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Remuneração e subsídios na Emenda nº 19/98

auto-aplicabilidade

Remuneração e subsídios na Emenda nº 19/98: auto-aplicabilidade

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1. Introdução

1.1. A Reforma Constitucional e o Poder Judiciário,
visto pelo Supremo Tribunal Federal

Através de recente deliberação tomada em Sessão Administrativa (24 de junho de 1998), o Supremo Tribunal Federal, por maioria, manifestou entendimento "de que não são auto-aplicáveis as normas inscritas no art. 37, XII, e no art. 39, § 4°, da Constituição da República, na redação dada pela Emenda Constitucional n. 19/98". E, por decorrência dessa orientação, assinala ofício enviado ao Presidente da Câmara dos Deputados (Of. GP n. 319/98, de 02.06.98), aquele Excelso Pretório "não teve por auto-aplicável o preceito consubstanciado no art. 29" da mesma Emenda.

Do contexto da ata que registrou a histórica deliberação constata-se que a mesma foi tomada tendo em vista que:

1) a fixação do subsídio mensal, em espécie, de Ministro do Supremo Tribunal Federal — que servirá de teto — nos termos do art. 48, XV, da CF (nova redação), depende de lei formal, de iniciativa conjunta dos presidentes nele assinalados;

2) não é tido como auto-aplicável o art. 29 da Emenda, por depender a aplicabilidade dessa norma da prévia fixação, por lei", do subsídio dos Ministros do Supremo Tribunal Federal;

3) qualificada, a fixação do subsídio mensal, "como matéria expressamente sujeita à reserva constitucional de lei em sentido formal, não assiste competência ao Supremo Tribunal Federal para, mediante ato declaratório próprio, dispor sobre essa específica matéria";

4) então, "até que se edite a lei fixadora do subsídio mensal a ser pago aos Ministros do Supremo Tribunal Federal, prevalecerão os tetos estabelecidos para os três Poderes da República, no art. 37, XI, da Constituição, na redação anterior à que lhe foi dada pela EC n. 19/98..." ("no Judiciário, a remuneração paga, atualmente, a Ministro do Supremo Tribunal Federal").

1.2. A Reforma Constitucional e o Poder Judiciário,
vistos pelos magistrados catarinenses

Os magistrados catarinenses, em especial os do chamado baixo-clero, atentos ao que se passa, convencidos dos direitos que lhes assistem desde o momento em que foi promulgada a Reforma Constitucional, ao pleitear, junto à cúpula do Poder Judiciário local, a adequação da respectiva remuneração à situação nova, fizeram-no em termos que vale rememorar. Segundo tais termos, revisados, mas não renegados:

1) as mudanças havidas na administração do Poder Judiciário, instituídas pela Reforma Constitucional, precisam ser imediatamente absorvidas, quanto possível, por atos formais que conciliem a legislação vigente à nova situação jurídico-institucional, de forma a deixar claro até que ponto mantidos estão os predicados da magistratura, sem dúvida nenhuma assaz machucados com o advento da nova ordem;

2) a mais importante, no momento, por envolver a execução orçamentária, as responsabilidades dos ordenadores de despesas, os direitos e as garantias da magistratura, é, sem dúvida, aquela que atinge a remuneração dos magistrados, agora desprovida das vantagens ditas pessoais, que engordam os respectivos contracheques, as quais, todavia, por seus efeitos atuais, sob o amparo dos princípios da irredutibilidade, e dos que informam o direito adquirido, são intangíveis por revisão constitucional derivada, a teor do art. 60, § 4°, inciso IV, da Constituição;

3) invocam, para esse efeito, a enfática determinação do art. 29 da Emenda Constitucional n. 19/98, segundo eles, de aplicação imediata, e que, por isso, não permite, a partir da mesma, reste situação diversa da que preconiza, não por seu propósito realmente equalizador, como moralizante, haja vista a parte final do seu contexto:

"Art. 29. Os subsídios, vencimentos, remuneração, proventos da aposentadoria e pensões e quaisquer outras espécies remuneratórias adequar-se-ão, a partir da promulgação desta Emenda, aos limites decorrentes da Constituição Federal, não se admitindo a percepção de excesso a qualquer título."

4) justificam o gesto, que não é singular no País, alinhando preciosos fundamentos, quais sejam, entre outros:

a) à vista do que dispõe o art. 39, § 4°, da Constituição (Reforma, art. 5°), a remuneração dos magistrados é representada por parcela única, a que se dá a nominação de SUBSÍDIO, vedados quaisquer penduricalhos. (De ressalvar-se as gratificações transitórias, as indenizatórias, as personalíssimas, e até as resguardadas pelo princípio do direito adquirido, se intangíveis por Constituinte derivada, protegidas, então, pelo art. 60, § 4°, inciso IV, da Carta — cláusula pétrea);

b) por outro lado, antes da Reforma, como depois dela, os magistrados gozavam — e gozam — da garantia de irredutibilidade de sua remuneração, segundo a legislação então vigente, que compreende o vencimento, propriamente dito, e as vantagens incorporáveis na aposentadoria. Assim, com o advento da Reforma, desaparecem as ditas vantagens, mas sem perda de seus efeitos até a data da Emenda, tanto que passam a integrar o denominado SUBSÍDIO, não só sob o fundamento da irredutibilidade, mas também por aquele outro, informado pelas chamadas cláusulas pétreas (CF, art. 60, § 4°, inciso IV), intangível pela Constituinte derivada (não originária, esta diretamente delegada pelo povo);

c) em conseqüência, como está ocorrendo na prática, aliás, o adicional por tempo de serviço, vantagem prevista na LOMAN, ora extinta pela Reforma, incorpora-se à dita da mesma, pelo valor efetivamente percebido, aos vencimentos dos magistrados, para formar e constituir o respectivo SUBSÍDIO, como induz e preconiza o art. 37, XI, da Carta (nova redação da Reforma), ao cuidar do teto;

d) de registrar-se, também, que não há de se considerar a situação pessoal de cada magistrado, quanto ao extinto adicional por tempo de serviço, pois o que importa, após a Reforma, o que realmente interessa, é o decrescente escalonamento a partir do teto ou subteto, firmado e confirmado, antes denominados vencimentos, agora SUBSÍDIO, seja dos Ministros do STF, do STJ, dos Juízes Federais de 2° grau, dos Desembargadores, que é o que de fato conta;

e) é verdade que a situação atual, relativa à remuneração dos Desembargadores, diante do teto preconizado no inciso V, do art. 95, da CF (paradigma, o SUBSÍDIO dos Ministros do STJ, e não mais do STF, etc.), pode vir a ser afetada, no futuro, para mais, ou para menos; isto, todavia, não constitui óbice, pois se nada ainda foi estabelecido há, no caso, vacatio legis, pelo que prevalece a situação atual, enquanto não advenha a situação nova, a qual, certamente, levará em conta os direitos adquiridos, intangíveis, como se sabe, por Constituinte derivada;

f) releva notar, finalmente, que, pelo princípio da irredutibilidade, reiterado na Reforma (nova redação aos arts. 37, V, e 95, III), mantida a situação vigente, o SUBSÍDIO, a ser fixado aos membros dos Tribunais, não poderá ser inferior à soma dos vencimentos e vantagens, não apenas os percebidos, in concreto, mas aqueles que a legislação assegurava à época da Reforma (o fato de não haver alguém circunstancialmente acostado no teto não reduz, ou o suprime); já quanto aos demais magistrados, desprezadas as situações pessoais, que são automaticamente absorvidas, o que manda e comanda é a relação com o teto, ou subteto, na conformidade do escalonamento (à parte, todavia, as vantagens indenizatórias ou personalíssimas, circunstancialmente acessíveis, que são mantidas, igualmente, pelo princípio do direito adquirido, invocado o art. 60, § 4°, da CF);

g) não constitui óbice, outrossim, o disposto no art. 37, X, da Reforma, segundo o qual a remuneração dos servidores, bem como os subsídios, somente podem ser fixados através de lei, pois não é o caso, argumenta-se, validamente: a lei, in casu, por primeiro, é a própria Constituição, pela disposição imperativa inserida no art. 29 da Emenda, complementada pela legislação ordinária recepcionada, que atende aos pressupostos do art. 93, V, da CF (nova redação), que cuida do escalonamento das diversas categorias, tal como o admite a Reforma (SC, Lei n. 6.741, de 18.12.85, art. 2°);

h) a previsão orçamentária, por sua vez, aventada no art. 96, § 1°, da CF, apontada como condicionante, não é aplicável, in casu, dado que se está cumprindo, isto sim, uma determinação constitucional (art. 29 da Emenda), o que, por si só, dispensa quaisquer óbices, mesmo porque a Constituição, devendo ser interpretada compreensivamente, afasta as aparentes contradições, harmonizados os textos, de forma a possibilitar o cumprimento da norma; por outro lado, a Emenda não concede vantagem ou aumento, mas apenas visa adequar situações que, por força da generalidade constitucional, exigem esta complementação, prevista no art. 29 da Emenda, como acima registrado;

i) essa previsão orçamentária, portanto, é a do Orçamento vigente, a teor do percentual devido ao Poder Judiciário; eventuais suplementações, se necessárias, são assimiláveis, naturalmente, dado que a situação implementada, sob comando constitucional, pressupõe interesse da sociedade como um todo, sem ressaibo corporativo;

j) de resto, a aplicação dos efeitos da Reforma, também aos inativos, encontra respaldo no art. 40, § 4°, da Constituição Federal, e no art. 30, § 3°, da Constituição do Estado, intangível a respectiva situação por alterações posteriores, mesmo de ordem constitucional, dado o caráter patrimonial que a informa, ainda mais se derivado o Poder Constituinte inovador.

1.3. A aplicação imediata da Reforma Constitucional, recomendada pelas Associações, já implementadas por outros Estados

(1) AMAGIS

(O art. 39, § 4°, é auto-aplicável — omisso o STF, os TJ podem fixar o subsídio provisório)

Já se mencionou que tal entendimento, assim exposto, nada tem de singular, haja vista que se ajusta ao que propõe o eminente Presidente da AMAGIS, para quem "o dispositivo da Constituição (art. 39, § 4°) é auto-aplicável". A partir do mês de junho, inclusive, esclarece, referindo-se aos seus co-estaduanos, "só poderemos receber subsídio fixado em parcela única, pois receber diferente disso seria inconstitucional".

Adiante, admitindo possa o STF deixar de atuar, prossegue:

"Caso Ministros não ajam, nada impede que a Corte Superior do Tribunal de Justiça fixe provisoriamente o subsídio de Desembargador, o que vincularia toda a magistratura estadual, conforme o art. 134, da Lei de Organização Judiciária. Evidente que o aumento do subsídio só poderá decorrer de lei, mas por força do princípio da irredutibilidade, após a promulgação da Reforma Administrativa, o subsídio do Desembargador corresponde à remuneração por ele então percebida. Basta que o valor seja declarado por ato administrativo"


(AMAGIS — JUSTIÇA, n. 2, jul./98).

(2) Estado do AMAPÁ

(Projeto em curso na AL)

A AMAAP, em face do texto da Emenda Constitucional n. 19/98 (Of. Circ. N. 057/98, de 01.07.98, enviado à AMC):

a) encaminhou expediente à Presidência do Tribunal "destacando a imediata aplicabilidade do disposto no art. 29 da Emenda, tal como fizeram — afirma — a AMB, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal";

b) encaminhou ao E. Tribunal "proposta de Projeto de Lei visando estabelecer o escalonamento dos subsídios a serem pagos aos magistrados em 95% dos pagos ao Superior Tribunal de Justiça aos Desembargadores, e em 5% decrescentemente às categorias inferiores (Juízes de 3ª, 2ª e 1ª entrância)";

c) esclarece, ainda, que foi tentada a substituição do Projeto de Lei, autônomo, por emenda a outro, em curso na AL, mas a iniciativa não teria merecido guarida por parte da Presidência do Tribunal, dado que este "preferiu seguir a cômoda posição adotada pelo Colégio de Presidentes" — expressões do ofício —, que seria contra o imediato enfrentamento do assunto. Mas, enviado o novo Projeto à Al, para sua tramitação, foi aprovado o regime de urgência, esperando-se a votação em primeiro turno, em meados deste mês.

(3) Estado do ACRE

(Projeto de lei em curso)

Expediente divulgado pela AMC revela, outrossim, que o Estado do Acre está agilizando a institucionalização da Reforma, fazendo-o, igualmente, através de Projeto de Lei, que consubstancia o seguinte:

a) os subsídios, proventos de aposentadoria e pensões da magistratura estadual vinculam-se, à base de 95%, ao subsídio mensal de Ministro do Superior Tribunal de Justiça, na forma dos incisos VIII e XVII, da CF (art. 1°), sendo de 5% a diferença para efeito de escalonamento do primeiro grau;

b) é assegurada a revisão, sempre que decorrer modificação do subsídio dos Ministros dos Tribunais Superiores.

(4) ASSOCIAÇÃO DOS MAGISTRADOS BRASILEIROS

(A promulgação da Emenda deflagra a eficácia imediata)

A Associação dos Magistrados Brasileiros, por sua vez, associada a tal entendimento, invocando a eficácia imediata do art. 29 da Emenda Constitucional n. 19/98, consoante o Ofício n. 134/98, enviado a Supremo Tribunal Federal, assim se expressa:

"O teor da norma autoriza a interpretação no sentido de que a promulgação da Emenda deflagra a eficácia imediata dos princípios e normas regentes do novo sistema, cuja impplantação se deve promover desde logo, inclusive por razões de moralidade administrativa e de gestão estratégica dos recursos públicos, postos em destaque na parte final do texto — não se admitindo a percepção de excesso a qualquer título."

(5) Juízes Federais da 4ª Região

(A INTERNET é veículo de inter-relacionamento)

E agora, recentemente, extraído da INTERNET, toma-se conhecimento de requerimento formulado por magistrados federais da 4ª Região (Porto Alegre), os quais tratam a matéria com muita proficiência. É do aludido requerimento os excertos que seguem:

(Art. 39, § 4°, auto-aplicável, na parte em que transforma em subsídio a remuneração mensal)

"Assim procedemos — é do requerimento — porque temos como aplicável direta e imediatamente o disposto no parágrafo 4°, do art. 39, da Constituição Federal, na redação que lhe deu a Emenda Constitucional n. 19/98, na parte que transforma em subsídio a remuneração mensal paga aos membros do Poder."

(Teto mínimo, os dos Ministros do STF)

"A eficácia é plena e imediata em relação aos valores a serem pagos, porque existe legislação ordinária prevendo a remuneração dos ocupantes de cargos, no âmbito dos diversos Poderes. A maior soma das atuais parcelas remuneratórias percebidas pelos Ministros do STF constitui, hoje, o teto mínimo dos atuais subsídios a serem futuramente fixados."

(Atuação do legislador ordinário somente para fixar o teto máximo)

"Assim, a atuação do legislador ordinário é necessária tão-somente para estabelecer os limites máximos para a percepção dos subsídios, mas não para impedir o pagamento de subsídios com base nos valores já previamente ficados por legislação infraconstitucional anterior."

(Nem mesmo a recente deliberação do STF infirma o entendimento)

"Assim sendo, desde a publicação da Emenda Constitucional n. 19/98, o valor pago mensalmente aos magistrados tem a natureza de subsídio, e não de vencimentos.

"Saliente-se que essa conclusão não infirma nem contraria o entendimento exarado pelo Supremo Tribunal Federal, na sessão administrativa realizada em 24 de junho de 1998. Naquela sessão o Supremo Tribunal Federal decidiu que, dos termos do art. 39, § 4°, da EC n. 19/98, não é possível desde logo restringir direitos, ou seja, limitar imediatamente a percepção de remuneração aos parâmetros fixados na Emenda. Para tais fins, a situação permanece inalterada, tendo, inclusive, o Supremo Tribunal Federal remetido à norma constante do inciso XI do art. 3).

"Além disso, o Supremo declarou não serem auto-aplicáveis apenas os arts. 37, XI, e 39, § 4° da EC n. 19/98, mas não fez com relação aos demais itens daquela Emenda, que também se referem aos subsídios. Daí conclui-se que a decisão diz respeito unicamente à impossibilidade de declaração de um teto máximo aplicável aos três Poderes."

(A boa hermenêutica não privilegia a não-aplicabilidade)

"É conhecida lição de hermenêutica a de que não se há de privilegiar a interpretação que leva à retirada da aplicabilidade das normas, tanto infraconstitucionais quanto constitucionais, especialemente destas últimas, sendo prevalecente e imperiosa a exegese que leva a atribuir a cada uma das normas jurídicas a maior eficácia possível."

(A Emenda não é programática)

"Adotar-se entendimento contrário implicaria negar vigência e eficácia à Emenda Constitucional n. 19/98, convertendo-a em norma meramente programática e destinada exclusivamente a orientar o legislador infraconstitucional na elaboração da lei, o que certamente não foi o objetivo da Reforma Administrativa (...)."

(Legislação anterior, não conflitante, é aplicável)

"Neste particular, enquanto não implementada a lei, deve-se considerar provisoriamente recepcionada a legislação vigente ao tempo da promulgação da Reforma Administrativa, porque não há incompatibilidade absoluta, devendo ser aplicada a legislação anterior no que não conflitar com novo texto constitucional"

(Teto a nível federal = R$ 12.720,00)

"(...) o valor do subsídio mensal de Ministro do Supremo Tribunal Federal, a ser fixado, em hipótese nenhuma poderá ser inferior ao maior pago atualmente a título de remuneração aos Ministros, visto que a Reforma Administrativa não autoriza a fixação em valor menor que o atualmente percebido, incluídas todas as parcelas remuneratórias.

"Esse valor já foi objeto de declaração expressa do (...) Ministro Sepúlveda Pertence (...), correspondendo, atualmente, a R$ 10.800,45 que, acrescida a gratificação eleitoral (...) perfaz o total (...) de R$ 12.700,00 (...)."

1.4. A deliberação do STF — comentário que se impõe

É estranho! O Excelso Supremo Tribunal Federal que, a seu juízo, não teria competência para, por ato declaratório próprio, dispor sobre a integração, em parcela única, das diversas parcelas que compõem a remuneração dos magistrados — é dos magistrados que se cuida —, a despeito da imperatividade do art. 29 da Emenda, dá-se por competente, todavia, para restaurar "o art. 37, XI, da Constituição, na redação anterior (sic), posto que, se anterior, como assinala a ata, deixaria de existir.

De fato, se o texto posterior, modificativo, incidiu sobre o contexto anterior, derrogando-o, integrou-se a ele no universo jurídico a que se destina, sem volta, salvo pelas vias próprias (emenda constitucional), jamais por deliberação interna dos Órgãos, aos quais, eventualmente, caiba aplicá-lo. Outra a ilação, se a norma não fosse auto-aplicável, ela, então, não teria incidido. Neste caso, o contexto dito anterior, passou a ser, na verdade, o atual, mas ainda não contaminado pela Reforma ( não auto-aplicável), que aguardaria, então, nos termos da deliberação, a lei ordinária de fixação do subsídio para implementar-se.

Agrava a situação, outrossim, o fato de que, sendo administrativa a deliberação, sua abrangência é limitada ao Alto Pretório que a adotou, interna corporis, não podendo impor-se, como pretende, aos servidores públicos, como um todo, nem mesmo aos magistrados em geral, uns e outros, por pressupostos próprios submetidos aos efeitos do referido dispositivo constitucional.

Válidas, portanto, são as iniciativas dos Estados que começam a tomar os seus próprios caminhos para cumprir, a seu juízo, a Reforma Constitucional naquilo que lhes toca.


2. Consumação da Reforma Constitucional na dependência de lei ordinária — inconveniências

Pelo visto, no particular, entretanto, a se dar efeito erga omnes à aludida deliberação do STF, a Reforma Constitucional só se terá por consumada se impelida por lei ordinária, vale dizer, com a sanção do Presidente da República, que se transforma, assim, por deliberação administrativa, não jurisdicional, pelas mãos da cúpula do Poder Judiciário, em árbitro das deliberações soberanas do Congresso Nacional, investido, válida e efeicazmente, do Poder Constituinte.

Mais, a teor do aludido entendimento condicionante, a Reforma só se consolida mesmo, em verdade: primeiro, se, à unanimidade, os quatro presidentes nomeados no art. 48, XV, da CF, não se desavierem na fixação do subsídio dos Ministros do Supremo Tribunal Federal. Imprevista deliberação por maioria, desavindo um deles, a iniciativa da lei fixadora do subsídio se inviabiliza, ela que é sinalizada como o móvel deste ponto sensível da Reforma; segundo, se consenso dos presidentes houver, o que é bem provável, viabilizada a lei fixadora, ponto de partida para a implantação da Reforma, esta, ainda assim, não estará a salvo. Devolve-se a bola ao Congresso Nacional, para que este, em sede de lei ordinária, retome a matéria, e lhe dê a esperada e conhecida seqüência que culmina com a sanção do Presidente da República.

As inconveniências institucionais da deliberação do Supremo Tribunal Federal, evidenciadas acima, como sugerem algumas Associações e até praticam alguns Estados, impõem aos aplicadores da Reforma a adoção de vias que, legitimando as mudanças, produzam os efeitos esperados, sem outras inserções senão as que cuidem de sua execução, partindo-se do pressuposto de que o legislador, dando-se por satisfeito, exauriu os objetivos a que se propôs. Todo o esforço, então, é o de validar a lei, dando-lhe força e vigor, sem mais perguntas e questionamentos.

Sob este enfoque, alvitra-se, portanto, com a devida vênia, que a via adotada pelo STF não é a que melhor responde à auto-aplicabilidade do art. 29 da Emenda n. 19/98, cuja determinação, em sede constitucional, precisa ser adequadamente reverenciada, com o apreço, certamente, da maioria vencida, os eminentes Ministros Sepúlveda Pertence, Carlos Veloso, Marco Aurélio e Ilmar Galvão, nada despresível, certamente!

Assim é que, para se aceitar o entendimento do Excelso Pretório, manifestado, por maioria, na citada Sessão Administrativa, há que se qualificar, como inepto, o Congresso Nacional, tanto que, no exercício de sua função privativa, por excelência, que é a de legislar, não foi capaz de produzir uma Reforma imediatamente viabilizada; e qualificar, também, como insensíveis, para não dizer omissos, quantos que, tendo convivido com o affaire, e até nele se envolvido, direta ou indiretamente, deixaram de, formal, ou informalmente, a tempo, advertir o Congresso Nacional da inocuidade imediata das mudanças, se mantida a redação enunciada.

Todavia, nada teve de inepto o Congresso Nacional, nem inepta é a Reforma no ponto questionado. Ela, a Reforma, incide em um universo jurídico preexistente que a completa, e a complementa. Ou melhor, ela, a Reforma, modificando, insere-se em contexto preexistente, dando-lhe a modulação superior que persegue. Basta querê-la, para admiti-la. E como tal deve ser vista e interpretada.

Interpretar, diz-se, é revelar, sem nada aditar, ou acrescentar, denunciando o que, em existindo na norma, nela está oculto, porque constam de outras normas, gerais ou especiais, com as quais ela se identifica, e até complementa. É assim, portanto, que deve ser visto o texto em comento, para que se tenha a Reforma como viabilizada, de pronto, sem vazios sem perplexidades.

Pois bem, interpretando as normas que focalizam a Reforma, que não pode ser dada como frustrada em seus objetivos, sob o ângulo teleológico, vale dizer por sua alta finalidade, e por sua razão de ser, induz-se o intérprete, diante da imperatividade do art. 29, centro das mudanças e não acessório destas, a não desprezar, antes a buscar, validamente, no contexto amplo do universo jurídico nacional, fundamentos para sua viabilização, os quais, certamente, foram levados em conta pelos Constituintes ao elaborar e aprovar os textos dados à lume.

Se é verdade, outrossim, que, para compor conflitos, ao Juiz é lícito recorrer à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito, quando omissa, lacunosa ou obscura for a lei (CPC, art. 126; Lei de Introdução, art. 4°), não é menos certo que das mesmas prerrogativas possam servir-se as autoridades administrativas quando, em circunstâncias semelhantes, devam resolver problemas que se lhes anteponham, se presentes os mesmos pressupostos.

No caso vertente, eventualmente, pode suscitar a invocação de tais regramentos, caso em que podem e devem ser utilizados, suprindo-se, sem inovar, as deficiências eventuais dos textos legislados, tendo em mente, como propósito maior, a circunstância de que:

a) a lei que, como lei, retrata a vontade da sociedade, presumidamente útil e conveniente, não pode simplesmente ser posta de lado, ignorada, sem que esforço algum se faça para implementá-la;

b) as deficiências, quando se façam presentes, nas mais das vezes subjetivas (a circunstância de haver vencidos admite a asserção), precisam ser supridas, sem novos apelos ao legislador, para que as complemente, tanto que isto pode e deve ser feito, por via de adequada e competente interpretação dos textos, traduzida, se preciso, por regulamentos, ou instrumentos outros, tendo como norte, teleologicamente, seja a intenção do legislador, a finalidade e a razão de ser da lei.

Tanto procedem os argumentos ora expendidos que soluções alternativas, juridicamente válidas, podem guiar a sociedade, ou quem suas vezes faça, para dar cumprimento imediato à Emenda, tal como promulgada.

Isto posto,


3. As soluções

Tudo, na verdade, para esse efeito, passa-se em um plano muito simples, detectável de pronto, se houver vontade, não diria política, mas sensibilidade institucional para, em aceitando ou acatando a Reforma, deslanchá-la. Com efeito.

Recapitulando, diz a CF nos artigos que a deliberação excelsa sinaliza (nova redação do art. 3°, art. 5° e art. 29 da Emenda):

Art. 3° (da Emenda):

"A Administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

"...

X — a remuneração dos servidores públicos e o subsídios de que trata o § 4°, do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa, em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; ..."

Ou, distinguindo as duas situações (magistrado/servidores):

1ª parte, aplicável aos servidores em geral:

"X — a remuneração dos servidores públicos (...) somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa, em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices; ..."

2ª parte, aplicável aos magistrados:

"X — (...) o subsídio de que trata o § 4°, do art. 39 somente poderão ser fixados ou alterados por lei específica, observada a iniciativa privativa, em cada caso, assegurada revisão geral anual, sempre na mesma data e sem distinção de índices;

"XI — a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, dos membros de quaisquer Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal."

Ou, distinguindo as duas situações (magistrados/servidores em geral):

1ª parte aplicável aos servidores em geral:

"XI — a remuneração (...) dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional, (...) e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal" (em espécie = em dinheiro).

2ª parte, aplicável aos magistrados:

"XI — (...) o subsídio (...) dos menbros de quaisquer Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal Federal"


(em espécie = em dinheiro).

Art 5° ( da Emenda):

"Art. 39. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselho de política de administração e remuneração de pessoal, integrado por servidores designados pelos respectivos Poderes.

"...

"§ 4°. O membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecido, em qualquer caso, o disposto no art. 37, X e XI."

Art. 29 (da Emenda):

"Art. 29. Os subsídios, vencimentos, remuneração, proventos de aposentadoria e pensões e quaisquer outras espécies remuneratórias adquar-se-ão, a partir da promulgação desta Emenda, aos limites decorrentes da Constituição Federal, não se admitindo a percepção de excesso a qualquer título."

Por sua vez, quatro foram as deliberações, em sede administrativa, do Supremo Tribunal Federal, distintas, mas integradas:

a) primeira, deliberou que "não são auto-aplicáveis as normas do art. 37, XI, e art. 39, § 4°, da Constituição, na redação que lhes deram os arts. 3° e 5°, respectivamente, da Emenda n. 19/98, de 4 de junho de 1998, porque a fixação do subsídio mensal, em espécie, de Ministro do Supremo Tribunal Federal — que servirá de teto — nos termos do art. 48, XV, da Constituição, na redação do art. 7° da referida Emenda Constitucional n. 19, depende de lei formal, de iniciativa conjunta dos Presidentes da República, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal e do Supremo Tribunal Federal";

b) segunda, "em decorrência disso, o Supremo Tribunal Federal não teve por auto-aplicável o art. 29 da Emenda n. 19/98, por depender, a aplicabilidade dessa norma, de prévia fixação, por lei, nos termos acima indicados, do subsídio de Ministro do Supremo Tribunal Federal";

c) terceira, "por qualificar-se, a definição do subsídio mensal, como matéria expressamente sujeita à reserva constitucional de lei em sentido formal, não assiste competência ao Supremo Tribunal Federal para, mediante ato declaratório próprio, dispor sobre essa específica matéria";

d) quarta, deliberou-se, "também, que, até que se edite a lei definidora do subsídio mensal a ser pago a Ministro do Supremo Tribunal Federal, prevalecerão os tetos estabelecidos para os três Poderes da República, no art. 37, XII, da Constituição, na redação anterior à que lhe foi dada pela EC n. 19/98, vale dizer: no Poder Executivo da União o teto corresponderá à remuneração paga a Ministro de Estado; no Poder Legislativo da União o teto corresponderá à remuneração paga aos Membros do Congresso Nacional; e no Poder Judiciário à remuneração paga, atualmente, a Ministro do Supremo Tribunal Federal."

Comentando, em passant, constata-se que a um só tempo, então, o Supremo Tribunal Federal, em sessão administrativa, (a) fulminou a Reforma Constitucional (não auto-aplicável); (b) todavia, admitiu a sua vigência, tanto que ela, a Reforma, teria revogado o texto anterior do art. 37, XI, ressuscitado, contudo, no mesmo ato, para prevalecer enquanto o teto qualificado da nova ordem não for editado; (c) legislou para os demais Poderes, aos quais ditou comportamentos, ao lhes impor o teto em ocaso, que elegera como saída ao impasse gerado pela deliberação que engendrara.

3.1. A solução alvitrada pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

É a que emerge da deliberação, em sede administrativa, de 24.06.98, assaz comentada. Adiada a aplicabilidade para as "colendas gragas". A urgência que o País (ou a mídia) vinha reclamando ficou comprometida com a deliberação, que vem sendo questionada por amplos setores da sociedade.

3.2. A solução alvitrada pela Presidência do Tribunal de Justiça de Santa Catarina

Coincide com a do Supremo Tribunal Federal, manifestada no Processo n. 105672-98.7, despacho de 17.07.98, que indefere requerimento formulado pelos diversos magistrados. Segundo entende o eminente Desembargador João Martins:

"(...) o art. 29 da Emenda Constitucional n. 19/98 não é auto-aplicável, dependendo a adequação dos requerentes de posterior publicação de lei, de modo que impossível se torna a regulamentação da matéria por via de simples resolução normativa."

Não pleitearam os magistrados, todavia, fosse editada Resolução consubstanciando o subsídio, mas a adequação da respectiva remuneração, sob a denominação correspondente, englobando vencimentos e vantagens, segundo o escalonamento previsto nas leis estaduais, que respeita as diferenças previstas na Constituição (antes e depois da Emenda n. 19/98).

Na expectativa do advento da definição em lei do teto geral, fixa-se na recomendação do Colégio Permanente de Presidentes, tomada em 25-26/jun/98, que é a de aguardar o projeto-padrão que, disciplinando as novas regras de remuneração dos magistrados, em elaboração por Comissão designada, possa vir a ser adotado pelos Tribunais do País.

Respeita-se — e compreende-se — o posicionamento da ilustre Presidência, mesmo porque retratada no consenso do Colégio dos Presidentes. Se não atende às expectativas, revela, todavia, ao menos indiretamente, em face da presteza com que despachou a postulação dos magistrados, o propósito de, ensejando o recurso, ver logo examinado o affaire pelo douto Órgão Especial, onde espera-se que do debate, democrático e abrangente, surjam as luzes que contemplem a solução por todos aguardada.

3.3. A iniciativa, por enquanto isolada, de um grupo de magistrados catarinenses — fundamentos

De fato, um grupo de magistrados, inconformados com este posicionamento que, de alguma forma, retarda a aplicação da Reforma no âmbito estadual, adotando o caminho indicado pela AMB, outras Associações e, objetivamente, por alguns Estados, ora postulam, administrativamente, junto à Presidência do TJSC, outra solução.

Através de requerimento, demandam a imediata adequação da respectiva remuneração (subsídios), mediante a aplicação, integrada, da legislação anterior, recepcionada, complementar e ordinária, sob o comando da Reforma, segundo alegam perfeitamente harmonizável à situação. Com efeito.

Dentre as alegações formuladas na peça inaugural, com que se expressaram, anotaram-se os fundamentos do recurso interposto perante o Órgão Especial do Tribunal de Justiça:

a) como mais importante, por envolver a execução orçamentária, as responsabilidades dos ordenadores de despesas, os direitos e as garantias da magistratura, aquela que atinge a remuneração dos magistrados, agora despida das vantagens ditas pessoais, que engordam os contracheques da magistratura, intangíveis pelos princípios que informam o direito adquirido, por isso incorporáveis, se eventualemente derrogada a legislação que os informa, inacessíveis até por revisão constitucional não derivada, a teor do art. 60, § 4°, inciso IV, da Constituição.

b) o pleito em causa pôs em destaque maior o art. 29 da aludida Emenda Constitucional n. 19/98, in verbis:

"Art. 29. Os subsídios, vencimentos, remuneração, proventos da aposentadoria e pensões e quaisquer outras espécies remuneratória adequar-se-ão, a partir da promulgação desta Emenda, aos limites decorrentes da Constituição Federal, não se admitindo a percepção de excesso a qualquer titulo."

Dita norma maior, de aplicação imediata, ao que se infere do seu contexto, não permite que, a partir da referida Emenda, reste situação diversa da que ela preconiza, haja vista a ênfase do contexto: "Os subsídios (...) adequar-se-ão (...) aos limites decorrentes da Constituição Federal (...)."

O paradigma para efeito de adequação da remuneração dos recorentes, a teor da Lei Estadual n. 6.741, de 18.12.85, recepcionada, seria a atual remuneração dos Desembargadores, considerados os respectivos vencimentos, mais as vantagens com assento legal percebidas, intocáveis por leis posteriores, todas elas, por isso, automaticamente incorporadas, EM PARCELA ÚNICA, sob a simplificada denominação de SUBSÍDIO.

Acode aos recorrentes, todavia, bem examinada a situação, de que à vantagem incorporada outras podem ter assento, como seja aquela que emerge da aplicação da última parte do art. 84 do citado Estatuto dos Funcionários Públicos, percebidas pelos magistrados que contam mais de trinta e cinco anos de serviço, ainda vigente, porquanto não afetada pelas leis subseqüentes que dispõem sobre adicionais por tempo de serviço (à data da Reforma: Lei n. 7.819, de 12.12.89), da ordem de R$ 11.400,00, compreendendo vencimentos, adicional por tempo de serviço, incluído o de permanência (desprezado, se for o caso, os excessos infringentes do teto maior — subsídio dos Ministros do STF).

Releva notar que, in casu, não foi considerada a gratificação eleitoral, cuja inclusão foi admitida pelo Ministro Sepúlveda Pertence, quando Presidente do STF, e que agora vem sendo pleiteada pelos Juízes Federais da 4ª Região (Porto Alegre). Administrativo o pleito, nada impediria, todavia, que a autoridade competente, ex officio, a considere, se for o caso, ao decidir.

A teor do art. 40, § 4°, da Constituição Federal, e do art. 30, § 3°, da Constituição do Estado, reitera-se, a nova situação aplica-se aos inativos, intangível a respectiva situação por alterações posteriores, o que está sendo considerado.

Os fundamento para o pedido então formulados, a título de justificação, foram assim concebidos:

a) à vista do que dispõe o art. 39, § 4°, da Constituição (Reforma, art. 5°), a remuneração dos magistrados é representada por parcela única, a que se dá a nominação de SUBSÍDIO, vedados quaisquer penduricalhos (De ressalvar as gratificações transitórias, indenizatórias, as personalíssimas, e até as resguardadas pelo princípio do direito adquirido, se intangíveis por Constituinte derivada, protegidas, então, pelo art. 60, § 4°, inciso IV, da Carta — cláusula pétrea);

b) por outro lado, antes da Reforma, como depois dela, os magistrados, como de resto os servidores em geral, gozavam — e gozam — da garantia de irredutibilidade dos respectivos vencimentos, que compreendem o vencimento, propriamente dito e as vantagens incorporáveis na aposentadoria; assim, com o advento da Reforma, desaparece a dita vantagem, mas sem perda de seus efeitos até a data da ocorrência, tanto que passa a integrar o vencimento, agora denominado SUBSÍDIO, não só pelo aludido fundamento (irredutibilidade), mas também por este outro, informado pelas chamadas cláusulas pétreas (CF, art. 60, § 4°, inciso IV), intangível pela Constituinte derivada (não originária, esta diretamente delegada pelo povo);

c) em conseqüência, como na prática está ocorrendo, o adicional por tempo de serviço, vantagem prevista na LOMAN, ora extinta pela Reforma, incorpora-se à data da mesma, pelo valor efetivamente percebido, aos vencimentos dos magistrados, para formar e constituir o respectivo SUBSÍDIO, como induz e preconiza o art. 37, XI, da Carta (nova redação da Reforma), ao cuidar do teto;

d) por outro lado, não há de se considerar a situação pessoal de cada magistrado, quanto ao extinto adicional por tempo de serviço, pois o que importa, após a Reforma, o que realmente permanece, é a sua vinculação, firmada e confirmada, com os vencimentos, agora SUBSÍDIO, dos Desembargadores, que é o que de fato conta;

e) é verdade que a situação atual relativa à remuneração dos Desembargadores, diante do teto preconizado no inciso V, do art. 95, da CF (paradigma, o SUBSÍDIO, dos Ministros do STJ, e não mais do STF, etc.) pode vir a ser afetada, no futuro, para mais, ou para menos; isto, todavia, não constitui óbice, pois se nada ainda foi estabelecido, há, no caso, vacatio legis, pelo que prevalece a situação atual, enquanto não advenha a situação nova, a qual, certamente, levará em conta os direitos adquiridos, intangíveis, repete-se, pela Constituinte derivada;

f) releva notar, finalmente, que a irredutibilidade, que assegura aos Desembargadores SUBSÍDIO representado pela soma de vencimentos e vantagens, foi mantida na Reforma, igualmente (nova redação aos arts. 37, V e 95, III).

Pode-se questionar o entendimento, argumentam, invocando-se o art. 37, X, segundo o qual a remuneração dos servidores, bem como os subsídios, somente podem ser fixados através de lei. Não seria o caso, assinalam, tanto que o dispositivo em apreço estaria sendo atendido, pois (a) a lei, primeiro, é a própria Constituição, pela disposição imperativa inserta no art. 29 da Emenda; (b) a Constituição, por sua vez, é escoltada pela legislação ordinária recepcionada, que atende aos pressupostos do art. 93, V, da CF (nova redação), que prevê o escalonamento, tal como o admite a Reforma (Lei n. 6.741, de 18.12.85, art. 1°).

A questão relacionada com a previsão orçamentária (art. 96, § 1°), também não apoquenta os recorrentes, para os quais a disposição in casu não seria aplicável, dado que (a) está sendo cumprido, isto sim, determinação constitucional (art. 29), o que, por si só, dispensa quaisquer óbices, inclusive porque a Constituição deve ser interpretada compreensivamente, afastando-se as aparentes contradições, harmonizados os textos; (b) não se está concedendo vantagem ou aumento, mas apenas adequando situações que, por força da generalidade constitucional, exigem esta complementação, prevista no art. 29 da Emenda, acima enfocado; (c) a previsão orçamentária, portanto, é a do Orçamento vigente, a teor do percentual devido ao Poder Judiciário.

3.4. A solução então afinal recomendada e adotada

Pois bem, diante do quadro geral apresentado, se, de fato, não é auto-aplicável a Reforma, nos pontos assinalados, ela — meramente programática — por enquanto não existe, não integra o universo jurídico nacional em termos de poder modificar o status quo anterior.

Mas bem combinadas as situações, entretanto, dúvida não há de que a Reforma, tal como aprovada, pode ser acolhida. É a opção que se fez:

  • Valida-se (ou convalida-se) a Reforma, para que o subsídio (provisório) se instale. Parâmetro? A soma dos vencimentos e vantagens atuais dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, com ou sem o penduricalho eleitoral, passa a ser, por ato declaratório do STF, o subsídio básico, provisório (qualificação que tem sido sugerida), tendo como fundamento a imperatividade do art. 29 da Emenda n. 19/98, que precisa ser obedecida, dado que fulmina, de modo peremptório, de um lado os excessos perseguidos,
  • e de outro, manda proceder, na forma que couber, a adequação da situação vigente, a partir do seu advento, e não a partir da fixação do teto qualificado, teto esse prescindível para dito efeito, segundo, aliás, o próprio entendimento do STF, quando restabelece o antigo, a teor das normas — para ele — em ocaso, a fim de que a ordem jurídica, que nele tem assento, não fique comprometida pelos vazios legais que a sua falta eventualmente possa suscitar.

Então, repete-se, o procedimento,

  • pelo Superior Tribunal de Justiça e demais Tribunais Superiores,
  • pelos Tribunais não superiores, entre estes os de Justiça,
  • e por quantos mais constituam parâmetros institucionais, da forma mais abrangente, para os magistrados, completada fica a legislação vigente, complementar ou ordinária, nacional, federal, estadual.

Assim, ter-se-á, certamente, como aplicada a Reforma, tal como desejou o Congresso Nacional, e esperava a sociedade como um todo!

É isto, afinal, que estão pleiteando os magistrados, sobretudo os do primeiro grau, mais diretamente afetados pela Reforma, que tem o grande mérito de pôr fim, uma vez por todas, à falaciosa notícia legislativa, que aos menos informados impressiona, qual seja a de que, no âmbito judiciário, a diferença entre a menor remuneração (Juiz Substituto) e a maior (Desembargador) é a da ordem de trinta por cento, quando, pela via do adicional de tempo de serviço, já chegou a mais de 140%, e, atualmente, conforme a situação em um e outro Estado, varia, aproximadamente, de 50% a 100%, a despeito do princípio: para igual serviço, igual remuneração. As diferenças, se recomendáveis, devem ser simbólicas, tão-só para caracterizar e ilustrar a pirâmide, que registra os acessos da carreira.

Ao arremate, se a boa remuneração, na base, por si só, não é a garantia de um Judiciário de mais qualidade, é, todavia, de um Judiciário de mais quantidade, o que significa mais agilidade, dinamismo e produtividade!


ANÁLISE DA REFORMA CONSTITUCIONAL

1. Legislação confrontada

Para efeito da análise é considerada a legislação anterior e a atual, constitucional e infraconstitucional.

2. A reforma constitucional e a remuneração dos magistrados

2.1. A legislação, em parte ainda em vigor, anterior à Emenda

2.1.1. Constituição Federal

A Constituição Federal, ocupando-se do tema, assim dispõe:

a) no art. 37, caput: submetem-se os magistrados, como integrantes do Poder Judiciário, ao elenco dos direitos e deveres evidenciados nos respectivos incisos: teto (XI); isonomia (XII); irredutibilidade (XV); acumulação (XVI e XVII);

b) no art. 39, § 1°: isonomia;

c) no art. 40, § 4°: revisão geral dos proventos, sempre que houver alteração na remuneração dos servidores em atividade, na mesma proporção, e condições;

d) no art. 93, V: os vencimentos dos magistrados serão fixados com diferença não superior a 10% (dez por cento) de uma para outra das categorias da carreira, não podendo, a título nenhum, exceder os dos Ministros do Supremo Tribunal Federal;

e) no art. 95, II: os Juízes gozam da garantia de irredutibilidade de vencimentos, respeitado o teto previsto no art. 37, XI, sujeitando-se, outrossim, ao pagamento dos impostos gerais;

f) no art. 95, parágrafo único: assegura o direito de exxercer outro cargo ou função, desde que de magistério;

OBS.: Como o exercício da judicatura eleitoral não é como tal classificável, significa que este outro cargo, de Juiz Eleitoral, não é autônomo, sendo, portanto, parte indissociada do principal.

2.1.2. Constituição do Estado

Naquilo que pertine, dispõe a Constituição do Estado:

a) no art. 23, II: teto máximo e mínimo de remuneração, que não pode ser, na área do Judiciário, superior à de Desembargador;

b) no art. 23, III: isonomia entre a remuneração do subsídio de Deputado Estadual e o vencimento de Desembargador;

c) no art. 26, § 1°: a isonomia remuneratória ressalva "as vantagens de caráter individual e as relativas à natureza ou ao local de trabalho";

d) no art. 30, § 3°: isonomia de proventos e vencimentos;

e) no art. 40, VIII: atribui à AL competência para fixar a remuneração dos Deputados, que não podem exceder, todavia, a estabelecida para os Deputados Federais, a qualquer título;

f) no art. 78, V: os vencimento dos magistrados serão fixados com diferença não superior a 10% (dez por cento) de uma para outra categoria da carreira, não podendo exceder, a título nenhum, os dos Ministros do Supremo Tribunal Federal;

g) no art. 80, I: função de magistério, acumulação permitida;

h) no art. 80, II: irredutibilidade de vencimentos;

i) no art. 81: autonomia administrativa e financeira do Poder Judiciário;

j) no art. 83, IV, "c": iniciativa privativa para projetos de lei sobre a fixação de vencimentos dos magistrados;

2.1.3. Lei Orgânica da Magistratura Nacional — LOMAN

a) no art. 32: é assegurada a irredutibilidade de vencimentos, sujeitos, contudo, aos impostos gerais;

b) no art. 61, parágrafo único: magistratura de primeira instância não pode perceber menos de dois terços dos vencimentos dos magistrados de segunda instância;

c) no art. 63, 1ª parte: os vencimentos dos Desembargadores não serão inferiores aos dos Secretários de Estado;

d) no art. 63, 2ª parte: os vencimentos dos Juízes não podem ser inferiores a dois terços dos vencimentos dos Desembargadores, e a diferença de uma entrância para outra não poderá ser superior a vinte por cento;

e) no art. 63, § 2°: para efeito da equivalência são excluídos do cômputo "apenas as vantagens de caráter pessoal, ou de natureza transitória";

f) no art. 65: além dos vencimentos os magistrados podem perceber, entre outras vantagens "pessoais": ajuda de custo para moradia; representação; gratificação por prestação de serviço eleitoral (1); gratificação adicional, por tempo de serviço (2).

OBS.: (1) O pagamento de gratificação, e não de vencimentos, justifica o entendimento de que não se trata de atividade autônoma.

(2) O limite de cinco por cento por qüinqüênio, não superior a sete, foi derrogado com o advento da Lei Federal n. 2.019, de 28.03.83, que insituiu o chamado "efeito cascata", fulminado pelo art. 37, XIV, da CF/88, substituído, depois, pela Lei n. 7.721, de 06.01.89, não se tendo restabelecido com o retorno, na área federal, à situação anterior, a teor do art. 2°, § 3°, da Lei de Introdução.

2.1.4. A legislação ordinária

A legislação ordinária assegura aos magistrados, como um todo, a percepção de vencimentos, no plural, o que compreende, segundo a doutrina consagrada pela jurisprudência, o vencimento propriamente dito e as vantagens pessoais permanentes, excluídas, portanto, as transitórias (gratificação pelo exercício de cargos de direção/diárias/ajuda de custo/salário-família/gratificação por serviço à Justiça Eleitoral e do Trabalho/magistério em cursos de preparação de magistrados/efetivo exercício de comarcas de difícil provimento/auxílio-moradia.

Todavia, o vencimento-base guarda relação, por disposição constitucional, com os subsídios dos Deputados Estaduais, pelo que percebam, para esse efeito, a qualquer título.

O escalonamento da carreira, por sua vez, traçado pela Lei n. 6.741, de 18.12.85, tendo como paradigma o vencimento dos Desembargadores, é o seguinte:

Desembargadores

100,00%

Juízes de 4ª entrância

90,00%

Juízes de 3ª entrância

85,50%

Juízes de 2ª entrância

81,22%

Juízes de 1ª entrância

77,16%

Juiz substituto

73,31%

Ao vencimento, assim estabelecido, são acrescidas vantagens, ditas pessoais, presentes também no STF, admitidas pela LOMAN, como é o caso do adicional por tempo de serviço.


3. Reforma Constitucional

A Reforma Constitucional (Emenda n. 19/98), por sua vez, inserindo-se no contexto, estabelece:

a) no art. 27, § 2°: o subsídio dos Deputados Estaduais serão fixados na razão de, no máximo, setenta e cinco por cento do estabelecido para os Deputados Federais, em parcela única, sem penduricalhos (art. 39, § 4°);

b) no art. 37, X: a remuneração dos servidores públicos e o subsídio (art. 39, § 4°) somente podrão ser fixados por lei específica, assegurada a revisão anual;

c) no art. 37, XI: a remuneração e o subsídio (...) dos membros dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais de qualquer outra natureza, não poderão exceder, em espécie, o subsídio dos Ministros do Supremo Tribunal Federal;

d) no art. 37, XV: o subsídio e os vencimentos dos ocupantes de cargos e empregos públicos são irredutíveis;

e) no art. 37, XVI e XVII: é mantido o direito à acumulação, nas situações indicadas, compreendendo empregos e funções, inclusive os exercidos em órgão descentralizados;

f) no art. 39, § 4°: a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão conselhos de política remuneratória, esclarecendo o § 4° que o membro de Poder, o detentor de mandato eletivo, os Ministros de Estado e os Secretários Estaduais e Municipais serão remunerados exclusivamente por subsídio fixado em parcela única, vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória, obedecidos os incisos X e XI do art. 37.

g) no art. 93, V: o subsídio dos Ministros dos Tribunais Superiores corresponderá a 95% do subsídio mensal fixado para os Ministros do STF;

  • O subsídio dos demais magistrados serão fixados e escalonados, em nível federal e estadual, conforme as respectivas categorias da estrutura judiciária nacional,
  • Não podendo a diferença entre uma e outra ser superior a 10% ou inferior a 5%,
  • Nem exceder a 95% do subsídio mensal dos Ministros dos Tribunais Superiores, respeitado o teto.

h) no art. 95, III: os Juízes gozam da garantia da irredutibilidade do respectivo subsídio;

i) no art. 96, II: compete privativamente (...) aos Tribunais de Justiça propor à AL (sic), (...) a remuneração dos Juízos que lhes são vinculados, bem como a fixação do subsídio de seus membros e dos Juízes, inclusive dos Tribunais inferiores, onde houver;

j) no art. 96, § 1°: a concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração (...) só poderão ser feitas:

  • se houver prévia dotação orçamentária suficiente;
  • se houver previsão na lei de diretrizes orçamentárias;

k) no art. 169: a despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.

Complementando, a Emenda insere, no seu art. 29, uma disposição extremamente relevante, visando conter o aumento de despesa, mas que funciona, igualmente, para prevenir o decesso:

"Art. 29. Os subsídios, vencimentos, remuneração, proventos da aposentadoria e pensões e quaisquer outras espécies remuneratórias adequar-se-ão, a partir da promulgação desta Emenda, aos limites decorrentes da Constituição Federal, não se admitindo a percepção de excesso a qualquer título."


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Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ABREU, Cesar Augusto Mimoso Ruiz. Remuneração e subsídios na Emenda nº 19/98: auto-aplicabilidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 3, n. 26, 1 set. 1998. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/319. Acesso em: 24 abr. 2024.