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Do caráter não obrigatório da análise, pelo órgão jurídico federal, na adesão à ata de registro de preços

Do caráter não obrigatório da análise, pelo órgão jurídico federal, na adesão à ata de registro de preços

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O artigo trata sobre o caráter não obrigatório da aprovação do edital, pelo órgão de assessoramento jurídico, quando da adesão por órgão federal.

Necessário perceber-se que uma das principais características do SRP é o fato de que ele permite que uma licitação reúna pretensões contratuais de diversos órgãos/entes públicos. Na sistemática admitida pelo SRP, tais órgãos reúnem suas pretensões contratuais para a realização de certame único, que será conduzido pelo “órgão gerenciador”.

Essa reunião pode produzir a obtenção de melhores propostas, uma vez que a ampliação do objeto da licitação, pela reunião de várias pretensões contratuais, permitindo ganhos em economia de escala, além da evidente diminuição dos custos burocráticos na realização da licitação.

Outrossim, para que essa sistemática funcione, com a eficiência que se exige, é importante racionalizar a lógica de processamento das demandas administrativas contratuais. Nesse sentido, por exemplo, firmou-se no Decreto federal nº 7.892/2013, restrição à incumbência de aprovação jurídica das minutas do edital e contratos, nas licitações para registro de preços.[1]

A regra acima, entendemos, foi incluída no corpo do regulamento federal para deixar claro que não cabe a aprovação jurídica da minuta do edital e contrato, pela assessoria jurídica do órgão participante. Esse ato (aprovação da minuta) é praticado pela assessoria jurídica do órgão gerenciador (que, em princípio, é o responsável pela condução das fases interna e externa da licitação, além do próprio gerenciamento da ARP), por uma questão de eficiência administrativa e de racionalização do procedimento licitatório.

Contudo, nada obstante a divergência em relação ao que será adiante defendido e a nossa opinião de que a regra prevista no Decreto visou à limitação da aprovação pela assessoria jurídica do órgão participante, parece-nos pertinente realizar uma interpretação ampliativa, em relação à assessoria jurídica do órgão não participante (aderente), quando da adesão, o que conduz à premissa de que não compete a ela, também, a “aprovação” das minutas adotadas na licitação.

É cediço que a manifestação jurídica de aprovação das minutas de editais e de contratos, conforme parágrafo único do artigo 38 da Lei nº 8.666/93[2], possui caráter obrigatório, mas não vinculante. Nada obstante, no que pese tal obrigatoriedade, a regra que a relativiza, em relação à assessoria jurídica dos órgãos participantes (ou, em nossa opinião, também pelos órgãos não participantes) busca, corretamente, racionalizar a tramitação burocrática do processo, evitando contradições opinativas que apenas prejudicariam a célere conclusão do certame ou da contratação.

No mesmo sentido, a futura contratação, lastreada na ata de registro de preços, está vinculada ao edital e a seus anexos, o que gera uma hipótese sui generis, prejudicando a “aprovação jurídica” da minuta do edital e contrato, pela assessoria jurídica do órgão participante ou não participante, uma vez que tal ato jurídico já foi praticado, quando da licitação (trata-se, in casu, de um parecer de natureza obrigatória).

Mesmo em relação ao contrato que será firmado pelo órgão participante ou não participante (aderente), descabe a “aprovação da minuta”, pela percepção lógica de que o princípio da vinculação impede que eventual discordância jurídica, em relação ao teor da minuta contratual estabelecida para o certame, possa gerar sua retificação, pela assessoria do órgão participante ou não participante, como condição para que o contrato seja firmado. Tal impedimento ocorre porque a alteração da minuta contratual, via de regra, não poderá ser feita, sob pena de descumprimento ao princípio da vinculação ao edital e riscos de desrespeito à isonomia e à competitividade.[3]

Ainda é conveniente ponderar que, caso admitíssemos que o órgão de assessoramento jurídico do órgão não participante (aderente) permanece com a atribuição de “aprovar as minutas” de contratos decorrentes da ARP, poder-se-ia gerar uma situação constrangedora, em que, por exemplo, órgãos da AGU estariam reprovando total ou parcialmente, minutas aprovadas por órgão da mesma AGU, incumbido do assessoramento jurídico do órgão gerenciador. Essa superposição da atuação de diversos órgãos jurídicos, pertencentes ao mesmo órgão, para realização da mesma atividade (aprovação de uma mesma minuta), parece-nos ineficiente e inadequada.

Frise-se que esse quadro é plenamente possível, notadamente diante da limitação subjetiva à adesão, por parte dos órgãos federais.

Nesta feita, parece-nos adequado realizar uma interpretação ampliativa, compreendendo que a aprovação da minuta (manifestação de natureza obrigatória), nas licitações sobre o Sistema de Registro de Preços, incumbe, apenas, ao órgão gerenciador, mesmo para as contratações relacionadas ao órgão aderente.

De qualquer forma, importante frisar que a desnecessidade de “aprovação” (obrigatória) da minuta contratual, pela assessoria jurídica do órgão não participante (aderente) não prejudica que seu órgão de assessoramento jurídico aprecie, a pedido do órgão consulente, a licitude da contratação, da adesão ou mesmo responda a qualquer dúvida jurídica relacionada. Contudo, ocorrerá, na espécie, uma manifestação de caráter facultativo (e não obrigatório, como sói ocorrer na “aprovação” das minutas).

Em suma, entendemos que, quando provocada pelo órgão consulente, na condição de órgão participante ou não participante (aderente), a manifestação do órgão de assessoria jurídica não tem o condão de “aprovar” a minuta (atividade jurídica já realizada pelo órgão de assessoria jurídica do órgão gerenciador), mas opinar sobre a viabilidade jurídica da presente contratação ou sobre outro aspecto suscitado em consulta, manifestação que não traz consigo a nuance da obrigatoriedade preconizada pelo parágrafo único do artigo 38 da Lei nº 8.666/93.


Notas

[1] 9º O edital de licitação para registro de preços observará o disposto nas Leis nº 8.666, de 1993, e nº 10.520, de 2002, e contemplará, no mínimo:

(...)

§ 4º O exame e a aprovação das minutas do instrumento convocatório e do contrato serão efetuados exclusivamente pela assessoria jurídica do órgão gerenciador. (Incluído pelo Decreto nº 8.250, de 2.014)

[2] Art. 38. In omissis.

Parágrafo único. As minutas de editais de licitação, bem como as dos contratos, acordos, convênios ou ajustes devem ser previamente examinadas e aprovadas por assessoria jurídica da Administração.

[3] Obviamente, esta premissa não impede que a minuta contratual padrão estabelecida no certame seja compatibilizada ao específico pedido de contratação. Assim, por exemplo, se a ata engloba o preço de dez itens licitados autonomamente, mas o órgão participante decidiu efetivar a contratação de sua pretensão contratual original, que envolvia apenas três deles, a minuta contratual será compatível com o objeto da contratação.


Autor

  • Ronny Charles Lopes de Torres

    Advogado da União. Palestrante. Professor. Mestre em Direito Econômico. Pós-graduado em Direito tributário. Pós-graduado em Ciências Jurídicas. Membro do Grupo de Editais de Licitações da AGU. Membro da Câmara Nacional de Uniformização da Consultoria Geral da União. Atuou como Consultor Jurídico Adjunto da Consultoria Jurídica da União perante o Ministério do Trabalho e Emprego. Atuou, ainda, na Consultoria Jurídica do Ministério da Previdência Social, na Consultoria Jurídica do Ministério dos Transportes e na Consultoria Jurídica da União, em Pernambuco. Autor de diversos livros jurídicos, entre eles: Leis de licitações públicas comentadas (8ª Edição. Ed. JusPodivm); Licitações públicas: Lei nº 8.666/93 (7ª Edição. Coleção Leis para concursos públicos: Ed. Jus Podivm); Direito Administrativo (Co-autor. 7ª Edição. Ed. Jus Podivm); RDC: Regime Diferenciado de Contratações (Co-autor. Ed. Jus Podivm); Terceiro Setor: entre a liberdade e o controle (Ed. Jus Podivm) e Improbidade administrativa (Co-autor. 3ª edição. Ed. Jus Podivm). Autor da coluna mensal “Direito & Política” da Revista Negócios Públicos.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

TORRES, Ronny Charles Lopes de. Do caráter não obrigatório da análise, pelo órgão jurídico federal, na adesão à ata de registro de preços. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 4978, 16 fev. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/39861. Acesso em: 25 abr. 2024.