Este texto foi publicado no Jus no endereço https://jus.com.br/artigos/6315
Para ver outras publicações como esta, acesse https://jus.com.br

Argüição de descumprimento de preceito fundamental

limites e ideologias

Argüição de descumprimento de preceito fundamental: limites e ideologias

Publicado em . Elaborado em .

RESUMO

A argüição de descumprimento de preceito fundamental é um instituto recente no ordenamento jurídico nacional, instituído pela Constituição de 1988, em seu artigo 102, § único, e posteriormente regulamentado, já como § 1º devido à redação da emenda 03/93, pela lei n. 9.882, de 03 de dezembro de 1999. A ação de argüição de preceito fundamental é o remédio constitucional para que se exerça o controle constitucional de questões que versem sobre a infração a preceitos fundamentais e desde que não seja pertinente o ajuizamento de ações diretas de inconstitucionalidade (ADIN); ou ações diretas de constitucionalidade (ADCON).

PALAVRAS-CHAVE: Preceito fundamental – Argüição – Descumprimento – Limites – Ideologias


INTRODUÇÃO

Este artigo traz em seu contexto o tema da argüição de descumprimento de preceito fundamental, o qual enriqueceu o sistema brasileiro de controle de constitucionalidade, tido como um dos mais evoluídos do mundo. Tal instituto pode ser considerado uma ponte de ligação entre os métodos difuso e concentrado de fiscalização da supremacia da Lei Maior.

Dispõe o artigo 102, § 1º, da Carta Constitucional de 1988:

Art. 102. A argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei.

§ 1° A argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei.

O referido dispositivo constitucional prevê, em linhas gerais, a competência do Supremo Tribunal Federal para julgar a argüição de descumprimento de preceito fundamental. Limitou-se o constituinte a fixar a competência do Supremo Tribunal Federal para o julgamento da ação, deixando os demais aspectos para a alçada do legislador, a quem incumbe fixar os contornos da argüição.

O parágrafo único do artigo 102 da Constituição brasileira foi alterado pela Emenda Constitucional n. 3/93, que transformou em parágrafo primeiro, o originalmente, parágrafo único. Posteriormente, objetivando, dentre outras providências, combater a chamada "guerra de liminares", a Lei n. 9.882/99 regulamentou o § 1º do art. 102, que estava inutilizado por falta de disciplina legal.

A argüição de descumprimento de preceito fundamental constitui, portanto, um mecanismo inovador na fiscalização de constitucionalidade, concentrado de leis municipais e dos atos não normativos, bem como de atos anteriores à promulgação do Documento Supremo.


ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL: LIMITES E IDEOLOGIAS

A Argüição de descumprimento de preceito fundamental constitui mais uma das formas de controle concentrado de constitucionalidade, prevista no artigo 102, § 1º, da Constituição Federal, produto da atividade do Poder Constituinte Originário.

Já se disse que "com a argüição, tem-se a complementação do sistema pátrio de controle da constitucionalidade, com uma medida extremamente aberta à correção dos atos estatais violadores da Constituição".

Com efeito, a argüição vem somar-se aos mecanismos assecuratórios do princípio da supremacia constitucional, com a particularidade de tutelar com especificidade a supremacia dos preceitos fundamentais da Carta Magna.

Elival da Silva Ramos [1] não esposa esse entendimento. Após tecer críticas ao Legislador Constituinte devido à parcimônia na previsão do novel instituto, consigna:

(...) não nos parece aceitável extrair-se de um dispositivo com um conteúdo significativo tão fluído, como é o caso do § 1º do art. 102, a interpretação de que ali se permitiu ao Legislador Infraconstitucional a instituição de um instrumento a mais voltado ao controle da constitucionalidade de leis ou atos normativos diante da Constituição Federal, controle esse, conforme gizado pelo Pretório Excelso, de natureza extraordinária, a exigir expressa manifestação de vontade do Constituinte.

Em que pese esse posicionamento, pensamos que a argüição de descumprimento de preceito fundamental se insere no rol dos institutos voltados ao controle concentrado da constitucionalidade, mormente porque dotado da característica específica, como já adiantamos, de tutela dos preceitos constitucionais fundamentais.


PRECEITO FUNDAMENTAL

Qualificam-se de fundamentais os grandes preceitos que informam o sistema constitucional, os quais estabelecem comandos basilares e imprescindíveis à defesa dos pilares da manifestação constituinte originária. Qualquer ato ou omissão, capaz de atingi-los, afrontando-lhes a forma ou corroendo-lhes a substância, suscita o ingresso no Supremo Tribunal Federal, com base no § 1º do art. 102, para que o "guardião da ordem constitucional" decida a respeito da controvérsia.

Paulo Napoleão Nogueira da Silva [2], por exemplo, procurou conceituar como "preceitos fundamentais" os constantes do Título I da Carta Política (à exceção do princípio Republicano, que não seria imutável); as cláusulas pétreas (artigo 60, § 4º); e o caput do artigo 60, ressaltando que seria necessária a edição de lei definindo a legitimação, o rito, e os efeitos da decisão. José Afonso da Silva, por sua vez, entendeu como preceitos fundamentais os "princípios fundamentais" (Título I), além de "todas prescrições que dão o sentido básico do regime constitucional, como são, por exemplo, as que apontam para a autonomia dos Estados, do Distrito Federal e especialmente as designativas de direitos e garantias fundamentais" [3]. Sustenta ainda este autor que o instituto teria, na verdade, natureza semelhante ao recurso constitucional alemão (Verfassungsbeschwerde). [4]

Para André Ramos Tavares os preceitos fundamentais e os princípios são parcialmente sinônimos, isso porque,

[...] - não se esgota no campo destes e, ademais, não se contempla totalmente. Há, pois, uma simetria imperfeita entre preceitos fundamentais e princípios constitucionais. Nem todos os preceitos fundamentais são princípios e nem todos os denominados princípios constitucionais são preceitos fundamentais. (5)

Zeno Veloso [6] ensina que:

A Constituição já indica os seus princípios fundamentais nos arts. 1º a 4º (forma federativa do Estado, soberania, cidadania, dignidade da pessoa humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, pluralismo político, independência e harmonia entre os poderes)… os direitos e garantias fundamentais (art. 5º). Elenca, mais os princípios regentes da administração pública (art. 37).

Nelson Nery Jr. e Rosa Maria Nery [7] asseveram que:

São fundamentais, entre outros, os preceitos constitucionais relativos: ao estado democrático de direito (CF 1.º caput); b) à soberania nacional (CF 1.º I); c) à cidadania (CF 1.º II); d) à dignidade da pessoa humana (CF 1. º III); e) aos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa (CF 1.º IV); f) ao pluralismo político (CF 1.º V); g) aos direitos e garantias fundamentais (CF 5º); h) aos direitos sociais (CF 6.º a 9.º); i) à forma federativa do estado brasileiro; j) à separação e independência dos poderes; l) ao voto universal, secreto, direto e periódico.

Os preceitos fundamentais devem ser interpretados de forma ampliativa, buscando de certa forma a sua completude. A respeito Walter Claudius Rothenburg [8], assevera que:

[…] A interpretação dos direitos fundamentais dever ser ampliativa, buscando a leitura mais favorável que deles se possa fazer. Essa propriedade também é dita eficácia irradiante dos direitos fundamentais. À guisa de ilustração, refira-se a extensão, que vem sendo aceita pela jurisprudência, da assistência judiciária gratuita (art. 5 º, LXXIV, da Constituição Brasileira) às pessoas jurídicas necessitadas.

Discute-se ainda a possibilidade de se incluir dentre os princípios fundamentais aqueles advindos da internacionalização desses direitos, de forma que se deveria admitir dentre os direitos fundamentais aqueles advindos da Declaração Universal dos Direitos Humanos; da Organização das Nações Unidas; Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, dentre outras.

Todo esse entendimento é de estrema importância por ser ele o delimitador da ação de argüição de preceito fundamental, que não terá como objeto qualquer matéria constitucional, mas apenas aquela que descumprir preceito fundamental.


LEGITIMAÇÃO ATIVA

Os legitimados ativos para propor a argüição estão elencados no artigo 2º, inciso I da Lei n. 9.882/99 e são os mesmos da ação direta de inconstitucionalidade: Presidente da República, Mesa do Senado Federal, Mesa da Câmara dos Deputados, Mesa de Assembléia Legislativa, Governador de Estado, Procurador-Geral da República, Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, partido político com representação no Congresso Nacional, confederação sindical ou entidade de classe de âmbito nacional (*Ver Nota de Atualização).

Foi vetado o inciso II, que versava sobre a legitimidade de "qualquer pessoa lesada ou ameaçada por ato do Poder Público" propor a argüição, com fundamento de se conceder um acesso irrestrito, direto, e individual ao Supremo Tribunal Federal, que é incompatível com o controle concentrado de constitucionalidade, e ensejaria uma elevação excessiva do número de feitos a serem apreciados pela Corte Suprema. Tal veto foi alvo de severas críticas da doutrina de Zeno Veloso e Maria Garcia.


DEMONSTRAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE OUTRO MEIO EFICAZ

A Lei n. 9.882, de 1999, impõe que a argüição de descumprimento de preceito fundamental somente será admitida se não houver outro meio eficaz de sanar a lesividade (art. 4, § 1º).

À primeira vista, poderia parecer que somente na hipótese de absoluta inexistência de qualquer outro meio eficaz para afastar a eventual lesão poder-se-ia manejar, de forma útil, a argüição de descumprimento de preceito fundamental. É fácil ver que uma leitura excessivamente literal dessa disposição, que tenta introduzir entre nós o princípio da subsidiariedade vigente no direito alemão e no direito espanhol para, respectivamente, o recurso constitucional e o recurso de amparo, acabaria por retirar desse instituto qualquer significado prático.

De uma perspectiva estritamente subjetiva, a ação somente poderia ser proposta se já se tivesse verificado a exaustão de todos os meios eficazes de afastar a lesão no âmbito judicial. Uma leitura mais cuidadosa há de revelar, porém, que, na análise sobre a eficácia da proteção de preceito fundamental nesse processo, deve predominar um enfoque objetivo ou de proteção da ordem constitucional objetiva. Em outros termos, o princípio da subsidiariedade – inexistência de outro meio eficaz de sanar a lesão – contido no art. 4, § 1º, da Lei n.º 9.882, de 1999, há de ser compreendido no contexto da ordem constitucional global.

Nesse sentido, se for considerado o caráter enfaticamente objetivo do instituto (o que resulta inclusive da legitimação ativa), meio eficaz de sanar a lesão, parece ser aquele apto a solver a controvérsia constitucional relevante de forma ampla, geral e imediata.

Convém observar que, no direito alemão, a Verfassungsbeschwerde (recurso constitucional) está submetida ao dever de exaurimento das instâncias ordinárias. Todavia, a Corte Constitucional pode decidir de imediato um recurso constitucional, se se mostrar que a questão é de interesse geral ou se demonstrar que o requerente poderia sofrer grave lesão caso recorresse à via ordinária (Lei Orgânica do Tribunal, § 90, II).

Como se vê, a ressalva constante da parte final do § 90, II, da Lei Orgânica da Corte Constitucional alemã confere-lhe uma ampla discricionariedade, tanto para conhecer das questões fundadas no interesse geral (allgemeine Bedeutung), quanto daquelas controvérsias baseadas no perigo iminente de grave lesão (schwerer Nachteil).

Assim, tem o Tribunal Constitucional admitido o recurso constitucional, na forma antecipada, em matéria tributária, tendo em vista o reflexo direto da decisão sobre inúmeras situações homogêneas. A Corte considerou igualmente relevante a apreciação de controvérsia sobre publicidade oficial, tendo em vista o seu significado para todos os partícipes, ativos e passivos, do processo eleitoral. No que concerne ao controle de constitucionalidade de normas, a posição da Corte tem-se revelado enfática: "apresenta-se, regularmente, como de interesse geral a verificação sobre se uma norma legal relevante para uma decisão judicial é inconstitucional".

No caso brasileiro, o pleito a ser formulado pelos órgãos ou entes legitimados dificilmente versará – pelo menos de forma direta – sobre a proteção judicial efetiva de posições específicas por eles defendidas. A exceção mais expressiva reside talvez na possibilidade de o Procurador-Geral da República, como previsto expressamente no texto legal, ou qualquer outro ente legitimado, propor a argüição de descumprimento a pedido de terceiro interessado, tendo em vista a proteção de situação específica. Ainda assim, o ajuizamento da ação e a sua admissão estarão vinculados, muito provavelmente, ao significado da solução da controvérsia para o ordenamento constitucional objetivo e não para a proteção judicial efetiva de uma situação singular.

Assim, tendo em vista o caráter acentuadamente objetivo da argüição de descumprimento, o juízo de subsidiariedade há de ter em vista, especialmente, os demais processos objetivos já consolidados no sistema constitucional. Nesse caso, cabível a ação direta de inconstitucionalidade ou de constitucionalidade, ou, ainda, a ação direta por omissão, não será admissível a argüição de descumprimento. Em sentido contrário, não sendo admitida a utilização de ações diretas de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, isto é, não se verificando a existência de meio apto para solver a controvérsia constitucional relevante de forma ampla, geral e imediata, há de se entender possível a utilização da argüição de descumprimento de preceito fundamental.

É o que ocorre, fundamentalmente, nos casos relativos ao controle de legitimidade do direito pré-constitucional, do direito municipal em face da Constituição Federal e nas controvérsias sobre direito pós-constitucional já revogado ou cujos efeitos já se exauriram. Nesses casos, em face do não-cabimento da ação direta de inconstitucionalidade, não há como deixar de reconhecer a admissibilidade da argüição de descumprimento.

Também é possível que se apresente argüição de descumprimento com pretensão de ver declarada a constitucionalidade de lei estadual ou municipal que tenha sua legitimidade questionada nas instâncias inferiores. Tendo em vista o objeto restrito da ação declaratória de constitucionalidade, não há que se cogitar aqui de meio eficaz para solver, de forma ampla, geral e imediata, eventual controvérsia instaurada.

Afigura-se igualmente legítimo cogitar de utilização da argüição de descumprimento nas controvérsias relacionadas com o princípio da legalidade (lei e regulamento), uma vez que, assim como assente na jurisprudência, tal hipótese não pode ser veiculada em sede de controle direto de constitucionalidade.

A própria aplicação do princípio da subsidiariedade está a indicar que a argüição de descumprimento há de ser aceita nos casos que envolvam a aplicação direta da Constituição – alegação de contrariedade à Constituição decorrente de decisão judicial ou controvérsia sobre interpretação adotada pelo Judiciário que não envolva a aplicação de lei ou normativo infraconstitucional.

Da mesma forma, controvérsias concretas fundadas na eventual inconstitucionalidade de lei ou ato normativo podem dar ensejo a uma pletora de demandas, insolúveis no âmbito dos processos objetivos.

Não se pode admitir que a existência de processos ordinários e recursos extraordinários deva excluir, a priori, a utilização da argüição de descumprimento de preceito fundamental. Até porque, tal como assinalado, o instituto assume, entre nós, feição marcadamente objetiva.

Nessas hipóteses, ante a inexistência de processo de índole objetiva apto a solver, de uma vez por todas, a controvérsia constitucional, afigura-se integralmente aplicável a argüição de descumprimento de preceito fundamental. É que as ações originárias e o próprio recurso extraordinário não parecem capazes, a mais das vezes, de resolver a controvérsia constitucional de forma geral, definitiva e imediata. A necessidade de interposição de uma pletora de recursos extraordinários idênticos poderá, em verdade, constituir-se em ameaça ao livre funcionamento do Supremo Tribunal Federal e das próprias Cortes ordinárias.

A possibilidade de incongruências hermenêuticas e confusões jurisprudenciais decorrentes dos pronunciamentos de múltiplos órgãos pode configurar uma ameaça a preceito fundamental (pelo menos, ao da segurança jurídica), o que também está a recomendar uma leitura compreensiva da exigência aposta à lei da argüição, de modo a admitir a propositura da ação especial toda vez que uma definição imediata da controvérsia mostrar-se necessária para afastar aplicações erráticas, tumultuárias ou incongruentes, que comprometam gravemente o princípio da segurança jurídica e a própria idéia de prestação judicial efetiva.

Ademais, a ausência de definição da controvérsia – ou a própria decisão prolatada pelas instâncias judiciais – poderá ser a concretização da lesão a preceito fundamental. Em um sistema dotado de órgão de cúpula que tem missão de guarda da Constituição, a multiplicidade ou a diversidade de soluções pode constituir-se, por si só, em uma ameaça ao princípio constitucional da segurança jurídica e, por conseguinte, em uma autêntica lesão a preceito fundamental.

Assim, tendo em vista o perfil objetivo da argüição de descumprimento, com legitimação diversa, dificilmente poder-se-á vislumbrar uma autêntica relação de subsidiariedade entre o novel instituto e as formas ordinárias ou convencionais de controle de constitucionalidade do sistema difuso, expressas, fundamentalmente, no uso do recurso extraordinário.

Como se vê, ainda que, aparentemente, pudesse ser o recurso extraordinário o meio eficaz de superar eventual lesão a preceito fundamental nessas situações, na prática, especialmente nos processos de massa, a utilização desse instituto do sistema difuso de controle de constitucionalidade não se revela plenamente eficaz, em razão do limitado efeito do julgado nele proferido (decisão, com efeito, entre as partes).

Assim sendo, é possível concluir que a simples existência de ações ou de outros recursos processuais – vias processuais ordinárias – não poderá servir de óbice à formulação da argüição de descumprimento. Ao contrário, tal como explicitado, a multiplicação de processos e decisões sobre um dado tema constitucional reclama, as mais das vezes, a utilização de um instrumento de feição concentrada, que permita a solução definitiva e abrangente da controvérsia.


MEIOS DE CONTROLE: REPRESSIVO E PREVENTIVO

Considerando o momento de intervenção do órgão competente para apreciação da inconstitucionalidade, encontramos sistemas que adotam o controle preventivo, que ocorre numa fase anterior à publicação da lei, ou seja, antes mesmo da produção final do ato legislativo. Neste caso, ainda se está diante da formação do ato, do estudo e da discussão do projeto de lei, constantes das seguintes fases: introdução, exame do projeto nas comissões permanentes, discussão, decisão e revisão. Efetivamente, dá-se a aplicação deste controle quando o projeto de lei passa pelo crivo da Comissão de Constituição e Justiça, ou ainda quando o próprio Presidente da República veta o projeto (art. 66, § 1º, CF). Portanto, percebe-se que o controle preventivo é exercido tanto pelo Poder Legislativo, através das Comissões Permanentes, quanto pelo Poder Executivo, através do Presidente da República.

Há ainda o controle repressivo que ocorre no momento em que o ato já está concluído, ou seja, após a publicação da lei. Também faz parte do controle repressivo o veto de competência do Congresso Nacional, no caso do art. 49, V, CF - quando os atos do Poder Executivo exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa.


CONCLUSÃO

A Constituição lançou no seu art. 102, §1° norma de eficácia limitada. Neste proceder, foi o próprio Poder Constituinte quem concedeu poderes ao legislador ordinário para definir o objeto da ação de argüição.

Tanto a Constituição Federal, quanto a Lei n. 9.882/99, que regulamentou seu artigo 102, § 1°, deixaram em aberto a delimitação do que seja preceito fundamental, decorrente desta Constituição.

Não há consenso na doutrina, quanto ao significado dessa expressão. As controvérsias operam-se desde a localização geográfica dos preceitos fundamentais decorrentes da Constituição, havendo quem os entenda situados fora dela; outros em seu bojo; outros em ambos.

Da restrita concepção de preceito fundamental como regra ou princípio de maior hierarquia, à ampla equiparação de preceito fundamental a toda e qualquer norma constitucional ou decorrente da Constituição, é certo que não se pode precisar com segurança qual a extensão desse termo, enquanto o Supremo Tribunal Federal não se manifestar, no processo de construção jurisprudencial, delineando a matéria.


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CLÈVE, Clémerson Merlin. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.

NERY, Nelson; NERY, Rosa. Código de processo civil comentado. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

RAMOS, Elival da Silva. A inconstitucionalidade das leis. São Paulo: Saraiva, 1994.

ROTHERBERG, Walter Claudius. 2000. Direitos fundamentais e suas características. In: Revista de Direito Constitucional e Internacional, n. 30. São Paulo: Revista dos Tribunais.

SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1982.

SILVA, Paulo Napoleão Nogueira da. Curso de direito constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1996.

TAVARES, André Ramos. Argüição de descumprimento de preceito constitucional fundamental: aspectos essenciais do instituto na constituição e na lei. In: Argüição de descumprimento de preceito fundamental: análises à luz da lei n. 9.882/99. São Paulo: Atlas, 2001.

______. Tratado da argüição de preceito fundamental. São Paulo: Saraiva, 2001.

VELOSO, Zeno. Controle jurisdicional de constitucionalidade. Belém: Cejusp, 1998.


NOTAS

1 RAMOS, Elival da Silva. A inconstitucionalidade das leis., 1994, s.p.

2 Paulo Napoleão Nogueira da Silva, Curso de direito constitucional, 1996, p. 559.

3 José Afonso da Silva, Aplicabilidade das normas constitucionais, 1982.

4 Clémerson Merlin Clève. A fiscalização abstrata da constitucionalidade no direito brasileiro, 2000, p. 409.

5 André Ramos Tavares, 2001,Tratado da argüição de preceito fundamental, p. 124/125.

6 Zeno Veloso, 1998, Controle jurisdicional de constitucionalidade, p. 328.

7 Nelson Nery e Rosa Nery, 2001, Código de processo civil comentado, 5. ed., p. 1818.

8 Walter Claudius Rotherberg, 2000, Direitos fundamentais e suas características. In: Revista de Direito Constitucional e Internacional, n. 30, p. 146/158.


(*) Nota de Atualização (do Editor)

O rol de legitimados para a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) foi ligeiramente alterado pela Emenda Constitucional nº 45/2004, para incluir expressamente também o Governador do Distrito Federal e a Mesa da Câmara Legislativa do Distrito Federal. O mesmo rol foi estendido à Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADECON). Contudo, como a legitimação para a propositura da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) não decorre diretamente da Constituição Federal, mas de lei infraconstitucional, cuja redação não foi alterada, caberá à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal decidir se a alteração introduzida pela EC nº 45/2004 no rol de legitimados da ADIN e da ADECON terá algum efeito também sobre a ADPF.


Autor


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Michele Maria Sagin da. Argüição de descumprimento de preceito fundamental: limites e ideologias. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 612, 12 mar. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6315. Acesso em: 19 maio 2024.