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Responsabilização civil do assédio moral no trabalho

Responsabilização civil do assédio moral no trabalho

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O assédio moral é conduta abusiva que afronta o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, e já conta com a cobertura de mantos legais, em que pese não haja dispositivo específico que o sancione.

1 RESPONSABILIDADE CIVIL NO ASSÉDIO MORAL

A noção de responsabilidade civil advém da máxima de que aquele que causar dano ou prejuízo a outrem fica obrigado à reparação, tanto pelos danos morais quanto pelos danos materiais que este vier a sofrer.

O assédio moral no ambiente de trabalho viola os direitos à saúde e a dignidade do trabalhador, bem como alguns direitos e garantias fundamentais elencados pelo art. 1º, III e IV da CRFB, que possuem a seguinte redação:

Art. 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

III. a dignidade da pessoa humana;

IV. os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa.

A CRFB veda, em seu artigo 5º, inciso III, o tratamento desumano ou degradante ao indivíduo, ao preceituar que “ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante”.

A Responsabilidade Civil consiste na obrigatoriedade, reputado a alguém, de reparar um dano ou prejuízo causado a outrem, por fato próprio ou por fato de pessoas.

Diversos doutrinadores conceituam de forma distintas, porém, mantém a mesma essência, que é a reparação dos danos ou prejuízos causados a alguém.

Segundo Gonçalves (2003, p. 449), responsabilidade tem origem do latim respondere, que é a ideia de segurança, garantia da restituição ou compensação do bem sacrificado, que tem como pressuposto a reposição ou ressarcimento.

De acordo com Stoco (1999, p.92), o componente influente da responsabilidade civil é a obrigação de reparar o dano, atendidos os pressupostos legais e as especificações e adequações à cada caso, através de indenização que quase sempre é pecuniária, dado ao ato ilícito do agente, em que cause um dano a outrem.

Diniz (1984, p. 32), define a responsabilidade Civil como:

 [...] aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar - dano moral ou patrimonial causado a terceiro em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele guarda (responsabilidade subjetiva) ou ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva).

Segundo Cavalieri (2008, p. 2), a responsabilidade civil parte do posicionamento que todo aquele que violar um dever jurídico através de um ato lícito ou ilícito, tem o dever de reparar, pois todos temos um dever jurídico originário - o de não causar danos a outrem - e, ao violar este dever jurídico originário, passamos a ter um dever jurídico sucessivo, o de reparar o dano que foi causado.

Para Dallegrave (2005, p. 77), a responsabilidade civil se define:

[...] como “a sistematização de regras e princípios que objetivam a reparação do dano patrimonial ou a compensação do dano extrapatrimonial causados diretamente por – ou por fato de coisas ou pessoas que dele dependam – que agiu de forma ilícita ou assumiu o risco da atividade causadora de lesão.

Gonçalves (2010, p.34) conceitua ato ilícito:

As obrigações derivadas dos “atos ilícitos“ são as que se constituem por meio de ações ou omissões culposas ou dolosas do agente, praticadas com infração a um dever de conduta e das quais resulta o dano para outrem. A obrigação que, em consequência, surge é a de indenizar ou ressarcir o prejuízo causado.

Em princípio, a atividade que gera dano acarreta responsabilidade ou dever de indenizar. Esta forma de reparar o dano causado a outrem, tem como sustentação o princípio da reposição do prejuízo causado, cuja finalidade é manter a segurança jurídica e a sanção civil compensatória ao lesado.

Por sua vez, dispõe os artigos 186 e187 do CC/2002, sobre a definição de ato ilícito:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Desta forma, comete ato ilícito quem violar direito ou causar dano a outrem por meio de uma conduta culposa, seja omissiva ou comissiva, ou ainda cometer abuso de direito.

O artigo 5°, inciso X da CRFB, no tocante aos danos extrapatrimoniais, preceitua a obrigatoriedade ao direito à indenização, pelo dano moral e material: “São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação”.

1.1 Responsabilidade civil subjetiva

Segundo descreve Rodrigues (2003), que a Responsabilidade Civil Subjetiva é quando surge a ideia de culpa, ou seja, sempre estará presente o elemento vontade do agente.

O art. 186 do Código Civil indicou a culpa como centro da Responsabilidade Subjetiva, o Código também no caput do art. 927, reitera o aludido.

Assim, como abrange o caput do art. 927, do CC/2002, “aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, está obrigado a repará-lo”; o que esclarece as características para existência da responsabilidade civil subjetiva como regra do Código atual. Desse modo, o ato ilícito, o dano a outrem e a culpa, caracterizam-se como base da existência da responsabilidade civil subjetiva.

Conforme Oliveira (2009, p.), a culpa, para os defensores da teoria da responsabilidade civil subjetiva, é o elemento básico que gera o dever do ofensor de reparar o dano.

Para Venosa (2008, p.23), na responsabilidade civil subjetiva o dever de indenizar pauta-se no ato ilícito, no exame de transgressão ao dever de conduta, em contrapartida, na responsabilidade subjetiva, “o ato ilícito mostra-se incompleto, pois é suprimido o substrato da culpa”.

No entendimento de Gagliano e Pamplona Filho (2008, p.24), entretanto, mesmo tendo sido mencionada em dispositivo de lei por meio da expressão “ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência”, a culpa não consiste em pressuposto da responsabilidade civil frente à existência da responsabilidade objetiva, espécie que prescinde desse elemento subjetivo para restar configurada.

Jorge Neto e Cavalcante (2008, p.802) asseveram que muito se combate essa ideia de culpa como fundamento da responsabilidade civil, porque, para os defensores da teoria subjetiva, o dever de reparar surge com a existência do dano concreto.

Ressaltam que na responsabilidade objetiva a atividade é lícita, mas, por expor terceiros a perigo, cabe ao agente adotar as devidas cautelas para que o dano não ocorra.

O Código Civil de 2002, assim como o de 1916, manteve a culpa como fundamento da responsabilidade subjetiva, adotando tal teoria como regra geral no ordenamento jurídico vigente.

Destarte, define-se como responsabilidade civil subjetiva aquela que tem por base a culpa do agente, que deve ser comprovada pela vítima para que haja o dever de reparação. Desta forma, não se pode responsabilizar alguém pelo dano sem que haja culpa, ou seja, tem que provar o ilícito.

Rodrigues (2002, p. 11) ensina que “se diz ser subjetiva a responsabilidade quando se inspira na ideia de culpa” e que, de acordo com o entendimento clássico, na “concepção tradicional, a responsabilidade do agente causador do dano só se configura se agiu culposa ou dolosamente”. De modo que a prova da culpa do agente causador do dano é indispensável para que surja o dever de indenizar. “A responsabilidade, no caso, é subjetiva, pois depende do comportamento do sujeito. ”

1.2 Responsabilidade civil objetiva

A responsabilidade civil objetiva foi expressamente apreciada pelo CC/2002, no artigo 927, § único, que inovou e previu que, quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano representar risco, tem o dever de indenizá-lo.

Segundo Tartuce (2011), A responsabilidade objetiva, independente de culpa, é fundada na teoria do risco, em uma de suas modalidades, sendo as principais:

  1. Teoria do risco administrativo: adotada nos casos de responsabilidade objetiva do Estado (art. 37, § 6º, da CF/88)
  2. Teoria do risco criado: está presente nos casos em que o agente cria o risco, decorrente de outra pessoa ou de uma coisa. Cite-se à previsão do artigo 938 do CC, que trata da responsabilidade do ocupante de prédio pelas coisas que dele caírem ou forem lançadas (defenestramento).
  3. Teoria do risco-proveito: é adotada nas situações em que o risco decorre de uma atividade lucrativa, ou seja, o agente retira um proveito do risco criado, como nos casos envolvendo os riscos de um produto, relacionados com a responsabilidade objetiva decorrente do Código de Defesa do Consumidor.
  4. Teoria do risco integral: nessa hipótese não há excludente de nexo de causalidade ou responsabilidade civil a ser alegada, como nos casos de danos ambientais, segundo autores ambientalistas (art. 14, § 1º, da Lei 6.938/81).

O CC/2002, em seu artigo 927, parágrafo único, preceitua que haverá a obrigação de indenizar, independentemente de culpa, nos casos previstos em lei, ou quando a atividade desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Assim, o CC/2002 afasta a teoria da culpa e expressamente adota a Teoria do Risco, chamada de objetiva, segundo a qual, aquele que, em virtude de sua atividade cria um risco de danos a terceiro, fica obrigado a reparar, sendo irrelevante que a ação do agente denote imprudência ou negligência.

Segundo Araújo Júnior (2014, p. 3), a culpa é a inexecução de um dever que o agente podia conhecer e observar. Se efetivamente o conhecia e deliberadamente o violou, ocorre o delito civil, ou, em matéria de contrato, o dolo contratual.

Para o Professor Stoco (2001, p. 97):

 “Quando existe uma intenção deliberada de ofender o direito, ou de ocasionar prejuízo a outrem, há o dolo, isto é, o pleno conhecimento do mal e o direto propósito de o praticar. Se não houvesse esse intento deliberado, proposital, mas o prejuízo veio a surgir, por imprudência ou negligência, existe a culpa (stricto sensu) ”.

A ideia de culpa não guarda relação com a violação intencional de um dever capaz de causar um prejuízo a outrem.

A responsabilidade objetiva tem seu sustentáculo na teoria do risco, pois todo aquele que desempenha uma atividade cria risco de dano para terceiros, devendo assim reparar o dano causado, mesmo que o agente não tenha atuado com culpa.

A obrigação de reparação é proveniente do risco do exercício que determinada a atividade do agente venha a causar a terceiros em função do proveito econômico auferido pelo agente. O fato do agente se beneficiar de sua atividade gera a obrigação de suportar os danos que porventura outros possam sofrer por sua atividade. Rodrigues (2002, p. 10) assim comenta a teoria do risco:

“A teoria do risco é a responsabilidade objetiva. Segundo essa teoria, aquele que, através de sua atividade, cria risco de dano para terceiros deve ser obrigado a repará-lo, ainda que sua atividade e seu comportamento sejam isentos de culpa. Examina-se a situação, e, se for verificada, objetivamente, a relação de causa e efeito entre o comportamento do agente e o dano experimentado pela vítima, esta tem direito de ser indenizada por aquele.”

1.3 Atos ilícitos

O ato ilícito, um dos pressupostos da responsabilidade civil, é o conceito de maior relevância para que seja possível estudar acerca do campo da responsabilidade civil em um todo, posto que é a partir dele que gera à pessoa que o suportou o direito de invocar a responsabilidade civil para que seja indenizada naquele dano que sofreu.

Pela definição de Venosa (2013, p. 24):

[...] os atos ilícitos são os que promanam direta ou indiretamente da vontade e ocasionam efeitos jurídicos, mas contrários ao ordenamento. O ato voluntário é, portanto, o primeiro pressuposto da responsabilidade civil [...]. O ato de vontade, contudo, no campo da responsabilidade deve reverter-se de ilicitude. Melhor diremos que na ilicitude há, geralmente, uma cadeia ou sucessão de atos ilícitos, uma conduta culposa. Raramente a ilicitude ocorrerá com um único ato. O ato ilícito traduz-se em um comportamento voluntário que transgride um dever. Como já analisamos, ontologicamente o ilícito civil não difere do ilícito penal; a principal diferença reside na tipificação estrita deste último.

A conduta é a primeira forma da expressão do ato ilícito, e é exteriorizada, conforme se vê na definição descrita no art. 186 do CC/2002 da seguinte forma: “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência”. Por conta disso, é o requisito necessário para que seja dada início à análise da responsabilidade civil.

Para Diniz (2005, p. 43):

A ação, elemento constitutivo da responsabilidade, vem a ser o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou licito, voluntario e objetivamente imputável do próprio agente ou de terceiros, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado.

Nas palavras de Filho (2012, p. 10), “A antijuridicidade de uma conduta é normalmente estabelecida à luz de certos valores sociais, valores que podem ser englobados na noção tradicional de bem comum”.

Segundo prescreve o artigo 186 do CC/2002 que, aquele que “por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.

A culpa é outra forma da expressão do ato ilícito. Venosa (2013, p. 25), citando José de Aguiar em sua doutrina, define acerca da culpa strictu sensu:

A culpa é falta de diligência na observância da norma de conduta, isto é, o desprezo, por parte do agente, do esforço necessário para observá-la, com resultado não objetivado, mas previsível, desde que o agente se detivesse na consideração das consequências eventuais de sua atitude.

Assim, a culpa em sentido estrito, nada mais é que o erro ou desvio de conduta de determinado agente, eivados de negligência, imprudência ou imperícia, ou seja, o agente não teve a intenção de lesar a outrem, mas, por falta de cuidado, observância das normas, o resultado danoso aconteceu.

Define-se como negligência quando há omissão do agente em agir ou tomar uma conduta em fato que este poderia fazer, agindo assim com descuido, indiferença ou atenção, não tomando as devidas precauções para que o dano fosse evitado.

A imprudência é a tomada de decisão precipitada. Agindo de modo diverso daquele esperado. Enquanto que a imperícia é a falta de técnica, experiência, para a realização de determinada atividade.

De outro lado, há o Dolo, que nada mais é que uma conduta intencional em que o agente tem a consciência, previsão, antevisão mental acerca do resultado que poderá causar com aquela ação, bem como a consciência da ilicitude de tal ato.

Segundo Filho (2012, p.32), tem-se como dolo a “vontade conscientemente dirigida à produção de um resultado ilícito. É a infração consciente do dever preexistente, ou o propósito de causar dano a outrem”.

O dano seria outra forma de expressão de ato ilícito. O dano nada mais é que o prejuízo causado à vítima pelo ato ilícito ensejador da responsabilidade civil.

 Nos dizeres de Venosa (2013, p. 38):

Dano consiste no prejuízo sofrido pelo agente. Pode ser individual ou coletivo, moral ou material, ou melhor, econômico e não econômico. A noção de dano sempre foi objeto de muita controvérsia. Na noção de dano está sempre presente a noção de prejuízo. Nem sempre a transgressão de uma norma ocasiona dano. Somente haverá possibilidade de indenização, como regra, se o ato ilícito ocasionar dano. Cuida-se, portanto, do dano injusto, aplicação do princípio pelo qual a ninguém é dado prejudicar outrem (neminem laedere) (Baptista, 2003:47) [...]

O dano encontra-se no centro da regra de responsabilidade civil, posto que a prática do ato ilícito, para que gere indenização, é necessária que acarrete um dano à vítima, podendo o dano ser moral, material, à imagem, entre outros.


2 Assédio Moral no Trabalho

O assédio moral é um tema que tem despertado grande interesse social em razão das enormes repercussões originadas pela sua ocorrência.

O terror psicológico no ambiente de trabalho constitui-se numa espécie de violência cruel e desumana, ocorrendo de forma repetitiva e sistemática, com escopo específico de desestabilizar a vítima psicologicamente, por meio de agressões verbais, constrangimentos, humilhações, maus tratos, entre formas.

O assédio moral é caracterizado por uma conduta abusiva, de forma repetitiva e prolongada, de natureza psicológica, que atordoe a saúde do empregado, com situações humilhantes e constrangedoras, capazes de causar ofensa à personalidade, à dignidade ou à integridade psíquica seja do empregador, que se utiliza de sua superioridade hierárquica para constranger seus subalternos, ou seja, dos empregados entre si, com a finalidade de excluir alguém indesejado do grupo, o que pode se dar, aliás muito comumente, por motivos de competição ou de discriminação pura e simples. Não se configura assédio moral a determinação para repetição de tarefas malfeitas, e nem a repreensão efetuada pelo mestre de obras ao pedreiro que não cumpriu a contento sua tarefa, sem comprovação de extrapolação dos limites do razoável (DETRT14 n.214, de 21/11/2011 - RO 885 RO 0000885).

A vitimóloga e psicanalista francesa Hirigoyen (2007, p. 65) assevera que por assédio moral em um local de trabalho temos que entender qualquer conduta abusiva manifestando-se, sobretudo, por comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos, que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego, ou degradar o ambiente de trabalho.

Segundo Barreto (2003, p.107), assédio moral é “a violência sutil – explicitada por situações de humilhação, intimidações, ameaças, discriminações, ironias, desvalorizações, desqualificações, assédio sexual e colonização da afetividade, as quais reafirmam a condição de submissão”.

Barros (2004, p.138) entende que o assédio moral está diretamente ligado à nossa estrutura emocional, ou seja, ao nosso caráter. Dentre suas causas estão a exibição de valores, o relato do brilho e da glória de uns com ostracismo do outro, o que gera ciúmes, inveja, rivalidade, e, por conseguinte, competitividade.

Para Guedes (2003, p. 63), no assédio moral no ambiente do trabalho:

 “[...] a vítima do terror psicológico no trabalho não é o empregado desidioso, negligente. Ao contrário, os pesquisadores encontraram como vítimas justamente os empregados com um senso de responsabilidade quase patológico, são ingênuas no sentido de que acreditam nos outros e naquilo que fazem, são geralmente pessoas bem-educadas e possuidoras de valiosas qualidades profissionais e morais.”

Diversas são as jurisprudências resultantes do julgamento de ações relacionadas ao dano moral pelo assédio. São decisões fundamentadas quase que exclusivamente no que se refere à dignidade da pessoa humana, à cidadania, a vida privada, aos valores sociais do trabalho.

Um dos princípios embasadores de constituição do dano moral por assédio está prescrito no art. 5º, inc. X, da CRFB, que dispõe:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

X - São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Da mesma forma que o texto constitucional assegura o direito à vida, a dignidade da pessoa humana, entre outros, a nossa Constituição Federal também assegura a prevalência do interesse social em detrimento do interesse particular, conforme preceitua o art. 193, CRFB: ”A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais“.

O assédio moral no trabalho é um dos problemas mais sérios enfrentados pela sociedade atual. Ele é fruto de um conjunto de fatores, como a globalização econômica predatória, que vislumbra somente o lucro, e a atual organização de trabalho, marcada pela competição agressiva e pela opressão dos trabalhadores através do medo e da ameaça (BARRETO, 2007, p. 16).

Será apresentado abaixo alguns julgados em forma de jurisprudência, para abrilhantar o nosso entendimento quanto a reparação dos danos causados pelo assédio moral:

ASSÉDIO MORAL-“A violência ocorre minuto a minuto, enquanto o empregador, está violando não só o que contratado, mas, também, o disposto no § 2º, do art. 461 consolidado - preceito imperativo - coloca-se na insustentável posição de exigir trabalho de maior valia, considerando o enquadramento do empregado, e observa contraprestação inferior, o que conflita com a natureza onerosa, sinalagmático e comutativa do contrato de trabalho e com os princípios de proteção, da realidade, da razoabilidade e da boa-fé, norteadores do direito do trabalho. Conscientizem-se os empregadores de que a busca do lucro não se sobrepõe, juridicamente, à dignidade do trabalhador como pessoa humana e partícipe da obra que encerra o empreendimento econômico” (TST, 1ª T, Ac. 3.879, RR 7.642/86, 9.11.1987, Rel. Min. Marco Aurélio Mendes de Faria Mello). Juíza Sônia, das Dores Dionísio, do TRT da 17ª Região-Espírito Santo. O Acórdão de nº 7660/2002, foi publicado em 9.09.2002.

ASSÉDIO MORAL - CONTRATO DE INAÇÃO - INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL - A tortura psicológica, destinada a golpear a autoestima do empregado, visando forçar sua demissão ou apressar a sua dispensa através de métodos que resultem em sobrecarregar o empregado de tarefas inúteis, sonegar-lhe informações e fingir que não o vê, resultam em assédio moral, cujo efeito é o direito à indenização por dano moral, porque ultrapassa o âmbito profissional, eis que minam a saúde física e mental da vítima e corrói a sua autoestima. No caso dos autos, o assédio foi além, porque a empresa transformou o contrato de atividade em contrato de inação, quebrando o caráter sinalagmático do contrato de trabalho, e por consequência, descumprindo a sua principal obrigação que é a de fornecer o trabalho, fonte de dignidade do empregado”. (TRT 17ª R, RO 1315.2000.00.17.00.1, Ac. 2276/2001, Relª. Juíza Sônia, das Dores Dionízio, 20.08.02, na Revista LTr 66-10/1237).

Para se caracterizar o Assédio Moral é preciso qualquer conduta agressiva ou vexatória, com o objetivo de constranger a vítima, humilhá-la, fazendo-a se sentir inferior. É exatamente por isso que o Assédio Moral também é conhecido como terror psicológico, psicoterror, violência psicológica.

2.1 Formas de como o assédio moral pode ocorrer no trabalho

As formas como o agente pode praticar o assédio moral ocorre de diversas maneiras e a psiquiatra e psicóloga Marie-France Hirigoyen (2002, p.108) traz uma lista de atitudes hostis. Ela classifica em quatro categorias, a saber: deterioração proposital das condições de trabalho; isolamento e recusa de comunicação; atentado contra a dignidade e violência verbal, física ou sexual.

Veja a lista de atitudes hostis, trazida pela autora Hirigoyen:

 1) Deterioração proposital das condições de trabalho

  • Retirar da vítima a autonomia.
  • Não lhe transmitir mais as informações úteis para realização de tarefas.
  • Contestar sistematicamente todas as suas decisões.
  • Criticar seu trabalho de forma injusta ou exagerada.
  • Privá-la do acesso aos instrumentos de trabalho: telefone, fax, computador...
  • Retirar o trabalho que normalmente lhe compete.
  • Dar-lhe permanentemente novas tarefas.
  • Atribuir-lhe proposital e sistematicamente tarefas inferiores às suas competências.
  • Pressioná-la para que não faça valer seus direitos (férias, horários, prêmios).
  • Agir de modo a impedir que obtenha promoção.
  • Atribuir à vítima, contra a vontade dela, trabalhos perigosos.
  • Atribuir à vítima tarefas incompatíveis com sua saúde.
  • Causar danos em seu local de trabalho.
  • Dar-lhe deliberadamente instruções impossíveis de executar.
  • Não levar em conta recomendações de ordem médica indicadas pelo médico do trabalho.
  • Induzir a vítima ao erro. 

2) Isolamento e recusa de comunicação 

  • A vítima é interrompida constantemente.
  • Superiores hierárquicos ou colegas não dialogam com a vítima.
  • A comunicação com ela é unicamente por escrito.
  • Recusam todo contato com ela, mesmo visual.
  • É posta separada dos outros.
  • Ignoram sua presença, dirigindo-se apenas aos outros.
  • Proíbem os colegas de lhe falar.
  • Já não a deixam falar com ninguém.
  • A direção recusa qualquer pedido de entrevista.

3) Atentado contra a dignidade

  • Utilizam insinuações desdenhosas para qualifica-la.
  • Espalham rumores a seu respeito.
  • Atribuem-lhe problemas psicológicos (dizem que é doente mental).
  • Zombam de suas deficiências físicas ou de seu aspecto físico; é imitada ou caricaturada. 
  • Criticam sua vida privada.
  • Zombam de suas origens ou de sua nacionalidade.
  • Implicam com suas crenças religiosas ou convicções políticas.
  • Atribuem-lhe tarefas humilhantes.
  • É injuriada com termos obscenos ou degradantes.

4) violência verbal, física ou sexual

  • Ameaças de violência física.
  • Agridem-na fisicamente, mesmo que de leve, é empurrada, fecham-lhe a porta na cara.
  • Falam com ela aos gritos.
  • Invadem sua vida privada com ligações telefônicas ou cartas.
  • Seguem-na na rua, é espionada diante do domicílio.
  • Fazem estragos em seu automóvel.
  • É assediada ou agredida sexualmente (gestos ou propostas).
  • Não levam em conta seus problemas de saúde.

Os nossos tribunais têm se manifestados quanto ao assédio moral no ambiente de trabalho, sendo destacados alguns casos concretos conforme se vê abaixo:

a) Empregado que sofre exposição humilhante e vexatória, colocado em ociosidade, em local inadequado apelidado pejorativamente de "aquário" pelos colegas, além da alcunha de "javali" (já vali alguma coisa) atribuída aos componentes da equipe dos "encostados". (TRT 15ª R. - RO 2229-2003-092-15-00-6 - (53171/05) - 11ª C. - Rel. Juiz Edison dos Santos Pelegrini - DOESP 04.11.2005 - p. 129).

b) Empregado que é colocado em indisponibilidade indefinidamente por mais de ano, embora remunerada; sofre tortura psicológica pela forma reiterada e prolongada a que esteve exposto a situações constrangedoras e humilhantes, minando a sua autoestima e competência funcional, depreciando a sua imagem e causando sofrimento psicológico. (TRT 15ª R. - RO 2142-2003-032-15-00-5 - (42274/05) - 11ª C. - Rel. Juiz Edison dos Santos Pelegrini - DOESP 09.09.2005 - p. 62).

c) Empregado que era submetido, rotineiramente e na presença dos demais colegas de trabalho, por ato do superior hierárquico, por não ter atingido a meta de produção, a usar vestes do sexo oposto, inclusive desfilar com roupas íntimas, além de sofrer a pecha de "irresponsável", "incompetente", "fracassado", dentre outros. (TRT 6ª R. - Proc. 00776-2002-006-06-00-5 - 1ª T. - Rel. Juiz Valdir José Silva de Carvalho - DOEPE 03.04.2004).

d) A dispensa de comparecimento à empresa, ainda que sem prejuízos de salário, constitui degradação das condições de trabalho e faz com que o trabalhador sinta-se humilhado perante os colegas, a família e o grupo social. Esse ataque à dignidade profissional é grave e não permite sequer cogitar de que os salários do período de inação compensem os sentimentos negativos experimentados.(TRT 9ª R. - Proc. 03179-2002-513-09-00-5 (RO 10473-2003) - (06727-2004) - Relª Juíza Marlene T. Fuverki Suguimatsu - DJPR 16.04.2004).

e) Empregado que é confinado em uma sala, sem ser-lhe atribuída qualquer tarefa, por longo período, existindo grande repercussão em sua saúde, tendo em vista os danos psíquicos por que passou. (TRT 17ª R. - RO 1142.2001.006.17.00.9 - Rel. Juiz José Carlos Rizk - DOES 15.09.2002).

f) Empregado submetido a dinâmica de grupo na qual se impõe ‘pagamentos’ de ‘prendas’ publicamente, tais como, ‘dançar a dança da boquinha da garrafa’, àqueles que não cumprem sua tarefa a tempo e modo. (TRT 17ª Região - RO 01294.2002.007.17.00.9, Relª Juíza Sônia Das Dores Dionísio – DOES 19.11.2003).

g) Empregada que é chamada de burra idiota e incompetente pelo seu chefe, sofre assédio moral porque tem sua dignidade atingida (TRT 2a. Região – RO  01163.2004.015.02.00-0, rel. Juiz Valdir Florindo in Consultor Jurídico de 04/04/2006).

h) Vendedor que recebe correspondências da empresa de teor intimidatório e agressivos tais como: "Semana retrasada demitimos o vendedor da Zona 51, semana passada demitimos o vendedor da Zona 02, quem será o próximo?" e; "Com tantas promoções, ofertas e oportunidades, sair do cliente sem vender nada é o mais absoluto atestado de incompetência", ou ainda; "Você pode ser tudo na vida, menos vendedor, é melhor procurar outra profissão" e, finalmente, "Não entendo!!! Entendo menos ainda que ainda contínuo encontrando vendedor ´barata tonta` (observem que nossa equipe está mudando algumas ´caras` e não é por acaso)", sofre assédio moral. (TRT 4a. Região – RO n° 01005-2004-662-04-00-5, Rel. Juiz João Ghisleni Filho, fonte site do TRT-RS, 24/01/2005).

Em situações como as acima exemplificadas, o dever indenizatório emerge da necessidade de proteção à dignidade da pessoa humana (CRFB, art. 1°, III), de tal sorte a afirmar que a punição pelo assédio moral se impõe através da condenação do empregador por danos morais.

Ainda são enumerados como espécie de assédio moral: o mobbing combinado e o mobbing ascendente. Aquele se daria com a união, tanto do chefe, quanto dos colegas, no objetivo de excluir um funcionário, enquanto o último seria o assédio praticado por um subalterno que se julga merecedor do cargo do chefe, bem como por um grupo de funcionários que quer sabotar o novo chefe, pois não o julgam tão tolerante quanto o antigo ou tão capacitado para tal cargo (SCHMIDT, 2002, p. 177-226).

2.2 Assédio moral como violação da dignidade do trabalhador

O princípio da dignidade da pessoa humana, como será visto, está fincado no ordenamento jurídico brasileiro através da CRFB e, tanto é a sua importância que a sua proteção, por parte da ordem jurídica, se faz mesmo quando não há uma norma onde este princípio esteja contido. 

A CRFB, traz no seu artigo 1º, inciso III, do Título I - “Dos Princípios Fundamentais”:

 Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como Fundamentos:

  1. – a soberania;
  2. – a cidadania;
  3. – a dignidade da pessoa humana;

Glöckner (2004, p. 32), menciona dois momentos em que os princípios gerais de direito são aplicados. Primeiro na Lei de Introdução ao Código Civil (Decreto-Lei nº 4.657, de 04 de setembro de 1942), que em seu artigo 4º determina ao juiz que, havendo omissão na lei, decida o caso conforme analogia, os costumes e os princípios gerais de direito. Há também uma segunda disposição que determina a aplicação dos princípios é a Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 01 de maio de 1943, que em seu artigo 8º diz que na ausência de disposições legais ou contratuais, as autoridades administrativas e judiciárias podem fazer uso dos princípios gerais de direito.

Silva (1967, p.526) consigna o que vem a ser a dignidade:

[...] dignidade é a palavra derivada do latim dignitas (virtude, honra, consideração), em regra se entende a qualidade moral, que, possuída por uma pessoa serve de base ao próprio respeito em que é tida: compreende-se também como o próprio procedimento da pessoa pelo qual se faz merecedor do conceito público; em sentido jurídico, também se estende como a dignidade a distinção ou a honraria conferida a uma pessoa, consistente em cargo ou título de alta graduação; no Direito Canônico, indica-se o benefício ou prerrogativa de um cargo eclesiástico.

Em uma valoração entre o princípio da isonomia e o da dignidade, na concepção do professor Nunes (2002, p. 45) tem-se que: 

 É ela, a dignidade, o primeiro fundamento de todo sistema constitucional posto e o último arcabouço da guarida dos direitos individuais. A isonomia serve, é verdade, para gerar equilíbrio real, porém visando concretizar o direito à dignidade. É a dignidade que dá a direção, o comando a ser considerado primeiramente pelo intérprete.

 Dispõe o art. 1º, III da CRFB:

“A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

III – a dignidade da pessoa humana. ”

Ainda nesse contexto de conferir à dignidade da pessoa humana um status de princípio fundamental, essencial, fonte de todo ordenamento jurídico brasileiro, manifesta-se o STF:

(...) o postulado da dignidade da pessoa humana, que representa - considerada a centralidade desse princípio essencial (CF, art. 1º, III) - significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional vigente em nosso País e que traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo (...). (HC 95464, Relator (a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 03/02/2009, DJe-048 DIVULG 12-03-2009 PUBLIC 13-03-2009 EMENT VOL-02352-03 PP-00466)

Logo, a dignidade da pessoa humana, se tomada como fundamento da República, princípio fundamental do ordenamento pátrio, norte constitucional, mínimo de direitos que garantem uma existência digna, não pode ser relativizada por constituir valor absoluto, vez que, nessa hipótese, o indivíduo é protegido por ser colocado em contraposição à sociedade ou ao Poder Público, portanto, em situação de vulnerabilidade.[1]

No mesmo sentido, Clève (2003, p. 152-153) demonstra que o princípio da dignidade da pessoa humana é considerado a base essencial de todo o ordenamento jurídico e de todo o sistema de direitos fundamentais, constituindo-se como valor supremo:

“Verifica-se, dessa maneira, que os direitos fundamentais sociais devem ser compreendidos por uma dogmática constitucional singular, emancipatória, marcada pelo compromisso com a dignidade da pessoa humana e, pois, com a plena efetividade dos comandos constitucionais”.

Destarte, a dignidade é garantida pelo princípio constitucional, logo não pode ser minimizada ou colocada em um relativismo, devido a sua clara importância.

Este princípio simboliza a base do próprio Estado Brasileiro. Mostra que as pessoas devem ser respeitadas, resguardadas em sua integridade física, mental e moral.

Nas palavras de Delgado (2006, p. 205):

[...] para se ter dignidade não é preciso necessariamente se ter direitos positivados, visto ser a dignidade uma intrínseca condição humana. De toda a forma, quanto à sua proteção, reconhece-se que o Estado, pela via normativa, desempenha função singular para a manutenção da dignidade do homem.

O assédio moral fere a dignidade, a autoestima e o respeito ao trabalhador. O princípio da dignidade deve reger as relações de trabalho. Se o trabalho dignifica o ser humano, e se a dignidade é inerente à pessoa, o trabalhador merece tal proteção.

Para a identificação precisa do assédio moral nas relações de trabalho, é necessária a violação da dignidade do profissional por condutas abusivas dentro do contexto profissional. O clima psicológico determinado pelo que acontece à volta do empregado enquanto ele trabalha é de suma importância para constatação de assédio. Desta forma, o assédio moral não se restringe ao ambiente físico de trabalho. Todavia, é imprescindível que o processo assediador seja praticado durante o exercício do trabalho, não se confundindo com questões pessoais que possam aparecer dentro do ambiente de trabalho (DOLORES, 2004, p. 43).

Assim, se a dignidade é intrínseca à pessoa, inalienável e irrenunciável, cabe ao Estado a sua proteção e a sua promoção.

Devem ser respeitados, acima de tudo, os direitos da personalidade, ou melhor, a dignidade da pessoa humana que é um princípio constitucional, consagrado no artigo 1º, inciso III e artigo 5º, incisos VI e X, da Constituição Federal. Estabelece este que são invioláveis os direitos à vida, à liberdade, à igualdade e à segurança, assim como são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem, prevendo que, se qualquer um desses direitos for violado, a pessoa tem o direito de resposta, bem como indenização por danos morais e materiais. Assim, entende o TRT de Roraima:

ASSÉDIO MORAL. O empregador que exige dos seus empregados resultados que extrapolem as metas previamente estabelecidas, ameaçando-os, com intimidações e xingamentos, e impondo "castigos" (como trabalhar de pé, proibindo-os de ir ao banheiro, tomar água ou lanchar), excede manifestamente os limites traçados pela boa-fé e pelos costumes e ainda vulnera o primado social do trabalho, ultrapassando os limites de atuação do poder diretivo, para atingir a dignidade e a integridade física e psíquica desses empregados, praticando ato abusivo, ilícito, que ensejará justa reparação dos danos causados aos ofendidos. Não se pretende defender que a produção estimulada e a busca por resultados cada vez maiores sejam um exercício maléfico nas relações de trabalho vigentes num mercado de trabalho, como o atual, que labora em constante transformação e adaptação às práticas comerciais que vão surgindo a cada momento. Mas há várias formas de estimular o empregado na conquista de resultados mais favoráveis ao empreendimento econômico do empregador, como, por exemplo, através da oferta de cursos de capacitação e liderança ou da conhecida vantagem econômica, prática muito embora controvertida, mas largamente adotada, de remunerar os trabalhadores por produção, desde que respeitados, naturalmente, os seus limites físicos e psíquicos, tudo se fazendo sem atingir, todavia, a sua dignidade ou integridade física e psíquica (ACÓRDÃO TRT3 01245-2005-012-03-00-0. RO).

2.3 A prova no Assédio moral

É de grande importância a análise da prova da ocorrência do assédio moral e do dano, tendo em vista que a agressão decorrente deste ato ilícito, na maioria das vezes, é oculta e atinge a esfera íntima e subjetiva da vítima.

Afirma Alkimin (2005, p. 117) que:

Para a reparação do dano moral, é imprescindível a prova dos fatos que dão causa ao dano moral, entretanto, é prescindível a prova da dor, sofrimento e perturbação interior causada pela conduta ilícita, pois a doutrina e jurisprudência admitem a teoria do danun in re ipsa, para a qual o dano se prova por si mesmo, ou seja, provando o ilícito, dispensa-se a prova do prejuízo moral in concreto, pois ferir os direitos de personalidade e afetar o mais íntimo sentimento humano, é de difícil constatação.

Em razão disto, a prova do dano moral no caso do assédio moral - diante das inúmeras dificuldades, dentre as quais, destacam-se as dificuldades em provar a dor interior, bem como a rejeição dos colegas de trabalho em testemunhar - não deve se sujeitar à disciplina geral em matéria de prova.

Para tanto, Alkimin (2005, p. 118) propõe, para tanto, a inversão do ônus da prova:

O juiz, valendo-se de sua persuasão racional e da presunção como meio de prova, poderá aferir ou até mesmo presumir a existência de dor, sofrimento, angústia, aflição, desespero, vergonha, humilhação, o descrédito perante os colegas, e admitir a existência do dano, determinando a inversão do ônus da prova, impondo ao agressor o ônus de provar a inexistência de conduta assediante e da possibilidade de nexo de causalidade; até porque, diante do desequilíbrio social e econômico entre empregado e empregador, perfeitamente justificável é a inversão do ônus da prova.

Neste mesmo sentido, valiosa contribuição foi dada pelo jurista Luiz de Pinho Pedreira da Silva (1998, p.83), ao dizer que:

No que diz respeito ao ônus da prova do dano moral, estou com Mosset Iturraspe quando sustenta que sobre a vítima desse dano pesa o ônus de prová-lo em sua existência e gravidade, mas acrescenta que essa prova pode ser produzida mediante presunções hominis extraídas de indícios, conforme as regras de experiência. Muitos autores, porém, acham que a prova do dano moral se faz in re ipsa.

Diante da subjetividade do assédio moral, em razão de sua natureza imaterial, as provas da demonstração ou verificação da verdade não podem ser exigidas nos mesmo moldes que o dano material, posto que se refere a uma ilicitude de ato ofensivo.

Nesse ínterim, o dano moral dispensa comprovação de sua existência, contudo cabe a vítima provar a conduta ofensiva do empregador, de modo a tornar clara a existência do dano.

A prova judicial acerca da prática do assédio moral é assunto que demanda bastante importância na seara do processo do trabalho, ante a dificuldade da vítima em provar sua existência, uma vez que, na maioria das vezes, a ocorrência do assédio se dá às escuras ou de forma camuflada.

Para Oliveira (2004, P.72), diante dos princípios que norteiam a temática probatória é relevante citarmos aqui o princípio in dubio pro misero em relação à valoração das provas, assim leciona:

A regra não se aplica na valoração da prova, estando restrita às interpretações de direito. Vale dizer: em se cuidando de matéria probatória, não haverá o julgador que aferir valoração favorável ao empregado. Se a prova produzida não permite convicção, cabe ao julgador decidir pelo ônus da prova.

Diante de todos os meios citados, vale ressaltar que tais provas são de difícil comprovação, em se tratando de casos de dano psicológico, este é um grande problema ainda existente na seara trabalhista, pois, neste universo, tudo é muito subjetivo, pois, as provas são as palavras, gestos, sinais, entre outros.

No assédio sexual, dificilmente existirão testemunhas, pois o assediador dificilmente expõe-se ao público. Além disso, a vítima nem sempre é lesionada de modo físico (LOPES, 2001, p. 29).

Segundo Mirabete, na busca da verdade real, não há limitação dos meios de prova, desde que obtidas licitamente. Desta forma, a vítima pode contar com o avanço tecnológico para provar o assédio:

Nada impede, portanto, que se utilizem provas com aplicação de meios técnicos ou científicos, como gravações em fita magnética, fotos, filmes, videofonogramas etc., desde que obtidas licitamente (MIRABETE, 1998, p. 259).


3 RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR NO COMETIMENTO DO ASSÉDIO MORAL

Apesar de ainda não existir legislação tipificando o assédio moral, a doutrina e a jurisprudência já estabeleceram os seus conceitos e punições para os ofensores, incluindo as empresas.

Assim, de maneira geral, para que haja responsabilização do empregador por dano causado ao empregado, deve aquele incorrer em culpa ou dolo, nos moldes da responsabilidade civil subjetiva adotada pela legislação civil.

Ao tratar-se de responsabilidade civil, tem em regra o ato ilícito, que constitui ação positiva ou negativa que violou os preceitos do ordenamento jurídico, ou uma obrigação assumida.

No Brasil, a sistemática do direito positivo trouxe a previsão de responsabilidade civil objetiva do empregador pelos atos dos seus prepostos, independentemente e sem prejuízo da possibilidade de responsabilização direta do agente causador do dano.

Relativamente à responsabilidade civil objetiva do empregador por ato de seus empregados, Pamplona Filho e Gagliano (2014, p. 263-264) explicam que:

A ideia de culpa, na modalidade in eligendo, tornou-se legalmente irrelevante para se aferir a responsabilização civil do empregador, propugnando-se pela mais ampla ressarcibilidade da vítima, o que se mostra perfeitamente compatível com a vocação de que o empregador deve responder pelos riscos econômicos da atividade exercida.

Seguindo a mesma linha de raciocínio, Guedes (2004, p. 119) ensina:

Graças à jurisprudência progressista dos tribunais, amparada na lição de Clóvis Beviláqua, se construiu a teoria da "presunção de culpa" - livrando a vítima da prova da culpa concorrente ou "in vigilando" do empregador. Assim, provado o dano e o nexo de causalidade entre este e o fato do agente, a pessoa jurídica é obrigada à reparação. [...] assim, na ocorrência de dano praticado por empregados ou prepostos no exercício do trabalho que lhes competir ou por ocasião deste, o empregador responde independentemente de culpa. Basta que reste provado o ato ilícito – ofensa a uma norma preexistente ou erro de conduta -, o dano e a relação de causalidade.

Este entendimento doutrinário encontra respaldo jurídico no art. 933 do CC/2002, o qual estabeleceu expressamente o caso de responsabilidade objetiva do empregador em face de atos praticados por seus empregados, em razão de seu trabalho: “As pessoas indicadas nos incisos I a V do artigo antecedente, ainda que não haja culpa de sua parte, responderão pelos atos praticados pelos terceiros ali referidos.”

A responsabilidade do empregador pelos atos de seus empregados decorre tanto de atos contra outros empregados, quanto de qualquer outra pessoa. Por sua vez, dispõe o art. 932, inc. III, do CC/2002 que: “São também responsáveis pela reparação civil: [...] o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele”.

Ademais, ainda que aplicada a responsabilidade subjetiva, o empregador responde em face do assédio praticado por seus prepostos, em razão de incorrer em culpa in omittendo e in eligendo.

Desse modo, em sendo praticado o assédio moral na empresa por qualquer empregado, gerente, preposto, contra qualquer pessoa, como empregado ou cliente, a empresa é responsável pela reparação civil, independentemente de culpa, podendo ser acionada judicialmente pela vítima.

3.1 A Conduta do Agressor e o Perfil da Vítima no Assédio Moral

O assédio moral, como já comentado, é uma forma de terror psicológico, humilhando a vítima que é inferiorizada e tem sua autoconfiança e autoestima abaladas. As ações do agressor são previamente articuladas para esse objetivo.

Hirigoyen (2001) divide as atitudes do agressor em duas etapas: a sedução perversa e a violência manifesta. A primeira fase ocorre no início do relacionamento, o agressor envolve a vítima com um processo de desestabilização e perda gradativa da autoconfiança. Já na segunda fase, já estando à vítima desestabilizada, o agressor começa a realizar estratégias de agressão e violência para eliminar a vítima de vez.

Para a estudiosa Barros (2007, p.909) esta traz o perfil do assediador como sendo: “O perfil do Assediador Moral, em princípio, é o de uma pessoa perversa. A provocação que exerce sobre a vítima leva-a a ultrapassar os seus limites. O perverso só consegue existir e ter uma boa autoestima humilhando os outros”.

Embora não haja um perfil fixo da figura do assediador, algumas características revelam-se comuns nesse tipo de agressor. Segundo Barreto (2007, p. 56) normalmente são pessoas “[...] vaidosas, ferinas, hipócritas, levianas, narcisistas e, para completar, fracas e medrosas”.

Entretanto, apesar de possuir essas características, o assediador não aparenta tais desvios de caráter e se esconde sob máscaras, por isso se utiliza de subterfúgios como, por exemplo, armar tramas e espalhar boatos sorrateiramente para alcançar seus objetivos perversos.

Carvalho (2009, p. 72), ao citar o empregador como principal agente causador do assédio moral, faz uma relação com denominado poder de direção:

“Decorrência direta da subordinação jurídica a que está submetido o empregado (por força do contrato empregatício), este tem a obrigação de cumprir suas tarefas com zelo, diligência e boa-fé, submetendo-se assim ao poder de direção, devendo obedecer às ordens que lhe são destinadas pelo empregador diretamente ou por aqueles que exercem poderes delegados (superiores hierárquicos).

Não obstante a subordinação jurídica do empregado perante o empregador, essa condição não permite que este trate o trabalhador de modo desrespeitoso, humilhante, degradante, violando assim sua dignidade e condição de ser humano”.

Desta forma, o empregador ou aquele que exerce o poder de direção de forma delegada, não pode exagerar no exercício desse poder, sob pena de atingir a dignidade do seu empregado e caracterizar o assédio moral. 

Em relação à vítima do assédio moral, Aguiar (2005) afirma que nem todos os empregados se tornam vítimas do assédio moral. Para ele os alvos são pessoas “atípicas”, seja por sua competência excessiva, por sua diferença dos padrões, por seu desempenho abaixo do esperado, etc.

Para a estudiosa Ramirez (2011, p. 1), no seu entendimento: 

“[...] a pessoa assediada é escolhida porque tem características pessoais que perturbam os interesses do elemento assediador, com ganância de poder, dinheiro ou outro atributo ao qual lhe resulte inconveniente o trabalhador ou trabalhadora, por suas habilidades, destreza, conhecimento, desempenho e exemplo [...].”

Em suma, podemos notar que o assédio moral é um fenômeno complexo, onde o problema todo passa principalmente pela cultura organizacional, pois ele acontece no âmbito da relação entre dois seres humanos, onde um tenta dominar o outro, infligindo humilhações silenciosas que atingem diretamente a honra, desta maneira a vítima, quem sofre as consequências diretas do assédio, tem atingida sua dignidade, sua honra, pelos comportamentos do agressor.

3.2 A necessidade de uma Lei Federal para Assédio Moral

Não existe uma medida efetiva que vise a inibir a prática do assédio moral. Uma das causas deste mal é não haver uma legislação, no âmbito federal, específica, que preveja a prisão dos assediadores.

No Brasil, diversos projetos de leis tramitam no Congresso Nacional, com o objetivo de regular a questão do assédio moral ou, como preferem alguns legisladores, a coação moral. Dentre tais projetos destacam-se os que alteram o Código Penal; a Lei nº 8.112, a Lei nº 8.666 e um que propõe alteração na CLT.

Tramita, no Congresso Nacional, um Projeto de Lei nº 3.760, de 2012, que dispõe sobre o assédio moral nas relações de trabalho, que tem como justificação que não há nenhuma Lei federal, específica, sobre assédio moral nas relações de trabalho, que coíba de forma eficaz e eficiente esse instituto deletério, responsável pela desestruturação do meio ambiente do trabalho, além de configurar fator de desrespeito à dignidade humana do trabalhador brasileiro.

Nesta justificação à proposta de aprovação deste projeto de lei, informa, ainda, que embora seja difícil estabelecer uma conceituação para o assédio moral, podemos defini-lo como uma conduta abusiva e reiterada praticada contra o empregado pelo empregador, ou por algum de seus prepostos com poder de mando sobre a vítima, deixando sequelas na saúde física e psíquica do trabalhador, vulnerando o ambiente laboral, configurando inequívoca afronta à dignidade da pessoa humana do empregado.

Na concepção de Glöckner (2004, p. 57) tem-se que:

A existência de uma lei expressa sobre o assédio moral não tem o condão somente de punir, mas fará com que sejam trabalhados sistemas de prevenção no ambiente de trabalho das empresas, e, infelizmente, aqui no Brasil só existem mudanças nas condições de trabalho quando da existência de uma lei expressa que regulamenta determinada condição e que a infringência do dispositivo gera prejuízo ao empreendedor.

Mesmo não havendo uma legislação específica sobre assédio moral, o dano pessoal dele decorrente compete à Justiça do Trabalho apreciar. Hirigoyen (2002, p. 343) diz que: "... antes mesmo de existir uma legislação, a Justiça tinha começado a levar em conta os atos hostis ou ofensivos dirigidos de maneira evidente contra um empregado em seu local de trabalho."

Atualmente, é pacificado (EC 45/2004) o entendimento de que todo e qualquer dano pessoal, incluindo inclusive o assédio moral que é causador deste dano pessoal, ocorrido na relação de emprego ou em função desta, compete à Justiça do Trabalho a proteção.

Na ausência de uma legislação específica, a Jurisprudência constitui um instrumento eficaz para estabelecer o conceito de assédio moral, com as infrações e sanções nesse terreno, e as medidas para evitar essa prática, as Convenções Coletivas.

Mas em qual legislação irá embasar a vítima que tem seu contrato de trabalho regido pela CLT ou mesmo que não tenha carteira assinada para pleitear seus direitos? A vítima irá buscar amparo, primeiramente, na CRFB, que em seu art. 5º, V e X, lhe assegura o respeito à dignidade humana, à cidadania, à imagem e ao patrimônio do obreiro, com indenização por danos morais.

As práticas do assédio moral são, geralmente, enquadradas no artigo 483 da CLT, o qual elenca que o empregado poderá considerar rescindido o seu contrato de trabalho e pleitear a devida indenização quando, entre outros motivos, forem exigidos serviços superiores às suas forças, contrários aos bons costumes ou alheios ao contrato, ou ainda, quando for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo ou ato lesivo da honra e boa fama.

O assédio moral também figura na esfera criminal, conforme o caso, a conduta do agressor poderá caracterizar crimes contra a honra, como a difamação e injúria, contra a liberdade individual, em caso, por exemplo, de constrangimento ilegal ou ameaça.

3.3 Competências à Justiça do Trabalho de processar e julgar Assédio Moral

A competência de processar e julgar os casos de assédio moral no ambiente de trabalho é da Justiça do Trabalho.

Durante muito tempo a doutrina e a jurisprudência discutiram sobre de quem seria a competência para processar e julgar os casos de assédio moral no ambiente de trabalho.

A divergência sobre de quem seria a competência para processar e julgar as ações de indenizações por danos morais e materiais decorrentes do assédio moral no ambiente de trabalho terminou com a chegada da EC nº. 45/2005, que atribuiu à Justiça do Trabalho a competência definitiva para julgar tais ações.

As súmulas 392 do TST e 736 do STF pacificam também o entendimento de ser da Justiça do Trabalho a competência para processar e julgar ações que descumpram normas trabalhistas e ações de indenização por dano moral derivadas da relação de trabalho.

Entende-se, finalmente, que o pedido de reparação de dano moral em virtude do assédio moral, decorrente da relação contratual-trabalhista, configurando descumprimento da obrigação contratual de respeito aos direitos de personalidade e dignidade do empregado, será de competência material da Justiça do Trabalho, embora, à primeira vista, a questão interesse ao direito civil, cujo assédio moral se enquadra no conceito de ato ilícito, previsto no art. 186 do CC.

Embora ainda não tipificado na legislação federal trabalhista, o assédio moral e seus efeitos indenizatórios derivam diretamente da Constituição da República, que firma como seus princípios cardeais o respeito à dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, CRFB), à vida e à segurança (art. 5º, caput, CRFB), ao bem estar e à justiça (Preâmbulo da Constituição), estabelecendo ainda como objetivos fundamentais do Brasil construir uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, I, CRFB), promovendo o bem de todos (art.3º, IV, ab initio, CRFB) e proibindo quaisquer formas de discriminação (art. 3º, IV, in fine, CRFB). Ressalte-se, por cautela, que não se há falar em prova do dano moral, mas, sim, na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, o constrangimento físico ou moral, o que ocorreu na hipótese.

Segundo a doutrinadora Nascimento (2009, p. 176), com a entrada em vigor da EC nº. 45/2004, o STF quando do julgamento do Conflito de Competência determinou que todas as causas pendentes de julgamento sobre o assunto deveriam ser remetidas a Justiça do Trabalho.

Segundo Leite (2009, p. 217-8), no que tange ao dano moral, antes mesmo da Emenda Constitucional 45/04, a jurisprudência já vinha entendendo que o dano moral oriundo da relação de emprego, isto é, aquela com vínculo empregatício entre o empregador e empregado, deveria ser julgado pela Justiça do Trabalho, como diz a Súmula 392 do TST, antiga Orientação Jurisprudencial: “Nos termos do art. 114 da CF/1988, a Justiça do Trabalho é competente para dirimir controvérsias referentes à indenização por dano moral, quando decorrente da relação de trabalho”. Com a EC 45/04, a Justiça do Trabalho passou também a apreciar casos envolvendo dano moral decorrentes de trabalhadores não empregados, como é o caso, por exemplo, do eventual, avulso e autônomo. Com a entrada em vigor da referida Emenda, passou a julgar também dano patrimonial.

Portanto, cominando os art. 114 e o inciso X do art. 5º, ambos da CRFB, com o art. 8º da CLT, conclui-se que a Justiça do Trabalho é competente para julgar dissídios entre empregado e empregador que envolva, não apenas matéria trabalhista prevista na CLT, como também pedidos de indenização por dano moral, que tenha decorrido da execução do contrato de trabalho, face à ampla garantia constitucional de reparação de dano moral, sendo que o texto constitucional não distingue ou limita a reparação apenas na esfera civil, e face à inovação da subsidiariedade da aplicação do direito comum à relação de emprego.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

O assédio moral no ambiente de trabalho já existe há muito tempo, porém, sem, contudo, haver punição para o assediador. Com uma maior atuação dos Direitos Humanos, este ato passou a ser algo intolerado pela sociedade atual,

O assédio moral representa a degradação do ambiente de trabalho, com transtornos psicossociais ao trabalhador. Este trabalho objetivou analisar a sistemática jurídica do assédio moral no ambiente do trabalho.

A crescente onda do assédio moral no ambiente do trabalho, com as diversas doenças psicossociais inerente ao caso, faz com que tenhamos o conhecimento deste ato ilícito e suas consequências tanto ao empregado quanto ao empregador, do ponto de vista jurídico.

Acredita-se que, devido a situação vexatória, vergonhosa e a necessidade em manter-se no emprego, alguns assediados se sentem desconfortáveis para denunciar tais práticas ainda existentes na esfera trabalhista e a dificuldade em provas tais práticas.

No tocante ao assédio moral, há vários projetos de lei no âmbito federal e a Lei 2.949 de 2002 no Distrito Federal e há como atacá-lo, também, com base nos direitos e garantias fundamentais elencados pelo art. 1º, III e IV da CF e nos direitos fundamentais trazidos pelo art. 5º, inciso X, também da CRFB que estabelece o dano moral.

Em consequência, pelo fato de o assédio moral atingir a esfera da dignidade da pessoa humana, restou-se necessário demonstrar de uma forma explicativa que este ato ilícito tem que ser combatido de uma forma reparadora, tanto moralmente quanto financeiramente, para que tais práticas abusivas não mais se repitam no âmbito trabalhista.

Desta forma, chama-se a atenção para a necessidade de se criar leis específicas que tenham o escopo de proteger os trabalhadores, pois o assédio moral é uma realidade e deve ser levada em consideração pelas empresas para que possam fazer suas adaptações.

A forma desumana como é praticado o assédio moral no ambiente de trabalho, além de cruel, é também imoral, porquanto associada ao desconhecimento de alguns empregados, o que os torna presas fáceis para este tipo de crime.

Importante salientar que nem todos os trabalhadores sabem que são vítimas de assédio moral, normalmente acreditando que tudo o que estão passando faz parte da cobrança da chefia para obtenção de uma maior produtividade.

Destarte, é bom observar que todo e qualquer tipo de assédio moral constitui um ataque direto à dignidade da pessoa humana, que deverá ser combatido utilizando de todos os meios admitidos no direito.

Diante disso, o trabalho apresentado conseguiu mostrar que o assédio moral fere uns dos principais princípios norteadores do direito do trabalho, que é o princípio da dignidade da pessoa humana, protegido e tutelado pela CRFB.

Mediante todo o exposto, conclui-se que o assédio moral foi definido como uma conduta abusiva realizada no ambiente de trabalho, que causa sofrimento psicológico e humilhação ao trabalhador, afrontando o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, devendo, portanto, ser tutelada por todos os sujeitos envolvidos, ou seja, deve haver uma proteção efetiva pelo Estado, pelos órgãos, pelas entidades, associações, entre outros.

Portanto, a elaboração deste estudo permitiu obter maiores esclarecimentos sobre a responsabilização civil do empregador no assédio moral, levando ao entendimento que é preciso existir uma cultura educacional de prevenção e punição de toda e qualquer forma de coação moral ao trabalhador.


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Nota

[1] http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/5787/A-dignidade-da-pessoa-humana-como-principio-absoluto <acesso em 30/03/2016>


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Edvaldo do Carmo. Responsabilização civil do assédio moral no trabalho. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5622, 22 nov. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/63882. Acesso em: 10 maio 2024.