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Ordem econômica e controle do poder

Ordem econômica e controle do poder

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SUMÁRIO: 1. Apresentação. 2. Igualdade de chances e desigualdade econômica. 3. Direitos fundamentais econômicos. 3.1. Uma explicação sociológica. 4. Canotilho e a Constituição dirigente. 4.1. Canotilho e os nossos juros. 4.2. Canotilho x Orlando Bitar. 4.3. Lassalle x Hesse. 5. Privatizações e (des)controle. 6. A (in)eficácia constitucional. 6.1. A Constituição hipócrita. 7. A (des)vinculação do legislador: um estudo de caso. 7.1. Os temporários do Bararu. 7.2. Constituição Federal e Lei de Improbidade. 8. Democracia e Accountability. 9. Considerações finais. 10. Referências bibliográficas.


RESUMO

O Mundo está em crise. O poder econômico e militar prevalece sobre as resoluções da ONU. As promessas de convivência pacífica entre os povos não têm sido cumpridas, e as normas do Direito Internacional não têm eficácia.

A globalização da economia, que inviabilizou o cumprimento das promessas de liberdade, igualdade e fraternidade, consagradas pelas constituições liberais-burguesas do século XVIII, e das promessas de justiça social das constituições dirigentes, que caracterizaram as últimas décadas do século passado, ampliou extraordinariamente a concentração do poder, e consolidou a hegemonia planetária do capitalismo, alterando também os conceitos de Estado nacional e de soberania.

Formalmente, o Brasil tem uma Constituição que garante inúmeros direitos fundamentais. No entanto, a enorme desigualdade social torna ineficaz essa garantia, e os tradicionais checks and balances da Teoria da Separação dos Poderes são incapazes de evitar que os governantes abusem do poder e descumpram a Constituição.

O presente trabalho trata da inefetividade da Constituição Brasileira, enfocando inicialmente os conceitos de CANOTILHO (Constituição Dirigente), FERDINAND LASSALLE (fatores reais do poder) e de KONRAD HESSE (força normativa da constituição), para apresentar depois um estudo de caso, ressaltando a consciente elaboração de diversas leis inconstitucionais, pela Assembléia Legislativa do Estado do Pará, sob os pretextos de fazer justiça social e solucionar o problema do desemprego.

Trata, ainda, do conceito de accountability, essencial para o funcionamento de um regime democrático.


1. APRESENTAÇÃO

Todos reconhecem, ou fingem reconhecer, que o poder pertence ao povo. Todas as nossas Constituições sempre o afirmaram, como um verdadeiro dogma, e até mesmo os Atos Institucionais procuraram legitimar o Regime de 1964 em função da vontade do povo. No entanto, ainda não conseguimos descobrir uma fórmula mágica para a limitação do poder dos governantes. Como seria possível impedir os abusos do poder, em seus vários aspectos e disfarces: político, econômico, tecnológico, militar, religioso, nacional, regional, comunitário, etc.? Afinal, somos apenas humanos, como dizia ROUSSEAU. [1]

A teoria da Separação dos Poderes do Estado, definitivamente sistematizada por MONTESQUIEU, no Espírito das Leis (1748), gestada sob a inspiração do racionalismo iluminista, na atmosfera das monarquias absolutistas, pretendia limitar o poder através dos freios e contrapesos, para que fosse possível evitar a tirania. Somente o poder seria capaz de limitar o poder: "le pouvoir arrête le pouvoir". Dizia Montesquieu que a concentração do poder em um só órgão, ou nas mãos de uma só pessoa, seria a própria definição da Tirania.

Mas nem MONTESQUIEU, nem os precursores dessa teoria, como LOCKE, HARRINGTON e BOLINGBROKE, deram a devida importância aos fatores sociais, políticos e econômicos necessariamente subjacentes a toda e qualquer normatividade jurídica. Por essa razão, preocuparam-se apenas em formular os checks and balances que pudessem limitar a atuação dos governantes e dos órgãos que estivessem no desempenho de parcelas do Poder Estatal. Tentaram limitar, apenas, os Poderes Constituídos, como se fosse possível a completa transferência, aos governantes, de todos os fatores reais do Poder, subjacentes na infraestrutura social.

Como conseqüência, mesmo nas primeiras Constituições elaboradas sob a inspiração do constitucionalismo histórico ou ideológico, identificado com o ideário da Revolução Francesa, é perfeitamente possível constatar o divórcio entre a Constituição real e a Constituição formal, ou escrita.

Embora feitas em nome do povo, na verdade existem sempre outros interesses, muito mais fortes. Dessa determinante, nenhuma Constituição esteve ou estará imune. Nem mesmo a Constituição norte-americana de 1.787, a cujo respeito o professor CHARLES A. BEARD [2] disse que foi elaborada por homens abastados, que tinham interesses a proteger, o que somente seria possível se eles, os Convencionais de Filadélfia, criassem um governo forte, para substituir o governo frouxo do regime confederativo. O professor BEARD, no Capítulo V de sua obra, estudando os arquivos e os documentos de sua época, apanhou a lista alfabética dos convencionais de Filadélfia, desde Abraham Baldwin até Robert Yates, para demonstrar, honestamente, que soma de interesses tinham esses homens todos. Apólices, interesses mobiliários, interesses imobiliários, eram armadores, eram homens ricos, como Washington, que era o homem mais rico do seu tempo, uma vez que não houve representação das classes menos favorecidas entre os convencionais de Filadélfia.

Essa crítica, dizia o Dr. ORLANDO BITAR, [3] desabou sobre os Estados Unidos como um tufão, e os professores universitários receberam a obra de BEARD dizendo que ela era indecente, porque o povo americano, ainda hoje, venera os originais de sua Constituição, e considera os "founding fathers" como uma espécie de semi-deuses.

Mas é evidente que BEARD tinha razão, em sua crítica, porque as Constituições e as leis não podem ser geradas espontaneamente, como em um passe de mágica. Elas são produtos históricos, culturais, e não se podem desvincular de seu código genético, que é a realidade social. Elas são necessariamente determinadas, em grande parte, pelo substrato político, econômico e social existente naquele determinado momento, embora essa determinação não seja absoluta, porque não se pode desprezar a função transformadora do ordenamento jurídico.

Se isso não ocorrer, ou seja, se houver um divórcio entre a Constituição real e a Constituição formal, esta não será mais do que uma folha de papel, no dizer de LASSALE, [4] porque estará em desacordo com o princípio ativo que lhe deve servir de fundamento. E não será efetivada, porque a sua efetivação seria prejudicial aos interesses dos detentores do poder.

Esse divórcio, que já era denunciado por LASSALLE, em 1.862, e por BEARD, em 1.910, tornou-se muito mais evidente, como resultado da concentração capitalista. Na sociedade industrial, altamente urbanizada e mecanizada, o poder cada vez mais se concentra, e o Direito tem se mostrado incapaz de controlar o poder econômico, que passou a rivalizar com o poder estatal.

No Mundo de hoje, do neoliberalismo e da globalização, resultantes do extraordinário progresso dos transportes e das comunicações, vigora o Mercado, mais do que o Direito. É a Nova Ordem Mundial, controlada pelos países ricos e pelas grandes empresas, que não prestam contas ao povo, a respeito de suas decisões, apesar da importância que essas decisões assumem, freqüentemente, para a própria sobrevivência da Humanidade.

O Estado-nação deixou de ser soberano. Os interesses dos países ricos (G7) e das grandes empresas transnacionais prevalecem sobre as normas internacionais e sobre as constituições nacionais, e isso tem produzido uma enorme concentração de renda. E de poder, evidentemente, porque é preciso não esquecer que a concentração do poder econômico causa também a concentração do poder tecnológico, militar, político, etc. E até mesmo do poder da ideologia, e o controle da mídia.

Mas seria possível limitar o poder imperial americano, que a pretexto de preservar a democracia no mundo, pretende agora usar todo o seu poderio bélico para desarmar uma nação, que supostamente possui armas de destruição em massa, quando os verdadeiros interesses parecem estar relacionados com as enormes jazidas petrolíferas do Oriente Médio? Alguns autores, considerando esses interesses subjacentes, já denominam "Oilgarquies" as minorias beneficiadas com essa política belicista. O desrespeito às decisões da ONU significará a falência do Direito Internacional, que será uma vez mais submetido ao poder dos canhões e dos interesses econômicos.

Dentro da Nova Ordem Mundial, dominada pelo Mercado, o conflito de classes já não se concentra, exclusivamente, na empresa, entre o patrão e o empregado. A empresa é hoje apenas um dos elementos da questão, porque o verdadeiro conflito ocorre entre os centros de poder econômico e político, entre as grandes corporações e os Estados-nação. O palco das lutas sociais, nos grandes eventos, como o Foro Econômico Mundial, é o campo das relações entre os centros de poder econômico e político. As maiores reivindicações políticas atuais se relacionam diretamente com os interesses das grandes empresas, e com a redução de seus lucros.

A receita anual das duzentas maiores empresas é superior ao Produto Interno Bruto (PIB) de mais da metade dos países do Mundo. Quatrocentos bilionários concentram maiores riquezas do que a metade mais pobre da população mundial, ou seja, três bilhões de pessoas.

De acordo com estudo realizado em dezembro de 2.000, por SARAH ANDERSON e JOHN CAVANAGH, do Institute for Policy Studies, [5] as grandes empresas já se tornaram economicamente mais poderosas do que os Estados. Assim, das 100 maiores entidades econômicas existentes no Mundo, 51 são corporações, e 49 são Estados.

Diria SIEYÈS: "A França não tem uma Constituição, porque ela não foi feita pelo povo".

Perguntaria ele: Existe hoje uma ordem jurídica nacional e internacional legítima? A Constituição Brasileira foi feita pelo povo? Ou o Brasil tem uma Constituição meramente formal, que não é efetiva, porque isso não interessa aos verdadeiros detentores do Poder?

Na verdade, o paradigma da separação dos poderes está ultrapassado. Hoje, cada vez mais, é preciso controlar o poder econômico. É necessário que o povo possa controlar as grandes empresas. É preciso que elas sejam obrigadas a prestar contas de suas decisões. É o que os ingleses e americanos denominam "corporate accountability".

Do contrário, seria apenas hipocrisia dizer que o poder pertence ao povo, ou que o povo é o titular do Poder Constituinte.


2. IGUALDADE DE CHANCES E DESIGUALDADE ECONÔMICA

Nos regimes monárquicos de direito divino, tudo dependeria da vontade de Deus. A boa ou a má sorte de cada um já estaria pré-determinada, e ninguém poderia impunemente transgredir essa ordem cósmica, porque os ricos seriam os eleitos dos céus, e os outros teriam sido criados apenas para servi-los.

Com a industrialização, a livre empresa e o capitalismo, as novas oligarquias usaram a doutrina do igualitarismo para justificar a ordem estabelecida, que faz derivarem da concorrência, e não do berço, todas as diferenças econômicas, políticas e sociais. O acaso, fruto da providência divina, foi substituído pela necessidade da seleção natural. A lei do mais forte passou a ser considerada como a força motriz da sociedade, e não apenas da natureza. Se pela ordem imutável das coisas, os leões devoram as gazelas, também na sociedade seria necessária a liberdade absoluta, o "laissez faire", para que o equilíbrio natural fosse estabelecido. Darwin pode ser considerado, portanto, um ícone do neoliberalismo e da globalização.

A vantagem dessa doutrina, para os detentores do poder, é que hoje o povo não tem mais tronos para derrubar, nem culpados para acusar. A sua miséria se deve, apenas, à sua própria incapacidade, à sua própria opção.

Mas as conseqüências dessa ordem econômica são evidentes, com o extraordinário aumento das desigualdades e da concentração do poder.

Para GAUDÊNCIO TORQUATO [6], o conflito clássico entre capital e trabalho foi substituído pelas relações entre as forças do mercado e as estruturas governativas, tornando peça de museu as velhas utopias e transformando a política em um espúrio processo de luta pelo poder:

"A política ingressa no foro dos negócios e perde a simbologia de missão cívica, transformando seus mecanismos - ideário, partidos, representantes, parlamentos - em ferramentas utilitárias. O bem comum não deixa de passar, antes, pela lupa do bem pessoal, fomentando a personalização do poder, a ressurgência de líderes carismáticos, o arrefecimento das idéias, o declínio das legendas, a perda de força das Casas parlamentares e a descrença nos atores políticos. A onda dos mercados globais passa a influenciar a ordem política, particularmente em países de instituições frágeis".

A Revista Forbes divulgou, no dia 27.02.2003, a lista dos homens mais ricos do planeta, incluindo cinco brasileiros que, sintomaticamente, são banqueiros, beneficiados pela inefetividade da limitação constitucional dos juros. São eles os irmãos Joseph e Moise Safra, do banco Safra, que possuem uma fortuna de US$ 3,6 bilhões, ocupando a 92ª posição dos homens mais ricos do mundo. Em terceiro lugar, Aloysio de Andrade Faria, que depois de vender o banco Real em 1998 para o ABN Amro, é dono do banco Alfa, com um patrimônio de US$ 2,7 bilhões, estando na 132ª posição no ranking dos bilionários. Em seguida vem Julio Bozano, que vendeu o Banco Bozano-Simonsen para o Santander, em 2000, e aparece na 348ª posição da lista, com um patrimônio de US$ 1,2 bilhão. O quinto lugar é de Lily Safra, viúva de Edmond Safra e cunhada de Joseph e Moise (primeiros da lista), que ocupa a 427ª posição da lista, com US$ 1 bilhão.

Por outro lado, as estatísticas da miséria são assustadoras. Mais de 20% da população mundial está morrendo de fome, e aproximadamente 2 bilhões de pessoas não dispõem de assistência médica, o que causa os enormes índices de mortalidade infantil nos países pobres.

A ONU classifica o Brasil em quarto lugar entre os países que possuem maiores desigualdades na distribuição de renda, atrás apenas de Serra Leoa, da República Centro-Africana e da Suazilândia. No Brasil, os 10% mais pobres recebem somente 0,7% da renda nacional, enquanto os 10% mais ricos se apropriam de 48% dessa renda. No nosso País, de todos o mais aquinhoado com recursos naturais, cinqüenta milhões de brasileiros excluídos sobrevivem com menos de meio salário mínimo.

Nos Estados do Norte, a situação é bem pior. Os dados do último censo do IBGE [7] mostram um quadro desolador. No Pará, 70% da população está abaixo da linha da pobreza.

Esses dados são ainda mais tristes, quando se sabe que o Pará é a maior província mineral do Planeta, que os garimpos geram sempre mais miséria e problemas sociais, e que a Vale do Rio Doce foi vendida a um grupo estrangeiro por apenas 3 bilhões de reais, ou seja, por menos de um por cento do valor estimado do minério que pretende explorar.


3. OS DIREITOS FUNDAMENTAIS ECONÔMICOS E A SUA INEFETIVIDADE

Inúmeros dispositivos da Constituição de 1.988 tratam dos direitos econômicos. Especificamente, o Título VII (Da Ordem Econômica e Financeira), nos arts. 170 a 192. Fora do Título VII, consagram igualmente normas de direito constitucional econômico os seguintes dispositivos: arts. 1º, 3º, 7º a 11, 201, 202 e 219. O professor EROS GRAU [8] indica ainda outros dispositivos, como: o art. 5º, LXXI, o art. 24, I, o art. 37, XIX e XX, o § 2º do art. 103, o art. 149, e o art. 225.

O art. 3º da Constituição de 1.988 determina que:

"Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;

........(...)

III- erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais..."

Declara também, a nossa Lei Fundamental, em seu art. 170, que a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos uma existência digna, conforme os ditames da justiça social e os diversos princípios que enumera, em seus nove incisos, entre os quais a função social da propriedade, a defesa do consumidor, a redução das desigualdades regionais e sociais, e a busca do pleno emprego.

Portanto, há quase quinze anos essas normas já existem, consagradas em nossa Lei Fundamental, visando a realização dos direitos sociais do homem e a efetivação de sua dignidade, que não poderá existir, porém, enquanto não se construírem as condições econômicas que assegurem a efetividade desses direitos.

Para o professor JOSÉ AFONSO DA SILVA, [9] o problema está em que muitos constitucionalistas ainda recusam a idéia de que os direitos sociais devam ser considerados como uma categoria dos direitos fundamentais da pessoa humana, e ainda os qualificam como meramente programáticos. Segundo ele, porém, tendo em vista o valor transcendente da dignidade humana, esse entendimento é completamente equivocado:

"De minha parte, sempre tomei a expressão direitos fundamentais da pessoa humana num sentido abrangente dos direitos sociais, e, portanto, não apenas os entendi como matéria constitucional mas como matéria constitucional qualificada pelo valor transcendente da dignidade da pessoa humana. Assim pensava antes da Constituição de 1988, guiado até pelo conteúdo de documentos internacionais de proteção dos direitos humanos. A Constituição assumiu essa posição, de sorte que, na sua concepção, os direitos sociais constituem direitos fundamentais da pessoa humana, considerados como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos."

Em apoio à sua tese, de que as normas constitucionais referentes aos direitos econômicos devem ser imediatamente efetivadas, JOSÉ AFONSO DA SILVA cita CANOTILHO, quando ele afirma que:

"a força dirigente e determinante dos direitos a prestações (econômicos, sociais e culturais) inverte, desde logo, o objecto clássico da pretensão jurídica fundada num direito subjetivo: de uma pretensão de omissão dos poderes públicos (direito a exigir que o Estado se abstenha de interferir nos direitos, liberdades e garantias) transita-se para uma proibição de omissão (direito a exigir que o Estado intervenha activamente no sentido de assegurar prestações aos cidadãos)"

Disse ainda o professor JOSÉ AFONSO DA SILVA [10] que:

" É difícil admitir a dignidade da pessoa humana num País de grandes misérias, mormente quando este país é um dos principais produtores de alimentos do mundo, país em que os 10% mais ricos se apropriam da metade da renda nacional, e os 50% mais pobres ficam com apenas 13,6% dessa riqueza; 1%, os ricos, têm participação praticamente igual (13,13%), onde 65% vivem na pobreza ou miséria, dos quais 54% são crianças, 24 milhões de crianças vivem na miséria, 23 milhões na pobreza, 33% das famílias ganham menos que um salário mínimo, e este fica ao nível da ridícula quantia de 60 dólares mensais; país em que a mortalidade infantil aumenta na razão direta da queda dos salários, e do desemprego em massa: na década de 80 eram 100 por 1000, hoje a taxa atinge a cerca de 170 mortes para cada 1000 nascidos vivos."

Mas apesar da existência de todas essas normas em nossa Lei Fundamental, e apesar dos inúmeros documentos internacionais, que garantem a igualdade soberana de todos os Estados, o respeito aos direitos do homem e às suas liberdades fundamentais, bem como o respeito à igualdade de direitos de todos os seres humanos, essas normas ainda estão muito distantes de sua efetivação.

Merece ser citada, neste ponto, a Declaração do Milênio [11], resultante da Assembléia Geral das Nações Unidas, reunida em Nova York, de 6 a 8 de setembro de 2.000, que reconheceu a necessidade da cooperação internacional para a solução dos problemas econômicos, sociais, culturais e humanitários, e reconheceu também que a mundialização, ou globalização, precisa se tornar uma força positiva para toda a humanidade, porque atualmente os seus benefícios e os seus encargos são repartidos de maneira extremamente desigual.

Aliás, não apenas as normas garantidoras de direitos sociais e econômicos da Constituição de 1988 estão muito longe, ainda, de sua efetivação, mas elas estão muito próximas de sua completa descaraterização ou revogação, em decorrência das reformas patrocinadas pelo projeto neoliberal, como adverte o professor EDUARDO CARRION [12]:

"Elemento importante na atual conjuntura são as iniciativas governamentais em matéria de reformas constitucionais, algumas já aprovadas pelo Congresso Nacional. Ao invés de conformar as políticas públicas à Constituição, inspirada nos princípios da democracia social e da democracia participativa, procura-se, na ótica conservadora, adaptar a Constituição ao projeto neoliberal, de alto custo social para as classes trabalhadoras. Grande parte das reformas constitucionais aprovadas atingiram o "núcleo jurídico-político fundamental" da Constituição de 1988, caracterizando uma verdadeira "fraude" à Constituição. Constituição essa que favorece um projeto de desenvolvimento nacional, inclusive como forma de viabilizar as conquistas sociais da Constituição. Projeto esse que historicamente, isto é, no contexto de uma industrialização tardia, encontrou e hoje ainda encontra no Estado um importante, se não decisivo, articulador. Não se trata de desconhecer ou de condenar o processo de internacionalização e de globalização da economia, mas de saber-se em que condições nos inseriremos nesse processo: como pólo periférico ou preservando a autonomia dos centros de poder nacionais em face da emergência das estruturas de poder transnacionais. De forma a que desenvolvimento, que implica também no nosso caso em resgate da dívida social, não seja confundido - abastardado poderíamos acrescentar - com simples crescimento econômico. Finalmente, o que se observa é uma tentativa de desmonte do Estado, a reforma econômica e a reforma administrativa, bem como a política indiscriminada de "privatizações" inserindo-se nessa perspectiva." 

Cabe recordar, também, que o § 1º do art. 5º da Constituição Federal dispõe: "As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata", e que a omissão de qualquer medida necessária para que as normas constitucionais se tornem efetivas poderá ser combatida através de uma ação direta de inconstitucionalidade por omissão (§ 2º do art. 103 da CF), ou através de um mandado de injunção (art. 5º, LXXI), quando a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania.

Qual poderia ser, então, a razão misteriosa, para a inefetividade desses direitos, se há tantos anos a normatividade constitucional pertinente parece tão clara e tão abundante?

3.1. Uma explicação sociológica

O professor JOSÉ EDUARDO FARIA escreveu, em 1998, [13] um interessante artigo, a respeito da reforma constitucional, no qual analisou, com muita propriedade, o impacto das condições políticas e econômicas atuais, da globalização e do enfraquecimento do princípio da soberania, sobre a nossa Constituição e a sua efetividade. A respeito da polêmica sobre se a Constituição é dirigente, ou seja, se ela se destina a promover o desenvolvimento econômico e a traçar as metas que os governos devem progressivamente realizar, ou se ela não passa de um texto legal que dificulta o livre funcionamento do Mercado e a modernização do País, disse o professor FARIA que a Constituição não pode ser vista apenas como a "lei suprema", porque é preciso levar em conta as recentes transformações econômicas, deslocando para o plano sociológico a discussão das funções que a Constituição deve desempenhar:

"Com a transnacionalização dos mercados, a internacionalização do sistema financeiro e a formação dos blocos regionais, aumentam as decisões tomadas fora do alcance da jurisdição dos Estados. Com o advento de formas mais flexíveis de produção e da interpenetração das estruturas empresariais, as fronteiras econômicas se dissolvem. A capacidade dos governos de gerir livremente seus instrumentos de política monetária, cambial e fiscal é relativizada. Quanto mais uma nação se insere no sistema mundial de produção, menos condições tem de se auto-administrar só com base nas variáveis internas. Na economia globalizada, as relações entre os problemas internacionais e os internos se invertem, de tal modo que os primeiros não são mais parte dos segundos. Ao contrário, estão acima dos problemas nacionais e também os condicionam. Com isso, as estruturas jurídicas forjadas com base no princípio da soberania, vital no contexto cultural e ideológico da formação do constitucionalismo moderno, têm sua centralidade e exclusividade postas em xeque. As intervenções regulatórias, os mecanismos de direção econômica, as concepções de "segurança nacional" e os projetos de crescimento auto-sustentado, que instrumentalizaram as estratégias de planejamento entre o pós-guerra e os anos 70, perdem efetividade. E as políticas de desenvolvimento de médio e longo prazos, tão comuns nesse período, colidem com o sentido de urgência decorrente da força transnacionalizadora dos capitais e dos mercados. Num cenário policêntrico como esse, que papel as Constituições realmente podem exercer? Se a autonomia decisória do Estado foi enfraquecida, comprometendo o exercício de suas funções controladoras, corretivas e distributivas, têm elas condições de atuar como princípio absoluto, visto e reconhecido como "norma fundamental"? Como estatuto ordenador e definidor de competências? Como instrumento de organização social e de conformação de políticas públicas, impondo aos legisladores ordinários e aos governantes a consecução de determinadas metas e objetivos materiais? O esvaziamento da força normativa das Constituições perante os novos esquemas regulatórios e as novas formas institucionais supranacionais e as subseqüentes propostas de reforma constitucional em perspectiva desreguladora não permitem responder afirmativamente a essas indagações."

Em suas conclusões, o Autor afirmou que não estamos assistindo à morte das Constituições, mas que elas estão em crise, porque perderam o seu papel de norma fundamental, no contexto econômico transnacionalizado e policêntrico, e não conseguem ser eficazes quando desconectadas das relações reais de poder cujo embate procuram balizar. Tudo se resume, portanto, segundo ele, à tensão entre a democracia e o capitalismo. A integração política, que corresponderia à vertente democrática, não consegue ser realizada exclusivamente no âmbito dos Estados enfraquecidos. A integração econômica, por sua vez, é produzida em uma perspectiva transnacional.

A análise é muito procedente, porque hoje cada vez mais o Mercado prevalece sobre o Direito. Na Nova Ordem Mundial, as decisões são tomadas pelas grandes corporações, conforme já anteriormente ressaltado, e não pela vontade do povo. O Poder já escapou de suas amarras, dos freios e contrapesos, e de toda e qualquer limitação jurídica. Retorna, aqui, a indagação exordial: como limitar o Poder?


4. CANOTILHO E A CONSTITUIÇÃO DIRIGENTE

A Constituição de 1988 pretendeu redemocratizar o País, após a ruptura com o Regime de 1964. Em seu Preâmbulo, ela já afirmou que o Estado brasileiro é um "Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais". Consagrou, ainda, como valor essencial, a dignidade humana, e incluiu os direitos sociais em seu Título II: Dos Direitos e Garantias Fundamentais.

Ela é, nitidamente, uma Constituição dirigente, no sentido de que enuncia diretrizes, fins e programas a serem realizados pela sociedade.

A idéia de Constituição dirigente foi formulada pelo festejado jurista português JOSÉ JOAQUIM GOMES CANOTILHO, em sua tese de doutorado [14] de 1.982, que abordou exatamente o tema das normas constitucionais programáticas e de sua inefetividade, em face da omissão do legislador. O título da obra, "Constituição dirigente e vinculação do legislador", já indicava o núcleo essencial do debate: como poderia a Constituição vincular os órgãos legiferantes, e como poderia o legislador cumprir adequadamente as imposições constitucionais.

No conceito de CANOTILHO, a Constituição não deve apenas limitar o Poder. Ao contrário, ela deve traçar as metas que deverão ser progressivamente realizadas pelo Estado, para transformar a ordem política, econômica e social, surgindo daí o problema nuclear do moderno constitucionalismo: como garantir os direitos sociais básicos? O grande desafio da Constituição dirigente é, portanto, a sua concretização, através da atividade legiferante ou regulatória, e através de sua interpretação e aplicação.

A tese do professor CANOTILHO teve uma extraordinária influência entre os constitucionalistas brasileiros, de modo que a publicação de sua segunda edição, em 2.001, suscitou uma enorme polêmica, durante o III Simpósio de Direito Constitucional, patrocinado pela Academia Brasileira de Direito Constitucional, quando alguns professores e alunos, em decorrência de uma tresleitura de seu prefácio, passaram a sustentar que o professor CANOTILHO teria dito que a Constituição dirigente havia morrido.

Em conseqüência, no âmbito do convênio existente entre o Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal do Paraná e a Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, o professor CANOTILHO foi chamado a participar de videoconferências, juntamente com outros 21 constitucionalistas brasileiros e portugueses, para esclarecer as dúvidas surgidas. Desses debates, resultou a obra "Canotilho e a Constituição Dirigente". [15]

4.1. CANOTILHO e os nossos juros

Pois bem: para quem já está acostumado com a inefetividade de nossa Lei (dita) Fundamental, é muito interessante observar que, durante esses debates, o professor CANOTILHO tenha demonstrado desconhecer que no Brasil não vigora, na realidade, a limitação dos juros, prevista no § 3º do art. 192 da Constituição Federal, porque o Supremo Tribunal Federal absurdamente já decidiu que se trata de norma programática, dependente de regulamentação pelo Congresso.

O professor FERNANDO FACURY SCAFF, da Universidade Federal do Pará, formulou algumas questões, referentes ao viés revolucionário vinculado ao dirigismo, e à vinculação do legislador. Assim, perguntou SCAFF ao professor CANOTILHO, às fls. 55: "Será que tudo que está inscrito na Constituição brasileira, direitos sociais inclusive, vincula o legislador?"

A essas indagações, o professor CANOTILHO respondeu, entre outras coisas, que:

"Poderá ser abusivo rastrear "normas revolucionárias" na Constituição brasileira. Mas elas lá estão a marcar a narratividade emancipatória:... .direito dos trabalhadores à participação nos lucros (...) usucapião pro labore.. (...) e a cobrança de taxas de juros reais sujeita ao limite de doze por cento ao ano, considerando-se a cobrança acima desse limite como crime de usura."

O professor SCAFF não desconhece, como ninguém no Brasil pode desconhecer, que essa norma, que existe há mais de quatorze anos, ainda não é efetiva, porque o Congresso é omisso, o Supremo é conivente e as instituições financeiras preferem cobrar juros de 180% ao ano. Todos pagamos, às instituições financeiras, juros abusivos, em limites fixados pelo Banco Central do Brasil, com supedâneo em norma não recepcionada pela vigente Constituição Federal.

Ou seja: não existe, no Brasil, a vinculação do legislador, de que fala CANOTILHO, em sua famosa tese de doutorado. Ao contrário, o legislador costuma "revogar" impunemente as normas constitucionais, como veremos a seguir, no capítulo 7º deste trabalho.

Mas a opinião do professor CANOTILHO, a respeito da efetividade das normas sociais e econômicas, ficou bastante clara, no fecho de sua resposta ao professor SCAFF:

"Quanto à terceira pergunta, ela levar-nos-ia a uma complexa discussão dogmática sobre a estrutura e natureza de normas constitucionais (distinção entre regras e princípios, normas de aplicação imediata e normas de aplicação diferida, normas auto-exequíveis e normas carecidas de interposição legislativa). Como quer que seja, a diferente estrutura e natureza das normas não autoriza, hoje, a reedição de teses (a começar pela de Carl Schmitt) que reconduziam todas as normas sociais e económicas de uma constituição a normas programáticas não vinculantes e, mais do que isso, a "não normas". Seria motivo para dizer que a norma da Constituição dos Estados Unidos impositiva da libertação dos escravos sem qualquer indenização seria apenas como uma declaração desprovida de efeitos jurídicos. Ainda bem que há revoluções sociais, económicas e políticas!" [16] (ob. cit., p.57) (os grifos não são do original)

4.2. CANOTILHO x ORLANDO BITAR

Apenas para repor a verdade dos fatos, embora sem querer desmerecer a construção doutrinária do professor CANOTILHO, deve ser ressaltado que o professor ORLANDO BITAR, em 1951, ou seja, trinta anos antes da tese do ilustre jurista português, em sua magnífica dissertação de Concurso para a Cátedra de Direito Constitucional da Faculdade de Direito do Pará, [17] já ressaltava, com muita propriedade e farto supedâneo doutrinário, que todos os artigos da Constituição devem ser tidos como mandamentais, para que sejam respeitadas as decisões políticas do poder constituinte:

"Cooley lembra ainda a questão das disposições que não são auto-exequíveis (self executing, self enforcing). Embora não se possam tornar obrigatórias aos particulares, por decisões do Judiciário, elas são sempre mandatórias, porque constituem uma ordem à legislatura. Esta não pode se furtar à elaboração da lei própria que regule a matéria. Tais, por exemplo, na nossa constituição vigente, os preceitos a que deveriam obedecer a legislação do trabalho e a da previdência social (art. 157), sem dúvida desde logo vigorantes aqueles que encontraram regulamentação ordinária anterior. Juristas atuais têm reafirmado categoricamente a obrigatoriedade total dos dispositivos constitucionais. O que quer que se encontre no documento escrito conhecido como constituição, diz Mathews, é constitucional no sentido formal, independentemente da essência da disposição. O que equivale à frase de Castillo – a constituição se define pela forma, e à afirmação do Ministro Castro Nunes: "toda matéria incluída na constituição é constitucional, inclusive as normas estranhas à organização dos poderes públicos, e garantias de liberdade, etc." Cada artigo da constituição sendo uma decisão política do poder constituinte, como quer Carl Schmitt e se a idéia fundamental de justiça não é determinante da própria validez da norma, diremos que todas as decisões exigem o mesmo acatamento por serem mandamentais..." (os grifos não são do original)

Mas o próprio professor CANOTILHO já apresentou, agora, um conceito mais relativo de sua Constituição dirigente, plasmada em 1982:

"A lei constitucional não tem capacidade para ser uma lei dirigente transportadora de metanarrativas ("transformação da sociedade no sentido de uma sociedade sem classes", "garantia da felicidade dos cidadãos", etc.). O caráter dirigente de uma constituição converter-se-á paradoxalmente em défice de direcção se a constituição for também uma lei com hipertrofia de normas programáticas articuladas com políticas públicas (da economia, do ensino, da saúde) sujeitas à mudança política democrática ou dependentes da capacidade de prestação de outros subsistemas sociais (ex.: políticas de pleno emprego, política de investimentos, política de habitação). Neste aspecto pergunta-se, hoje, se o texto constitucional de 1976, poderá ainda reivindicar algumas pretensões de dirigismo social e económico concebido em termos dirigentes. As considerações acabadas de referir relativizam o caráter dirigente de um texto constitucional mas tão pouco significam que as constituições não possam e não devam ter um papel de mudança social. [18](os grifos não são do original)

4.3. LASSALLE x HESSE

Também antes da tese de CANOTILHO, foi publicada, em 1959, a obra de KONRAD HESSE, [19] que pretendeu contestar a concepção sociológica de LASSALLE, [20] segundo a qual os fatores reais do poder constituiriam a essência da constituição, que não poderia ser identificada apenas como uma lei fundamental. A constituição seria apenas uma "folha de papel", se estivesse em desacordo com essa força ativa, resultante da realidade social. A Constituição formal seria determinada pela constituição real, resultante dos fatores reais do poder que regem a sociedade, em um certa época. Para Lassalle, portanto, as constituições escritas não teriam nenhum valor, nenhuma durabilidade, ou como diríamos hoje, não seriam eficazes, se não exprimissem fielmente os fatores reais do poder, determinantes da realidade social.

Em contraposição a esse entendimento sociológico, HESSE desenvolveu a tese de que existe um condicionamento mútuo entre a constituição real (fatores reais do poder) e a constituição jurídica (escrita, formal), de modo que a constituição jurídica desenvolve um significado próprio, porque a sua pretensão de eficácia lhe atribui uma força normativa. Em suma, a constituição reflete a realidade histórica, mas também se transforma, ela própria, em uma força ativa, capaz de modificar essa realidade.

Dizia o ilustre ex-Presidente da Corte Constitucional alemã:

"A Constituição não configura apenas expressão de um ser, mas também de um dever ser; ela significa mais do que o simples reflexo das condições fáticas de sua vigência, particularmente as forças sociais e políticas. Graças à pretensão de eficácia, a Constituição procura imprimir a ordem e conformação à realidade social e, ao mesmo tempo, determinante em relação a ela, não se pode definir como fundamental nem a pura normatividade, nem a simples eficácia das condições sócio-políticas e econômicas. Embora a Constituição não possa, por si só, realizar nada, ela pode impor tarefas. A Constituição transforma-se em força ativa se essas tarefas forem efetivamente realizadas, se existir a disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela estabelecida (...). Pode-se afirmar que a Constituição converter-se-á em força ativa se fizerem-se presentes, na consciência geral - particularmente, na consciência dos principais responsáveis pela ordem constitucional -,não só a vontade de poder, mas também a vontade de constituição." [21]

Para HESSE, portanto, a constituição real e a constituição jurídica condicionam-se mutuamente, mas a constituição jurídica adquire um significado próprio, porque a sua pretensão de eficácia se apresenta como um elemento autônomo. A força normativa da constituição dependerá, conseqüentemente, de que esta logre realizar essa pretensão de eficácia. A força normativa da constituição não resulta, apenas, de sua capacidade de refletir os fatores reais do poder, mas também de que ela própria se transforme em uma força ativa, capaz de alterar essa própria realidade.


5. PRIVATIZAÇÕES E (DES)CONTROLE

Inúmeros temas poderiam ser aqui tratados, com repercussão na ordem econômica, para que se pudesse avaliar em que medida a Constituição de 1988 tem sido capaz de exercitar essa força ativa, a que se refere KONRAD HESSE, e até que ponto ela se tem mostrado eficaz para alterar a nossa perversa realidade social.

Seria necessário, também, avaliar o grau de participação política do povo brasileiro na tomada das decisões mais importantes para o futuro do País, tais como as pertinentes às privatizações, à soberania nacional, à propriedade privada e à sua função social, aos investimentos estrangeiros, à remessa de lucros, à contratação de empréstimos externos, à reforma previdenciária, à reforma tributária, ao Mercosul, à Alca, ao controle do poder dos estabelecimentos bancários e das grandes empresas, e muitos outros.

Esse aprofundamento escapa, no entanto, aos limites deste trabalho, embora não escape a clara percepção de que tem ocorrido, em muitas oportunidades, um evidente desvio do poder do Estado em favor dos interesses dos grandes grupos econômicos, financeiros e empresariais, internos ou transnacionais, em detrimento dos reais interesses do povo brasileiro.

Ressalte-se que esse desvio ocorre nos três níveis de governo e através dos mais variados meios, expedientes e artifícios, prevalecendo sempre em virtude da impunidade, decorrente da inexistência ou ineficiência dos processos de controle, a começar pela nossa jurisdição constitucional, que adota, no dizer do Ministro Sidney Sanches, do Supremo Tribunal Federal, o controle confuso de constitucionalidade, porque o nosso é um sistema híbrido, do controle concentrado, de inspiração européia, e do controle difuso, criação norte-americana, e terminando pela quase inexistência do controle do povo em relação aos seus mandatários, o que decorre de nossa reduzida politização, ou seja, pela inexistência de "accountability", essencial à caracterização de um regime democrático.

A respeito das privatizações, disse MARCO AURÉLIO DE BARROSO [22] que:

" Privatização, por exemplo, tinha que existir. Mas o quadro de desordem nos contratos e nos financiamentos e a precariedade regulatória dentro da qual se desenvolveu o processo de privatização – do qual os casos da Vale do Rio Doce e da Light constituem exemplos espantosos - já é extremamente grave, tanto para os consumidores quanto para os cidadãos brasileiros. Na prática, o Governo privilegia as privatizações como suposto mecanismo de financiamento das contas internas e externas, deixando de lado tanto a melhoria dos serviços e a redução dos custos para o consumidor quanto o problema maior do emprego e da competitividade sistêmica. Não por acaso o processo de privatização avança na área de transferência patrimonial - com altos custos para o Tesouro e ônus de financiamento para o BNDES - sem que tenha sido definido um marco estratégico de política para os setores envolvidos e estabelecidas metas de investimento e mecanismos operacionais de regulação. A combinação deste processo desregulamentado de privatizações com a adesão inconsequente ao acordo de liberalização dos investimentos estrangeiros teria conseqüências trágicas para o país, servindo para legitimar toda sorte de abusos – econômicos, principalmente, praticados pelos investidores estrangeiros.

No que diz respeito às privatizações que envolveram concessões de serviços públicos, o exemplo da Light soou a campainha de alarme. Já está na hora de que a população brasileira passe do estágio de consumidores - maltratados e burlados - ao de cidadãos. Uma vez que se copia tantas coisas da sociedade de consumo americana, não estaria mal iniciarmos com decisão e em caráter permanente organizações do tipo "Public Citizen" nos moldes da iniciativa de Ralph Nader nos Estados Unidos. Este começou com a defesa dos consumidores e evoluiu para a defesa dos cidadãos contra os interesses dos poderosos ‘lobbies’ que operam no Congresso Americano e no Departamento de Estado. Assim foi que conseguiu frear o ‘fast track’ que autorizaria ao Presidente dos EUA tomar decisões sobre tratados de comércio e investimento que permitiriam aos grandes grupos financeiros norte-americanos obter automaticamente a aprovação da Presidência. Foi o movimento de defesa dos consumidores por ele fundado que, rompendo o muro de silêncio imposto pelo Departamento de Estado, divulgou pela Internet os termos do Acordo Multilateral de Investimentos, cujas cláusulas só agora vieram a público."

Em suma, o professor BARROSO conclui que o Governo brasileiro, sem se preocupar com as conseqüências sociais, tem sido muito complacente com a subordinação dos interesses nacionais à arrogância dos grandes grupos econômicos e financeiros multinacionais, e aos seus agentes políticos. E conclui, ainda, que é necessário criar:

"novos ‘comitês pela cidadania’ que levem o debate à sociedade, e pressionem pela imprensa e pelas vias judiciais, tanto os contratos abusivos que envolvem serviços de utilidade pública, que prejudicam o consumidor, quanto os acordos internacionais, pelos quais o governo brasileiro pode comprometer os destinos do país, sem uma consulta aos cidadãos, ampliando assim as lutas suprapartidárias iniciadas por Betinho e Barbosa Lima Sobrinho."

Fica mais do que evidente, portanto, que a cidadania não consiste apenas na participação, de dois em dois anos, através das urnas, porque se o poder realmente pertence ao povo, é preciso que o povo possa evitar que ele seja exercido apenas em benefício de uma oligarquia.

Mas é preciso insistir, ainda, em que hoje, com a redefinição da hierarquia dos poderes políticos e econômicos, decorrente do neoliberalismo e da globalização, e com o surgimento de um poder mundial hegemônico e o conseqüente enfraquecimento do princípio da soberania, não se pode mais restringir o controle do poder ao clássico sistema de freios e contrapesos.

É preciso controlar, também e principalmente, o poder econômico, que é capaz de criar e derrubar governos e que consegue, com a maior facilidade, adequar o nosso ordenamento jurídico aos seus interesses específicos. O poder econômico preenche os mais importantes cargos e funções públicas, distribui verbas e dotações orçamentárias, e influi poderosamente na mídia, para defender os seus interesses. Em um círculo vicioso, o poder político retribui as benesses recebidas, através da aprovação de leis, reformas constitucionais, e decisões necessárias à manutenção e à ampliação dos poderes dessa elite dirigente.

A respeito de nossa política econômica, interessa transcrever algumas das conclusões de LUIZ CARLOS MONTEIRO COUTINHO: [23]

"O Brasil é um país de pobres e excluídos da plena cidadania, apesar da prioridade constitucional pela pessoa humana. Os índices de mortalidade infantil, analfabetismo, mortalidade infantil, violência e desemprego indicados pela Comissão Econômica para a América Latina-CEPAL e pelo professor Márcio Pochmann, nos levam a pensar que a nossa Constituição, em sede de direitos humanos, não passa de uma "folha de papel", para se usar a expressão de Ferdinand Lassale; b) o processo de concentração de renda globalizado, onde 70% da população mundial aufere apenas 23% da renda produzida, causa a pobreza extrema, especialmente nos países subdesenvolvidos, e nesse "bonde" vai o Brasil, uma vez que os dados colhidos neste trabalho nos indicam que com o serviço das dívidas interna e externa, ou seja, juros e correção monetária - sem pagamento do capital - gastou-se 76,8% do Orçamento Geral da União; c) o Programa Nacional de Desestatização criado pelo governo do Presidente Fernando Collor, através da Lei n.º 8.031/90 e a revogação do art. 171 da Constituição, serviram apenas para acabar com a soberania econômica do Brasil, não passando de artifícios legais que atendem aos interesses escusos daqueles que venderam o patrimônio nacional, aliás com empréstimos de valores vultuosos do Estado brasileiro às empresas estrangeiras; d) o Estado brasileiro, ao contrário do que se faz nos países desenvolvidos, não tem uma política normativa que priorize a preferência pelo País, na aquisição de bens e serviços de seu mercado interno, daí porque se fez necessária a extinção da empresa nacional; e) a empresa privada brasileira, por conseqüência, não tem igualdade de concorrência no mercado internacional e navega à deriva, ao passo que as empresas estrangeiras, quando não estatais, vêm tomando o nosso mercado interno e são intransigentemente defendidas pelos Estados onde têm suas sedes; f) de tudo isso resulta o processo mais insano de desnacionalização da economia brasileira; g) a Constituição brasileira é uma Constituição dirigente que vincula, não apenas o legislador ordinário ou revisor da Carta, mas também todos os Poderes da República, de natureza política; h) o Poder Judiciário, portanto, como Poder Político, tem a seu cargo a realização dos princípios fundamentais sobre os quais se assenta a organização do sistema republicano e democrático adotado pela Carta Política. Aliás, o Poder Judiciário é o guardião da Constituição, conforme dispõe o seu art. 102, e, sendo assim, cumpre a este Poder decretar a invalidade (inconstitucionalidade) dos atos normativos ou não, lesivos aos princípios e fundamentos do texto constitucional, respeitados os critérios de validade adotados pelo ordenamento jurídico pátrio. Estamos, pois, afirmando a legitimidade do Poder Judiciário para invalidar atos do governo ou políticas normativas contrárias ao Estatuto Maior, com todas as suas conseqüências; i) é hora, portanto, do povo brasileiro defender a sua Constituição, exigir o seu cumprimento, de modo que a Ordem Econômica estabelecida pelo Poder Constituinte, possa efetivamente cumprir os seus objetivos, posto que não se pode fazer da Carta de 1988 uma "folha de papel ", ou, quando muito, a ela se dar o sentido de uma democracia liberal desnacionalizada."


6. A (IN)EFICÁCIA CONSTITUCIONAL

MARIA HELENA DINIZ [24] afirma que as normas programáticas possuem eficácia jurídica, a partir dos seguintes argumentos:

"a) impedem que o legislador comum edite normas em sentido oposto ao direito assegurado pelo constituinte, antes mesmo da possível legislação integrativa que lhes dá plena aplicabilidade, condicionando assim a futura legislação com a conseqüência de ser inconstitucional;

b) impõem um dever político ao órgão com competência normativa;

c) informam a concepção estatal ao indicar suas finalidades sociais e os valores objetivados pela sociedade;

d) condicionam a atividade discricionária da administração e do Judiciário;

e) servem de diretrizes teleológicas para a interpretação e aplicação jurídica (subsunção, integração e correção);

f) estabelecem direitos subjetivos por impedirem comportamentos antagônicos a elas."

Dizia o professor CANOTILHO [25] que hoje não é mais possível considerar como meramente programáticas as normas sociais e econômicas da Constituição, como se elas fossem "não normas".

Dizia, também, EROS ROBERTO GRAU, que "a Constituição do Brasil é – tem sido – uma Constituição dirigente e vincula o legislador. E ainda que tenha sido múltiplas vezes emendada, o seu cerne, que identifico fundamentalmente nos preceitos dos artigos 3º, 1º e 170, resta intocado." [26]

Caberia portanto, de acordo com EROS GRAU, [27] recordar a lição do Tribunal Constitucional da República Federal da Alemanha, que em 1969 decidiu que a omissão do Legislativo na regulamentação das normas programáticas não deve vulnerar a hierarquia máxima normativa da Constituição, porque isso consistiria na transferência da função constituinte ao Poder Legislativo, e que o Judiciário deveria ajustar a solução do caso sub judice ao preceito constitucional não implementado pelo legislador.

6.1. A Constituição hipócrita

Na verdade, a nossa Constituição de 1.988 não foi feita para instaurar uma nova ordem, mas apenas para manter a dominação já existente. Não pretendeu, na verdade, instaurar um Estado Social. A seguir, a opinião de EROS ROBERTO GRAU: [28]

"A Constituição formal, em especial enquanto concebida como meramente programática – continente de normas que não são normas jurídicas, na medida em que define direitos que não garante, na medida em que esses direitos só assumem eficácia plena quando implementados pelo legislador ordinário ou por ato do Executivo -, consubstancia um instrumento retórico de dominação. Porque esse o seu perfil, ela se transforma em mito.

(...) As Constituições formais inúmeras vezes consubstanciam modalidade exemplar de mito moderno. Por um lado, instalam no seio da coletividade a convicção de que se vive sob a égide do Estado de Direito. Por outro – sobretudo a partir do instante em que, tocada por um gesto de brilhantismo invulgar, a burguesia faz incluir nela um capítulo atinente aos direitos econômicos e sociais – funcionam como anteparo às expansões da sociedade, amortecida naquilo que seria expressão de sua ânsia de buscar a realização de aspirações econômicas e sociais. A Constituição, então, instaura o "Estado Social" e passa a ser exaustivamente "consumida" pela sociedade. Pouco importa que suas disposições tenham caráter programático, contemplem direitos não juridicamente exeqüíveis, isto é, não garantidos. Outro lance de brilhantismo invulgar encontra-se na teorização da distinção entre direitos e garantias. Pacificam-se as consciências das ordens privilegiadas e os néscios encontram o conforto próprio aos que vivem sob a égide da Constituição, devidamente conformados – seja porque se tornam pacíficos, seja porque seus comportamentos assumem padrões predeterminados, na dupla denotação do vocábulo. A Constituição, assim – isto é, o documento formal denominado "Constituição" – desnuda-se como instrumento de dominação ideológica. É mito que acalentamos, dotado de valor referencial exemplar, na medida em que contribui eficazmente para a preservação da ordem que não se pretendia instaurar, mas, simplesmente, manter."

Evidentemente, não havia sinceridade na Constituinte de 1.987/1.988, aliás uma estranha Constituinte, porque foi convocada pelo Poder Reformador, através da Emenda Constitucional nº 26, de 27.11.1985. Ou seja: o Congresso Nacional, que não poderia exercer o Poder Constituinte Originário, mas apenas o Poder Reformador, através dessa Emenda (?) transformou o futuro Congresso em uma Assembléia Constituinte, dotada de poderes soberanos para aprovar uma nova Constituição Federal. E com uma agravante: participaram da Constituinte os senadores "biônicos", um por Estado, que haviam sido eleitos indiretamente, em 1.982, pelos Colégios Eleitorais, nos termos do § 2º do art. 41, c/c o § 2º do art. 13 da Constituição Federal de 1.967, com a redação da Emenda Constitucional nº 8, de 14.04.1977 (integrante do Pacote de Abril, conjunto de normas editadas com fundamento no Ato Institucional nº 5/68, após a decretação do recesso do Congresso Nacional).

A burguesia, que no dizer de EROS GRAU fez incluir na Constituição de 1988 um capítulo atinente aos direitos econômicos e sociais, não pretendia nenhuma mudança, mas apenas simular que tudo mudaria, como no cínico presságio de LAMPEDUSA, ao explicar os objetivos e a dissimulação da elite dominante: "Se quisermos que tudo permaneça como está, basta simularmos que tudo muda." [29]

Esperemos que haja um mínimo de sinceridade nas propostas do Presidente Lula e do novo Governo, referentes à redução da pobreza, para que não se concretize, uma vez mais, esse presságio.


7. A DESVINCULAÇÃO DO LEGISLADOR: UM ESTUDO DE CASO

Mas seria muito interessante, realmente, que tivéssemos uma Lei Fundamental, respeitada por todos, governantes e governados. No entanto, essa não é a nossa realidade, porque a respeito das normas programáticas, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem sido muito clara, no sentido de negar ao Judiciário a possibilidade de sua efetivação. Na prática, a omissão do legislador tem prevalecido, porque as garantias constitucionais do mandado de injunção e da ação direta de inconstitucionalidade por omissão têm sido anuladas pelo entendimento de que o Judiciário não pode sanar a omissão do legislador, mas apenas "recomendar" que seja providenciada a edição da norma indefinidamente postergada.

Não existe, assim, na prática, a vinculação do legislador. Nossa Constituição, embora seja teoricamente rígida, porque prevê um processo especial para a sua reforma, e um complexo sistema de controle de constitucionalidade, que deveria servir para evitar a prevalência das leis inconstitucionais, na verdade tem sido facilmente modificada, pela sistemática omissão do legislador. Entre nós, infelizmente, o legislador está inteiramente desvinculado da obediência às normas programáticas da Constituição.

A Constituição de 1.988 determinou, no § 3º de seu art. 192, que:

"As taxas de juros reais, nelas incluídas comissões e quaisquer outras remunerações direta ou indiretamente referidas à concessão de crédito, não poderão ser superiores a doze por cento ao ano; a cobrança acima deste limite será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos que a lei determinar."

Qualquer jurista, que não esteja familiarizado com os critérios hermenêuticos às vezes utilizados pelo Supremo Tribunal Federal, ao ler esse dispositivo, entenderá, com certeza, que a norma que limita os juros a doze por cento ao ano é de eficácia plena, e que apenas a tipificação do crime de usura e a fixação das penas foram deixadas para uma lei posterior. No entanto, o Supremo Tribunal Federal já decidiu que essa é uma norma meramente programática, e que os juros abusivos poderão continuar sendo cobrados, enquanto o Congresso Nacional não elaborar a referida lei.

Hoje, decorridos quase quinze anos de sua edição, a norma do § 3º ainda não existe em nosso ordenamento jurídico. É completamente ineficaz, o que significa que a Constituição vem sendo, continuamente, reformada, através da simples omissão do Congresso Nacional, que se nega a editar as leis que seriam necessárias à efetivação de inúmeros dispositivos constitucionais. Não se pode afirmar, portanto, que a nossa Constituição seja rígida, porque somente admite a sua reforma, nos termos do art. 60 da Constituição Federal, pelo Congresso Nacional, através de um processo especial, mais difícil do que o processo utilizado para a legiferação ordinária.

Na realidade, ela vem sendo reformada, por um processo muito mais flexível, o da simples omissão do Congresso Nacional, porque o Supremo Tribunal Federal já decidiu que não lhe cabe editar a norma necessária, mas apenas "recomendar" ao Legislativo que o faça, para suprir a sua omissão. Sem a fixação de um prazo para que essa omissão seja suprida, a Constituição perdeu, em grande parte, a sua eficácia, porque inúmeras normas programáticas servem, apenas, para enganar os juristas estrangeiros, que às vezes pensam que existe alguma seriedade em determinados setores de nosso Governo, que seriam responsáveis pelo respeito ao princípio da supremacia constitucional.

Mas o problema é ainda muito mais grave, porque se é graças ao beneplácito do Supremo Tribunal que a omissão do legislador tem prevalecido em relação aos dispositivos constitucionais tidos como programáticos, por outro lado, deve-se à ineficiência de nosso controle de constitucionalidade a prevalência de inúmeras leis inconstitucionais, que têm conseguido revogar, na prática, dispositivos constitucionais de eficácia plena, que não dependeriam, absolutamente, da edição de qualquer norma posterior.

7.1. Os temporários do Bararú

Dispõe a Constituição Federal de 1.988 que a investidura em cargo ou emprego público dependerá da aprovação prévia em concurso público (art. 37, II), e que a lei estabelecerá os casos de contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público (art. 37, IX). A matéria foi rigorosamente disciplinada pela Lei 8.745/93.

No entanto, essa exigência constitucional, que encontra motivação nos princípios da igualdade, da impessoalidade e da moralidade, e que não se trata, absolutamente, de norma programática, cuja eficácia dependesse da edição de uma lei regulamentadora, vem sendo inobservada, há muitos anos, em todo o Brasil, em diversos Estados e Municípios, e até mesmo em alguns órgãos federais.

No Estado do Pará, apenas para exemplificar, temos os "temporários do Bararú", assim denominados em razão do nome do deputado que durante muitos anos apresentou os projetos que resultaram na indefinida prorrogação dos contratos desses servidores.

Tudo começou com a Lei Complementar nº 7/91, de 25.09.91, que estabelecia, em seu art. 2º, que o prazo máximo da contratação seria de seis meses, prorrogável, por igual período, uma única vez.

No entanto, em 04.02.93, a Lei Complementar nº 11/93 autorizou a prorrogação dos contratos temporários até 31.12.93, embora prevendo que deveria "o Estado promover concurso público para provimento das funções, na medida da necessidade".

No ano seguinte, em 01.02.94, a Lei Complementar nº 19/94, embora estabelecendo que deveriam ser realizados os concursos públicos até 31.07.95, permitiu a prorrogação dos contratos temporários até 31.12.95, "em função da insuficiência de pessoal para a execução dos serviços e do desempenho anterior do servidor". Antes dessa data, a Lei Complementar nº 30, de 28.12.95, autorizou a prorrogação dos contratos dos servidores temporários até 31.12.98. Recomendou, porém, que "devem as autoridades responsáveis tomar as providências para a realização de concurso público, para admissão de pessoal, em caráter permanente, nos setores em que houver vagas e necessidade de serviço".

A Lei Complementar nº 36, de 04.12.98, autorizou a prorrogação desses contratos até 31.12.02, embora repetindo a recomendação acima transcrita. Evidentemente, prorrogar contratos de servidores temporários por quatro anos não deixa qualquer dúvida a respeito da completa ineficácia, no Estado do Pará, da norma constitucional que exige o concurso público, e que somente permite a contratação sem concurso para atender a uma necessidade temporária de excepcional interesse público. Conseqüentemente, deveria ser aplicada a norma do §2º do mesmo art. 37, que prevê a nulidade do ato e a punição da autoridade responsável.

No entanto, a nossa Assembléia Legislativa aprovou, por unanimidade, diga-se de passagem, em junho do ano passado, a Lei Complementar nº 40/02, em uma tentativa de "efetivar" os servidores temporários; segundo os ilustres deputados, para evitar um grave problema social, com o desemprego desses servidores. Ressalte-se, ainda, que os nossos deputados publicamente confessaram reconhecer a inconstitucionalidade dessa Lei, mas disseram que a sua aprovação seria necessária, por uma questão de "justiça social".

Mais recentemente, em dezembro, foi aprovada a Lei Complementar nº 43/02, que prorrogou por dois anos esses contratos.

Evidentemente, todas essas leis eram e são inconstitucionais, e têm servido apenas a determinados interesses políticos, e para que se chegasse hoje aos números absurdos que têm sido divulgados, de 20.000, apenas nos órgãos estaduais, sabendo-se que existem inúmeros servidores temporários na Assembléia Legislativa (261), e também no Tribunal de Justiça do Estado, no Ministério Público Estadual (158), no Tribunal de Contas do Estado, e no Tribunal de Contas dos Municípios, ou seja, nos próprios órgãos que deveriam impedir que essa imoralidade se concretizasse.

Mas essas leis, sendo materialmente inconstitucionais, são também formalmente inconstitucionais, porque o art. 105 de nossa Constituição Estadual dispõe que são de iniciativa privativa do Governador as leis que disponham sobre "os servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos,... " (art. 105, II, "b").

Todos os projetos foram apresentados pelos deputados, a maioria pelo deputado Antenor Bararú, diversas vezes reeleito em conseqüência de sua atuação em favor desses servidores. Portanto, todas as leis que autorizaram a contratação e a prorrogação dos contratos dos servidores temporários são também formalmente inconstitucionais, por vício de iniciativa, porque compete privativamente ao Governador a iniciativa das leis que disponham sobre os servidores públicos do Estado.

Ressalte-se, ainda, que no Tribunal de Contas dos Municípios a situação é ainda mais escabrosa, porque a contratação sem concurso vem desde as origens dessa Corte, ainda como Conselho de Contas dos Municípios, quando a Lei nº 5.033/82, em seu art. 46, cuja redação foi alterada pela Lei 5.033/82, autorizou a primeira investidura sem concurso público, em caráter efetivo, nos cargos de Auditor e Procurador desse Órgão.

Em 1.987, o Supremo Tribunal Federal julgou procedente a Representação de Inconstitucionalidade nº 1.359/PA, referente a essa Lei, sendo Relator o Ministro Oscar Correa (Publicação: DJ DATA-19-06-87 PG-12448 EMENT VOL-01466-01 PG-00054). No entanto, mais de quinze anos depois daquela decisão, esses servidores temporários (37, de acordo com a mídia) continuam exercendo suas importantes atribuições naquela Corte, e muitos deles estão hoje aposentados.

7.2. Constituição Federal e Lei de Improbidade

Desde a vigência da Constituição de 1.988, o princípio da exigência do concurso público tem sido desrespeitado, em todo o Brasil, em inúmeros municípios, nos Estados e até mesmo em órgãos federais, mas em nosso Estado a questão dos temporários apresenta pelo menos duas peculiaridades:

a) a primeira, a existência das leis acima referidas, que autorizam a contratação e a prorrogação dos contratos dos temporários, e que de certa forma têm servido para que os administradores estaduais acreditem que não podem ser alcançados pelas normas dos parágrafos 2º e 4º do art. 37 da Constituição Federal e pelas sanções da Lei nº 8.429/92, que tratou dos atos de improbidade administrativa, que poderão resultar na suspensão dos direitos políticos, na perda da função pública, na indisponibilidade dos bens e no ressarcimento ao erário, sem prejuízo da ação penal cabível. Afinal, esses administradores podem perfeitamente afirmar, agora, que estão apenas cumprindo a Lei Complementar nº 43/02, que autorizou a contratação dos temporários e a prorrogação dos seus contratos, por mais quatro anos! Evidentemente, ao cumprirem essa lei inconstitucional, que é totalmente nula, eles estão preferindo descumprir a Constituição Federal, para satisfazerem a outros interesses, que não o interesse público, nem o de fazer a "justiça social".

b) além disso, fica também evidente, em nosso Estado, a completa ausência dos órgãos que teriam a missão constitucional de fiscalizar e de evitar que se chegasse a esta situação absurda, em que os governantes deliberadamente descumprem as normas constitucionais, prejudicando não apenas o interesse público, mas também os próprios servidores temporários, que trabalham durante longos anos e que não têm qualquer direito, a não ser o pagamento dos salários e a aposentadoria pela previdência geral, mesmo depois de "efetivados" no quadro suplementar. Ao contrário, o mesmo não parece ter acontecido em outros Estados, como São Paulo, onde tramitam inúmeras Ações Civis Públicas, e inúmeros prefeitos e vereadores foram responsabilizados pela prática da improbidade administratriva. Apenas para exemplificar, pode ser também citado Santa Catarina, que tem sido bastante rigoroso na fiscalização da contratação de temporários, pelos 293 municípios catarinenses, e cujo Ministério Público possui uma Coordenadoria da Moralidade Administrativa.

Seria perfeitamente possível, portanto, a instauração de Inquérito Civil, pelo Ministério Público Estadual, para a apuração da eventual prática de atos de improbidade por membros de qualquer dos Poderes Constituídos, para a posterior instauração de Ação Civil Pública, destinada à anulação do ato e à responsabilização de seus mentores. Os legisladores também podem cometer atos de improbidade, quando aprovam um instrumento normativo de caráter concreto, destinado a beneficiar, de maneira inconstitucional, um grupo de pessoas, como os temporários, em detrimento do interesse público.

O problema, evidentemente, é que o próprio Ministério Público do Estado do Pará tem inúmeros servidores temporários, beneficiando-se também dessa imoralidade, e os Promotores responsáveis alegam que não podem tomar nenhuma providência contra os administradores que efetuam essas contratações e prorrogações (entre elas, o próprio Procurador Geral de Justiça), porque eles estão apenas cumprindo a Lei que autoriza essas contratações. Disseram eles, pelo Ofício nº201/2002-MP/2ºPJ/DC/PP, de 03.06.2002, que caberia ao Procurador Geral de Justiça ingressar perante o Tribunal de Justiça do Estado com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra essa lei, para que eles pudessem, posteriormente, responsabilizar as autoridades que efetuaram aquelas contratações. Até hoje, isso não foi feito, evidentemente.

Fica assim provado, portanto, que a separação de poderes não funciona, na hipótese, porque todos os órgãos e inúmeros políticos estão interessados na manutenção desse esquema, que beneficia apenas a elite dominante, e não estão nem um pouco preocupados com a efetividade da Constituição, nem com o respeito ao princípio constitucional da moralidade. Fica provado, também, que os nossos legisladores não estão vinculados pelos dispositivos constitucionais, nem pelas normas programáticas, como seria o caso daquelas acima referidas, que limitam os juros, e nem mesmo pelas que deveriam ter eficácia plena, se a nossa Constituição fosse respeitada e os mecanismos de controle do poder fossem efetivos, para que se evitasse a impunidade.

Diria LUÍS ROBERTO BARROSO [30] que ainda estamos sofrendo as conseqüências do Regime de 64:

"No plano institucional, o exercício autoritário do poder desprestigiou e enfraqueceu os órgãos de representação política e afastou da vida pública as vocações de toda uma geração. O processo de amadurecimento democrático, de consciência política e de prática da cidadania ficou truncado. Agravou-se, ainda, pelo fisiologismo e clientelismo – que não podiam ser denunciados nem combatidos à luz do dia – a atávica superposição entre o público e o privado, com as perversões que a acompanhavam: favorecimentos, nepotismo, corrupção e descompromisso com a eficiência."


8.DEMOCRACIA E ACCOUNTABILITY

Accountability significa obrigação, dever, responsabilidade. No vernáculo, poderíamos talvez dizer "controlabilidade", no sentido de que os governantes têm o dever de prestar contas aos cidadãos, enquanto que estes têm o direito de responsabilizar os governantes pelos seus erros.

Essa "controlabilidade" é o elemento essencial da democracia. Em qualquer democracia, os cidadãos têm o direito de controlar os governantes, o que não pode ser feito apenas através das eleições. JAMES MADISON já ressaltava, em um dos artigos publicados na imprensa de Nova York, em defesa do projeto de Constituição, que não somente o poder dos governantes lhes é atribuído pelo povo, mas os governantes devem ser mantidos sob controle. [31]

Para que esse controle seja efetivo, porém, existem alguns requisitos, e os mais importantes deles são os relacionados à cultura, à cidadania, e à participação política do povo, porque a ignorância, como já ressaltava TOCQUEVILLE, [32] favorece a concentração do poder e a escravização do povo:

"...the concentration of power and the subjection of individuals will increase amongst democratic nations... in the same proportion as their ignorance."

Em suma, a Constituição somente será efetiva quando o povo se conscientizar de que é ele o titular do poder, e souber exigir dos governantes o integral respeito à nossa Lei Fundamental, impedindo os privilégios e a impunidade daqueles que se encastelaram nos postos de comando apenas para se beneficiarem pela criação de sinecuras vitalícias para todos os seus familiares, amigos ou correligionários.

Como ressalta COMPARATO [33], "no regime democrático, o atributo maior da soberania popular consiste em constitucionalizar a nação."

Para isso, no entanto, para que o Governo não possa abusar do poder, é preciso que os cidadãos sejam responsáveis, e que levem a sério os problemas políticos, informando-se, discutindo e votando conscientemente.

A tarefa não é fácil, claro, mas hoje controlar o poder é ainda mais difícil, devido à extraordinária concentração do poder econômico, resultante da globalização do capitalismo. Os interesses das grandes corporações não são os mesmos interesses do povo, mas as suas decisões atingem, freqüentemente, os direitos fundamentais do homem e anulam, às vezes, a sua dignidade. O poder das corporações é enorme, e também precisa ser controlado, como se observa, aqui mesmo em nosso Estado, em relação à Vale do Rio Doce.

Em um Estado de Direito, todo poder deve ser controlado, e o enorme poder exercido pelos dirigentes das grandes empresas é extremamente contraditório, em uma sociedade democrática, porque esses dirigentes não são eleitos pelo povo, e porque essas empresas, pela sua própria natureza, visam muito mais o lucro do que o benefício do interesse público. O problema é muito sério, portanto, haja vista que hoje o poder pertence às grandes corporações transnacionais, muito mais do que aos governantes eleitos pelo povo.

ROBERT MONKS, proeminente teórico do "corporate accountability", sugere que devem ser adotadas medidas que obriguem as corporações a obedecerem às leis, a compensarem os eventuais prejuízos causados à sociedade, e a não influenciarem demasiadamente os atos do Governo. [34]


9. CONSIDERAÇÕES FINAIS.

9.1. O paradigma da separação dos poderes está hoje ultrapassado, porque cada vez mais é preciso controlar o poder econômico. É necessário que o povo possa controlar as grandes empresas, que comandam a economia e o poder em escala mundial. É preciso que elas sejam obrigadas a prestar contas de suas decisões, para que o "lucro" não possa prevalecer sobre a democracia.

9.2. Da mesma forma como o desrespeito às decisões da ONU, com a agressão ao Iraque, significará a falência do Direito Internacional, cada vez mais o Direito Constitucional também se submete ao poder dos canhões e ao interesse econômico das grandes corporações.

9.3. Apesar do enorme progresso tecnológico, portanto, a humanidade ainda não aprendeu a se governar. Isso é mais do que evidente, pela simples observação do cotidiano, que ressalta o primado da força e da violência, e a universalidade do governo de homens, ao invés do sonhado governo de leis.

9.4. A Constituição, como estatuto do Poder, e como lei fundamental do Estado, ao fixar as bases do ordenamento jurídico, estabelece também os limites ao exercício do poder pelos governantes. No entanto, com a ineficácia de suas normas, programáticas ou não, prevalecem sempre os interesses da elite dominante, em detrimento dos "direitos" do povo, que teoricamente seria o titular do poder.

9.5. Para limitar o poder, é indispensável combater a promiscuidade dos interesses comuns que freqüentemente unem a Justiça, a política, o Executivo, o Legislativo, a elite dominante, o Ministério Público, os Tribunais de Contas, as grandes empresas, e alguns advogados.

9.6. A Constituição não passará de um pretensioso, ridículo e caro pedaço de papel, se não pudermos contar com uma cidadania alerta e consciente, que possa exigir o respeito aos seus direitos fundamentais. Afinal, o Direito é uma eterna luta, para limitar o Poder e combater a injustiça, porque a espada sem a balança é apenas a força bruta, mas a balança sem a espada é a total impotência do Direito.


10. NOTAS

01. "Para descobrir as melhores regras de sociedade que convêm às nações, seria necessária uma inteligência superior que, descobrindo todas as paixões humanas, não experimentasse nenhuma, que não tivesse relação com a natureza, e que a conhecesse a fundo, cuja felicidade fosse independente de nós, e que, por conseguinte, pudesse ocupar-se da nossa, e finalmente, que no transcurso dos tempos, contentando-se com uma glória longínqua, pudesse trabalhar num século para gozar sua obra no outro. Seriam precisos deuses para legislar aos homens". ROUSSEAU, Jean-Jacques.

02. BEARD, Charles A. American Government and Politics, New York: The MacMillan Company, 1.910.

03. BITAR, Orlando Chicre Miguel. Aulas de Direito Constitucional, curso mimeografado, 1.963.

04. LASSALE, Ferdinand. O Que é uma Constituição? Belo Horizonte: Editora Líder, 2.001

05. Sources: Sales: Fortune, July 31, 2000. GDP: World Bank, World Development Report 2000. Disponível na internet em : http://www.corporations.org/system/top100.html

06. TORQUATO, Gaudêncio. O Poder do Executivo, artigo publicado no jornal O Liberal de 13.02.2003

07. "Fome é a realidade de 2,5 milhões de paraenses", notícia publicada no jornal O Liberal, de 02.03.2003

08. GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. São Paulo: Malheiros Editores, 2002

09. SILVA, José Afonso da. Garantias Econômicas, Políticas e Jurídicas da Eficácia dos Direitos Sociais.

10. SILVA, José Afonso da. Garantias Econômicas, cit.

11. (Sommet du millénaire : 54e session - Assemblée du millénaire de l´Assemblée Générale des Nations Unies, 6 au 8 septembre 2000, New York).

(...)

Nous sommes résolus à instaurer une paix juste et durable dans le monde entier conformément aux buts et aux principes inscrits dans la Charte.

Nous réaffirmons notre volonté de tout faire pour assurer l´égalité souveraine de tous les Etats;

le respect de leur intégrité territoriale et de leur indépendance politique; le règlement des différends par des voies pacifiques et conformément aux principes de la justice et du droit international; le droit à l´autodétermination des peuples qui sont encore sous domination coloniale ou sous occupation étrangère; la non-ingérence dans les affaires intérieures des Etats;

le respect des droits de l´homme et des libertés fondamentales;

le respect de l´égalité des droits de tous, sans distinction de race, de sexe, de langue ou de religion;

et une coopération internationale en vue du règlement des problèmes internationaux à caractère économique, social, culturel ou humanitaire.

Nous sommes convaincus que le principal défi que nous devons relever aujourd´hui est de faire en sorte que la mondialisation devienne une force positive pour l´humanité tout entière.

Car, si elle offre des possibilités immenses, à l´heure actuelle ses bienfaits sont très inégalement répartis, de même que les charges qu´elle impose.

Nous reconnaissons que les pays en développement et les pays en transition doivent surmonter des difficultés particulières pour faire face à ce défi majeur.

La mondialisation ne sera donc profitable à tous, de façon équitable, que si un effort important et soutenu est consenti pour bâtir un avenir commun fondé sur la condition que nous partageons en tant qu´êtres humains, dans toute sa diversité. Cet effort doit produire des politiques et des mesures, à l´échelon mondial, qui correspondnt aux besoins des pays en développement et des pays en transition et sont formulées et appliquées avec leur participation effective.

(...)

12. CARRION, Eduardo K. M. A Efetividade dos Direitos Fundamentais, disponível na internet em:

http://www.direito.ufrgs.br/pessoais/carrion/Nova%20pasta/A%20EFETIVIDADE%20DOS%20DIREITOS%20FUNDAMENTAIS.doc

13. O Debate sobre a Reforma Constitucional, artigo publicado no jornal O Estado de S. Paulo, de 10.08.98

14. CANOTILHO, J.J.Gomes. Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador. Coimbra, 1.982

15. COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda, org. Canotilho e a Constituição Dirigente. Rio de Janeiro/São Paulo: Editora Renovar, 2.003.

16. Canotilho e a Constituição Dirigente, cit., p. 57.

17. BITAR, Orlando Chicre Miguel, A Lei e a Constituição. Alguns Aspectos do Controle Jurisdicional de Constitucionalidade, in Obras Completas de Orlando Bitar, Conselho Federal de Cultura, 1978, 2° volume, p. 42.

18. CANOTILHO, J.J.Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 5ª edição, 2001, pp. 1.419.

19. HESSE, Konrad. A Força Normativa da Constituição, tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris, 1.991.

20. LASSALE, Ferdinand. O Que é uma Constituição?, cit.

21. HESSE, Konrad. A Força Normativa das Constituições, cit., pp. 15 e 19.

22. BARROSO, Marco Aurélio de. Direitos Fundamentais Econômicos. Artigo disponível na internet em: http://www.oabmt.org.br/index.php?secao=ler_artigo.php&num=29

23. COUTINHO, Luiz Carlos Monteiro. A Ordem Econômica e a Prevalência da Democracia Liberal Desnacionalizada no Brasil, em Detrimento dos Direitos Humanos, disponível na internet em: http://www.trt19.gov.br/doutrina/004.htm

24. DINIZ, Maria Helena. Norma constitucional e seus efeitos. São Paulo: Editora Saraiva, 1992, p. 114

25. Canotilho e a Constituição Dirigente, cit.

26. Canotilho e a Constituição Dirigente, cit., Resenha do Prefácio, por Eros Roberto Grau.

27. Canotilho e a Constituição Dirigente, cit., Resenha do Prefácio.

28. GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1.988. São Paulo: Malheiros Editores, 7ª edição, 2002, pp. 24 e 26.

29. LAMPEDUSA,Giuseppe Tomasi, Il Gattopardo: "Se vogliamo che tutto rimanga com’é, bisogna che tutto cambi."

30. BARROSO, Luís Roberto. O Direito Constitucional e a Efetividade de suas Normas. Rio de Janeiro: Editora Renovar, 6ª edição, 2.002, p. 289.

31. MADISON, James. O Federalista, trad. de Reggy Zacconi de Moraes. Rio de Janeiro: Editora Nacional de Direito, 1959, nº 37, p. 145.

32. TOCQUEVILLE, Alexis de, Democracy in America, Part II, Book IV.

33. COMPARATO, Fábio Konder. Réquiem para uma Constituição. In: O Desmonte da Nação. Petrópolis: Vozes, 1.999, p. 16.

34. "Corporations must: obey the law, disclose fully the impact of their functioning in society and have a restrained impact on government." Restoring Trust(s), disponível na internet em: http://www.paulagordon.com/shows/monks/


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

LIMA, Fernando. Ordem econômica e controle do poder. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 8, n. 65, 1 maio 2003. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/4028. Acesso em: 24 abr. 2024.