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Evolução histórica e jurídica do trabalho no Brasil

Evolução histórica e jurídica do trabalho no Brasil

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Passando pelos escravos, imigrantes e movimentos populares, este artigo é um passeio pela história e evolução do Direito do Trabalho brasileiro.

Os índios foram os primeiros trabalhadores do Brasil. Os nativos viviam da caça, da pesca e da agricultura, realizadas pelos homens enquanto na tribo, as mulheres eram encarregadas da comida, das crianças, da colheita e do plantio.

A vida tranquila que os silvícolas levavam foi interrompida pela chegada dos portugueses que, para conquistar a nova terra, dizimaram tribos inteiras, não somente em combates mas também trazendo da Europa muitas doenças.

Os lusitanos recém chegados à terra tupiniquim não se fixaram imediatamente por aqui. Na verdade, eles estavam interessados na exploração do pau-brasil e isso se prolongou por trinta anos, até que em 1530, o rei de Portugal, Dom João III, mandou organizar a primeira expedição para colonizar o Brasil e iniciar o cultivo de cana de açúcar, uma mercadoria que valia muito à época.

A base da economia colonial era o engenho de açúcar e as plantações ocorriam em grandes fazendas que o produziam como único produto e utilizavam mão de obra escrava, vendendo principalmente para a Europa.

A sociedade, no período do açúcar, era marcada pela grande diferença social. No topo estavam os senhores de engenho, seguidos por uma classe de pessoas livres, como os padres, os comerciantes, os artesãos e os funcionários públicos. Na base da sociedade estavam os escravos, tratados como mercadoria e responsáveis por quase todo o trabalho realizado na colônia.

No início, as Constituições brasileiras tinham normas apenas sobre a forma do Estado e o sistema de governo. Após, passaram a tratar de todos os ramos do Direito e, especificamente, do Direito do Trabalho, como ocorre com nossa atual Constituição.

A Carta Mágna de 1824 apenas tratou de abolir as corporações de ofício. Vieram posteriormente as leis ligadas à escravatura, culminando com a sua abolição em 1888. Em 13 de maio de 1888, depois de vários movimentos populares, a princesa Isabel assinou a lei que abolia a escravidão, conhecida como “Lei Áurea”. Essa lei libertou cerca de 700.000 (setecentos mil) escravos, mas, infelizmente, o fim da escravidão não melhorou a condição social e econômica dos ex-escravos. Sem formação escolar ou uma profissão definida, continuaram numa condição social subalterna.

Foi, então, que os imigrantes desembarcaram no porto de Santos e ocuparam o lugar deixado pelo trabalho escravo. O plantio de café que estava em pleno desenvolvimento por aqui necessitava de mão de obra e isso estimulou a entrada dos imigrantes, que trouxeram novas técnicas de produção e constituíram a primeira mão de obra assalariada no Brasil, criando, assim, um mercado consumidor indispensável ao desenvolvimento industrial.

No início de 1900, as jornadas de 14 ou de 16 horas diárias de trabalho eram comuns, assim como a exploração da força de mulheres e crianças. O salário era muito baixo e, como forma de castigo, os patrões podiam reduzir, ainda mais, o pagamento do trabalhador. Todos eram explorados sem qualquer direito ou proteção legal.

Desse modo, os trabalhadores começaram a se organizar e, em 1858, os tipógrafos do Rio de Janeiro realizaram a primeira greve.

Com a industrialização nas cidades, os empregadores passaram a reunir, no mesmo espaço físico, centenas ou milhares de trabalhadores. Porém, essa reunião passou a demonstrar aos trabalhadores que eles possuíam condições de trabalho semelhantes e que, em sua maioria, eram degradantes e aviltavam as condições básicas de vida, com salários ruins e jornadas extensas.

O fato de vivenciarem a mesma experiência no convívio laboral incitou nos trabalhadores a necessidade de se posicionarem frente à busca de melhores condições de trabalho, o que culminou com movimentos de greve, paralisando a produção e tentando a negociação de melhorias nas conjunturas de trabalho e de salário.

A Constituição de 1891 reconheceu a liberdade de associação, em seu caráter genérico.

No começo do século XX, a cidade de São Paulo despertava para sua vocação de grande centro industrial, atraindo a população da zona rural. O início do processo de industrialização se deu devido ao café e aos investimentos em infraestrutura gerados de sua produção.

Entre 1914 e 1918 ocorreu a Primeira Guerra Mundial e o conflito estimulou a produção interna e o crescimento industrial do país. Com as transformações ocorrendo na Europa e o aparecimento da OIT, em 1919, houve incentivo à criação de normas trabalhistas em nosso país.

A partir dos anos 1930, foi implantada em nossas indústrias uma organização científica do trabalho. Esse método, também conhecido como Taylorismo, dividia o trabalho em etapas, fazendo com que o operário desenvolvesse tarefas especializadas e repetitivas. Dessa forma, o trabalho podia ser mais organizado, subdividido, e cada uma das frações era intensificada em termos de produtividade, sendo que o controle ficara nas mãos da gerência.

Também havia um controle rígido sobre o tempo gasto em cada tarefa para que ela fosse executada o mais rápido possível, sem levar em conta o esforço exigido. O trabalhador que produzisse mais, em menos tempo, receberia prêmios e incentivos. Nesta época, havia somente leis ordinárias que tratavam de trabalho dos menores, da organização dos sindicatos rurais e urbanos, de férias etc.

A Constituição Federal de 1934 foi a primeira a tratar especificamente do Direito do Trabalho. Ela garantia a liberdade sindical, o salário mínimo, a isonomia salarial, a proteção do trabalho de mulheres e de menores, o repouso semanal e as férias anuais.

“Trabalhadores do Brasil...”. Era assim que Getúlio Vargas iniciava seus discursos. No ano de 1930, depois de comandar uma revolução que derrubaria o governo de Washington Luís, Getúlio tomou o poder. Ele foi responsável por instituir diversos direitos trabalhistas, como o salário mínimo, o décimo terceiro salário, as férias e a rescisão de contrato, enfim, as normas da Consolidação das Leis do Trabalho, conhecida como CLT. Existiam várias leis esparsas sobre os mais diversos assuntos trabalhistas, que estavam desordenadas, específicas para cada profissão, o que tornava extremamente complicada a sua aplicação. Assim, foram reunidos todos os diplomas legais trabalhistas num único diploma.

O "governo provisório" de Getúlio, estendendo-se desde a revolução de 1930, precisava de base de sustentação institucional. A resposta foi a convocação de uma assembleia nacional constituinte, formada por 214 parlamentares e 40 representantes de sindicatos, que, evidentemente, foram recomendados pelo próprio governo, a exemplo do que acontecia na Itália de Mussolini e da Alemanha de Hitler.

A Carta de 1934 institui o voto secreto, o voto feminino (uma antiga reivindicação), proibiu o trabalho infantil, criou a Justiça do Trabalho, nacionalizou as riquezas naturais e abriu caminho para a nacionalização de empresas.

Com o início da ditadura aberta, em 1937, o Congresso foi dissolvido e a constituição revogada, sendo outorgada outra pelo Presidente da República, que continuou na chefia do novo governo.

Já a Constituição de 1946 trouxe a participação dos trabalhadores nos lucros, o repouso semanal remunerado, a estabilidade e o direito de greve.

A legislação ordinária começou a instituir novos direitos. Assim, surgiram leis ordinárias versando sobre os empregados, vendedores, viajantes etc.

A Constituição de 1967 manteve os direitos trabalhistas estabelecidos nas Constituições anteriores com apenas algumas modificações. Após esta Constituição, ainda tivemos várias outras leis ordinárias versando sobre o trabalho dos empregados domésticos, o trabalhador rural, o trabalhador temporário, as férias etc.

Por fim, com a promulgação da atual Constituição Federal (05/10/1988), tivemos a inclusão dos direitos sociais e dos direitos e garantias individuais, ao passo que nas constituições anteriores os direitos trabalhistas eram sempre previstos no âmbito da ordem econômica e social.

A Constituição de 1988 representou um importante marco democrático no Direito do Trabalho Brasileiro. A nova ordem constitucional rompeu com um dos principais pilares do velho modelo, qual seja o controle político administrativo do Estado sobre a estrutura sindical. Foram inaugurados, após seis décadas de autoritarismo, incentivos e reconhecimento à negociação coletiva no seio da sociedade civil.

A Carta Magna vigente estampa o maior e mais significativo rol de direitos que o Brasil já teve, consagrando uma grande gama de direitos individuais, ampliando garantias já existentes e criando outras, novas no panorama jurídico pátrio, renovando a cultura jurídica brasileira, permitindo o raiar de uma abordagem coletiva das questões, em contraposição à visão individualista que dominava o contexto jurídico até então.



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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GUARDIA, Augusto Bazanelli Medina. Evolução histórica e jurídica do trabalho no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4622, 26 fev. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/46707. Acesso em: 17 abr. 2024.