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Como melhorar a arrecadação de tributos no Brasil?

Como melhorar a arrecadação de tributos no Brasil?

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O sistema tributário em vigor é fruto do conjunto dos pensamentos, atos e omissões das autoridades ao longo da história. Este cenário só será modificado diante da ação organizada, pacífica, inteligente e perseverante da sociedade civil.

Introdução: Receitas públicas no contexto da Atividade Financeira do Estado.

A atividade financeira do Estado consiste em obter, criar, gerir e despender o dinheiro indispensável às necessidades, cuja satisfação o Estado assumiu ou atribuiu a outras pessoas de direito público. Dentro deste contexto, ganham relevo fundamental as receitas públicas, que se entendem como o total em dinheiro recolhido pelos Entes da Federação, com o objetivo de custear as despesas públicas em geral.

Em outras palavras: sem arrecadar, o Estado não pode gastar. Sem gastar, o Estado não pode satisfazer as necessidades para as quais foi criado. Mas isso não é tudo: a qualidade da arrecadação e também do gasto são essenciais. Não basta arrecadar e gastar, mas é preciso arrecadar bem e gastar melhor.

Parece-nos que não é mais possível entender o poder do Estado como algo inevitável e alheio ao consentimento de seus “súditos”. Aliás, nem parece adequado falar-se mais de “súditos”, pois o “súdito” nada mais espera de seu dominador do que castigos e ordens. O Estado, no século XXI, adquire sua legitimidade sobretudo a partir da habilidade que demonstra em servir as pessoas. Quanto melhor o Estado serve às pessoas, mais poderoso é, não só aos olhos de seus próprios cidadãos, como aos olhos do Mundo.

Assim, a pessoa do século XXI contribui ao Estado esperando dele a satisfação de suas necessidades, e não apenas por senso cívico ou simplesmente temor. Se o Estado não satisfaz adequadamente as necessidades das pessoas, desestimula a contribuição à arrecadação espontânea. E se a arrecadação não ocorre espontaneamente, o Estado (supostamente) deveria aplicar os “rigores da Lei”, ou seja, sancionar os contribuintes omissos. E isso esquecendo de quem se omitiu antes.

Quanto a “cobrança forçada” o discurso de alguns vai no sentido de “criminalizar” o contribuinte omisso. Quem não paga tributos simplesmente é bandido, e merece cadeia. Felizmente, a jurisprudência brasileira, há muito, desestimulou este pensamento, mas ainda está latente este desejo nos legisladores e administradores públicos. Seria mais simples assim para o Estado: prendo quem não paga e cobro apoiado em técnicas de terror, independente de como sirvo os cidadãos.

Mas esta via cada dia fica mais difícil. Primeiro porque o Estado não é tão poderoso como pensa. Os contribuintes são muitos e, por mais que o Fisco contrate servidores, nunca conseguirá estar em todos os lugares ao mesmo tempo. A verdade é que a lei não é nada sem a obediência a seus comandos, ou seja, o Estado brasileiro pode legislar quanto e como quiser, mas se não contar com a colaboração dos contribuintes, não conseguirá resultados.

Por outro lado, temos a globalização do século XXI. Sem dúvida a globalização traz desafios e inúmeros problemas, mas ao mesmo tempo traz chances e soluções. Se o Estado ao qual uma pessoa está vinculada não a trata bem, pode procurar outro que o faça. Claro que esta solução não é para todos, mas não resta dúvidas que os Estados de onde os cidadãos estão “fugindo” assistem impotentes sua legitimidade se desfazer progressivamente. O fato é que se muitas pessoas e empresas se arriscam para mudar de país, é porque em seus países originários a coisa vai muito mal. E esta constatação, ainda que indiciária, compromete a viabilidade destes Estados e ameaça até sua futura existência.

Portanto, o primeiro passo para arrecadar mais é fazer os contribuintes colaborarem mais com a arrecadação. E o terror é o pior caminho para isso.


O que é Dívida Ativa?

O ordenamento jurídico brasileiro[1] define a Dívida Ativa (em síntese) como o conjunto de créditos em favor da Fazenda Pública, não pagos espontaneamente, provenientes de obrigações legais. Em outras palavras, é a vala comum para onde vão todos os créditos não pagos ao erário, não importa o motivo por trás da inadimplência.

O ordenamento prevê como consequências da inscrição em dívida ativa, dentre outros: 1) a presunção relativa de fraude na oneração e alienação de bens do devedor[2]; 2) impedimento à expedição de certidões com eficácia liberatória[3]; 3) possibilidade de ajuizamento de ação de execução fiscal e suas consequências.

Mas antes mesmo da inscrição em dívida ativa, os devedores já sofrem sanções. As principais são a possibilidade de responder em ação cautelar fiscal[4], inscrição no CADIN[5], suspensão ou cancelamento de registros especiais[6] e até mesmo exigência de depósitos ou arrolamento de bens como condição prévia para recursos administrativos[7]. Ainda conta o Fisco com a possibilidade de representar o contribuinte frente às autoridades competentes, quando entender que sua conduta se enquadra em ilícito de natureza penal.

Não resta dúvidas, então, que o aparelho repressor do Estado está bem armado. Mas será que isso está sendo eficaz?

A situação da Dívida Ativa e da Sonegação no Brasil

A julgar pelo aparelho repressor a disposição do Estado Brasileiro, poderíamos ser levados a crer que ninguém ousaria ficar devendo ao Fisco. Mas a realidade infelizmente é outra.

Estima-se que a evasão tributária média é de 8,6% do PIB e que a arrecadação tributária poderia se expandir em 23,6% se, por um passe de mágica, todos os devedores pagassem seus débitos[8]. Segundo o SINPROFAZ[9], a perda de arrecadação pode ser ainda maior, dependendo do critério de cálculo. A entidade estima que o Brasil perde por ano cerca de 27,6% de sua arrecadação com “sonegação”[10], montante que seria de R$ 518,2 bilhões. Este montante corresponde a 90% da arrecadação total de todos os entes descentralizados (Estados e Municípios juntos).

E, segundo o site Quanto Custa o Brasil[11], no período entre janeiro de julho de 2015, o Brasil perdeu pouco mais de R$ 259,4 bilhões com a sonegação. Isso seria suficiente, segundo o site, para a construção de 5,4 milhões de postos policiais equipados.

A explicação da cúpula do Executivo da União (Ministério da Fazenda) atribui a culpa aos contribuintes, que possuiriam uma “cultura” de sonegação, arraigada desde os tempos coloniais. Já os Procuradores da Fazenda atribuem a principal causa ao binômio Carga Tributária x Efetividade da Cobrança.

O relatório do SINPROFAZ aponta que a alta carga tributária, combinada com a ausência de condições adequadas de trabalho nos órgãos incumbidos da cobrança (sobretudo Receitas e Procuradorias Fiscais) seria a principal causa. Ou seja, onde se tem que pagar muito, mas não há certeza da reação do Estado, a tendência é instituir-se uma “cultura” de sonegação. A entidade lembra ainda que tal cultura é universal, variando de intensidade de país para país e de uma época histórica para outra.

As razões expostas pela entidade são reais. Os órgãos da Administração Tributária e das Procuradorias Fiscais, em que pese a aparência em contrário, apresentam estrutura inadequada para a tarefa a seu encargo. A desatualização tecnológica[12], a falta de servidores, contingenciamentos indiscriminados de verbas e estratégias de atuação desatualizadas podem ser elencados como alguns dos problemas presentes no dia a dia destas instituições. Em que pese os recentes esforços, os métodos de trabalho digital e virtual ainda tardarão a fazer parte da cultura destes órgãos[13].

E também assiste razão em dizer que a carga tributária no Brasil é muito elevada. As estatísticas demonstram que o Brasil tem a maior carga tributária na América Latina, e uma das maiores do Mundo. E ter uma alta carga tributária não é uma situação ideal.

Como já advertia Maquiavel:

"(...) É, ainda, dever seu incutir nos súditos a idéia de que poderão exercer em paz os respectivos ofícios, seja no comércio, seja na agricultura, seja ainda em outro qualquer ramo da atividade humana, para não virem a abster-se, ou de aformosear as suas propriedades com medo que lhas tirem, ou de estabelecerem qualquer gênero de comércio, temendo os impostos."[14]

Maquiavel entendia que o respeito e proteção do “príncipe”[15] à propriedade privada e à liberdade econômica atendia mais a interesses pessoais e egoísticos do próprio governante. Isso porque, fortalecendo a atividade econômica, o “príncipe” evitaria instabilidades e contestações a seu próprio comando. Também é importante notar que Maquiavel inclui nesta ótica o excesso de tributação, na medida em que este representa uma forma de admoestação, pelo Estado, da atividade econômica e da propriedade privada.

Portanto, independente de qualquer outra consideração, a proporção de tributação em relação ao produto interno bruto se mostra excessiva em nosso país. Seria necessária sua redução, preferencialmente a níveis próximos de 20% do PIB[16].

Mas é preciso somar mais uma causa, que contribui fortemente para os altos índices de sonegação no Brasil: a baixa reciprocidade de nossa carga tributária. É que o brasileiro paga tributos demais, por serviços públicos ruins ou, muitas vezes, inexistentes na prática.

Segundo o relatório do SINPROFAZ, na América Latina, em comparação com sete outros países da região, inclusive Argentina e México, nossa carga tributária total é a maior da região (34,3% do PIB em 2007, seguido da Argentina com 29%).

Mas analisar carga tributária não é suficiente para afirmar se um sistema tributário é ou não eficiente. A carga tributária média da Escandinávia é bastante alta, mas estes países possuem os melhores índices de Índice de Desenvolvimento Humano no planeta. Dessa forma, o relatório faz uma comparação da carga tributária com o IDH médio de cada país. Na América Latina, em comparação com 7 países (dentre eles Argentina, México, Chile e outros) o Brasil possuía em 2007 decepcionante performance.

Enquanto, por exemplo, a Argentina tinha em 2007 carga tributária de 29% do PIB, o IDH daquele país foi de 0,797. O do Brasil foi de apenas 0,718 com carga de 34,9%/PIB. Perdemos até para o Peru, onde 17,4% do PIB revertem em IDH de 0,725.

A comparação com outros países do Mundo nos deixa ainda mais embaraçados. Nos EUA, o PIB de 25,1% rendeu um IDH de 0,910, na Coréia do Sul o PIB é de 25,9% e o IDH é de 0,897.

Diante deste cenário, não é de causar surpresa os números da sonegação no Brasil. Mas há outros fatores que também contribuem, como demonstraremos a seguir.


A “crise” da Dívida Ativa

Não parece restar dúvidas que existe uma baixa reciprocidade por parte do Estado brasileiro frente a carga tributária que exige. Em outras palavras, o Estado brasileiro cobra mais que muitos países, sem satisfazer as necessidades de seus cidadãos e empresas na mesma proporção. Talvez possamos chamar isso de “baixa reciprocidade”, apenas para fins de referência futura.

Esta “baixa reciprocidade”, sem dúvida, fustiga a legitimidade do Estado em várias esferas e pode servir como um fator a contribuir para os altos índices de evasão fiscal e sonegação. Mas acredito que há outros fatores igualmente influentes.

Sem a pretensão de descartar outros fatores que possam ter influência sobre o cenário exposto, penso que as causas a seguir também contribuem para o cenário desfavorável.


O fetiche brasileiro pelo Estado

O brasileiro confia demais no Estado. Diante de qualquer problema, a primeira coisa que passa pela cabeça do brasileiro é “O estado precisa resolver isso”. Mas esquecemos que, toda vez que delegamos ao Estado uma tarefa, isso o obrigará a gastar mais e, para gastar, precisa arrecadar. E o leitor já sabe, por certo, quem pagará a conta ao final.

É notório e dispensa maiores considerações que o setor privado é muito mais eficiente em alocar recursos, bens e serviços que o Estado. Ou seja, os serviços públicos são, em regra, mais caros e menos eficientes que seus similares privados. Portanto, pela lógica, a intervenção estatal deveria ser muito menos usada do que é na prática.

Mas, por razões históricas e culturais, herdamos este “fetiche” pelo Estado e esta crença (ilusória) que as soluções vindas da iniciativa estatal são necessariamente mais honestas e eficientes. Já vem da época colonial este preconceito a priori contra os empreendedores. Mas a verdade demonstra que as soluções vindas do Estado (quando realmente existem) são mais caras e menos eficientes para satisfazer as necessidades das pessoas.

A questão não se resume a privatizar estatais. Vai a todos os aspectos da vida. Cada vez mais delegamos ao Estado tarefas que deveriam ser nossas, da família e da comunidade. E às vezes fazemos isso simplesmente porque não queremos assumir tais tarefas.

Neste cenário, a carga tributária é o preço a pagar por esta opção de Estado que queremos. Quanto mais transferirmos atribuições ao Estado, mais caro será o peso dos tributos.

Quando falamos da dicotomia público-privada, esquecemos frequentemente que iniciativa privada não se resume a atividade empresarial com fins lucrativos. Na verdade, a iniciativa privada também é composta de atividades sem fins lucrativos. Nesse contexto, o cooperativismo e o associativismo ganham relevância.

É preciso estimular, por todas as formas possíveis, o crescimento da auto-iniciativa dos brasileiros. A melhor forma de se fazer isso é transferir funções do Estado ao terceiro setor, desonerando a carga tributária na mesma proporção. Mas isso só será possível se este terceiro setor estiver capacitado e capitalizado para atender as demandas coletivas, tão bem ou mais que o setor público ou a iniciativa empresarial.

Outro aspecto ainda neste sentido é a ânsia do Estado brasileiro em interferir na economia. Boa parte da carga tributária é gasta na persecução deste objetivo, e não diretamente na satisfação das necessidades da população. E, até aqui, falha o Estado, porque seus esforços frequentemente freiam a economia, ao invés de fazê-la crescer e ser mais eficiente.

É preciso que o dirigismo estatal diminua, abrindo mais espaço para a iniciativa privada, em especial das pequenas empresas.


Aplicar mais o Princípio da Progressividade

O imposto progressivo no Brasil ainda é uma utopia. Isso porque a maioria dos tributos brasileiros não adotam este princípio, e mesmo quando o adotam a tributação dos mais ricos é ínfima se comparado com a suportada pelos níveis intermediários (a “classe média”).

É bem verdade, como aponta PIKETTY[17], que esta é uma tendência mundial. O imposto progressivo, no sentir deste autor, está em crise e progressivo desuso. Segundo o autor, os países que melhor usaram o imposto progressivo foram os Estados Unidos no período entre 1930 e 1980, e o Reino Unido. Mas não só eles: Europa Ocidental, Japão, Canadá e muitos outros.

Todavia, no Brasil, a alíquota máxima, por exemplo no imposto de renda, é de 27,5% na pessoa física, incidindo sobre faixas de renda ainda muito próximas do mínimo vital. Na verdade, o perfil de nossa tabela progressiva sobe muito das faixas intermediárias de renda, e decresce conforme a renda sobe mais, chegando ao nível da insignificância nas faixas de rendas excessivas. É a forma de “sino”[18], a que se refere PIKETTY.

A progressividade nos EUA, que PIKETTY entende como a ideal, ocorreu no período entre 1930 e 1980. As alíquotas máximas ficaram na faixa de 70 a 80%, mas reservado para rendas excessivas (como quantias de US$ 500 mil ou US$ 1 milhão), atingindo cerca de 0,5 ou 1% da população. Na faixa intermediária (como a da classe média) incidência mais branda que a nossa atual.

Não obstante, importante registrar que no caso brasileiro, os últimos vinte anos representaram iniciativas de ampliação do imposto progressivo, mas ainda tímidas e insuficientes. No caso do IPTU, a Emenda 29 à Constituição admitiu a possibilidade da progressividade conforme o valor do imóvel, mas a depender do legislador municipal. Recentemente, o STF afirmou a possibilidade da progressividade também no imposto sobre transmissão causa mortis e doações (o imposto sobre heranças).

Já quanto a tributação das empresas, que corresponde ao maior volume, há pouca ou nenhuma aplicação da progressividade. No SIMPLES NACIONAL embora tenhamos as tabelas progressivas de alíquotas, a progressividade é ofuscada pelo fato de incidir sobre a receita bruta, e não sobre os lucros.

Uma tributação predominantemente progressiva, além de mais justa e socialmente aceitável, seria capaz de melhorar a arrecadação. Os contribuintes seriam mais estimulados ao recolhimento espontâneo se soubessem que sua carga é proporcional a sua capacidade econômica, e que os ricos realmente pagam mais que os pobres. Por outro lado, a redução da carga na classe média seria compensada pelo aumento da base, se considerados os tributos em geral e o aumento de arrecadação nas categorias mais abastadas.

Mas há um obstáculo, que PIKETTY chama de “concorrência fiscal”. É um dos efeitos da facilidade de migração de capitais e fortunas pelo Mundo. Alguns argumentam que os ultra ricos, diante da ameaça de aumento de sua quota, simplesmente mudariam seus negócios e investimentos para outro país que assegurasse tributação mais favorecida. E, de fato, este risco é real, sobretudo num cenário econômico de fortunas virtuais.

Neste particular, importante revisitar o exemplo dos EUA. Como dissemos, no período 1930-80 aquele pais chegou a adotar imposto confiscatório sobre rendas excessivas e isso foi considerado uma prática positiva pelos agentes econômicos. Não houve desestímulo, no caso dos EUA, porque o aumento da tributação não é considerado isoladamente, mas no conjunto das oportunidades oferecidas pelo mercado aos investidores.

Parece-me pouco crível que um “alta renda” deixasse de investir no Brasil apenas diante do advento de um imposto progressivo mais acentuado. O mercado brasileiro é grande demais para ser desprezado, e ainda este contribuinte teria inúmeras oportunidades de reprogramar suas atividades de forma a buscar uma carga tributária menor, especialmente se renunciasse à acumulação e preferisse circular sua riqueza (abrindo empresas, por exemplo).


Distribuição desigual da Carga Tributária na Federação

Parece-nos claro que a carga tributária brasileira é desigualmente distribuída e excessivamente concentrada na União.

Nossa Constituição estabeleceu que os serviços mais essenciais à população fossem prestados pelos entes descentralizados (Estados, Municípios e Distrito Federal), reservando à União o papel de integrar o território nacional, protegê-lo contra agressões e ameaças externas e prestar os serviços não incumbidos predominantemente aos entes descentralizados (como o ensino superior, por exemplo).

Diante desta lógica, seria de se supor que a carga tributária fosse mais onerosa nos entes descentralizados, e menos onerosa na União. Contudo, estudos do SINPROFAZ indicam o contrário. Segundo a entidade, baseando-se em estatísticas oficiais, a União “draga” 24,9% do PIB, o que representa 68,2% da carga tributária total exigida no Brasil.

Aos Estados (responsáveis pela Justiça estadual, segurança pública, saúde, educação, saneamento e tantos outros serviços essenciais) cabe míseros 25,8% da carga tributária, ou apenas 9,4% do PIB (dados de 2014). E aos Municípios, responsáveis por cuidar das cidades onde vivemos, somente 2,2% do PIB (ou 6% da carga).

É verdade que a União reparte receitas em alguns casos, mas não sobre o total dos tributos que exige. Nos impostos, somente o IR, IPI e ITR repartem receitas. No IOF, somente a incidência sobre ouro financeiro é repartida com os entes descentralizados, e esta é a menor parcela de arrecadação deste imposto. Nas contribuições, somente a CIDE Combustíveis, ainda assim somente 29% da arrecadação. Parece-nos pouco e não representa grande reforço em favor dos entes descentralizados.

Também é verdade que a União institui contribuições sociais, e que algumas delas são vertidas à Previdência Social. Mas aqui também é preciso lembrar que a União desvincula 20% destes recursos para seu uso exclusivo, através do instituto da DRU (supostamente provisório, mas perene na prática) e, dentre as contribuições, apenas algumas são realmente vertidas ao Fundo de Previdência Social Geral. Outras, como a COFINS e CSLL tem destinação pouco divulgada e, na verdade, representam sobre-alíquotas dos impostos em muitos casos.

Portanto, há três caminhos, pelo menos, para reduzir o peso da carga tributária da União: 1) Reduzir as contribuições especiais; 2) Aumentar a repartição de receitas em favor dos entes descentralizados, ou; 3) A União assumir papel mais incisivo na prestação de serviços diretos à população.

No que tange ao primeiro item (contribuições especiais) parece-nos necessário repensar a opção do constituinte de 1988 em estatizar certas intervenções. Muitos países, por exemplo, adotam modelo de previdência privada como sendo o sistema dominante, e com isso não só desoneram como garantem melhores condições em favor dos próprios beneficiários, visto que, conhecidamente, o setor privado é bem mais eficiente que o setor público no atendimento direto às necessidades das pessoas.

Por outro lado, na década de 1990 o Brasil adotou um confuso e controverso sistema de intervenção na Economia, através de agências reguladoras. Até aqui nenhum problema, porque muitos países fazem o mesmo (como os EUA, com suas “Administrations”). O problema no modelo brasileiro é o custeio destas entidades. São autarquias, e sobrevivem quase totalmente à base de tributos, integrantes das espécies taxas ou CIDES (Contribuições de Intervenção no Domínio Econômico).

Antes das Agências Reguladoras, o controle dos setores estatizados era baseado em órgãos internos nos ministérios e, a meu sentir, num modelo bem menos oneroso, pois as empresas “estatais” estavam sobre controle direto ou indireto da União. O controle e fiscalização, portanto, era internalizado nas próprias estatais ou suas holdings, e o custo era baseado em receitas não tributárias (tarifas ou preços públicos).

O novo modelo tem muitas virtudes, é verdade, mas parece-me excessivamente oneroso e uma das causas do aumento da carga tributária, na forma das CIDEs e de novas taxas. Faz-se necessário, portanto, repensar o modelo, buscando soluções igualmente eficientes com menos ônus à economia e à sociedade.


Perfil “estagnador” da Carga Tributária Brasileira

Creio possível afirmar que grande parte da carga tributária brasileira incide sobre atividades produtivas da economia, preferindo a “geração de riquezas” à “acumulação de riquezas”. Ou melhor, quem decide “trabalhar” no Brasil, seja como pessoa física, seja como agente econômico, paga mais tributos do que aquele que decide imobilizar suas riquezas.

No relatório do SINPROFAZ, a que fizemos referência, a entidade concluiu que 94,4% da carga tributária recaiu em 2013 sobre bens, serviços, renda e folha de salários. Os tributos sobre propriedades oneraram apenas 1,4% do PIB (ou 3,9% da carga) e as transações financeiras representaram apenas 1,7% da carga tributária.

Portanto, parece lícito concluir que, no Brasil, quem investe recursos para gerar empregos e negócios paga muito mais tributos que aquele que prefere acumular riquezas e viver de especulação. Isso provoca o que chamo de perfil “estagnador”, na medida em que a carga tributária produz como efeito colateral o desestímulo à produção de novas riquezas, tendendo a estagnar a circulação na economia.

Tal efeito, provavelmente involuntário por parte do Estado, explica a imensa “mortalidade infantil”[19] que aflige as pequenas empresas no Brasil. As pequenas empresas, aliás, dificilmente deixam de ser pequenas em nosso país, e muitos empreendedores acabam fracassando e convertendo-se em devedores da Fazenda Pública.

Não resta dúvidas que esse perfil estagnador afeta a arrecadação. Se o Estado sobrevive retirando uma parte da produção da economia, quanto menor for esta produção pior para a arrecadação do Estado.


Reflexos da Atividade Criminosa no Brasil

As atividades consideradas ilícitas pelo nosso Direito Penal são realizadas por seus autores diante de motivações diversas. Embora alguns crimes sejam cometidos por razões não econômicas, não se pode negar que, especialmente no Brasil,  tem crescido o percentual de crimes com nítida motivação econômica. Podemos citar, como exemplos, os “crimes de colarinho branco”, contrabando, descaminho, tráfico de drogas e armas, crimes contra a administração pública, etc.

Toda vez que uma atividade ilícita com motivação econômica obtém êxito, o produto desta arrecadação passa ao campo da informalidade e, por consequência, é prejudicada a arrecadação do Estado.

Assim, por exemplo, quando uma quadrilha consegue desviar recursos públicos num esquema de corrupção e o dinheiro não é restituído integralmente, o erário é prejudicado de  múltiplas formas:

a) O dinheiro desviado precisará ser reposto por mais arrecadação, daqueles mesmos contribuintes fiéis e honestos;

b) Este mesmo dinheiro desviado será em algum momento utilizado pelos autores do crime, mas não necessariamente em nosso território e em favor da economia brasileira;

c) O triunfo do crime estimula a sonegação, pois o contribuinte que entrega uma fatia cada vez maior do produto suado de seu trabalho ao Estado sente-se injustiçado, assim como o irmão do filho pródigo[20] ou o “Homem Honesto” de Rui Barbosa[21]. Este contribuinte é convidado, pela própria incompetência do sistema, a deixar de arrecadar ou, pelo menos, deixar de empreender.

Mesmo quando o patrimônio lesado é estritamente privado, a arrecadação também é prejudicada. A sensação de insegurança e de impunidade desestimula as pessoas a empreender e a realizar novas atividades. Menos ativa, a Economia é menos próspera e, sem dúvida, menos rentável ao Estado.

Alguns números dão a dimensão do problema. O custo de crimes contra o varejo, somado aos investimentos em prevenção, chegou a US$ 2,1 bilhões em 2009, segundo pesquisa da BBC News[22]. Outra pesquisa do IBGE e ETCO, em 2014, demonstrou que a economia informal movimentou R$ 830 bilhões, ou 16,2% do PIB brasileiro. Claro que nem todas as atividades consideradas integrantes da informalidade são necessariamente criminosas, mas penso lícito afirmar que  boa parte destas atividades estão relacionadas direta ou indiretamente ao crime organizado, tráfico de drogas ou armas.

Em 2004 o Ministério da Justiça criou o Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI). Este Departamento tem por principal finalidade empreender esforços para aumentar o percentual de recuperação de produtos de crimes, mas apresenta números modestos. Em seus dez anos de existência, conseguiu repatriar apenas R$ 34,2 milhões. Estima-se que os resultados em recuperação são muito inferiores aos custos do próprio órgão[23].

As leis que prevêem condutas ilícitas penais-tributárias têm uma forte tendência a reprimir condutas que busquem ludibriar a fiscalização, tais como emissão de documentos falsos ou inidôneos e outros. Não se vê nos tipos penais um real interesse em prevenir crimes com potencial impacto sobre a arrecadação, ou mesmo na efetiva recuperação do produto do crime e respectiva parcela de arrecadação. Embora não seja especialista em matéria penal, a impressão que o conjunto desta legislação me causa é do interesse maior em intimidar os contribuintes habitualmente adimplentes, do que reprimir os verdadeiros e convictos inadimplentes.

Boa parte dos atuais tipos penais (em especial os da Lei 8137) poderiam muito bem converter-se em ilícitos administrativo-tributários, com previsão de penalidades compatíveis e severas (multas mais altas, interdição de exercício de atividades quando necessário, etc.).

Parece-nos que esta legislação precisa sofrer uma ampla e cuidadosa reforma, com vistas a gerar um elenco de tipos penais mais adequado ao enfrentamento correto da questão. Em primeiro lugar, parece-me essencial que a legislação demonstre capacidade de separar a situação do devedor insolvente, do devedor criminoso. É que nem todos os devedores do Estado brasileiro são criminosos.

Na verdade, a grande maioria é composta de ex-empreendedores, que fracassaram em seus empreendimentos e, em vista da conjuntura tributária vigente, acabaram tragados pela famosa “bola de neve” tributária.

Mas não há como negar que uma parte da Dívida Ativa é reflexo das atividades ilícitas e, para esta parcela, parece-me que a solução deve ocorrer simultaneamente a solução em seara penal.

Para cada situação cabe uma solução diferente. Para os devedores insolventes, cabe aumentar as oportunidades de composição extrajudicial. Por exemplo, aumentar as possibilidades de compensação, transação, remissão, parcelamentos, moratórias, etc. Falaremos adiante sobre algumas sugestões, hoje rejeitadas pelo nosso ordenamento.

Para os devedores criminosos, a solução da dívida ativa reflexa deve ser integrada à persecução penal, havendo uma cooperação habitual e obrigatória entre as Procuradorias Fiscais, Ministério Público e Polícias. Hoje esta cooperação é episódica e insuficiente na maioria dos casos. O uso sábio da tecnologia da informação pode ser um caminho para concretizar este ideal.

Outra providência necessária é a integração e aperfeiçoamento dos registros públicos no Brasil. Não parece adequado que uma Procuradoria Fiscal precise aguardar por vários dias para receber uma cópia de matrícula de registro de imóveis. E não parece adequado também que existam ainda (em pleno século XXI) matrículas que não correspondem a realidade dos imóveis existentes.

A inconsistência e a fragmentação dos bancos de dados oficiais no Brasil faz com que a Fazenda Pública atue, quase sempre, sem ter acesso aos fatos reais, o que explica o excesso de presunções previstas em nossa legislação. Parece-nos que se a Administração Tributária tivesse acesso, em tempo real, a verdadeira e completa situação fiscal, financeira e econômica do contribuinte, teria condições de ter maior eficiência na prevenção e recuperação de casos de sonegação e evasão fiscal. Mas também teria condições de realizar atos mais perfeitos e justos, em proveito dos próprios contribuintes.

Aumentando e facilitando a base de informações, a Administração Tributária poderia detectar, mais rapidamente, casos de ilícitos penais e desencadear mais eficazmente a reação estatal. Poderia também evitar o ajuizamento inútil de milhares de execuções fiscais, que só oneram o erário e humilham inutilmente os devedores insolventes. Poderia também aplicar as soluções  mais adequadas para cada caso, conforme a atual capacidade contributiva de cada devedor.


Um Novo Processo Legislativo Tributário

Para aumentar a carga tributária no Brasil basta que o executivo edite medidas provisórias, as quais podem tratar sobre a maioria dos assuntos tributários e são, via de regra, concebidas e aprovadas apressadamente.

Este cenário cria uma situação extremamente desfavorável ao planejamento da Atividade Financeira do Estado, e é uma das principais causas da legislação confusa e pouco eficiente que temos no Brasil em matéria tributária.

O Executivo tem superpoderes para instituir ou aumentar tributos no Brasil, graças a este sistema. Como consequência, a instituição e aumento de tributos passa a fazer parte da política econômica do governo, quando deveria submeter-se ao planejamento financeiro-orçamentário geral do ente federativo.

Em que pese, oficialmente, o ordenamento preceitue sistemática diversa, na prática as coisas se dão da seguinte maneira: o Estado descobre, inesperadamente, que precisa aumentar as receitas; os Ministros são cobrados a achar uma solução, em especial o da Fazenda; este então propõe texto de medida provisória, aumentando tributos que serão pagos pelos mesmos contribuintes fiéis de sempre; o Presidente assina e pressiona o Congresso a aprovar (o que quase sempre ocorre); a doutrina protesta inutilmente; os poucos contribuintes melhor aparelhados vão ao Judiciário que, às vezes, estabelece limites (normalmente insuficientes e parciais).

O que menos se faz, entretanto, é perquirir porque o Estado, inesperadamente, fica sem recursos. Não existe um planejamento orçamentário no País? E a previsão da Receita, obrigatoria e previamente constante da Lei Orçamentária? Será que um país que não está em guerra, não é assolado por desastres naturais constantes precisa trabalhar dentro deste nível de imprevisão?

Matéria tributária, creio, deveria ser fruto de prévia e expressa autorização legislativa, assim como ocorre com as leis orçamentárias. Por isso, necessário que seja vedado o uso de medidas provisórias para matéria tributária, salvo em casos de guerra, grave comoção interna e calamidade pública.

Na elaboração dos projetos de Lei em matéria tributária, ainda, necessária maior fundamentação e rigor. Relatórios de impacto orçamentário-financeiro e pareceres prévios de órgãos de controle técnico são necessários para a análise pelo Congresso.

Gerar leis tributárias mais legítimas, melhor planejadas e elaboradas também pode aumentar a arrecadação. Leis mais perfeitas fecham espaço para a sonegação, para a litigância habitual maliciosa[24], para controvérsias administrativas ou judiciais e aumentam o compromisso dos próprios contribuintes com seu cumprimento, na medida em que foram (ao menos) ouvidos no processo de sua criação.

Por outro lado, as autoridades, cientes que não poderão contar com novas fontes de receitas a curto prazo, vincular-se-ão mais ao planejamento orçamentário e certamente serão forçadas a administrar melhor os recursos públicos.


Uma Nova Instância Administrativa

No meu sentir, a solução de conflitos tributários no Brasil deveria ser predominantemente resolvida em instância administrativa, e somente em casos raros e específicos pelo Poder Judiciário. Tal cenário, todavia, vem sendo prejudicado em especial pela falta de autonomia financeira, orçamentária e jurisdicional dos órgãos de Instância Administrativa.

É princípio basilar do Direito Processual que o julgador deve ser equidistante às partes e a situação sob julgamento. Contudo, os órgãos de Instância Administrativa no Brasil são subordinados ao Ministro da Fazenda e seus pares nos entes descentralizados. Ficam, estranhamente, presos ao Princípio da Hierarquia, obrigados a julgar atos e decisões que, em última análise, foram ordenados pelos chefes do Executivo ou seus Ministros e Secretários.

Como decorrência deste cenário, é vedado (em regra) aos órgãos julgadores administrativos afastar a aplicação ou deixar de observar tratado, acordo internacional, lei ou decreto, sob fundamento de inconstitucionalidade. As exceções existentes são raras e se restringem a aplicar decisões já tomadas por outras autoridades ou Poderes[25].

Tribunais e órgãos administrativos de julgamento independentes, gozando de autonomia administrativa e financeira, com prerrogativas e obrigações semelhantes aos membros do Poder Judiciário causariam aumento da arrecadação, e não diminuição, como seria de se supor.

Assim acredito porque a existência de tais órgãos representaria uma aliança entre os contribuintes e o Fisco em prol da arrecadação. Para ser autenticamente equidistante, é preciso que a Instância Administrativa seja mantida por representação paritária de entidades representativas dos contribuintes e do Estado. Tal composição já ocorre na maioria dos Conselhos de Contribuintes e no CARF[26], mas não consegue produzir os efeitos desejados graças à falta de autonomia frente ao Poder Executivo e demais impedimentos a seu pleno funcionamento.

Independente, a Instância Administrativa passaria a ser a inteligência por trás do sistema tributário nacional, gerando soluções e inovações capazes de manter e aprimorar a arrecadação, dentro de bases aceitáveis para ambas as partes (contribuintes e Fisco). Outras vantagens são detectáteis neste cenário.

Uma das vantagens da independência da Instância Administrativa seria estabelecer uma maior uniformidade na aplicação da legislação tributária. Quanto mais eficiente e justas forem as decisões proferidas pelos órgãos administrativos, menor divergência terão em relação às decisões proferidas pelo Poder Judiciário. Tal uniformidade, quanto maior, mais estimula a arrecadação espontânea e dificulta a atuação dos litigantes habituais maliciosos (estatais ou privados).

Outra vantagem ocorre na medida em que os parâmetros estabelecidos para julgamento serão fruto do consenso entre representação paritária, substituindo a política de confronto pela de cooperação entre contribuintes e Fisco. É intuitivo, segundo a experiência humana, que a cooperação gera melhores resultados que o conflito, pois estimula a consciência, por parte de todos, que a arrecadação é um bem comum, e não um ritual de sacrifício de uma das partes.

A ascensão da Instância Administrativa traria outro fator importantíssimo: o surgimento de um órgão especializado em matéria tributária, com condições de estar mais presente às relações tributárias. Tal cenário permitiria ao Estado conhecer melhor a situação real dos contribuintes, avaliar sua real capacidade contributiva e, também, detectar e reagir mais rapidamente a atitudes criminosas.

Mas algumas mudanças são necessárias para que ocorra esta ascenção. A seguir, elencamos algumas, sem a intenção de estabelecer numerus clausus.

A primeira é estabelecer um regime jurídico sólido, que assegure aos órgãos de instância administrativa a independência e autonomia que precisam. Os órgãos administrativos precisam ter a liberdade e a responsabilidade de tomarem decisões, ainda que desagradem à cúpula do Executivo ou de quem quer que seja.

A segunda é que estes órgãos atuem integrados com a sociedade. Sejam dirigidos por conselhos compostos de representantes dos contribuintes, dos meios acadêmicos (em especial das Faculdades de Direito), do Fisco, do Ministério Público, do Legislativo, do Judiciário e de toda e qualquer representação que assegure a imparcialidade do órgão.

A terceira é que sejam assegurados recursos para que o órgão tenha corpo técnico qualificado, de forma a se transformar um órgão de excelência em matéria tributária, capaz de gerar decisões que sejam referências aceitáveis pela maioria.

A quarta é que o método democrático seja a base da constituição e funcionamento de tais órgãos.

A quinta, seja assegurado a tais órgãos acesso pleno a todas as bases de dados disponíveis, de forma que possa tomar decisões coerentes com a realidade, tornando o uso das presunções raro e subsidiário.

A sexta, sejam estes órgãos intensamente fiscalizados por órgãos dele independentes, de forma a garantir a idoneidade e a regularidade de sua atuação.


Preferir as Soluções Extrajudiciais

Há ainda um grande preconceito contra as soluções extrajudiciais no Brasil. A atuação das Procuradorias Fiscais parece se concentrar em ajuizar execuções fiscais, confiando que esta via é a solução de todos os males. Não há que se falar de culpas, mas sim de tradição. Desde a época colonial, o Estado sempre apostou mais na intimidação do que na negociação. Este processo se repete em diversas searas, não somente na área tributária.

É de se estranhar, por exemplo, que a União, sujeito ativo de quase cem espécies tributárias, e participando de milhões de relações jurídicas, possua apenas pouco menos de uma dezena de hipóteses de parcelamento, não possua ainda uma lei de transação tributária e restrinja as hipóteses de compensação.

Na verdade, são raras (e sempre intensamente criticadas) as iniciativas de aprimorar métodos mais eficazes e modernos de cobrança. Na União, por exemplo, adotou-se técnicas de composição com a Lei 10522/2002, mas até hoje a aplicação destas técnicas ainda não é completa. Muitos Estados e Municípios não tem limite para ajuizamento de execuções fiscais. Há registro de créditos inscritos e execuções de valores ínfimos, onde o Estado brasileiro gasta muito mais que o valor do crédito, e ainda assim com baixíssima probabilidade de recuperação.

Como procuramos demonstrar, uma boa parcela dos devedores estão nesta situação por motivos alheios a sua vontade, resultantes do insucesso de seus empreendimentos ou de acidentes. O ordenamento precisa oferecer alternativas compatíveis para a reabilitação destas pessoas, separando-as dos criminosos.

Algumas ideias já surgiram neste sentido, e algumas já são implementadas. Mas muitas vezes uma boa ideia é contaminada por erros de implementação ou até mesmo omissões.

Um bom exemplo é o protesto de créditos de dívida ativa. A ideia em si é boa, mas carece de implementação mais cuidadosa. É verdade que vivemos numa sociedade onde o consumo é um valor cada dia mais ligado à liberdade. Assim, para muitas pessoas, não consumir é uma punição com forte caráter didático. Mas quando se fala de empresas, por exemplo, pode significar o empréstimo da salvação que não virá, ou o investidor que desistirá de investir. Muitos negócios honestos e viáveis já foram inviabilizados simplesmente por se encontrarem “positivados”.

Creio que seria muito mais eficaz e justo que o cadastro da Dívida Ativa fosse ampliado e aperfeiçoado, de forma a se tornar um “Cadastro de Qualidade de Contribuintes”, premiando os bons contribuintes com descontos, brindes, filas preferenciais, etc; e oferecendo à sociedade a realidade sobre a conduta dos contribuintes devedores.

Imaginemos um devedor cujos negócios fracassaram como consequência de uma proibição inesperada, imposta pelo próprio Estado. Esta proibição privou a empresa de sua receita, e o empreendedor teve que optar por pagar os haveres aos seus funcionários e deixar os débitos fiscais para depois. Se eu fosse investidor e quisesse propor uma sociedade a esta pessoa, teria dela uma impressão melhor do que em relação ao criminoso, que faliu propositalmente sua empresa com o objetivo de fraudar seus credores e enriquecer ilicitamente.

Em resumo, as pessoas tomam decisões conforme as informações que têm acesso. E o cadastro da Dívida Ativa (e também os cartórios de protesto) nos oferecem uma informação indistinta dos devedores, sugerindo que todos não são confiáveis, a menos que paguem.

A seguir, com a pretensão de provocar o debate e a reflexão, ofereço algumas ideias de melhorias que poderiam ajudar na performance da Administração Tributária e das Procuradorias Fiscais.


Melhorar a comunicação com os Contribuintes

Uma necessidade é que a Administração Tributária e as Procuradorias Fiscais ampliem e facilitem sua rede de atendimento aos contribuintes. A criação de “call centers”, que ofereçam aos contribuintes (e em especial aos devedores) canais facilitados de acesso via telefone, e-mail, fax, etc., aliada a ampliação de oportunidades de composição extrajudicial, certamente aumentaria muito a recuperação de créditos e também a atualização de dados sobre os contribuintes.


Ampliar as Opções de Compensação

Atualmente, em geral, a compensação tributária só é possível entre créditos de mesma natureza e quando são administrados pelo mesmo órgão fazendário. Embora a compensação tributária deva respeitar os pressupostos e princípios do Direito Financeiro e Orçamentário e a composição dos fundos e orçamentos, não vislumbro real necessidade de tal restrição, pelo menos em nível tão conservador.

O devedor insolvente não tem dinheiro para oferecer. Mas pode oferecer bens corpóreos ou incorpóreos, direitos, pode oferecer serviços e até mesmo trabalho.

Por exemplo, creio que o ordenamento deveria admitir a compensação, em favor dos contribuintes, de toda e qualquer condenação pecuniária devida pelo Estado. Se fosse possível, por exemplo, que um cidadão que teve seu patrimônio lesado pelo Estado pudesse deixar de pagar tributos na proporção do valor de seu precatório, o Estado teria mais preocupação em melhorar a qualidade de atendimento à população e evitar oportunidades para ser processado judicialmente. Hoje, como se sabe, esta possibilidade é restrita, mal projetada juridicamente e é parcial em favor do Estado.

Outra situação análoga à compensação seria a possibilidade do devedor fornecer bens e serviços à Administração, em troca de sua dívida. A situação atual é surreal e desfavorável: de um lado, o Estado não consegue cobrar grande parte de seus débitos, e de outro lado paga caro em licitações os serviços e bens que precisa.

Imaginemos que uma fábrica de alimentos esteja em dificuldades financeiras e devendo ao governo, porque não aceitar alimentos ao invés de dinheiro? O Estado é obrigado a comprar alimentos em licitações, e como sabemos nem sempre pelo melhor preço que se poderia comprar.

Contudo,  nosso ordenamento repugna tal solução, porque associa esta forma de composição com a escravidão do devedor. Mas tal risco pode ser afastado se a composição for voluntária e se respeitadas as normas de proteção do trabalho e demais princípios da Constituição. É sabido, aliás, que só não se admite a dação em pagamento de bens móveis porque não se previu tal providência em lei complementar. O mesmo se diga em relação à prestação de serviços.


Estimular a Denúncia Espontânea

Um dos institutos mais importantes do Direito Tributário Brasileiro na composição extrajudicial é o da denúncia espontânea. Este instituto, previsto no artigo 138 do CTN, procura estimular os contribuintes inadimplentes a regularizarem sua situação independente da máquina estatal precisar se mover ou fazer qualquer coisa.

Em síntese, a ideia é que o contribuinte que deixou de pagar ou de cumprir qualquer obrigação anterior, o faça ainda que extemporaneamente pagando o tributo integralmente e acrescido dos consectários cabíveis. Em troca, o contribuinte deixaria de ser penalizado.

A denúncia espontânea procura resolver um problema prático: a Administração Tributária não tem, nem nunca terá, recursos suficientes para estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Por isso, muitas obrigações são descumpridas sem que a Administração sequer tenha condições de suspeitar disso. Prometendo benefícios ao contribuinte, o CTN espera que ele próprio contribua com a fiscalização, denunciando sua omissão e, ao mesmo tempo, regularizando-a integralmente.

Contudo, amparado em uma antiga e superada interpretação do STF, a Fazenda Pública ainda insiste em exigir, em caso de denúncia espontânea, que o contribuinte recolha também a multa moratória. Dessa forma, a Administração concorda apenas em deixar de aplicar a multa punitiva, mas se recusa a reconhecer validade quando o contribuinte se recusa a recolher a multa moratória.

Mesmo diante da pacificação sobre o tema junto ao STJ, não é raro encontrar Administrações que continuem exigindo a multa moratória.

Acredito que o Fisco pensa que, ao impor a multa moratória, está arrecadando mais. Mas na verdade, acredito que está desestimulando muitos contribuintes a usarem da denúncia espontânea. Ou seja, se simplesmente aceitasse a posição externada pelo STJ, arrecadaria menos multa moratória, mas tal perda provavelmente seria compensada e superada pelo aumento de arrecadação.

É importante lembrar que a denúncia espontânea está inserida no contexto da arrecadação. Isso significa que, apenas desonerar àqueles que a praticam não garante, por si só, o incremento na arrecadação. Na verdade, a denúncia cresce também diante da eficiência da fiscalização, pois grande parte dos casos de denúncia ocorrem ante o temor do início da fiscalização, ou porque ela já aconteceu em casos parecidos ao do denunciante.

Mas, de qualquer forma, desonerar o contribuinte que se auto-denuncia é uma medida de inteligência e eficiência, que merece não só a desoneração de qualquer penalidade, como também outros incentivos, sobretudo nos casos em que a omissão do contribuinte não é dolosa.

Na verdade, grande parte das situações onde os contribuintes deixam de cumprir suas obrigações decorrem de erros ou outras causas não voluntárias. Não se pode descartar que o próprio sistema induz o contribuinte em erro, ante a sua complexidade e a falta de avisos prévios. Ou seja: o Estado institui uma multidão ininteligível de obrigações acessórias, estabelece a presunção que o contribuinte deve conhecê-las a partir da publicação no diário oficial, e pune impiedosamente quem não as cumpre, como se o fizesse sempre de propósito.

Na realidade, a presunção de ciência e conhecimento das obrigações merece uma revisão conceitual. Não é possível ao homem médio, ou mesmo às corporações, a infalibilidade no cumprimento de suas obrigações acessórias que supõe nosso sistema. Por isso, parece-me bastante adequada a solução adotada por alguns Municípios, onde antes de ser penalizado, o contribuinte tem o direito a um aviso de regularização.

Consiste tal providência, na maioria dos casos, em uma notificação por parte da Administração, especificando qual a omissão cometida pelo contribuinte e assinalando-lhe um prazo para regularização. Se o contribuinte perseverar na irregularidade, aplica-se-lhe a penalidade cabível.

Tal sistemática, pelo menos no âmbito federal, não é ordinariamente utilizada. Iniciado o procedimento de investigação, a denúncia não é mais possível. E isso frustra qualquer interesse do contribuinte em compor espontaneamente, pois não auferirá nenhuma vantagem se reconhecer e regularizar sua omissão.


Estimular a Transação

Embora prevista no CTN, a transação é um instituto muito pouco utilizado no Brasil. A opinião dominante no seio da Administração Tributária e também nas Procuradorias Fiscais é que este instituto desestimula a arrecadação espontânea.

Argumentam alguns que, se o contribuinte souber que poderá obter condições melhores em uma eventual transação, não se sentirá estimulado a cumprir a obrigação espontaneamente.

É claro que há sim o risco de desestímulo à arrecadação espontânea. Mas isso só ocorrerá se a transação for mal utilizada. Se for bem empregada, a transação pode aumentar muito a arrecadação e a solução de créditos em dívida ativa.

Em muitos casos, a transação pode ser a única alternativa de recebimento. Mas é essencial para o sucesso deste instituto que alguns pressupostos sejam garantidos.

Em primeiro lugar, é preciso que sejam criadas boas Leis de transação. Leis que estabeleçam condições de outorga inteligentes e adequadas, que permitam soluções eficazes em favor do Estado e também dos contribuintes.

Em segundo lugar, é essencial que tais Leis sejam adequadamente aplicadas. As autoridades às quais serão atribuídas as funções de presidir as transações precisam estar capacitadas e possuir os meios necessários para sua correta aplicação.

Em terceiro lugar, é essencial que a transação seja a melhor solução, se comparada com as demais presentes no caso concreto. Para isso, é muito importante que o Estado conheça precisamente qual é a real situação patrimonial do contribuinte. Considerando que a transação implica em concessões mútuas, o Estado deve reservar esta solução para aquelas situações onde a execução fiscal fracassaria.

E por último, fundamental que se adotem mecanismos para que a transação não seja vista pelos contribuintes como mais um meio de pagamento. Uma das sugestões é estabelecer restrições para os contribuintes que já foram beneficiados por outra transação no passado recente.


Uso sábio das Moratórias e Remissões

Também previstas pelo CTN, os institutos da moratória e das remissões são pouco utilizadas no Direito Tributário brasileiro, e vistas com extrema desconfiança e preconceito pelas autoridades. Se corretamente utilizadas, podem aumentar a arrecadação sem prejudicar a adesão dos demais contribuintes.

No caso das remissão parcial, seu uso combinado com a transação pode dar solução para situações que, do contrário, terminariam em total inadimplência do devedor. Em muitos casos, como o de falências, a remissão parcial (ou mesmo total, para alguns créditos) pode ser a única solução.


Conclusão

Por certo, como bem lembra o relatório do SINPROFAZ, a sonegação não é um problema tipicamente brasileiro. Mas as estatísticas demonstram que o Brasil tem uma carga tributária desproporcional, com baixa legitimidade, reciprocidade e eficácia.

Grande parte deste cenário é provocado pelo próprio Estado. A começar pela opção de Estado intervencionista, dirigista e onipresente que adotamos. Prossegue na hipertrofia da União, desequilibrando a Federação e sugando grande parte dos recursos para sustentar este modelo de Estado.

Vimos também que nosso sistema tributário se debruça demais sobre atividades produtivas e do trabalho, e demonstra pouco interesse pelas atividades especulativas. Agrava o problema a baixa eficiência do aparelho repressor penal do Estado, que se preocupa mais em aprisionar do que proteger a economia formal.

Dessa forma, a nosso ver, para termos um sistema tributário mais equilibrado, e uma carga tributária melhor, precisamos:

  1. Reprogramar o Estado, para que gaste menos e melhor usando menos recursos, e de forma mais objetiva no sentido de atender as necessidades da sociedade e da economia.
  2. Diminuir o tamanho e a arrecadação da União, e reforçar a distribuição de recursos aos Estados e Municípios, onde de fato os serviços diretos à população são prestados.
  3. Distribuir a carga tributária de forma mais equânime entre as áreas de produção e de acumulação de riquezas.
  4. Aumentar a eficiência do Sistema Penal na prevenção e recuperação de recursos subtraídos à economia formal.
  5. Instituirmos um novo processo legislativo tributário, mais vinculado ao planejamento orçamentário, mais democrático e menos sujeito a improvisos.
  6. Instituirmos um regime de predominância da instância administrativa, com autonomia, independência em suas decisões, celeridade e qualidade.
  7. Diminuir a dependência em relação ao Poder Judiciário, sem mutilar suas prerrogativas e atribuições, pelo aumento da qualidade e legitimidade das decisões administrativas.
  8. Estimular os métodos de composição extrajudicial e amigável de conflitos, como ampliação de opções de compensação, parcelamento, transação, remissão, denúncia espontânea, moratória, etc.
  9. Reaparelhar a Administração Tributária e as Procuradorias Fiscais, para que possam aplicar e coordenar corretamente esta nova ordem.

Um novo e melhor Sistema Tributário, por certo, não advirá exclusivamente da iniciativa do establishment. O sistema tributário hoje em vigor é fruto do conjunto dos pensamentos, atos e omissões das autoridades ao longo da História. Este cenário só será modificado diante da ação organizada, pacífica, inteligente e perseverante da Sociedade Civil.

E os instrumentos de luta estão disponíveis: leis de iniciativa popular, passeatas, ações judiciais coletivas, maior participação popular no planejamento orçamentário e na fiscalização, boicotes econômicos e greves. São apenas alguns exemplos dentre muitos outros meios capazes de produzir grandes melhorias.

Esse é o desafio lançado a nossa geração e às futuras: construirmos juntos um novo sistema tributário e, através dele, um país melhor.


Notas

[1]     Faço referência, em especial aos artigos 39, §2º da Lei 4320 de 17/3/1964 e ao artigo 2º da Lei 6830, de 22/9/1980.

[2]     Assim prevê a nova redação do artigo 185 e seu parágrafo único do Código Tributário Nacional, a Lei 5172/1966, combinado com sua moderna interpretação, segundo a qual “...a Súmula n.º 375 do Egrégio STJ não se aplica às execuções fiscais...” (STJ RESP-RR 1141990 / PR).

[3]     Chamo de certidões com “eficácia liberatória” sobretudo as certidões negativas e as positivas com efeito de negativas, porque estas certidões são, via de regra, estabelecidas como condições para que os contribuintes possam exercer direitos e usufruir de benefícios perante a Administração, tais como participar de licitações públicas e contratar com o poder público, extinção das obrigações dos falidos, concessão de recuperação judicial, proferir sentenças de julgamento de partilha ou adjudicação, etc.

[4]     A Lei nº 8.397, de 6 de janeiro de 1992 instituiu medida cautelar fiscal e deu outras providências. Segundo esta Lei, na maioria das situações nela elencadas, caberia a medida cautelar fiscal já a partir do lançamento. A medida cautelar importa ordem judicial provocando a indisponibilidade dos bens do requerido, até o limite da satisfação da obrigação.

[5]     O CADIN é o Cadastro Informativo de créditos não quitados do setor público federal (Cadin). Constitui um banco de dados de consulta obrigatória pelos agentes públicos nos seguintes casos: realização de operações de crédito que envolvam a utilização de recursos públicos; concessão de incentivos fiscais e financeiros; celebração de convênios, acordos, ajustes ou contratos que envolvam desembolso, a qualquer título, de recursos públicos, e respectivos aditamentos. Seu fundamento está na Lei 10.522, de 2002.

[6]     Existem registros especiais, por exemplo, no setor de fabricação de cigarros, bebidas alcoólicas, habilitação para operações de comércio exterior, etc.

[7]     Esta última situação foi combatida pela jurisprudência, em especial pela Súmula Vinculante 21 do STF. Mesmo assim, ainda há registro de continuidade da exigência pelos Estados membros e Municípios.

[8]     Os dados fazem parte de um relatório publicado pelo SINPROFAZ (Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional) e se referem a realidade até 2014. Publicado em: http://www.quantocustaobrasil.com.br/artigos/sonegacao-no-brasil%E2%80%93uma-estimativa-do-desvio-da-arrecadacao-do-exercicio-de-2014. Consultado em 2 de julho de 2015.

[9] O Sindicato Nacional dos Procuradores da Fazenda Nacional é a entidade nacional que representa os Procuradores da Fazenda nacional, carreira responsável pela administração do cadastro da Dívida Ativa da União e pela representação da União em processos administrativos e judiciais envolvendo matéria relacionada a esta dívida ativa, matéria tributária e aduaneira.

[10]   Sonegação aqui se refere ao sentido leigo, e não ao sentido penal. Quer se referir, a nosso sentir, aos tributos devidos que deixam de ser arrecadados, independente da causa da inadimplência.

[11]   http://www.quantocustaobrasil.com.br/, consulta em 9/07/2015.

[12] Denomino “desatualização tecnológica” a falta de preparo e de flexibilidade da política de tecnologia de informação presente, em regra, nas Procuradorias Fiscais e nos órgãos de Administração Tributária. Faltam a estes órgãos equipamentos adequados, treinamento de seus servidores, programas e sistemas mais inteligentes e operacionais e sobretudo integração de seus bancos de dados com os demais bancos públicos, em especial com os programas de automação dos processos judiciais. Soma-se a isso o apego de tais instituições à “cultura do papel” e o preconceito (por vezes) aos novos métodos inerentes à automação virtual.

[13] Não nego, por certo, os esforços individuais e mesmo alguns avanços (como  as “declarações virtuais” ou a documentação digital). Ademais, o governo federal instituiu, através do Decreto nº 6.022, de 22 de janeiro de 2007, o Sistema Público de Escrituração Digital (Sped). Este programa faz parte do Programa de Aceleração do Crescimento do Governo Federal (PAC 2007-2010) e constitui-se em mais um avanço na informatização da relação entre o fisco e os contribuintes. Contudo, seriam necessários avanços muito mais rápidos e eficazes, ante o crescimento desenfreado do número de contribuintes e de situações a serem resolvidas pelo Fisco. Em geral, o Estado conta com programas e sistemas que não “conversam entre si”, fragmentados e com dados por vezes desatualizados ou pouco precisos. Suas interfaces são pouco amigáveis ao usuário final, e a política de treinamento para os novos sistemas, embora existente, é insuficiente ao meu ver para as necessidades da atualidade.

[14] O PRINCÍPE, Nicolau Maquiavel.

[15] Podemos estender as considerações feitas pelo pensador italiano, originalmente em relação ao Príncipe, à figura do Estado moderno, ante a similitude de pressupostos e também pelo fato de que, numa visão moderna, o Estado assume e abarca muitas das funções que Maquiavel entendia caber aos governantes de sua época.

[16] O percentual de carga tributária de 20% sobre o PIB é extraído a partir da comparação média de carga tributária entre países do Mundo com características semelhantes ao Brasil. Não representa, contudo, um número absoluto ou uma regra insuperável.

[17] PIKETTY, Thomas. O Capital no Século XXI, Tradução Mônica Baumgarten de Bolle, Editora Intrínseca, RJ.

[18] Se representada num gráfico, a carga tributária cresce conforme a renda até um certo ponto e, a partir daí, decresce proporcionalmente, como uma linha sinuosa na forma de onda. Daí a alusão ao formato de “sino”.

[19]   A expressão “mortalidade infantil” é uma expressão simbólica usada por alguns economistas e estudiosos para se referir ao alto índice de insucesso das microempresas e empresas de pequeno porte, nos primeiros dois ou três anos de sua existência.

[20]   A  PARÁBOLA DO FILHO PRÓDIGO. Evangelho de Lucas cap.15 vers. 11 a 32. “...29-Mas ele respondeu a seu pai. Há tantos anos  que te sirvo sem jamais  transgredir uma ordem tua, e nunca me deste um cabrito sequer para alegrar-me com os meus amigos ; 30-vindo, porém, esse teu filho, que desperdiçou os teus bens com meretrizes , tu mandaste matar para ele o novilho cevado...”.

[21]   De tanto ver triunfar as nulidades; de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto. Senado Federal. Rio de Janeiro, DF. Obras Completas de Rui Barbosa. V. 41, t. 3, 1914. p. 86

[22]   “No Brasil, o custo dos crimes contra o varejo somado aos investimentos em prevenção chegou a US$ 2,1 bilhões (R$ 3,6 bilhões) em 2009, 0,74% maior do que o de 2008...” (Brasil é 7º em ranking de prejuízo com furtos no varejo, http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2009/11/091112_roubovarejo.shtml, acesso em 4 de julho de 2015).

[23]   Arquivos de Tag: drci - Entenda: Órgão gasta mais do que recuperou em dez anos, em http://www.politicanarede.com.br/tag/drci/, acesso em 4 de julho de 2015.

[24] Tradicionalmente usa-se a expressão “litigância habitual” com conotação pejorativa, para designar a pessoa que tenta recorrer aos meios processuais com intenções maliciosas, ou seja, para extrair do sistema vantagem indevida ou moralmente reprovável. É, por exemplo, o caso do contribuinte que usa o processo administrativo fiscal com o objetivo premeditado de retardar e frustrar a cobrança do tributo e satisfação dos direitos da Fazenda. Contudo, entendo mais adequado dizer “litigância habitual maliciosa”, pois me parece que o simples fato de um contribuinte possuir muitos processos não permite, por si só, a conclusão de o fazer com objetivos escusos. Há várias outras causas que podem ocasionar grande quantidade de demandas, como falências e questões repetitivas, como por exemplo, vários autos de infração sobre o mesmo assunto, mas em períodos diferentes.

[25] Decreto 70235/1972, art. 26-A, § 6o  O disposto no caput deste artigo não se aplica aos casos de tratado, acordo internacional, lei ou ato normativo: (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

I – que já tenha sido declarado inconstitucional por decisão definitiva plenária do Supremo Tribunal Federal; (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

II – que fundamente crédito tributário objeto de: (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

a) dispensa legal de constituição ou de ato declaratório do Procurador-Geral da Fazenda Nacional, na forma dos arts. 18 e 19 da Lei no 10.522, de 19 de julho de 2002; (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

b) súmula da Advocacia-Geral da União, na forma do art. 43 da Lei Complementar no 73, de 10 de fevereiro de 1993; ou (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

c) pareceres do Advogado-Geral da União aprovados pelo Presidente da República, na forma do art. 40 da Lei Complementar nº 73, de 10 de fevereiro de 1993. (Incluído pela Lei nº 11.941, de 2009)

[26] O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais - CARF foi criado pela Medida Provisória nº 449, de 2008, convertida na Lei nº 11.941, de 27 de maio de 2009. É a instância recursal do processo administrativo fiscal da União.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

KARKACHE, Sergio. Como melhorar a arrecadação de tributos no Brasil?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4442, 30 ago. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/41916. Acesso em: 23 abr. 2024.