A não se refere mais à presunção de violência ou grave ameaça como elemento normativo do novo tipo penal. Para a realização objetiva dessa nova infração penal, basta que o agente tenha conhecimento de que a vítima é menor de 14 anos de idade e decida com ela manter conjunção carnal ou qualquer outro ato libidinoso. Formalmente, pode-se dizer que a incriminação da conduta não repousa mais na polêmica questão da violência presumida. [47]

Esse entendimento é corroborado pela própria justificação ao projeto de lei que deu origem à alteração legislativa (PLS 253, 2004), que explicitou a intenção de afastar o debate a respeito da presunção de violência, aumentando-se o rigor penal considerando-se a vulnerabilidade de crianças e adolescentes como uma objetividade fática. [48]

Dessa forma, o menor de 14 (quatorze) anos, por ser considerado vulnerável, seria especialmente protegido pelo dispositivo, independentemente de possuir, no caso concreto, maior ou menor discernimento ou experiência em matéria sexual. [49]

Outros autores, contudo, firmaram o entendimento no sentido de que permanece a discussão, embora com outra roupagem, ou seja, a mudança legislativa não teria afastado o debate jurisprudencial e doutrinário. Nessa esteira, Guilherme de Souza Nucci sustenta que continua o debate em razão da permanência do mesmo enunciado incriminador, com mera substituição da presunção de violência pela condição de vulnerável da vítima:

A proteção conferida aos menores de 14 anos, considerados vulneráveis, continuará a despertar debate doutrinário e jurisprudencial. O nascimento de tipo penal inédito não tornará sepulta a discussão acerca do caráter relativo ou absoluto da anterior presunção de violência. Agora, subsumida na figura da vulnerabilidade, pode-se tratar da mesma como sendo absoluta ou relativa. [50]

Com efeito, o surgimento do novo tipo penal não afasta a antiga controvérsia, mormente considerando-se a realidade social e o escopo da norma penal, de proteger a evolução e o desenvolvimento normal da personalidade do menor.

Pode-se afirmar, inclusive, que se trata de uma tentativa do legislador de impedir a prevalência da orientação jurisprudencial a respeito da relatividade da presunção de violência, utilizando-se os mesmos enunciados empregados pelo texto revogado, o que não afasta o debate, como expõe Cezar Roberto Bitencourt:

Essa pretensão do legislador fica muito clara quando se observa que, na definição do estupro de vulnerável, com o mesmo enunciado incriminador do art. 213, apenas substituiu a violência ou grave ameaça reais pela condição de vulnerável do ofendido (menor de quatorze anos ou deficiente mental). Essa presunção implícita, inconfessadamente utilizada pelo legislador, não afasta aquela discussão sobre a sua relatividade, naquela linha de que o rótulo não altera a substância. [51]

Destarte, apesar da intenção do legislador de evitar a discussão sobre a relatividade da presunção de violência, definindo apenas a conjunção carnal ou o ato libidinoso com menor de 14 anos como crime, é certo que toda lei está sujeita a interpretação no momento de sua aplicação, em que concorrem outros elementos na análise do caso concreto, afastando-se sua pretensa clareza.[52] Nessa linha de entendimento, Plínio Gentil defende:

Embora tenha-se utilizado outra técnica legislativa, qual seja, suprimir a previsão expressa da presunção de violência, certamente, a interpretação mais racional deve seguir o mesmo caminho que vinha trilhando a orientação do STF, qual seja, examinar caso a caso, para se constatar, in concreto, as condições pessoais de cada ofendida, o seu grau de conhecimento e discernimento da conduta humana que ora se incrimina, ante a extraordinária evolução comportamental da moral sexual contemporânea. [53]

Nesse contexto, não é possível ignorar a evolução da sociedade quanto ao tema da sexualidade, sendo necessário analisar, no caso concreto, a existência de efetiva ofensa ao bem jurídico tutelado pela norma.

2.2.2     Aplicação da nova legislação nos Tribunais

Nos tribunais pátrios, as primeiras decisões a respeito do tema indicam que apesar da nova lei, a controvérsia a respeito da presunção de violência – ou de vulnerabilidade da vítima – tende a permanecer, justificando, em casos excepcionais, a absolvição do acusado.

No Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios - TJDFT, há decisões em ambos os sentidos:

PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL (ART. 217-A DO CP). CONSENTIMENTO DA MENOR PARA A PRÁTICA DO ATO SEXUAL. VULNERABILIDADE. TIPICIDADE.O consentimento da vítima menor de 14 anos de idade para a prática do ato sexual é viciado pela própria idade, pessoa vulnerável. A norma do art. 217-A protege a menor de 14 anos, por considerar que esta não possui capacidade intelectual e volitiva ou, ainda, maturidade fisiológica para resistir aos impulsos naturais do desenvolvimento corporal.Evidente a innocentia consilli da menor, é típica a conduta que se amolda, formal e materialmente, ao tipo penal do art. 217-A do Código Penal.Apelação desprovida. [54]

PENAL. PROCESSO PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. VÍTIMA MENOR DE 14 ANOS. RELAÇÃO CONSENTIDA. PRESUNÇÃO DE VIOLÊNCIA. RELATIVA. CONSENTIMENTO VÁLIDO. AUSÊNCIA DE VÍCIO. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.1.A sentença absolutória deve ser mantida, pois, o principal fundamento da intervenção jurídico-penal no domínio da sexualidade é a proteção contra o abuso e a violência. Não é contra atos sexuais consentidos praticados em razão de relação de afeto.2.Mesmo que se considere que o apelado tinha plena consciência da idade da vítima - apesar da sua compleição física avantajada para sua idade, conforme se denota do Laudo Pericial, no qual, consta que ela possuía 1,56 cm de altura, pesando 52 Kg, com desenvolvimento e saúde mental normais - o crime de estupro contra vulnerável não se configurou.3.In casu, percebe-se claramente que a vítima não sofria de qualquer enfermidade ou deficiência mental, conforme atestaram os peritos criminais. Assim, há de se levantar em conta o seu consentimento nos atos sexuais, não havendo qualquer vício em sua vontade, uma vez que tinha pleno conhecimento sobre sexo, tendo em vista que afirmou em juízo que somente terminou o namoro com o recorrido porque ficou sabendo da sua infidelidade.4.Recurso conhecido e não provido. [55]

De acordo com recente pesquisa realizada pelo G1 a respeito da atuação do Poder Judiciário no que tange ao crime de estupro de vulneráveis, constatou-se que mesmo após a Lei n. 12.015/09 os tribunais têm absolvido os réus em caso de consentimento da vítima.

De um total de 46 acórdãos referentes a fatos ocorridos após a nova lei, houve absolvição de 8 réus sob o fundamento do consentimento das vítimas, que possuíam, à época, idade entre 12 e 13 anos. Em um desses precedentes, o acusado e a vítima mantinham relacionamento de namoro consentido pela própria família da vítima. [56]

Destaca-se, outrossim, que na prática é possível que o próprio representante do Ministério Público entenda pela atipicidade da conduta e requeira o arquivamento dos autos do inquérito policial ou a absolvição do acusado. Essa constatação é relevante, uma vez que atuando não apenas como parte, mas como fiscal da lei, o membro do Ministério Público possui independência funcional a fim de avaliar a existência da tipicidade formal e material da conduta objeto de apuração.

Porém, quando o próprio Ministério Público requer o arquivamento dos autos do inquérito policial ou a absolvição do acusado –  especialmente em se tratando de crimes contra a dignidade sexual, cujos processos estão em segredo de justiça – o julgamento não contribui para formação de jurisprudência sobre o tema, pela ausência de recurso a remeter os autos para a segunda instância. Em outros termos, o tema apenas enseja debate nos tribunais quando o representante do parquet firmou posicionamento pela tipicidade do delito independentemente das circunstâncias do caso concreto.

Nesse sentido, é possível concluir que o pretenso novo rigor do novo tipo penal não afastou a discussão doutrinária e jurisprudencial a respeito do tema, especialmente considerando a realidade social, que não pode ser ignorada pelos operadores do Direito.


3     A POSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL AO CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL

3.1 O PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL

O princípio da adequação social está intimamente relacionado com o princípio da intervenção mínima, segundo o qual a intromissão do Estado no âmbito do direito penal deve ocorrer na medida estritamente necessária a fim de preservar os bens mais importantes e necessários ao convívio em sociedade. [57]

 Destarte, no Estado Democrático de Direito, a liberdade individual é considerada um bem supremo, de forma que o poder-dever punitivo estatal no âmbito do direito penal deve buscar a preservação da dignidade da pessoa humana, por meio da proteção dos bens jurídicos mais relevantes. Isso porque o direito penal diz respeito à esfera de poder máximo estatal, correspondendo às mais graves sanções coercitivas à pessoa. Nesse sentido, Guilherme de Souza Nucci:

Fosse o Direito Penal a primeira opção do legislador para a composição de conflitos e mediação de interesses contrapostos e estar-se-ia vulgarizando a força estatal, privilegiando o império da brutalidade, pois a todos os erros seriam impostas reprimendas máximas. [58]

Portanto, a intervenção penal deve ocorrer apenas quando não for suficiente a atuação dos demais ramos do direito, ou seja, as infrações às normas jurídicas devem ser inicialmente coibidas por instrumentos jurídicos extrapenais, reservando-se a tutela penal à última instância (ultima ratio).

Nesse contexto, é possível identificar os princípios correlatos e paralelos ao princípio da intervenção mínima, quais sejam, os  princípios da subsidiariedade, da fragmentaridade e da ofensividade.

O princípio da subsidiariedade indica que o direito penal possui caráter subsidiário em relação aos demais ramos do ordenamento jurídico. O princípio da fragmentaridade estabelece que o direito penal constitui apenas um fragmento do ordenamento jurídico, interferindo na liberdade individual quanto às condutas infratoras mais graves. O princípio da ofensividade ou da lesividade, por sua vez, preconiza que a aplicação da lei penal apenas legitima-se quando a conduta infratora se volte, com eficiência, contra bem jurídico tutelado. [59]

O princípio da intervenção mínima, nas suas vertentes acima indicadas, constitui parâmetro a ser observado pelo legislador na escolha dos bens jurídicos a serem tutelados pelo direito penal, conforme esclarece Rogério Greco:

Na tarefa de proteção dos bens vitais e necessários ao convívio em sociedade, o legislador, encarregado da seleção desses bens, deve considerar como princípios norteadores da sua atividade a chamada intevenção mínima do Direito Penal, ressaltando-se a sua natureza subsidiária, bem como a lesividiade e a inadequação social do comportamento que se quer proibir ou impor sob a ameaça de uma sanção.[60]

O princípio da adequação social, elaborado por Hans Welsel, constitui uma causa supralegal de exclusão da tipicidade e sugere que a teoria do delito não pode se afastar da realidade social. Conforme relata Luiz Flávio Gomes, o mérito dessa construção doutrinária foi afastar a dogmática meramente positivista, cedendo espaço para a realidade social e privilegiando soluções justas para o caso concreto.

Com Welsel, então, pela primeira vez, vincula-se o sistema do fato punível com a realidade social e a hermenêutica. A consequência principal dessa conexão foi a construção de mais um critério delimitador do âmbito da normatividade do tipo penal por razões sociais (tradição, cultura, costumes de uma povo em determinado período histórico) ficam fora do âmbito do proibido (fora da literalidade dos tipos penais) algumas condutas até danosas mas só aparentemente típicas (leia-se: não materialmente típicas).[61]

De acordo com o princípio da adequação social, considerado regra interpretativa de cunho restritivo, condutas socialmente adequadas, embora formalmente típicas, devem ser excluídas da esfera de incidência do tipo penal, pela ausência de tipicidade material. [62]

A teoria da adequação social, concebida por Hans Welzel, significa que, apesar de uma conduta se subsumir formalmente ao modelo legal, não será considerada típica se for socialmente adequada ou reconhecida, isto é, se estiver de acordo com a ordem social da vida historicamente condicionada [...]. [63]

A tipicidade material envolve o desvalor da conduta e o desvalor do resultado, de forma que a conduta, além de subsumir formalmente ao tipo penal, deve efetivamente provocar uma lesão ao bem jurídico protegido. O princípio da adequação social afasta a tipicidade material em razão do desvalor do resultado, considerando-se questões de índole ético-sociais, jurídicas e políticas dominantes. [64]

Assim, apenas devem ingressar no âmbito do tipo penal as condutas socialmente inadequadas, entendidas como aquelas contrárias às concepções ético-sociais que inspiram uma determinada sociedade em um determinado momento histórico.[65] Ao revés, conduta conformada socialmente é aquela aceita pela sociedade como um comportamento ajustado à realidade social, diante do padrão normal de convivência.

Hans Welsel esclarece que “as condutas socialmente adequadas não são necessariamente exemplares, senão condutas que se mantêm dentro dos marcos da liberdade de ação social” [66].            Destarte, vincula-se à noção de conduta socialmente adequada o contexto histórico-social da vida de um povo.

As ações socialmente adequadas, portanto, pelas suas características, não contrastam com as exigências da vida social, num determinado momento histórico, ainda que possam apresentar uma aparente contrariedade com os preceitos de uma legislação penal. [67]

A análise da adequação social da conduta é relevante em razão do descompasso existente entre as normas penais incriminadoras e os comportamentos socialmente permitidos ou tolerados, de sorte que as condutas socialmente adequadas não se revestem de tipicidade material.[68]

É possível identificar nítida correlação entre o princípio da adequação social e o princípio da intervenção mínima, no sentido de que devem ser afastadas do âmbito da intervenção jurídico-penal determinadas hipóteses que não são desvaloradas do ponto de vista social, embora sejam relevantes para outros setores do ordenamento jurídico. [69]

Conforme explicita Rogério Greco, na tarefa de selecionar as condutas objeto de incidência do direito penal, o legislador deve identificar aquelas que ofendem os bens jurídicos mais relevantes e necessários para o convívio em sociedade, ao passo que deve evitar criminalizar condutas aceitas ou toleradas socialmente, sob pena de compelir a população à prática de crimes.

[…] estando a socidade acostumada a praticar determinados comportamentos, não mudaria a sua normal maneira de ser pelo simples fato do surgimento de uma lei penal que não teve a sensibilidade suficiente para discernir condutas inadequadas socialmente daquelas outras que não são toleradas pela sociedade. [70]

Impende salientar, ainda, a necessidade de revogação de tipos penais quando as condutas consideradas socialmente inadequadas no passado passarem a ser adequadas. “Enfim, o princípio da adequação social será de grande valia para que não sejam proibidas, impostas ou mesmo mantidas condutas que já estejam perfeitamente assimiladas pela sociedade.” [71]

Por outro lado, o princípio da adequação social possui uma importante função interpretadora dos tipos penais,”[…] abarcando concepções de cunho político, social e jurídico que influem diretamente na tutela dos bens protegidos pela norma.” [72]. A adoção do princípio da adequação social como princípio de interpretação conduz à atipicidade material do fato.

No presente estudo, defende-se a possibilidade da incidência do princípio da adequação social ao crime de estupro de vulnerável, quando a conduta formalmente típica corresponder a um comportamento ajustado à realidade social, inexistindo ofensa ao bem jurídico tutelado.

3.2  A INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA ADEQUAÇÃO SOCIAL NO CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL

Em relação ao crime de estupro de vulnerável, em muitos casos, embora a conduta seja formalmente típica, a ação não constitui ofensa ao bem jurídico protegido pela norma penal, não sendo possível, por conseguinte, considerá-la materialmente típica, tendo em vista a adequação social da conduta.

De acordo com o artigo 217-A do Código Penal pátrio, acrescentado pela Lei nº 12.015/09, ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (quatorze) anos constitui crime de estupro de vulnerável, punível com reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

Não obstante, o contexto social em que se caracteriza a conduta formalmente típica não pode ser ignorado pelos aplicadores do direito, que devem observar a efetiva lesão ao bem jurídico tutelado, sob pena de responsabilização objetiva, vedado pelo ordenamento jurídico pátrio.

A respeito da aplicação do princípio da adequação social ao delito de estupro de vulnerável, asseveram Júlia de Arruda Rodrigues, Larissa Ataide Cardoso, Lina Marie Cabral e Marina Dantas Pereira:

Essa tipificação atenta flagrantemente ao Princípio da Adequação Social, de modo que se encontra desvinculado da realidade social brasileira, pois é inegável que os jovens iniciam sua vida sexual cada vez mais cedo, nos dias atuais, sendo esta uma prática já inserida no contexto social com as transformações dos valores e costumes. [73]

Nesse contexto, é relevante destacar as mudanças no comportamento sexual do jovem brasileiro, com o intuito de avaliar a caracterização de ofensa ao bem jurídico tutelado pelo crime de estupro de vulnerável e o valor do consentimento do menor na prática do ato sexual.

3.2.1     A mudança no contexto sexual do jovem

Acompanhando os diversos acontecimentos e mudanças ocorridas no mundo nas últimas décadas, tais como a eclosão de guerras mundiais, a evolução da tecnologia e das ciências humanas, entre outras, o campo da liberdade sexual também sofreu transformações.

No campo social, político e familiar, observa-se que a mulher alcançou uma maior liberdade, a partir dos movimentos feministas, em que se pleiteou a igualdade de direitos em relação aos homens. A mulher deixou de ter um papel secundário na família, passando a ter igualdade de direitos nas decisões a respeito dos filhos, no exercício do pátrio poder e no próprio casamento.

Na vida social, a mulher inseriu-se no mercado de trabalho e passou a acumular as atividades domésticas – que, aliás, não são mais de responsabilidade exclusiva da mulher – com o exercício de atividade remunerada, alcançando postos reconhecidos. Na política, foi reconhecido o direito de voto às mulheres, que passaram a influir de forma decisiva nos rumos das decisões do país.

A juventude também foi atingida pelas transformações resultantes da explosão demográfica, industrialização, progresso técnico científico, de forma que seus ideais, pensamentos, atitudes, gostos e valores sofreram e sofrem constantes mutações, determinantes para a transformação da moralidade pública. [74]

A liberdade sexual também foi afetada pelas mudanças sociais, em que se observou o afastamento dos tabus impostos pela sociedade outrora extremamente moralista. Esse aspecto é bem abordado por Márcio Bartoli, que ressalta que o tema sexo tornou-se realidade presente na sociedade:

Mas, o assunto sexo, que, para alguns ainda continua sendo um verdadeiro tabu, é uma realidade presente na sociedade; presente na vida das pessoas, assunto que de um tempo para cá passou a ser tratado com a maior e a mais ampla liberdade, porque, é claro, se tudo mudou, a visão das pessoas sobre tal tema também se modernizou. […] [75]

A evolução da sociedade no campo da moralidade e sexualidade é caracterizada pelo aumento do diálogo a respeito do tema nas instituições sociais e pela facilidade do acesso à informação.

Nos meios de comunição, o tema é amplamente explorado, abandonando-se antigos preconceitos. O surgimento e a popularização da rede mundial de comunicação – internet – contribuiu para que as informações relativas ao sexo fossem rapidamente e eficientemente divulgadas.

Na família, as questões relativas à sexualidade também são discutidas com maior liberdade, uma vez que o tema sexo deixou de ser um assunto proibido e passou a ocupar posição de relevo na criação e educação dos filhos. Os pais possuem atuação essencial no sentido de propiciar um saudável desenvolvimento sexual orientando os filhos a respeito das primeiras experiências.

No âmbito educacional, o tema sexo passou a integrar o currículo escolar, sendo discutidos diversos assuntos nas instituições de ensino objetivando um desenvolvimento saudável da sexualidade, com responsabilidade. A principal preocupação é informar os jovens acerca dos riscos da prática de atos sexuais sem proteção, no que diz respeito às doenças sexualmente transmissíveis e à gravidez indesejada.

Por oportuno, destaca-se o seguinte trecho da obra de Tadeu Antônio Dix Silva, que sintetiza as referidas mudanças no âmbito sexual:

É mais do que claro que nos dias atuais não se pode mais afirmar que uma pessoa, no período da vida corresponde à pré-adolescência, continue, como em 1940, a ser uma insciente das coisas do sexo. Como antes mencionado, sexo, na atualidade, deixou de ser o tema preconceituoso e até ‘imoral’ de antigamente, para situar-se numa posição de grande destaque na família, onde é discutido livremente, até por questão de sobrevivência, em virtude de surgimento de uma moléstia letal; nas escolas, onde adquiriu o status de matéria curricular, e nos meios de comunicação de massa, onde se tornou assunto corriqueiro. [76]

Com efeito, o tema da sexualidade passou a ser debatido mais abertamente na sociedade, reconhecendo-se a liberdade sexual de homens e mulheres como aspecto relevante da própria dignidade humana. Confira-se a ponderação de Alessandra Orcesi Pedro Greco e João Daniel Rassi:

[...] a sexualidade é para o ser humano, uma manifestação positiva. A revolução sexual e a existência de uma sociedade mais permissiva provocaram uma mudança dos valores e atitudes em face do comportamento sexual e hoje percebe a sexualidade como uma das diversas possibilidades de manifestações de realização pessoal do ser humano. [77]

Em relação às crianças e adolescentes, merece realce a realização de estudos sobre a sexualidade infantil e juvenil. “A ciência médica, por si, e através de seus ramos da psiquiatria e psicologia, passou a cogitar da sexualidade infantil e juvenil, como sendo o início do processo de formação da capacidade de autodeterminação sexual.” [78]

Conforme ressalta Solange Azevedo, a mudança social no comportamento sexual do jovem brasileiro é patente e cada mais visível no decorrer das gerações. “Os jovens brasileiros estão cada vez mais distantes dos tabus sexuais das gerações passadas. Mais da metade deles não dá importância à virgindade. Em geral, transam cada vez mais cedo e veem a sexualidade de homens e mulheres em pé de igualdade.”[79]

Antigamente, explicam as pesquisadoras, os jovens tinham modelos do que era certo ou errado. Mas foram desconstruídos pelas gerações anteriores, com as conquistas dos movimentos feministas e da revolução sexual. Agora, eles encontram uma sociedade com possibilidades mais amplas e precisam encontrar sua posição individual dentro dela. [80]

Os métodos contraceptivos anteciparam a primeira relação sexual dos jovens, contribuindo para desvincular a prática sexual da finalidade meramente reprodutiva. Sem a preocupação com a gravidez indesejada, a mulher alcança a libertação de sua sexualidade. [81]

A partir das mudanças constatadas no comportamento sexual do jovem, é possível afirmar que o sentimento médio público do pudor e vergonha se transformou.

Entretanto, as mudanças nos padrões de comportamento dos jovens brasileiros não ocorrem de forma generalizada em todas as regiões do país, diferenciando-se conforme a classe social e os costumes prevalecentes. Os valores tradicionais coexistem com a nova visão da sexualidade, resultando em peculiaridades no comportamento sexual do jovem brasileiro. [82]

Ademais, a partir dos estudos que afirmam de forma categórica um momento de maior permissividade sexual, revela-se duvidosa a possibilidade de reverter o quadro social mediante o aumento do rigor da legislação penal, sendo mais adequado buscar interferir no processo a fim de fornecer orientação e evitar consequências indesejadas de um comportamento sexual liberal.[83]

3.2.2     Redução da idade da primeira relação sexual

A UNESCO fez um estudo no ano de 2004 em parceria com o Ministério da Saúde, denominado “Juventudes e Sexualidade”, com a participação de jovens estudantes de 13 capitais brasileiras (Belém, Cuiabá, Florianópolis, Fortaleza, Goiânia, Maceió, Manaus, Porto Alegre, Recife, Rio de Janeiro, Salvador, São Paulo e Vitória) e no Distrito Federal. [84]

O estudo abrange diversos aspectos da vida sexual dos jovens, incluindo-se a iniciação sexual. Os dados obtidos na pesquisa revelaram a queda na idade da primeira relação sexual na população brasileira.

A idade média da primeira relação sexual é significativamente mais baixa entre os alunos do sexo masculino do que entre as estudantes do sexo feminino. Os dados obtidos na pesquisa indicam que mais da metade dos jovens do sexo masculino iniciaram-se sexualmente na faixa entre 10 e 14 anos – em Manaus, cerca de 70% dos entrevistados; em Salvador, 68%; e em Belém, 66%. A proporção das jovens do sexo feminino que se iniciaram na mesma faixa etária é menor, embora ainda expressiva – em Porto Alegre, cerca de 39%; em Manaus, 36%; e em São Paulo, 34%.

No Distrito Federal, 61,6% dos indivíduos do sexo masculino e 21,9% do sexo feminino praticaram sua primeira relação sexual com menos de 14 anos, ou seja, 43,1% da população do Distrito Federal teve sua primeira relação com menos de 14 anos.

A sexualidade precoce das novas gerações é resultado de um conjunto de fatores, como a crise familiar, a liberdade cada vez maior dos jovens e a cultura da sensualidade existente no país. “A dificuldade dos pais em impor limites, a falta de orientação sexual eficiente nas escolas e uma cultura de massa extremamente erotizada são fortes estímulos” [85].

A pesquisa da UNESCO destacou que os jovens brasileiros sofrem pressão social quanto à iniciação sexual, relacionada com a construção da masculinidade, para que ocorra o mais rápido possível e mais intensamente. Por outro lado, as jovens brasileiras sofrem pressão social a fim de retardar o máximo possível a iniciação sexual. [86]

Considerando a redução da idade da primeira relação sexual pelos jovens brasileiros, é possível concluir que uma grande parte da população brasileira incide formalmente na prática do crime de estupro de vulnerável, considerado crime hediondo.

3.2.3     Gravidez na adolescência

Segundo o citado estudo da UNESCO, é considerável a porcentagem de gravidez na adolescência no Brasil. De acordo com o Relatório Mundial sobre População da ONU, o Brasil figura como um dos países que apresentam taxas acima da média mundial de gravidez na adolescência.

O percentual de jovens alunas de ensino fundamental e médio que afirmaram que já ficaram grávidas alguma vez é substancial em várias capitais brasileiras. Destaca-se que 33,3% de jovens de Fortaleza, 22,2% de Cuiabá e 20,0% de Manaus relataram que já engravidaram na faixa de 10 a 14 anos, correspondendo em números absolutos a 423, 669 e 567 alunas, respectivamente. No Distrito Federal, 14,2% das alunas do ensino fundamental e médio engravidaram na faixa etária entre os 10 e 14 anos. [87]

A pesquisa demonstrou que o aumento da porcentagem de adolescentes grávidas ocorreu em relação a todas as classes sociais, inclusive nas famílias mais favorecidas economicamente, com acesso a informação, orientação médica e anticoncepcionais. [88] Destacou, ainda, que embora se verifique uma queda geral da fecundidade na modernidade contemporânea, as taxas de fecundidade crescem entre as jovens, que estão gerando mais filhos do que as mulheres mais velhas. [89]

O aumento da gravidez na adolescência preocupa demógrafos e especialistas, tendo em vista a possível influência na vida reprodutiva futura, os problemas de saúde relacionados e o ônus para os serviços de saúde.

Nas regiões mais pobres do país, a gravidez na adolescência contribui para a perpetuação da pobreza, uma vez que a maior parte das adolescentes-mães ficam desempregadas. Não obstante, entre muitas jovens pobres a gravidez é considerada sinal de status, pois são mais respeitadas pela comunidade e obtêm liberdade para usufruir a sexualidade, embora ainda sustentadas pela família. Na classe média, a gravidez inesperada atrapalha os estudos, as perspectivas de carreira e de relacionamentos futuros. [90]

3.2.4     Os reflexos das mudanças sociais no direito penal

O momento histórico-cultural da sociedade deve ser observado pelo legislador, no momento de elaboração das normas jurídicas, bem assim pelo julgador, na tarefa de enquadrar o fato à norma. Em outros termos, as mudanças sociais devem influenciar o processo de criação e aplicação das normas jurídicas.

No âmbito do direito penal, o contexto social assume especial relevância no processo legislativo para a elaboração dos tipos penais, mormente considerando-se a relevância dos bens jurídicos tutelados e possibilidade de aplicação de pena privativa de liberdade.

Assim, a legislação penal deve refletir ao interesse social e a real necessidade da nação, bem assim as mudanças sociais propiciadas pela evolução social, pelo desenvolvimento científico e tecnológico, entre outros fatores, impondo-se a abolição ou a modificação do tipo penal que não seja condizente com a atual realidade da sociedade. Nesse sentido, expõe Adelina de Cássia Bastos Oliveira Cavalho:

Assim é que o legislador, para realizar a tipificação, tem que fazer criteriosa seleção dos comportamentos de inegável relevância social, não se esquecendo, também, de destipificar determinadas condutas, que, com o correr dos tempos, com o avanço cultural, científico-tecnológico, mutações de conceitos morais, de injusto, implementação de costumes, enfim, mudanças sociais em geral, passaram a ser aceitas e adequadas ao meio social, deixando, por esse motivo, de ser penalmente relevantes. [91]

Com efeito, a redução do limite etário da presunção de violência de 16 anos para 14 anos, estabelecida pelo Código Penal de 1940 em relação ao Código Penal de 1980 foi justificada pela necessidade de acompanhar as mudanças sociais da época, conforme expressamente disposto na exposição de motivos ao Projeto de 1940 (item 70):

[...] Com a redução do limite da idade, o projeto atende à evidência de um fato social contemporâneo, qual seja a precocidade no conhecimento dos fatos sexuais. O fundamento da ficção legal de violência, no caso dos adolescentes, é a innocentia consilli do sujeito passivo, ou seja, a sua completa insciência em relação aos fatos sexuais, de modo que não se pode dar valor algum ao seu consentimento. Ora, na época atual, seria abstrair hipocritamente a realidade ao negar-se que uma pessoa de 14 (quatorze) anos completos já tem uma noção teórica, bastante exata, dos segredos da vida sexual e do risco que corre se se presta à lascívia de outrem. [...] [92]

A discussão doutrinária e jurisprudencial acerca da relatividade da presunção de violência dos menores de 14 anos de idade também foi motivada pela necessidade de compatibilizar a norma penal em face das constantes mudanças sociais, conforme destacado alhures.

Porém, com o intuito de afastar a discussão e atribuir um maior rigor penal à conduta, o legislador promoveu a alteração na legislação por meio da Lei n. 12.015/09, incluindo o novo tipo penal denominado estupro de vulnerável (artigo 217-A do Código Penal), no qual a idade da vítima passou a ser elemento típico, consoante relata Plínio Gentil:

Não há como negar que o legislador, pretendendo o que pretendia, foi cuidadoso. Esmerou-se, para evitar a discussão sobre a eventual relatividade da presunção de violência, em definir a simples conjunção carnal ou o ato libidinoso com menor de catorze anos como crime, inclusive com o requinte de lhe dedicar uma redação diferente daquela adotada para a definição do crime de estupro simples [...] [93]

A alteração legislativa ignorou as mudanças sociais que ensejaram a construção doutrinária e jurisprudencial quanto à relatividade da presunção de violência. Porém, a compatibilização da norma penal à realidade social é impositiva, sob pena de criminalização de condutas que sequer representam ofensa ao bem jurídico protegido.

Nesse contexto, é possível concluir que a pretensão do legislador de evitar a discussão sobre a relatividade da presunção de violência ao considerar o limite de 14 anos de idade como elemento do tipo penal do crime de estupro de vulnerável, está em evidente conflito com a realidade social e por esse motivo não deve prevalecer.

3.2.5     O direito ao livre exercício da sexualidade pelo menor e a capacidade de consentimento na prática de atos sexuais

A sexualidade de crianças e adolescentes é comumente abordada pelo direito a partir de sua violação, especialmente quanto ao abuso e à exploração sexual, o que dificulta a aceitação e discussão, pela sociedade brasileira, de seu conteúdo afirmativo. [94]

O reconhecimento da sexualidade dos menores encontra obstáculos decorrentes de concepções morais e da prevalência dos interesses dos adultos. Nesse contexto, a legislação penal brasileira historicamente criminalizou condutas como crimes sexuais objetivando tutelar a moralidade prevalecente, negando-se a sexualidade infanto-juvenil.

Não obstante, diante das mudanças sociais, é imperioso avaliar a compatibilidade entre a idade fixada pelo legislador penal para a prática regular de atos sexuais e a liberdade autodeterminação sexual do menor.

A quantidade de informações, de esclarecimentos, de ensinamentos sobre o tema `sexo` flui rapidamente e sem fronteiras, dando às pessoas até com menos de 14 anos de idade, uma visão teórica da vida sexual possibilitando-a `rechaçar`as propostas e agressões que nessa área se produzem e uma consciência bem clara e nítida da disponibilidade do próprio corpo. [95]

A mudança da sociedade quanto à questão da sexualidade, dentre outros fatores sociais relevantes, indicam que para os adolescentes que já atingiram a maturidade quanto à matéria sexual, a repressão penal constitui um óbice para autodeterminação sexual. Sobre o tema, confira-se o entendimento de Adelina de Cássia Bastos Oliveira Carvalho:

A subtração ao adolescente que tenha consciência ética do ato sexual do direito de exercer sua sexualidade, por não ter ainda alcançado a idade fixada por lei para tanto, por imposição de concepções morais dominantes na sociedade, é meio de cerceamento do direito constitucional de liberdade.[96]

É importante ressaltar que a proteção penal das crianças e dos adolescentes nos crimes sexuais apenas possui respaldo constitucional e legal quando se tratar de situação de abuso, violência ou exploração sexual (Artigo 227, §4º, da Constituição Federal e artigos 4º e 5º do Estatuto da Criança e do Adolescente).

Embora a proibição do exercício da sexualidade das crianças e dos adolescentes possua seu fundamento na proteção do desenvolvimento regular da sexualidade, nem sempre o exercício da sexualidade pelo menor de 14 anos caracteriza-se como situação de abuso ou violência.

Ademais, a proteção ao desenvolvimento da sexualidade das crianças e adolescentes não significa necessariamente enquadrar o seu exercício como conduta a ser reprimida pelo direito penal, sendo cabíveis outras espécies de intervenção, incluindo-se o acompanhamento e a orientação. [97]

Deve-se reconhecer, assim, que o menor possui direito ao livre exercício da sexualidade, ou seja, ainda que não tenham atingido a idade prevista na norma penal, podem descobrir e desenvolver sua sexualidade por meio de práticas sexuais saudáveis, desde que possuam capacidade de compreensão. Conforme destaca Fabio Agne Fayet, deve-se destacar as situações de abuso sexual e o normal desenvolvimento da sexualidade do menor:

 [...] Destarte, nos parece mais aceitável e adequado aos tempos em que vivemos a norma punir com todo o seu rigor o sujeito que abusa sexualmente de indivíduo menor de catorze anos, não impedindo que o mesmo, consciente do ato e suas consequências, possa descobrir e desenvolver sua sexualidade.[98]

Portanto, é possível reconhecer a relevância do consentimento do adolescente à prática sexual quando inexistente a ofensa ao bem jurídico protegido, ou seja, quando caracterizada a capacidade de autodeterminação do menor na esfera da sexualidade. A respeito da capacidade de consentimento do menor à prática do ato sexual, confira-se a lição de Adelina de Cássia Bastos Oliveira Carvalho:

[...] No campo penal sexual; a capacidade de consentimento do menor refere-se ao momento em que o mesmo adquire capacidade para decidir, com liberdade, sua vida sexual, passa a contar com amadurecimento biológico (emocional, social, cognitivo) e fisiológico para assimilar a prática sexual, tornando-se válida a sua anuência para a relação carnal.[99]

Com efeito, o ordenamento jurídico veda o abuso sexual de crianças e adolescentes, de forma que a limitação à liberdade sexual do menor apenas é possível quando caracterizar um ataque à sua dignidade ou ao seu livre desenvolvimento, o que não pode ser valorado de forma genérica. [100]

Dessa forma, na hipótese de ausência de lesão à dignidade sexual, a caracterização do tipo penal deve ser afastada em razão da atipicidade material da conduta.

3.2.6     Incidência do princípio da adequação social: parâmetros de aplicação

Em várias hipóteses a conduta formalmente caracterizada como crime de estupro de vulnerável não ofende efetivamente o bem jurídico tutelado pela norma penal, tendo em vista a adequação social da conduta.

Quanto à possibilidade de se afastar a tipicidade do crime de estupro de vulnerável em face do princípio da adequação social, é necessário prevenir-se do indesejado subjetivismo exacerbado do julgador, mormente considerando-se que o tema está sujeito a controvérsias moralistas.

Por outro lado, é inegável a importância da análise do julgador em face do caso concreto, tendo em vista a impossibilidade do legislador de prever para todas as situações a capacidade do ofendido para consentir com a prática sexual. Na aplicação da lei, o juiz deverá avaliar com cautela e prudência a caracterização da tipicidade material do delito, em consonância com as mudanças sociais. Quanto ao papel do aplicador do direito no processo de interpretação da lei, Adelina de Cássia Bastos Oliveira Carvalho destaca:

Com efeito, o intérprete da lei não pode permanecer atrelado a um legalismo exacerbado e formal, que circunda o tradicionalismo jurídico, sob pena de gerar uma prestação jurisdicional ineficaz. Deve, sim, adotar uma postura flexível, de compromisso com a realidade social e a justiça.[101]

Assim, se de um lado não se pode desprezar a capacidade volitiva dos menores em todo e qualquer caso, é necessário estabelecer parâmetros razoáveis e proporcionais de aplicação do referido princípio, a fim de orientar a análise e a decisão do julgador.

De início, destaca-se que a possibilidade de se afastar a tipicidade penal do crime de estupro de vulnerável limita-se aos casos em que a vítima adolescente, embora menor de 14 (quatorze) anos, é maior de 12 (doze) anos. Esse entendimento encontra respaldo legal no Estatuto da Criança e do Adolescente, que diferencia criança (pessoa até 12 anos incompletos) de adolescente (pessoa entre 12 e 18 anos), atribuindo ao segundo certa capacidade de discernimento e de determinação. [102]

Portanto, considerando que o menor de 12 (doze) anos é criança, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente, sua proteção penal quanto ao domínio da sexualidade deve ser considerada absoluta, conforme defendem Alessandra Orcesi Pedro Greco e João Daniel Rassi:

Assim, a elementar da idade da vítima não é absoluta quando se estiver diante de um menor entre 12 e 14 anos, caso em que sua vulnerabilidade será constatada no caso concreto [...]. No entanto, em se tratando de menor de 12 anos, mantém a presunção de vulnerabilidade, jure et de jure, havendo a tipicidade. [103]

Para aferir se o comportamento do agente é adequado socialmente, é necessário levar em consideração os usos e costumes da população, na época e local em que ocorreu a conduta, investigando-se o sentimento da maioria da sociedade a respeito da capacidade de autodeterminação do adolescente na esfera da sexualidade.

Destarte, deve-se levar em consideração para a tipicidade material do crime de estupro de vulnerável aspectos sociais como a idade média da primeira relação sexual da população, o comportamento sexual dos adolescentes no contexto social em que a vítima vive, entre outros.

Deve-se, ainda, verificar aspectos individuais relativos ao caso concreto, a saber: o consentimento do ofendido, o contexto de relação de afeto, o conhecimento e a aceitação do relacionamento pela família da vítima, o nascimento de filhos, entre outros.

Nas hipóteses em que o adolescente tomar a iniciativa ou a provocação do ato sexual ou aderir prontamente ao convite de caratér sexual dirigido pelo agente, o consentimento deve ser levado em consideração, uma vez que a princípio é possível afastar a caracterização de abuso ou violência. [104]

Porém, o consentimento do ofendido, embora de especial relevância, não deve permitir, por si só, o afastamento da tipicidade da conduta, devendo ser analisados outros aspectos que, em conjunto, permitam concluir pela capacidade de autodeterminação da vítima na esfera da sexualidade. “Em suma, na aplicação da nova lei, deve o julgador verificar com espero se houve realmente um estupro ou apenas um inocente namoro” [105].

É necessário, outrossim, tomar precauções para não invadir a esfera de intimidade da vítima, sob pena de impor um verdadeiro julgamento a respeito de sua pessoa, seu comportamento e vida pregressa.[106] Dessa forma, embora seja necessário avaliar a conduta da vítima no caso concreto, deve-se evitar provocar uma vitimização secundária.

Nos casos em que do relacionamento sexual com menor de 14 anos decorre gravidez, além da discussão acerca da validade do consentimento da vítima, há outras questões a serem enfrentadas. Em primeiro lugar, deve-se verificar se o suposto agressor oferece apoio material e moral à vítima e ao filho em comum. Isso porque o artigo 229 da Constituição Federal preconiza a necessidade de assistência por parte do pai, que se tornaria impossibilitada caso o autor fosse condenado a pena privativa de liberdade.

Além disso, o artigo 226 da Carta Magna é categórico ao afirmar que a família é a base da sociedade e tem especial proteção ao Estado. Ainda que a vítima seja adolescente, se há relacionamento estável com o consentimento da família, dar ensejo à ação penal pode implicar a desconstituição da harmonia familiar pelo próprio Estado. Esse entendimento independe, outrossim, de casamento entre autor e vítima, uma vez que o §4º do mesmo artigo garante o direito à entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.

Ademais, os oficiais de registro, diante do dever de comunicar às autoridades a possível ocorrência de crime, são compelidos a levar a conhecimento das autoridades competentes qualquer registro de nascimento cuja mãe tenha idade inferior ou igual a 14 anos, em razão da descrição típica do crime de estupro de vulnerável.

Nessas situações, a aplicação irrestrita do artigo 217-A do Código Penal, além de inconstitucional, também é passível de gerar uma consequência social negativa, qual seja, a falta de registro de paternidade nas hipóteses que, em tese, se subsumiriam ao crime, em razão da natural resistência dos pais de assumirem a paternidade.

Assim, a questão da caracterização do delito em casos de gravidez da vítima deve ser avaliada pelo julgador com especial cuidado, buscando-se harmonizar os bens jurídicos envolvidos.

Por fim, é relevante ressaltar que ainda que o comportamento não atinja o bem jurídico penalmente tutelado, caracterizando a atipicidade material, não significa que deva ser incentivado. É necessária e relevante a atuação integrada do governo, da família e da própria sociedade no sentido de desestimular a atividade sexual precoce e informar os jovens acerca dos riscos e da necessidade de prevenção, para que exerçam sua sexualidade com responsabilidade.


CONCLUSÃO

Avaliar a possibilidade de considerar a atipicidade do crime de estupro de vulnerável em face de princípios implícitos no ordenamento jurídico é um desafio. Na doutrina e na jurisprudência a discussão a respeito do tema não revela a existência de uma posição pacífica, principalmente diante da forte incidência da moral social e da dificuldade de conciliar a proteção ao desenvolvimento livre da personalidade sexual das crianças e adolescentes com o direito à autodeterminação sexual do menor.

A proteção penal dos menores no âmbito dos crimes sexuais objetiva a tutela da dignidade sexual e, especificamente, do livre desenvolvimento da personalidade sexual. Portanto, considera-se que os indivíduos abaixo de determinada idade definida pelo legislador não possuem capacidade para validade consentir à prática da relação sexual, diante da imposibilidade de compreensão do ato praticado.

Não obstante, a fixação de limite etário como marco da aquisição da capacidade de autodeterminação sexual da pessoa incorre em uma indevida generalização, tendo em vista a interferência de diversos fatores pessoais, culturais, éticos e sociais para o alcance da liberdade sexual de cada indivíduo, que ocorre mediante um processo dinânimo e gradativo.

A presunção de violência prevista no revogado artigo 224 do Código Penal para os menores de quatorze anos gerou uma polêmica doutrinária e jurisprudencial quanto à sua natureza, se absoluta ou relativa. Há, ainda, autores que defendiam a inconstitucionalidade desse dispositivo, por ofensa aos princípios da presunção de violência, da ampla defesa e ao contraditório, da responsabilidade pessoal, entre outros.

A teoria absoluta, embasada em um positivismo legalista, não admitia afastar a presunção de violência por prova em contrário, pela impossibilidade de concessão quanto à liberdade sexual da criança e do adolescente. A teoria relativa, por sua vez, preconiza que a presunção de violência pode ser afastada no caso concreto, admitindo-se a validade do consentimento do menor à prática do ato sexual quando constatado o discernimento ou experiência no âmbito sexual.

Com o advento do novo tipo penal estupro de vulnerável (artigo 217-A do Código Penal), acrescentado na reforma penal promovida pela Lei n. 12.015/09, a idade do menor de quatorze anos passou a ser elemento da conduta típica. Diante da alteração legislativa, parte da doutrina entende encerrada a discussão e caracterizado o crime de estupro de vulnerável desde que a vítima possua idade inferior ao limite legal, sendo irrelevantes circunstâncias do caso concreto.

Não obstante, a despeito da mudança legislativa, a discussão permanece, embora com outra roupagem, pois permaneceu o mesmo enunciado incriminador, apenas substituindo-se a presunção de violência pela condição de vulnerável da vítima. Destarte, não é possível desconsiderar a realidade social e o escopo da norma penal, de proteger a evolução e o desenvolvimento normal da personalidade do menor.

Ademais, apesar da intenção do legislador de impedir a discussão sobre a relatividade da presunção de violência, é certo que toda lei está sujeita a interpretação no momento de sua aplicação, em que concorrem outros elementos na análise do caso concreto, afastando-se sua pretensa clareza. De fato, as primeiras decisões dos Tribunais a respeito do tema indicam que mesmo depois da nova lei em determinados casos o consentimento da vítima de estupro de vulnerável constituiu fundamento para a absolvição do acusado.

É possível a incidência do princípio da adequação social ao crime de estupro de vulnerável, avaliado sob uma pespectiva constitucional, quando a conduta formalmente típica corresponder a um comportamento ajustado à realidade social, inexistindo ofensa ao bem jurídico tutelado.

O princípio da adequação social, elaborado por Hans Welsel, serve de orientação ao legislador para a criação ou revogação dos tipos penais, assim como de instrumento de interpretação dos tipos penais, permitindo o afastamento da tipicidade diante da conformação social da conduta. Destarte, embora formalmente típicas, as condutas socialmente adequadas devem ser excluídas da esfera de incidência do tipo penal, pela ausência de tipicidade material.

Nesse contexto, as mudanças no comportamento sexual do jovem brasileiro afetam a caracterização de ofensa ao bem jurídico tutelado pelo crime de estupro de vulnerável e o valor do consentimento do menor na prática do ato sexual.

A evolução da sociedade no campo da moralidade e sexualidade é caracterizada pelo aumento do diálogo a respeito do tema nas instituições sociais e pela facilidade do acesso à informação. Nos meios de comunicação, o tema é amplamente explorado, abandonando-se antigos preconceitos. Na família, as questões relativas à sexualidade também são discutidas com maior liberdade, deixando de ser um assunto proibido e passou a ocupar posição de relevo na criação e educação dos filhos. No âmbito educacional, o tema sexo atualmente integra o currículo escolar, e os jovens são constantemente informados acerca de doenças sexualmente transmissíveis e gravidez indesejada.

Com efeito, o tema da sexualidade passou a ser debatido mais abertamente na sociedade, reconhecendo-se a liberdade sexual de homens e mulheres como aspecto relevante da própria dignidade humana. Em relação às crianças e adolescentes, estudos revelam a sexualidade intantil e juvenil como relevante para a formação da capacidade de autodeterminação sexual.

De acordo com o estudo “Juventudes e Sexualidade”, realizado pela UNESCO denominado, verificou-se a queda na idade da primeira relação sexual na população brasileira, bem assim o aumento da ocorrência de gravidez na adolescência, em todas as classes sociais.

O momento histórico-cultural da sociedade deve ser observado pelo legislador, no momento de elaboração das normas jurídicas, bem assim pelo julgador, na tarefa de enquadrar o fato à norma. A compatibilização da norma penal à realidade social é impositiva, sob pena de criminalização de condutas que sequer representam ofensa ao bem jurídico protegido.

A partir dos estudos que afirmam de forma categórica um momento de maior permissividade sexual, revela-se duvidosa a possibilidade de reverter o quadro social mediante o aumento do rigor da legislação penal, sendo mais adequado buscar interferir no processo a fim de fornecer orientação e evitar consequências indesejadas de um comportamento sexual liberal.

A sexualidade de crianças e adolescentes é comumente abordada pelo direito a partir de sua violação, especialmente quanto ao abuso e à exploração sexual, o que dificulta a aceitação e discussão, pela sociedade brasileira, de seu conteúdo afirmativo. A legislação penal brasileira historicamente criminalizou condutas como crimes sexuais objetivando tutelar a moralidade prevalecente, negando-se a sexualidade infanto-juvenil.

Embora a proibição do exercício da sexualidade das crianças e dos adolescentes possua seu fundamento na proteção do desenvolvimento regular da sexualidade, nem sempre o exercício da sexualidade pelo menor de 14 anos caracteriza-se como situação de abuso ou violência. Deve-se reconhecer, assim, que o menor possui direito ao livre exercício da sexualidade, ou seja, ainda que não tenham atingido a idade prevista na norma penal, podem descobrir e desenvolver sua sexualidade por meio de práticas sexuais saudáveis, desde que possuam capacidade de compreensão.

Portanto, nos casos em que o adolescente possui discernimento para decidir pela prática de ato sexual, sem ofensa à sua dignidade, inexiste violação ao bem jurídico tutelado e a disposição penal atua como circunstância repressora do exercício da sexualidade. Nesse particular, observa-se cabível considerar o valor do consentimento do menor na prática do ato sexual.

Quanto à possibilidade de se afastar a tipicidade do crime de estupro de vulnerável em face do princípio da adequação social, é necessário prevenir-se do indesejado subjetivismo do julgador. Por outro lado, é inegável a importância da análise do caso concreto pelo julgador, que deverá avaliar com cautela e prudência a caracterização da tipicidade material do delito, em consonância com as mudanças sociais.

Para aferir se o comportamento do agente é adequado socialmente, é necessário levar em consideração os usos e costumes da população, na época e local em que ocorreu a conduta, investigando-se o sentimento da maioria da sociedade a respeito da capacidade de autodeterminação do adolescente na esfera da sexualidade.

Ademais, ainda que no caso concreto se afaste a intervenção do direito penal, é necessária e relevante a atuação integrada do governo, da família e da própria sociedade no sentido de desestimular a atividade sexual precoce e informar os jovens acerca dos riscos e da necessidade de prevenção, para que exerçam sua sexualidade com responsabilidade.

Não se busca com o presente trabalho uma solução definitiva, tampouco esgotar todos os aspectos relativos ao tema. Ao revés, procura-se incentivar uma maior reflexão a respeito, criando espaços para futuros questionamentos e indagações, sempre visando alcançar decisões justas e coerentes com o ordenamento jurídico pátrio e o contexto social.


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Notas

[1] NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a Dignidade Sexual: Comentários à Lei 12.015/2009. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 33-34.

[2] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 23.

[3] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 24.

[4] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 26.

[5] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 26-27.

[6] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 25.

[7] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 25.

[8] FUHRER, Maximiliano Roberto Ernesto. Novos crimes sexuais. São Paulo: Malheiros editores, 2009, p. 175.

[9] FAYET, Fabio Agne. O delito de estupro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011, p. 41.

[10] GRECO, Alessandra Orcesi Pedro; RASSI, João Daniel. Crimes contra a Dignidade Sexual. São Paulo: Atlas, 2010, p. 33-34.

[11] NATSCHERADETZ, apud GRECO, Alessandra Orcesi Pedro; RASSI, João Daniel. Crimes contra a Dignidade Sexual. São Paulo: Atlas, 2010, p. 54-55.

[12] GRECO, Alessandra Orcesi Pedro; RASSI, João Daniel. Crimes contra a Dignidade Sexual. São Paulo: Atlas, 2010, p. 59.

[13] ALEIXO, Klelia Canabrava. Problematizações sobre o estupro de vulnerável em face do princípio da proteção integral. In: Boletim IBCCRIM, ano 17, n. 209, p. 8-9, abril 2010, p. 8.

[14] NETTO, Alamiro Velludo Salvador. Estupro bilateral: um exemplo limite. Boletim IBCCRIM: São Paulo, ano 17, n. 202, p. 8-9, set. 2009, p. 8.

[15] COSTA, Álvaro Mayrink da. Breves apontamentos sobre a reforma dos crimes contra a dignidade sexual da pessoa humana. In: Revista da EMERJ, v. 13, n. 49, p. 29-50. 2010,  p. 40

[16] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte especial. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2011 (v. 4), p. 93.

[17] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 43.

[18] GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. 6ª ed. Niterói/RJ: Impetus, 2012, p. 692.

[19] FUHRER, Maximiliano Roberto Ernesto. Novos crimes sexuais. São Paulo: Malheiros editores, 2009, p. 177.

[20] FAYET, Fabio Agne. O delito de estupro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011, p. 88-89.

[21] GRECO, Alessandra Orcesi Pedro; RASSI, João Daniel. Crimes contra a Dignidade Sexual. São Paulo: Atlas, 2010, p. 151.

[22] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte especial. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2011 (v. 4), p. 94.

[23] FAYET, Fabio Agne. O delito de estupro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011, p. 90.

[24] GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. 6ª ed. Niterói/RJ: Impetus, 2012, p. 692.

[25] FUHRER, Maximiliano Roberto Ernesto. Novos crimes sexuais. São Paulo: Malheiros editores, 2009, p. 177.

[26] NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a Dignidade Sexual: Comentários à Lei 12.015/2009. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 38.

[27] GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. 6ª ed. Niterói/RJ: Impetus, 2012, p. 689.

[28] GRECO, Alessandra Orcesi Pedro; RASSI, João Daniel. Crimes contra a Dignidade Sexual. São Paulo: Atlas, 2010, p. 151.

[29] FAYET, Fabio Agne. O delito de estupro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011, p. 90.

[30] FUHRER, Maximiliano Roberto Ernesto. Novos crimes sexuais. São Paulo: Malheiros editores, 2009, p. 179.

[31] NETTO, Alamiro Velludo Salvador. Estupro bilateral: um exemplo limite. Boletim IBCCRIM: São Paulo, ano 17, n. 202, p. 8-9, set. 2009, p. 9.

[32] MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal. 24 ed. São Paulo: Atlas, 2006. (v. 2: parte especial, Arts. 121 a 234-B do CP), p. 444.

[33] SILVA, Tadeu Antônio Dix. Crimes sexuais: reflexões sobre a nova Lei nº 11.106/2005. Leme: J. H. Mizuno, 2006, p. 226.

[34] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 28.

[35] SILVA, Tadeu Antônio Dix. Crimes sexuais: reflexões sobre a nova Lei nº 11.106/2005. Leme: J. H. Mizuno, 2006, p. 228.

[36] GRECO, Alessandra Orcesi Pedro; RASSI, João Daniel. Crimes contra a Dignidade Sexual. São Paulo: Atlas, 2010, p. 102.

[37] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 17.

[38] MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal, volume 2: parte especial, Arts. 121 a 234-B do CP. 24. ed. São Paulo: Atlas, 2006, p. 444-445.

[39] NETTO, Alamiro Velludo Salvador. Estupro bilateral: um exemplo limite. Boletim IBCCRIM: São Paulo, ano 17, n. 202, p. 8-9, set. 2009, p. 08.

[40] SILVA, Tadeu Antônio Dix. Crimes sexuais: reflexões sobre a nova Lei nº 11.106/2005. Leme: J. H. Mizuno, 2006, p. 228.

[41] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 132-133.

[42] BRASIL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp 1184236/TO, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 07/12/2010, Diário de Justiça Eletrônico, 17 dez. 2010.

[43] BRASIL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. REsp 637.361/SC, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEXTA TURMA, julgado em 01/06/2010, Diário de Justiça Eletrônico, 28 jun. 2010.

[44] BRASIL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. EREsp 1021634/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23 nov. 2011, Diário de Justiça Eletrônico, 23 mar. 2012.

[45] BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. HC 105558, Rel. Min. ROSA WEBER, Primeira Turma, julgado em 22 maio 2012, Diário de Justiça Eletrônico, 11 jun. 2012.

[46] MARCÃO, Renato; GENTIL, Plínio. Crimes contra a dignidade sexual: comentários ao Título VI do Código Penal. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 186.

[47] LEAL, João José; LEAL, Rodrigo José. Novo tipo penal unificado de estupro comum e a figura do estupro de pessoa vulnerável. In: Revista IOB de direito penal e processual penal, v. 10, n. 58, p. 17-42, out./nov. 2009, p. 29/30.

[48] RODRIGUES, Júlia de Arruda; CARDOSO, Larissa Ataide; CABRAL, Lina Marie; PEREIRA, Marina Dantas. O novo tipo penal estupro de vulnerável e suas repercussões em nossa sistemática jurídica. In: http://jus.com.br/revista/texto/13908/o-novo-tipo-penal-estupro-de-vulneravel-e-suas-repercussoes-em-nossa-sistematica-juridica#ixzz28Y88h1ta. Acesso em: 06 out. 2012.

[49] MIRABETE, Julio Fabbrini; FABBRINI, Renato N. Manual de direito penal. 28 ed. São Paulo: Atlas, 2011. (v. 2: parte especial, Arts. 121 a 234-B do CP), p. 408.

[50] NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a Dignidade Sexual: Comentários à Lei 12.015/2009. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 37.

[51] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte especial. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2011 (v. 4), p. 95.

[52] GENTIL, Plínio. Estupro de vulnerável consentido: uma absolvição polêmica. In: Revista Magister: Direito Penal e Processual Penal, ano VIII, n. 45, p. 65-70, dez./jan. 2012, p. 67.

[53] BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte especial. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2011 (v. 4), p. 96.

[54] BRASIL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS. Acórdão n. 572753, 20100112278836APR, Relator MARIO MACHADO, 1ª Turma Criminal, julgado em 12 mar. 2012, Diário de Justiça, 23 mar. 2012, p. 200.

[55] BRASIL. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL E TERRITÓRIOS. Acórdão n. 542075, 20100310073825APR, Relator CESAR LABOISSIERE LOYOLA, 1ª Turma Criminal, julgado em 11 out. 2011, Diário de Justiça, 19 out. 2011, p. 202.

[56] D’AGOSTINO, Rosane. Tribunais absolvem acusados de sexo com menor, apesar de nova lei. G1, São Paulo. 20 maio 2012. Disponível em: < http://g1.globo.com/brasil/noticia/2012/05/tribunais-absolvem-acusados-de-sexo-com-menor-apesar-de-nova-lei.html.> Acesso em: 15/07/2012.

[57] GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio: uma visão minimalista do Direito Penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2009, p. 62-63.

[58] NUCCI, Guilherme de Souza. Princípios Constitucionais penais e processuais penais. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 191.

[59] NUCCI, Guilherme de Souza. Princípios Constitucionais penais e processuais penais. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012, p. 191-193.

[60] GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio: uma visão minimalista do Direito Penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2009, p. 68.

[61] GOMES, Luis Flávio. Princípio da insignificância e outras excludentes de tipicidade. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 164-165.

[62] REIS, André Wagner. O princípio da adequação social no direito penal. In: Revista de estudos criminais, v. 7, n. 27, p. 217-223, out./dez. 2007, p. 218.

[63] PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. (v. 1: parte geral, arts. 1º ao 120), p. 143-144.

[64] PRADO, Luiz Regis. Adequação social e risco permitido: aspectos conceituais e delimitativos. In: Revista dos tribunais, v. 95, n. 844, p. 435-431, fev. 2006, p. 438.

[65] PRADO, Luiz Regis. Adequação social e risco permitido: aspectos conceituais e delimitativos. In: Revista dos tribunais, v. 95, n. 844, p. 435-431, fev. 2006, p. 435.

[66] WELSEL, apud PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 6. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. (v. 1: parte geral, arts. 1º ao 120), p. 144.

[67] PIERANGELLI, José Henrique. O consentimento do ofendido na teoria do delito. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989, p. 39.

[68] BITENCOURT. Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral, 1. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 55.

[69] PRADO, Luiz Regis. Adequação social e risco permitido: aspectos conceituais e delimitativos. In: Revista dos tribunais, v. 95, n. 844, p. 435-431, fev. 2006, p. 436.

[70] GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio: uma visão minimalista do Direito Penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2009, p. 82.

[71] GRECO, Rogério. Direito Penal do Equilíbrio: uma visão minimalista do Direito Penal. 4. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2009, p. 83.

[72] SOUZA, Ricardo Antonio de; AMORIM, Tathiana de Melo Lessa. Delineamentos sobre o risco permitido e a adequação social. In: Consulex: revista jurídica, v. 12, n. 276, p. 57-58, jul. 2008, p. 58.

[73] RODRIGUES, Júlia de Arruda; CARDOSO, Larissa Ataide; CABRAL, Lina Marie; PEREIRA, Marina Dantas. O novo tipo penal estupro de vulnerável e suas repercussões em nossa sistemática jurídica. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/13908/o-novo-tipo-penal-estupro-de-vulneravel-e-suas-repercussoes-em-nossa-sistematica-juridica#ixzz28Y88h1ta.> Acesso em: 06 out. 2012.

[74] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 132-133, p . 90.

[75] BARTOLI, Marcio. A capacidadede autodeterminação sexual da vítima como causa de relativizaçãoda presunção de violencia. In: Revista dos Tribunais, n. 678, p. 410-413, abr. 1992, p. 410.

[76] SILVA, Tadeu Antônio Dix. Crimes sexuais: reflexões sobre a nova Lei nº 11.106/2005. Leme: J. H. Mizuno, 2006, p. 231.

[77] GRECO, Alessandra Orcesi Pedro; RASSI, João Daniel. Crimes contra a Dignidade Sexual. São Paulo: Atlas, 2010, p. 58.

[78] BARTOLI, Marcio. A capacidadede autodeterminação sexual da vítima como causa de relativizaçãoda presunção de violencia. In: Revista dos Tribunais, n. 678, p. 410-413, abr. 1992, p. 410.

[79] AZEVEDO, Solange. Sexo na cabeça. In: Época, n. 303, p. 46-51, 8 mar.  2004, p. 46.

[80] AZEVEDO, Solange. Sexo na cabeça. In: Época, n. 303, p. 46-51, 8 mar.  2004, p. 51.

[81] FUHRER, Maximiliano Roberto Ernesto. Novos crimes sexuais. São Paulo: Malheiros editores, 2009, p. 102.

[82] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 132-133, p . 96-97.

[83] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 132-133, p . 93.

[84] ABRAMOVAY, MIRIAM; CASTRO, Mary Garcia; SILVA, Lorena Bernadete da Silva. Brasília: UNESCO Brasil, 2004. Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001339/133977por.pdf>. Acesso em: 27 jul. 2012.

[85] FRUTUOSO, Suzane. Sexo cada vez mais cedo. In: Isto é, v. 32, n. 2056, p.  58-63, 8 abr. 2009, p. 61.

[86] ABRAMOVAY, MIRIAM; CASTRO, Mary Garcia; SILVA, Lorena Bernadete da Silva. Brasília: UNESCO Brasil, 2004, p. 73-74. Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001339/133977por.pdf>. Acesso em: 27 jul. 2012.

[87] ABRAMOVAY, MIRIAM; CASTRO, Mary Garcia; SILVA, Lorena Bernadete da Silva. Brasília: UNESCO Brasil, 2004, p. 140. Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001339/133977por.pdf>. Acesso em: 27 jul. 2012.

[88] COTES, Paloma; ARANHA, Carla; BARBI, Daniela. Mães antes da hora. In: Época, n. 303, p. 54-59, 8 mar.  2004.

[89] ABRAMOVAY, MIRIAM; CASTRO, Mary Garcia; SILVA, Lorena Bernadete da Silva. Brasília: UNESCO Brasil, 2004, p. 133. Disponível em: <http://unesdoc.unesco.org/images/0013/001339/133977por.pdf>. Acesso em: 27 jul. 2012.

[90] COTES, Paloma; ARANHA, Carla; BARBI, Daniela. Mães antes da hora. In: Época, n. 303, p. 54-59, 8 mar.  2004.

[91] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 132-133, p . 88.

[92] BRASIL, Exposição de Motivos da Parte Especial do Código Penal, item 70. Vade Mecum. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 500.

[93] GENTIL, Plínio. Estupro de vulnerável consentido: uma absolvição polêmica. In: Revista Magister: Direito Penal e Processual Penal, ano VIII, n. 45, p. 65-70, dez./jan. 2012, p. 67.

[94] ALEIXO, Klelia Canabrava. Problematizações sobre o estupro de vulnerável em face do princípio da proteção integral. In: Boletim IBCCRIM, ano 17, n. 209, abril 2010, p. 8.

[95] BARTOLI, Marcio. A capacidadede autodeterminação sexual da vítima como causa de relativizaçãoda presunção de violencia. In: Revista dos Tribunais, n. 678, p. 410-413, abr. 1992, p. 412.

[96] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 132-133, p . 17.

[97] ALEIXO, Klelia Canabrava. Problematizações sobre o estupro de vulnerável em face do princípio da proteção integral. In: Boletim IBCCRIM, ano 17, n. 209, abril 2010, p. 9.

[98] FAYET, Fabio Agne. O delito de estupro. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2011, p. 93

[99] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 132-133, p . 99-100.

[100] GRECO, Alessandra Orcesi Pedro; RASSI, João Daniel. Crimes contra a Dignidade Sexual. São Paulo: Atlas, 2010, p. 67.

[101] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 132-133, p . 39.

[102] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 132-133, p . 101.

[103] GRECO, Alessandra Orcesi Pedro; RASSI, João Daniel. Crimes contra a Dignidade Sexual. São Paulo: Atlas, 2010, p. 103.

[104] BARTOLI, Marcio. A capacidadede autodeterminação sexual da vítima como causa de relativizaçãoda presunção de violencia. In: Revista dos Tribunais, n. 678, p. 410-413, abr. 1992, p. 413.

[105] FUHRER, Maximiliano Roberto Ernesto. Novos crimes sexuais. São Paulo: Malheiros editores, 2009, p. 176.

[106] CARVALHO, Adelina de Cássia Bastos Oliveira. Violência sexual presumida. Curitiba: Juruá, 2005, p. 132-133, p . 40.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

FARIAS, Vanessa de Souza. O crime de estupro de vulnerável e o direito à autodeterminação sexual do menor. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4007, 21 jun. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29641. Acesso em: 17 abr. 2024.