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A convenção internacional sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial e o ordenamento jurídico brasileiro

A convenção internacional sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial e o ordenamento jurídico brasileiro

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Buscaremos elucidar as principais questões que norteiam os direitos humanos frente à nova ordem internacional, bem como analisar minuciosamente os meios de que o Brasil vem se utilizando para cumprir com as Convenções Internacionais acerca do racismo.

1 INTRODUÇÃO

            A globalização ou internacionalização dos direitos humanos é uma das mais importantes questões do início deste século. O grande problema deste tema é que ele versa sobre a essência da relação política, isto é, poder e pessoa, ou seja, quanto mais direitos do homem menos poder e vice-versa.

            Os ideais de universalidade dos direitos humanos defendidos pela ONU desde sua criação, manifestados com a Declaração Universal dos Direitos do Homem, em 1948, estão adquirindo uma maior consistência, inobstante a flagrante constatação de desrespeitos em vários pontos do mundo. A preocupação internacional sai da retórica e procura a concretude. Há uma tendência para o processo de construção de uma cultura universal de observância dos direitos humanos.

            Uma das objeções suscitadas quanto à globalização dos direitos humanos foi levantada pelos países islâmicos e asiáticos. Estes acusaram que os propósitos universalistas dos direitos humanos são, na verdade, princípios ocidentais, que desprezam as particularidades regionais de cada povo. É uma discussão que deve ser aprofundada, ainda mais em face dos recentes acontecimentos político-religiosos do Afeganistão e da China, só para darmos um exemplo.

            O fundamentalismo religioso afegão nega uma série de direitos que nós, ocidentais, reputamos como ínsitos à natureza humana, principalmente a liberdade religiosa e de expressão. O Islão, por sua vez, vem fechando cada vez mais as suas portas, procurando um isolamento frente ao Ocidente, no ideal de formar uma comunidade vinculada aos preceitos do Alcorão. Tal política isolacionista dificulta sobremaneira a vigilância internacional sobre os direitos humanos. É o tribalismo maléfico.

            Com a China, o processo de abertura econômica não causou a devida abertura política e, por conseguinte, a sua democratização. Atualmente a situação é delicada, principalmente para os EUA, posto que os maciços investimentos das empresas ocidentais e, evidentemente, os avantajados lucros, estão em conflito com as posturas políticas de seus países, no tocante às exigências de respeito aos direitos humanos pelos chineses. Pequim ameaçou retaliar se continuassem as intromissões em sua política interna. Os prejuízos econômicos podem ser enormes. Eis o dilema. Qual a prioridade: investimentos ou direitos humanos?

            O Brasil, ao lado da Guatemala e Honduras, figura entre os países com os mais elevados índices de discriminação e injustiça social no mundo, segundo um documento da Anistia internacional. O estudo foi elaborado pela entidade para a 3ª Conferência das nações Unidas contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata em Durban na África do Sul.

            O racismo existe em todas as sociedades, em todo o mundo. Há o testemunho de que a globalização tem aspectos negativos e positivos. O que tem prevalecido até agora, são os reflexos que essa globalização causa e que reforça os padrões de racismo e de discriminação racial estabelecidos pela herança do sistema colonial-escravagista em todo o mundo.

            A nova universalidade dos direitos fundamentais os coloca assim, desde o princípio, num grau mais alto de juridicidade, concretude, positividade e eficácia. É universalidade que não exclui os direitos da liberdade, mas primeiro os fortalece com as expectativas e os pressupostos de melhor concretizá-los mediante a efetiva adoção dos direitos da igualdade e da fraternidade.

            Ainda podemos dizer que a nova universalidade procura, enfim, subjetivar de forma concreta e positiva os direitos da tríplice geração na titularidade de um indivíduo que antes de ser o homem deste ou daquele País, de uma sociedade desenvolvida ou subdesenvolvida, é pela sua condição de pessoa um ente qualificado por sua pertinência ao gênero humano, objeto daquela universalidade.

            Diante desse contexto, é possível perceber qual a importância e qual o valor dos direitos humanos na sociedade moderna, e, sobretudo, da igualdade racial. Sendo assim, buscaremos, através deste estudo, elucidar as principais questões que norteiam os direitos humanos frente à nova ordem internacional, bem como analisar minuciosamente os meios de que o Brasil vem se utilizando para cumprir com as Convenções Internacionais acerca do racismo.


2 O SISTEMA INTERNACIONAL DE PREVENÇÃO E PUNIÇÃO À DISCRIMINAÇÃO RACIAL

            2.1 O SISTEMA ESPECIAL DE PROTEÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS

            Segundo José Augusto Lindgren Alves, o sistema especial de proteção dos Direitos Humanos desenvolve-se por meio de um grande número de Declarações e Convenções Internacionais.

            Embora a Carta Internacional dos Direitos Humanos, com seu escopo abrangente e sua pretendida universalidade, pudesse constituir per se instrumental suficiente para garantir proteção a todos os direitos humanos, as Nações Unidas, ainda na fase de elaboração dessa Carta, iniciaram um processo paralelo de proteção especializada contra certos tipos de violação e para determinados grupos de indivíduos, cujas características especiais exigiram atenção particular de normas específicas mais pormenorizadas. (1)

            Flávia Piovesan (2) entende que o sistema especial de proteção é endereçado a um sujeito de direito concreto, visto em sua especificidade e na sua concreticidade de suas diversas relações. Ao contrário, do sujeito de direito abstrato, genérico, destituído de cor, sexo, etnia, classe social, dentre outros critérios, emerge o sujeito de direito concreto, historicamente situado, com especificidades e particularidades. Portanto, o sistema normativo internacional passa a reconhecer e a tutelar direitos endereçados às crianças, às mulheres, aos idosos, às pessoas vítimas de tortura, às pessoas vítimas de discriminação racial, etc.

            Há que se fazer uma diferenciação entre os sistemas geral e especial de proteção, na medida em que um complementa o outro. O sistema especial de proteção é voltado à prevenção da discriminação ou à proteção de pessoas ou grupos de pessoas que merecem uma proteção especial, enquanto que o sistema geral de proteção tem por destinatário toda e qualquer pessoa, abstrata e genericamente considerada. Vale dizer, ao lado da International Bill of Rights, que integra o sistema geral de proteção, organiza-se o sistema especial de proteção, que adota como sujeito de direito o indivíduo historicamente situado, o sujeito de direito "concreto", na peculiaridade e particularidade de suas relações sociais.

            Pode-se dizer que foi com o processo de universalização dos direitos humanos que os Estados partes concordaram em submeter ao controle da comunidade internacional o que até então era de seu domínio reservado.

            A carta da ONU adotada em 1945, estabelece que as Estados-partes devem promover a proteção dos direitos humanos e liberdades fundamentais.

            Por direitos humanos, cito o conceito de DALLARI, para o qual os mesmos representam "uma forma abreviada de mencionar os direitos fundamentais da pessoa humana. Esses direitos são considerados fundamentais porque sem eles a pessoa humana não consegue existir ou não é capaz de se desenvolver e de participar plenamente da vida" (3)

            A Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, vem atestar o reconhecimento universal de direitos humanos fundamentais, os quais são "justamente os direitos humanos consagrados pelo Estado como regras constitucionais escritas" (4).

            Costuma-se sustentar que a declaração não apresenta força jurídica obrigatória e vinculante. Após a sua adoção, instaurou-se uma larga discussão sobre qual seria a maneira mais eficaz em assegurar o reconhecimento e a observância universal dos direitos humanos nela elencados. Chegou-se a conclusão de que a Declaração deveria ser "juridicizada" sob a forma de tratado internacional, que fosse juridicamente obrigatório e vinculante no âmbito do Direito Internacional.

            Esse processo de "juridicização" da Declaração, começou em 1949 e foi concluído apenas em 1966, com a elaboração de dois tratados internacionais distintos, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (5) e o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (6), os quais passaram a incorporar os Direitos constantes da Declaração Universal.

            Portanto, foi a partir da elaboração desses Pactos que forma-se a Carta Internacional dos Direitos Humanos, International Bill of Rights, a qual inaugura o sistema global de proteção desses direitos, ao lado do qual já se delineava o sistema regional de proteção.

            Os sistemas global e regional são complementares, inspirados pelos valores e princípios da Declaração Universal eles compõem o universo instrumental de proteção dos direitos humanos no plano internacional. Tendo em vista, este complexo universo de instrumentos internacionais, fica a escolha do indivíduo que sofreu a violação de direito à escolha do aparato mais conveniente, uma vez que, eventualmente, direitos idênticos são tutelados por dois ou mais instrumentos de alcance global ou regional.

            Por sua vez, o sistema global veio a ser ampliado com o advento de diversos textos de proteção aos direitos humanos de alcance regional e abrangência setorial, tais como o genocídio, a tortura, a discriminação racial, a discriminação contra as mulheres, a violação dos direitos das crianças, dentre outras formas específicas de violação.

            Segundo Antonio Augusto Cançado Trindade (7), tem-se reconhecido o caráter complementar de procedimentos não apenas sob tratados e instrumentos gerais "de direitos humanos, mas também sob tratados e instrumentos "especializados" voltados a aspectos específicos da proteção de direitos humanos, a nível global e regional."

            2.2 ASPECTOS RELEVANTES DA IMPLEMENTAÇÃO DA CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE A ELIMINAÇÃO DE TODAS AS FORMAS DE DISCRIMINAÇÃO RACIAL

            A Convenção sobre a Eliminação de todas as formas de discriminação Racial foi adotada pelas Nações Unidas em 21 de dezembro de 1965, tendo sido ratificada pelo Brasil em 27 de março de 1968. Nos dizeres de Flávia Piovesan (8) três relevantes fatores históricos impulsionaram o processo de elaboração desta Convenção na década de 60, destacando-se o ingresso de dezessete novos países na ONU em 1960, a realização da Primeira Conferência de Cúpula dos Países Não-Aliados em Belgrado em 1961 e o ressurgimento de atividades nazifacistas na Europa dos países.

            Para José Augusto Lindgren Alves, a CIEFDR (9) foi inspirada de perto pelas atrocidades cometidas pelos nazistas em nome da "superioridade da raça ariana" e como já foi mencionado, o ingresso de países afro-asiáticos recém-emersos do regime colonial.

            Estes países, independentes nos anos 60, haviam sofrido na pele a discriminação do colonizador liberal, submetidos ao regime do apartheid que separava as raças em todos os setores, inclusive no tocante a utilização de espaços públicos.

            O sentimento anticolonialista predominante nesta época, associado a repugnância pelas práticas racistas do nazismo nos anos 30 e 40, foi o marco para a definição de normas internacionais contrárias à discriminação racial com aplicabilidade em qualquer parte do mundo.

            Portanto, foram estes os fatores que estimularam a edição da Convenção, como um instrumento internacional voltado ao combate da discriminação racial.

            A CIEFDR, de 1965, foi a primeira grande Convenção das Nações Unidas na área dos direitos humanos. Teve por base legislativa o artigo 1°, parágrafo 3°, da Carta de São Francisco, que define o propósito de promover os direitos humanos de todos "sem distinção de raça, sexo, língua ou religião" e o Artigo 2° da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o qual afirma terem todas as pessoas capacidade para gozar dos direitos e liberdades nela consagrados "sem distinção de qualquer espécie, seja de raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza (... )".

            Em 1946, o Conselho Econômico e Social autorizou a Comissão dos Direitos Humanos das Nações Unidas a estabelecer uma subcomissão, a ela subordinada, dedicadas à prevenção da discriminação, bem como duas outras destinadas respectivamente à liberdade de informação e de imprensa e à proteção de minorias. Porém, a subcomissão para a liberdade de expressão não chegou a ser concretizada e, quanto às outras duas Subcomissões, foram amalgamadas num único órgão, estabelecido em 1947, sob a denominação de: Subcomissão das Nações Unidas Para a Prevenção da Discriminação e Proteção das Minorias. (10)

            A subcomissão foi durante muito tempo, o único órgão das Nações Unidas de composição não-estatal: seus membros não representam governo, ou seja, não atuam em nome dos países de origem, mas tem natureza técnica, seu trabalho mais significativo desenvolve-se na forma de estudos e anteprojetos, em muitos casos, têm constituído a origem de vários dos instrumentos e mecanismos internacionais de proteção aos direitos humanos.

            A subcomissão dedicou-se desde o começo de seu funcionamento, ao tema da prevenção da discriminação, sob diversas faces, mas dedicou-se a uma delas com exclusividade que foi a luta internacional contra o apartheid. Também, em muito contribuiu para a redação da cláusula não-discriminatória do Artigo 2° da Declaração Universal dos Direitos Humanos e deu um grande impulso para a elaboração da Convenção Internacional Sobre Todas as Formas de Discriminação Racial agilizando a sua implementação. Porém, nos primeiros anos, limitou-se a formular sobre a matéria a redação do Artigo 27° do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, relativo aos direitos das pessoas pertencentes a minorias étnicas, religiosas ou lingüísticas, o qual veio a suprir omissão da Declaração Universal (11).

            2.3. ANÁLISE DOS ASPECTOS CENTRAIS DA CONVENÇÃO

            Ao analisar a CIEFDR, chega-se a conclusão que a mesma reafirma o propósito das Nações Unidas, qual seja o da promoção do respeito universal dos direitos humanos, sem discriminação de raça, sexo, idioma, ou religião. Enfatizando ainda os princípios da Declaração Universal de 1948, em especial a concepção de que todas as pessoas nascem livres e iguais em direitos, sem distinção de qualquer espécie e principalmente de raça, cor, ou origem nacional.

            Em seu preâmbulo a Convenção afirma que qualquer doutrina de superioridade baseada em diferenças raciais é cientificamente falsa, moralmente condenável, socialmente injusta e perigosa, inexistindo justificativa para a discriminação racial, em teoria ou prática, em lugar algum. Pois, a existência de barreiras raciais repugna os ideais de qualquer sociedade humana.

            É com base nestes propósitos, que a Convenção tem por objetivos eliminar a discriminação racial em todas as suas formas e manifestações e prevenir e combater doutrinas e práticas racistas.

            O conceito de discriminação racial está disposto no artigo 1º da Convenção, em que a expressão " discriminação racial " significa qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência, baseadas em raça, cor, descendência ou origem nacional ou étnica que têm por objetivo ou efeito anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício em um mesmo plano ( em igualdade de condição) de direitos humanos e liberdades fundamentais no domínio político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro domínio de vida pública. Isto é, a discriminação sempre tem por objetivo ou efeito anular ou restringir o exercício, em igualdade de condições, dos direitos humanos e das liberdades fundamentais. Portanto, para garantir o pleno exercício dos direitos humanos fundamentais, faz-se necessário o combate à discriminação racial.

            Há que se enfatizar que a CIEFDR apresenta duas metas básicas, que visam à implementação do direito à igualdade. São elas: o combate a toda e qualquer forma de discriminação racial e a promoção da igualdade. (12)

            Ocorre que não são consideradas discriminatórias, as distinções estabelecidas pelos Estados entre cidadãos nacionais e estrangeiros.

            Referida exceção, é em princípio justificável em razão da ótica da formação e da proteção das nacionalidades e possivelmente imprescindível à aceitabilidade da Convenção para muitos Estados, mas, por outro lado, possibilita uma falsa aparência de legalidade em relação a medidas claramente discriminatórias, particularmente intensificadas no período atual, onde imigrantes, tanto os clandestinos, quanto os legais, que vivem em países desenvolvidos, sofrem com o racismo.

            O equilíbrio dessa exceção discriminatória encontra-se no próprio artigo 1º, parágrafo 4º, da Convenção, e que segundo José Augusto Lindgren Alves:

            Abriu caminho para as chamadas ‘ações afirmativas’, em defesa de grupos ou indivíduos que se encontrem em situação de inferioridade dentro das sociedades nacionais. Ele estipula que não serão consideradas discriminatórias ‘as medidas especiais tomadas com o único objetivo de assegurar o progresso adequado de certos grupos raciais e étnicos ou de indivíduos que necessitem de proteção’ para que possam ter o gozo efetivo de seus direitos humanos, ‘contando que tais medidas não conduzam, em conseqüência, à manutenção de direitos separados para diferentes grupos raciais’ e não prossigam após terem sido alcançados os níveis eqüitativos que se têm em mira para fruição dos direitos fundamentais. (13)

            Outrosssim, o artigo 2º da Convenção define os compromissos assumidos pelos Estados-partes, nas esferas política, legislativa e administrativa, para combater a discriminação racial, devendo tais compromissos abranger a atuação de "todas as autoridades públicas nacionais e locais".

            Sendo que o artigo 3º diz respeito ao apartheid, que foi uma das motivações principais a acelerar a redação da Convenção. Este artigo determina que os Estados-partes eliminem em seus territórios todas as práticas desta natureza e, por conta do artigo 4° os Estados-partes da Convenção devem condenar toda propaganda e todas as organizações que se inspirem em teorias racistas, devendo proibir qualquer incitamento ao ódio e discriminações raciais, punindo a difusão de idéias baseadas na superioridade racial.

            Já o artigo 5° , apresenta um amplo catálogo de direitos, que inclui: o direito a um tratamento igual perante os Tribunais, o direito à segurança da pessoa ou à proteção do Estado contra a violência, direitos de participação política, direito à liberdade de locomoção, direito à nacionalidade, direito de casa-se e escolher o cônjuge, direito à propriedade, direito à herança, direito à liberdade de pensamento, direito à liberdade de expressão, direito à liberdade de reunião, direitos econômicos, sociais e culturais, como direito ao trabalho, a habilitação, à saúde pública, à previdência social, à educação, a participação em atividades culturais, ao acesso a todos os lugares e serviços destinados ao uso público, dentre outros direitos.

            O artigo 6º refere-se a importância de os Estados-partes assegurarem a todas as pessoas, que estiverem sob a sua jurisdição, proteção e recursos eficazes perante os Tribunais nacionais, assim como o direito à indenização justa e adequada por qualquer dano decorrente do ato discriminatório.

            No artigo 7°, a Convenção estabelece aos Estados-partes o dever de adoção de medidas eficazes nos campos do ensino, educação, cultura e informação, contra os preconceitos que levem à discriminação racial, ressaltando, assim, a importância de uma educação para a cidadania, fundada no respeito à diversidade, tolerância e dignidade humana.

            2.4 MECANISMOS DE IMPLEMENTAÇÃO DA CONVENÇÃO

            Os tratados internacionais de direitos humanos não se limitam a enunciar direitos e consagrar deveres dos Estados-partes. Ao elenco dos direitos, adicionam uma sistemática peculiar de garantia destes direitos, mediante a instituição de organismos internacionais e mecanismos de implementação de direitos. Neste sentido, a CIEFDR prevê a criação do Comitê para a Eliminação da Discriminação Racial.

            Segundo José Augusto Lindgren Alves:

            O Comitê Para a Eliminação da Discriminação Racial- CERD- foi estabelecido formalmente em 10 de julho de 1970. Com autonomia em relação aos Estados de origem de seus integrante, inclusive para instituir seu próprio regulamento, o CERD tem desenvolvido ponderável conjunto de atividades na luta contra o racismo e a discriminação racial, muitas das quais extrapolam as funções para que fora originalmente constituído. (14)

            O CERD é um mecanismo de supervisão, com funções de assessoramento e supervisão, de conciliação e de investigação, as quais encontram-se definidas nos artigos 8° a 16°. É precursor de todos os mecanismos congêneres existentes na área de direitos humanos, cabe a este Comitê realizar o monitoramento dos direitos reconhecidos pela Convenção. (15)

            Conforme o disposto no artigo 8º da Convenção, o Comitê será composto por dezoito peritos de grande prestígio moral e reconhecida imparcialidade, que serão eleitos pelos Estados-partes dentre os seus nacionais e que exercerão suas funções a título pessoal, levando-se em conta uma distribuição geográfica eqüitativa e a representação das formas diversas de civilização, assim como dos principais sistemas jurídicos. Os seus membros serão eleitos em votação secreta, para um mandato de quatro anos, dentre uma lista de pessoas indicados pelos Estados-partes, sendo que cada Estado-parte poderá indicar uma pessoa dentre os seus nacionais.

            O artigo 9º determina que as funções de assessoramento e supervisão dizem respeito principalmente ao exame dos relatórios periódicos que os Estados-partes se comprometem a apresentar bienalmente sobre as medidas legislativas, judiciárias, administrativas e de outra ordem que tenham tomado para implementar as disposições da Convenção. "O exame dos relatórios se completa, após argüição dos representantes governamentais que os defendem, com o envio dos Estados-partes das conclusões do CERD sobre os respectivos informes." (16)

            Nos artigos 11º a 13º estão previstas as funções de conciliação para os casos objeto de queixas interestatais.

            Além desta instância internacional, a Convenção estabelece mecanismos de implementação dos direitos nela enunciados. Vale ressaltar, que os instrumentos internacionais de proteção dos direitos humanos apresentam, em geral, três mecanismos de implementação de direitos:

            a)os relatórios;

            b)as comunicações inter-estatais; e

            c)as petições individuais.

            "O sistema de relatórios é, a despeito de variações processuais, um método de implementação internacional de direitos humanos ou controle exercido ex offício pelos órgãos de supervisão internacionais" (17)

            O artigo 11° da Convenção estabelece que um Estado poderá denunciar que um outro Estado-parte não está cumprindo as disposições da Convenção. Caberá ao Comitê receber e examinar a comunicação inter-estatal, com observância do princípio do contraditório. Este mecanismo vem previsto sob a forma de cláusula facultativa, exigindo que o Estado-parte faça uma declaração específica admitindo essa sistemática. Vale dizer, em se tratando de cláusula facultativa, as comunicações interestatais só podem ser admitidas se os Estados envolvidos, ambos ("denunciador" e "denunciado"), reconhecerem e aceitarem tal sistemática.

            Já o artigo 14° consagra o direito de petição, que consolida a capacidade processual internacional dos indivíduos. O direito de petição, contudo, também é previsto sob a forma de cláusula facultativa. Isto é, o direito de petição fica condicionado à declaração do Estado-parte de que reconhece a competência do Comitê para receber e examinar comunicações de indivíduos ou grupo de indivíduos que se considerem vítimas de violação, pelo referido Estado-parte, de qualquer direito de Convenção.

            O direito de petição está sujeito a determinados requisitos de admissibilidade, como o prévio esgotamento dos recursos internos disponíveis. Ao admitir uma petição, o Comitê solicita informações e esclarecimentos ao Estado violador e, à luz das informações colhidas, formula sua opinião e faz recomendações. O Estado é convidado a informar o Comitê a respeito das ações e medidas adotadas, em cumprimento às recomendações feitas. A opinião ou decisão do Comitê é destituída de força jurídica vinculante. Todavia, é revestida de alta força política e moral, pois é publicada no relatório anual laborado pelo Comitê, que é, por sua vez, encaminhado à Assembléia Geral das Nações Unidas. (18)

            Nas palavras de Antonio Augusto Cançado Trindade (19) "O sistema de petições vem a cristalizar a capacidade processual internacional dos indivíduos, constituindo "um mecanismo de proteção de marcante significação, além de conquista de transcendência histórica".

            Somente a título de esclarecimento até a data de 31 de julho de 2001, trinta e quatro Estados-partes haviam feito a Declaração no sentido de aceitar a competência do Comitê para receber e considerar as comunicações individuais nos termos do já referido artigo 14°da Convenção.

            O Brasil, através do Decreto №. 4.738, de 12 de junho de 2003, promulga a Declaração Facultativa prevista no art. 14 da CIEFDR, reconhecendo a competência do Comitê Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial para receber e analisar denúncias de violação dos direitos humanos cobertos na mencionada Convenção.

            "Sob a responsabilidade do Ministério das Relações Exteriores e do Ministério da Justiça, o décimo relatório, enviado ao CERD em fins de 1995, teve características especialmente abrangentes, com vistas a suprir os informes devidos nos anos de 1988, 1990, 1992 e 1994" (20). Este relatório, ressaltava a promulgação em 1988 da nova Constituição da República, a qual constituiu um marco jurídico da transição democrática da institucionalização dos direitos humanos e seu enfoque antidiscriminatório de todos os temas.

            Segundo Antonio Augusto Cançado Trindade (21), os direitos dos indivíduos de acionar os procedimentos internacionais de proteção (sistema de petições) e o poder dos órgãos de supervisão internacionais de receber e examinar reclamações (sistema de petições), assim como tomar providências e exercer controle ex ofícios (sistemas de relatórios e investigações), acompanham-se como métodos comumente utilizados por mecanismos de proteção no plano global e regional.

            Os sistemas de petições, em particular, compreendem as petições ou comunicações, ou reclamações individuais ( direito de petição individual ), assim como as petições ou comunicações ou reclamações dos Estados ( petições interestatais ). As condições de seu uso e de sua admissibilidade estão consignadas em distintos instrumentos de direitos humanos que as prevêem.

            2.5 CONTROLE DE VIOLAÇÕES

            A Comissão dos direitos Humanos (CDH) possui um conjunto de mecanismos para lidar concretamente com as violações de direitos humanos. Inicialmente, a Comissão reconhecia não ter poder para tomar qualquer medida a respeito de reclamações referentes aos direitos humanos. Porém, atualmente, conta com amplo arsenal para a realização de cobranças aos Governos, tanto em função de comunicações recebidas, como por iniciativa própria.

            É preciso esclarecer que os mecanismos de controle da CDH não se confundem com os órgãos de monitoramento dos Pactos e das Convenções. Pois, estes supervisionam apenas os Estados-partes de cada instrumento jurídico, seja pelo exame dos respectivos relatórios, seja em ações mais diretas que dependerão sempre do consentimento expresso do Governo envolvido (para a acolhida de queixas individuais e interestatais e para missões de investigação). Os mecanismos da CDH funcionam de forma semi permanente, são mais ágeis do que o dos Comitês, são estabelecidos por simples resoluções da Comissão exercendo seu mandato sobre qualquer país, sendo ele parte ou não dos instrumentos jurídicos e, tais mecanismos são atualmente os que mais fiscalizam as situações nacionais e, consequentemente, mais têm exigido ações e respostas do Brasil. (22)

            A constituição desses mecanismos para tratar de violações é relativamente recente, foi a partir de 1970 que o ECOSOC ( Conselho Econômico e Social ), aprovou algumas resoluções, estabelecendo os mecanismos extra-convencionais de monitoramento e supervisão dos direitos humanos. Os principais são o Procedimento 1503, intitulado "Procedimento para lidar com comunicações relativas a violações de direitos humanos e liberdades fundamentais", conhecido como procedimento confidencial e a designação de Relatores Especiais, por temas, ou por países.

            O nome Procedimento 1503 decorre da Resolução do ECOSOC, que estabeleceu que um Grupo de Trabalho da Sub-Comissão para a Promoção e Proteção dos Direitos Humanos, que integra a Comissão de Direitos Humanos, a qual receberia uma lista de queixas ou reclamações ("comunicações"), junto com um resumo das provas que as acompanham.

            Quando o Grupo de Trabalho encontrar prova de haver um padrão consistente de grave violação aos direitos humanos, este remete a matéria para a Sub-Comissão para a Promoção e Proteção dos Direitos Humanos, a qual, por sua vez, pode encaminhar a matéria para a Comissão de Direitos Humanos.

            Através do chamado Procedimento 1503 não são tratados casos individuais, mas situações de graves violações coletivas e consistentes de direitos humanos (23).

            2.5.1 Relatores Especiais

            Em razão da relevância ou importância de um assunto, ou em razão dos problemas enfrentados por países específicos, a Comissão de Direitos Humanos e o Conselho Econômico e Social têm estabelecido mecanismos extraconvencionais conhecidos por Relatores Especiais, que podem ser Temáticos ou por Países, incidindo a escolha em especialistas, que atuam a título pessoal, ou em particulares independentes, denominados relatores especiais, representantes ou especialistas, os quais tem a incumbência de acompanhar a evolução de determinadas situações nacionais.

            Nos dizeres de José Augusto Lindgren Alves:

            A figura dos relatores especiais para países é forma de controle polêmica. Para seu estabelecimento, quase sempre decidido em votações difíceis, conta sobretudo a capacidade de influência do governo iniciador da idéia junto aos demais membros da Comissão, assim como o peso específico ou a fragilidade política, muita vezes circunstancial, do Estado visado. Por seu caráter seletivo e por prestar-se a obtenção de "vitórias" parlamentares, essencialmente políticas, o mecanismo tem sua validade questionada tanto pelos governos alvos e seus aliados, quanto por muitos militantes autenticamente devotados à causa dos direitos humanos. (24)

            O mesmo autor faz menção a figura do relator temático:

            De todos os mecanismos de controle gradativamente estabelecidos pela Comissão dos Direitos Humanos, os que mais se têm ampliado e mais merecido apoio são os chamados relatores temáticos. Individualmente ou em grupos de trabalho, tais relatores recebem a atribuição de monitorar em todo o mundo, de forma não-seletiva, a observância de normas atinentes a determinados temas. (25)

            Os mandatos conferidos a esses procedimentos e mecanismos consistem em examinar e vigiar como está a situação dos direitos humanos nos países ou territórios específicos (os chamados mecanismos ou mandatos por país) ou fenômenos importantes de violação dos direitos humanos a nível mundial (os mecanismos ou mandatos temáticos), e informar publicamente a respeito, em ambos os casos. Esses procedimentos e mecanismos denominam-se coletivamente de Procedimentos Especiais da Comissão de Direitos Humanos. Atualmente, existem 49 mandatos (27 por países e 22 temáticos), entre eles 18 (10 por países e 8 temáticos) confiados ao Secretário Geral. Os que interessam mais ao presente trabalho são: Relator Especial contra a Tortura; Relator Especial para a Violência contra a Mulher; Relator Especial para a Alimentação; Relator Especial para a Educação; Relator Especial para a Habitação; Relator Especial para Execução Extrajudicial; Relator Especial para Racismo, Xenofobia, e outras formas de intolerância; etc.

            Todos os Procedimentos Especiais têm por objetivo central melhorar a eficácia das normas internacionais de direitos humanos, bem como procuram dispor diálogos construtivos com os governos e exigir sua cooperação em relação às situações, incidentes e casos concretos, que examinam a investigação de maneira objetiva com vistas a compreender a situação e a recomendar aos governos soluções aos problemas inerentes à tarefa de garantir o respeito dos direitos humanos. Às vezes, nas comunicações enviadas aos mecanismos extraconvencionais, informa-se que está na iminência de cometer uma grave violação dos direitos humanos. Nestes casos, o Relator Especial ou o Presidente de um grupo de trabalho pode enviar uma mensagem por fax ou telegrama às autoridades de Estado de que se trate para pedir-lhes esclarecimentos e formular um chamamento ao Governo, a fim de que se adote as medidas necessárias para garantir os direitos da possível vítima. Diante disso, esses chamamentos têm caráter preventivo e de nenhuma maneira prejulgam uma conclusão.

            Recebendo uma comunicação relatando a iminência de violação séria à direitos humanos, o Relator Especial adota as seguintes ações (26):

            a)apela ao Governo referido para assegurar proteção efetiva à alegada vítima;

            b)solicita das autoridades competentes que adotem procedimentos investigatórios urgentes e imparciais, e todos às medidas necessárias para prevenir violações futuras;

            c)identificação de vítimas presumíveis;

            d)identificação dos autores da violação;

            e)identificação da pessoa(s) ou organização (organizações) que apresentam a comunicação (por conseguinte, as comunicações anônimas não são admissíveis);

            f)descrição detalhada das circunstâncias do incidente em que se produziu a presumível violação.

            Por fim, as comunicações devem descrever os fatos relacionados com o incidente e os detalhes pertinentes que se tem mencionado de uma forma clara e concisa.


3 O BRASIL E O SISTEMA INTERNACIONAL DE PREVENÇÃO E PUNIÇÃO Á DISCRIMINAÇÃO RACIAL

            3.1 A ORIGEM DO RACISMO NO BRASIL

            O racismo nos países do sistema de colonização escravagista teve suas origens com o sistema econômico, ou seja, a economia baseada no trabalho do africano e índio escravizado. Esses fatos fazem com que a posição inferiorizada dessa população explorada seja forçosamente derivada desta história e deste sistema econômico.

            O problema da discriminação no país é um fenômeno histórico, surgido no Brasil-colônia. Iniciou com a inferiorização da figura feminina, vista como objeto de exploração sexual pelos seus senhores. Surge também a idéia da "democracia racial" brasileira, face à escassez da mão de obra branca com a conseqüente colocação do mulato e do índio para exercerem trabalhos braçais e funções específicas, levando-os aos trabalhos nas casas grandes coloniais. E é deste modo, com a escravidão física, que o afro-descendente e o indígena vão integrar o mundo escravocrata, a serviço da elite branca dominante, cominando com a conseqüente destruição da identidade desses sujeitos. (27)

            Com a campanha abolicionista, movimento para a libertação dos escravos, intensificada a partir do final da Guerra do Paraguai, milhares de negros foram utilizados nas frentes de batalhas. Anos mais tarde, o Exército assumiu a defesa da abolição e se negou a perseguir os negros que fugiam.

            O principal responsável pelo processo de abolição foi o grupo da aristocracia cafeeira paulista, que introduziu o trabalho assalariado explorando imigrantes. A passagem do trabalho escravo para o trabalho livre deixou na população negra seqüelas não admitidas, permeadas por falsos argumentos. Não é exagero dizer que a mais perversa estratégia de exclusão contra a população negra remonta às políticas de imigração, voltadas para beneficiar a população de origem européia e levada a cabo nos últimos anos do Império e nas três primeiras décadas da República. Isso foi realizado sob o argumento de uma inata falta de adaptação da mão-de-obra recém-emancipada às novas regras do trabalho livre e a insuficiência de braços para atender a expansão da lavoura cafeeira.

            Vale ressaltar, que outro fator de grande importância foi a pressão externa sendo mais fortemente manifestada pela Inglaterra, sendo que o Brasil era o único país americano que mantinha a escravidão. Diante da forte pressão, o governo imperial decretou algumas leis abolicionistas como a Lei do Ventre Livre, a Lei dos Sexagenários e a Lei Áurea.

            Mesmo com o negro alcançando a igualdade jurídica com a abolição, mantinha-se não só a desigualdade econômica e social entre os escravocatas e a população branca e a classe dos negros e índios, mas a antiga ideologia que definia bem a diferença entre os dois e reservava a esses indivíduos uma posição de submissão. O preconceito racial continuou a ser exteriorizado de maneira discreta e branda, ou seja, o preconceito de cor está presente em várias regiões do Brasil, e penetra em maior ou menor grau, em todas as classes sociais, sem contudo associar-se com manifestações ostensivas.

            Após a abolição da escravatura, verifica-se que desenvolve-se paralelamente a uma legislação a que pode chamar " emancipadora do cidadão negro", outros mecanismos legais para "controlar" os novos cidadãos. Quanto aos Direitos Civis desses novos cidadãos, o Estado Brasileiro entende que não há nada especial a fazer. Nenhum programa, nenhuma ação. (28)

            O processo de passagem da condição de escravo para a de cidadão foi feito de maneira errada e sem se pensar o que fazer com o contingente de trabalhadores livres. Da noite para o dia os negros foram declarados livres e após a "comemoração" encontravam-se sem abrigo, trabalho e meios de subsistência. Mesmo sendo forçado, no trabalho escravo o negro recebia um mínimo para sua subsistência. Com a libertação, não se considerou a necessidade de proporcionar-lhes meio de sobrevivência, como posse da terra para sua fixação. Supondo-os sem direito àquela, dava-se o primeiro passo para sua marginalização e desfavorecimento.

            Os negros que viviam na cidade encontravam-se agora perambulando pelas ruas como mendigos e começaram a habitar cortiços que deram origem às atuais favelas. Os que viviam no campo emigraram para as cidades causando o primeiro êxodo rural em nosso país. Durante muito tempo, os negros não conseguiram acesso a profissões ou ocupações, mesmo aquelas das quais foram desalojados, principalmente devido à chegada de emigrantes europeus que passaram a substituir o homem negro primeiramente nas lavouras de café. Os serviços mais modestos, que exigiam especialização mínima, e eram mal remunerados representavam normalmente as "oportunidades" do negro no mercado de trabalho.

            Com o capitalismo o negro, por não possuir qualificação, fica à margem do processo ou é utilizado em serviços pesados nas industrias.

            Essa situação se refletiu tanto no nível econômico dos negros quanto os levou a um processo de marginalização social. O escravo passa de meio de produção para assalariado, porém não participa da elevação social no mesmo nível que os senhores brancos.

            "Termos como desclassificados, vadios e marginais foram comuns para designar um contingente populacional expressivo, composto sobretudo por ex-escravos e seus descendentes" (29)

            A reprodução da deterioração do nível de vida do negro dá-se então a partir daí, sendo ele impedido de exercer plenamente as atividades de trabalhador livre, uma vez que não tem fácil acesso ao mercado de trabalho.

            Com o escravismo, constituíra-se uma estrutura de privilégios a favor da população branca. Admitir o negro como um cidadão significaria, para esse contingente dominante, a provável perda dos benefícios alcançados ao longo da adoção do trabalho escravo. Preconceito e discriminação ganham, então novos significados e espaços de atuação voltados para a defesa desta estrutura de privilégios.

            Demoramos muito para perceber que o Brasil é um país racista, pois durante bastante tempo acreditamos viver em uma democracia racial. "A idéia ganhou força nos anos 30, inspirada pela obra do sociólogo Gilberto Freyre, para quem não havia no Brasil distinções rígidas entre brancos e negros e a discriminação era social, feita aos pobres" (30).

            O mito começou a cair a partir do final da década de 60, quando se se descobriu que o Brasil não só tinha preconceito em relação aos pobres como a discriminação era especialmente dirigida a negros, pardos e índios.

            As principais propostas para vencer o preconceito estão agrupadas em uma categoria chamada "ações afirmativas", as quais serão apresentadas no próximo capítulo.

            Em suma, o racismo no Brasil tem suas raízes, segundo Salomon Blajberg, na ideologia do antinegro:

            Surgida durante a expansão marítima portuguesa, servindo de legitimação para o tráfico negreiro e o escravismo. A imagem da África e da pessoa negra no Brasil foi essencialmente moldada pelo colonialismo português. Além de transformar as pessoas negras em mercadorias e bens, elementos significativos de dominação sexual, religiosa e lingüistica, estão associadas ao escravismo no Brasil: a) a miscegenação que se tornou fundamento lógico de um sistema de idéias conducentes ao embranquecimento e ao mito de democracia racial; b)a conversão ao catolicismo, feita de maneira incompleta, não se estendendo aos escravos o sacramento do matrimônio e nem lhes proporcionando instrução religiosa; com a imposição do idioma português, misturando-se os escravos de diversas procedências. (31)

            Segundo dados da Comissão Pastoral da Terra, o trabalho escravo ainda existe no Brasil, pois no interior do Pará, há atualmente, 13 fazendas que mantêm mais de 500 trabalhadores em regime de escravidão por dívida e trabalho forçado em grandes fazendas (32).

            O trabalho escravo, além de presente no Estado do Pará, ainda é grande no interior do Tocantins, Maranhão e Mato Grosso, onde empreiteiros percorrem essas regiões em busca de trabalhadores rurais, que na promessa de bons empregos e salários, acaba por sofrer a exploração do trabalho escravo, ameaças e até penas corporais.

            As principais propostas para vencer o preconceito estão agrupadas em uma categoria chamada "ações afirmativas", as quais serão apresentadas no próximo capítulo.

            3.2 A EVOLUÇÃO DA LEGISLAÇÃO NACIONAL

            Em 1831, foi editada a primeira lei que aboliu o Tráfico Negreiro e declarou a liberdade dos escravos (33) - a chamada Lei Diogo Feijó.

            Após, em 1850, foi editada a Lei 581 denominada Lei Eusébio de Queiroz, que ficou conhecida como a segunda Lei contra o Tráfico Negreiro no Brasil.

            Lei Nabuco de Araújo, de 1854, foi editada por força da pressão inglesa em pôr fim ao comércio dos escravos no território nacional.

            Em 28 de setembro de 1871 foi editada a Lei Rio Branco, também conhecida como Lei do Ventre Livre.

            Apenas com a edição da Lei dos Sexagenários ( Lei Saraiva-Cotejipe)-Lei n.º 3.270, de 28 de setembro de 1885, juntamente com a Lei Áurea - Lei n.º 3.353, de 13 de maio de 1888, o Brasil acabou por proibir definitivamente a escravidão.

            Segundo Flávia Piovesan, (34) a Carta de 1934:

            Foi influenciada pela Constituição de Weimar, que ineditamente na história constitucional brasileira alargou a dimensão dos direitos fundamentais, no sentido de também incluir os direitos sociais. Com efeito, a característica básica de Weimar- o sentido social dos novos direitos - foi incorporada à Carta de 1934. Com a tutela dos direitos sociais, objetiva-se disciplinar aquela categoria de direitos que assinalam o primado da Sociedade sobre o Estado, afastando o absenteísmo estatal do século XIX, para consolidar a reabilitação do papel do Estado com referência à democracia, à liberdade e à igualdade.

            A Constituição de 1946, em termos de garantias e direitos individuais, assegurava aos cidadãos brasileiros e estrangeiros residentes no país, a inviolabilidade dos direitos concernentes à vida, liberdade, segurança individual e à propriedade, trazendo, ainda, a garantia do direito ao exercício de qualquer profissão, atendidas as condições de capacidade que a lei viesse a estabelecer.

            Em 1948, a Convenção da ONU, aprovada em Paris em 09 de dezembro de 1948, considerou o crime de genocídio como sendo contra "o Direito Internacional, contrário ao espírito a aos fins das Nações Unidas e que o mundo civilizado condena", reconhecendo ainda, que em todos os períodos da história, o genocídio causou grandes perdas à humanidade, sendo a cooperação internacional necessária na sua prevenção e punição.

            O Brasil incorporou esse documento ao seu ordenamento jurídico em 1949, promulgando-o através do Decreto № 30.822/49 e com fundamento neste tratado, foi editada a Lei № 2.889/56, que definiu o crime de genocídio como comportamento com a intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso, não o considerando, porém, como crime político para efeito de extradição, confirmando, mais uma vez, a doutrina do espírito do povo brasileiro, avesso a qualquer discriminação desde as suas origens, já que produto de um conjunto diversificado de povos e etnias.

            Vale ressaltar, que desde 1951, o Estado Brasileiro é parte da Convenção para a Prevenção do Crime de Genocídio.

            O primeiro texto legal que buscou combater a discriminação racial foi a Lei № 1.390/51, mais conhecida como Lei Afonso Arinos. Esta lei tipificou uma das formas de racismo, qual seja, a recusa de entidades públicas e ou privadas em atender pessoa em razão de cor ou raça. No entanto, pode-se dizer que suas penas eram apenas simbólicas, uma vez que, puniu estas condutas com mera contravenção penal, ou seja, delito de menor potencial ofensivo.

            Nos dizeres de Jorge da Silva (35) " Por ironia, o principal mérito da Lei Afonso Arinos foi descrever a forma como se dava a discriminação".

            A Constituição de 1967, juntamente com a emenda n.º 1 de 1969, implantaram a constitucionalização do crime de preconceito e de raça, bem como consagraram o princípio da igualdade perante a lei, sem distinção de sexo, raça, trabalho, credo religioso e convicção política.

            Vale ressaltar, que no ano de 1968, o Brasil passou a integrar, a Convenção relativa à luta contra a discriminação no campo de ensino, promulgada em 6 de setembro pelo Decreto № 63.223. Também é parte da Convenção 111 da Organização Internacional do trabalho, a qual faz menção à eliminação da discriminação em matéria de emprego e profissão, cujo Decreto № 62.150 incorporou definitivamente, em 23 de setembro desse mesmo ano, tal documento ao ordenamento jurídico interno.

            O maior marco contra todos os tipos de discriminação é sem dúvida, a Constituição Federal de 1988." Reconhecendo formalmente a especificidade da situação discriminatória dos negros e dos seus valores culturais, pois cuida da questão em vários dos seus dispositivos. Trata-se, evidentemente, de uma grande perspectiva que se abre no sentido da emancipação civil dos afro-brasileiros" (36)

            É interessante citar a respeito, a justificação oferecida pelo ex constituinte Carlos Alberto de Oliveira, o CAÓ, ao propor à Assembléia Constituinte de 1988 a tipificação do racismo como crime:

            Passados praticamente cem anos da data da abolição ( da escravatura ), ainda não se completou uma revolução política...iniciada em1988.Com efeito, imperam no país diferentes formas de discriminação racial, velada, ou ostensiva, que afetam mais da metade da população brasileira, constituída de negros ou descendentes de negros, privados do pleno exercício da cidadania. Como a prática do racismo eqüivale a decretar a morte civil, urge transformá-la em crime. (37)

            Nos dizeres de Flávia Piovesan (38) o texto de 1988, ao simbolizar a ruptura com o regime autoritário, empresta aos direitos e garantias ênfase extraordinária, situando-se como o documento mais avançado, abrangente e pormenorizado sobre direitos humanos, na história constitucional do país.

            Logo no Preâmbulo, propugna por uma sociedade "fraterna, pluralista e sem preconceitos" ( grifei ).

            A atual Constituição Federal Brasileira, além de aludir ao princípio da igualdade no preâmbulo, de forma genérica, reservou a esse crime espaço próprio, colocando-o entre os direitos e deveres individuais e coletivos, dentro do Título dos Direitos e Garantias fundamentais, com a previsão de que o racismo constitui crime inafiançável e imprescritível ( como já o fazia a Cata anterior), sujeito à pena de reclusão, cuja definição é de lei ordinária. Além dessa garantia, ainda determinou que a lei estabelecesse a punição a qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais.

            Princípio básico fundamental da Carta Magna é o da Dignidade da pessoa humana, do qual todos os outros são decorrentes. Nas palavras de Ingo Wolfgang Sarlet temos por dignidade da pessoa humana:

            ...a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. (39)

            "Está aqui o reconhecimento de que, para o direito constitucional brasileiro, a pessoa humana tem uma dignidade própria e constitui um valor em si mesmo, que não pode ser sacrificado a qualquer interesse coletivo" (40)

            O artigo 3º do texto constitucional de 1988, nos seus incisos III e IV, consagra como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, a redução das desigualdades sociais e promoção do bem comum, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade, ou quaisquer outras formas de discriminação. "O Estado reconheceu que não basta declarar que todos são iguais perante a lei; a República assume a responsabilidade de " promover" ( o que implica a adoção de providências objetivas) o bem de todos". (41)

            Não obstante, a Carta Política de 1988, no artigo 4º, dispõe que: "A República federativa do Brasil rege-se nas relações internacionais pelos seguintes princípios:...VII - repúdio ao terrorismo e ao racismo". Portanto, um dos princípios fundamentais que passam a reger as relações internacionais do Brasil é o "repúdio ao terrorismo e ao racismo".

            Igualmente, para proteger a cultura negra, seus ritos religiosos e costumes trazidos da África, a Constituição Federal garante, no seu artigo 5º, inciso VI, a inviolabilidade da "liberdade de consciência e de crença", "o livre exercício de cultos religiosos" e "a proteção aos locais de culto e suas liturgias" Esta disposição representa um avanço em relação aos textos constitucionais anteriores, que reprimiam a cultura negra, considerando-a atentatória à "ordem pública" e aos "bons costumes".

            No que se refere ao resgate dos valores étnicos dos integrantes da raça negra e à sua contribuição para a formação da cultura brasileira, o artigo 68 º da Disposições Constitucionais Transitórias, em referência aos "quilombos" (comunidades negras que se organizaram autonomamente no interior do Brasil, liberando-se de fato da situação da escravidão), dispõe o seguinte: "Aos remanescentes das comunidades dos quilombos que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva, devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos".

            Em decorrência dos princípios fundamentais da Carta Magna, notadamente contra a discriminação racial em 5 de janeiro de 1989 foi promulgada a Lei 7..716, conhecida como " Lei Anti-Racismo" ou " Lei Caó" de condutas discriminatórias.

            Esta lei define considera o preconceito como crime. Apesar do seu nome, essa lei não representou maior avanço no campo da discriminação racial por ser excessivamente evasiva e exigir, para a tipificação de crime de racismo, que o autor declare após praticar o ato discriminatório que a sua conduta foi motivada por razões de discriminação racial. A mencionada lei, mostrou ser de difícil aplicação, já que não cria mecanismos que facilitem a prova de efetiva prática desse crime. Por outro lado, ao tornar necessário provar a intenção discriminatória, conduz a situações de prova em que a palavra do agressor compete com a do agredido e faz evidenciar a ofensa objetiva. E, também não previu as decorrentes de ofensa à honra em razão da raça, muito comum no dia a dia, levando as autoridades policiais a classificarem este tipo de ofensa como calúnia, injúria ou difamação, com penas bem inferiores, além de dependerem de ação privada, facilmente prescritíveis. Isso evidentemente não ocorreriam se fossem classificados como racismo, com reprimenda severa, demandando ação penal pública e sendo constitucionalmente inafiançáveis e imprescritíveis.

            Cabe ainda observar que a Lei № 7.716/89 definiu tão somente os crimes resultantes de preconceito de raça ou cor, não prevendo as práticas resultantes de preconceito de descendência ou origem nacional ou étnica, que à luz da CIEFDR integram também a definição de discriminação racial (42).

            A Lei № 9.459/97, alterou em parte a Lei № 7.716/89 Lei Anti-Racismo, incluindo novos tipos penais, visando combater crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional. A nova lei amplia as formas de discriminação, acrescentando ao lado de cor e raça, os critérios etnia, religião e procedência nacional. É interessante ressaltar que esta lei não só inclui estes critérios alinhando-os à definição de discriminação racial prevista pela CIEFDR, bem como inclui o critério religião, não previsto pela mesma.

            No tocante ao crime de injúria, a nova lei acrescenta um parágrafo ao artigo 140 do Código Penal, prescrevendo pena de reclusão de um a três anos e multa "se a injúria consiste na utilização de elementos referentes a raça, cor, etnia, religião ou origem".

            No entanto, o fato da Constituição e do Código Penal serem tão explícitos em relação a punição das práticas de discriminação racial apenas significa a existência da discriminação e do preconceito racial em nosso país. Porém, entre as intenções punitivas das leis e a sua real implementação, o que se vê de concreto é um grande abismo. As atitudes preconceituosas ou racistas, como agressões verbais contra o cidadão negro são, em geral, interpretadas pelos juízes como sendo apenas casos de ofensa à honra, deixando de ser crimes.

            As outras formas de discriminação, como as que ocorrem no âmbito das relações de trabalho, dificilmente podem ser enquadradas na lei. A pesquisa realizada pelo Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT) informa que, dos 250 boletins de ocorrência registrados na Delegacia Especial de Crimes Raciais de São Paulo, apenas 130 resultaram em inquéritos e destes, pelo menos, 70% foram arquivados a pedido do Ministério Público. O que presenciamos de concreto é que apenas 15% das denúncias de racismo podem levar a alguma punição do criminoso.

            Pode-se dizer, que atualmente a legislação nacional evolui, havendo além desta legislação específica a existência de leis esparsas com relevantes dispositivos normativos que procuram amenizar as disparidades existentes entre os diversos grupos sociais brasileiros. Neste sentido, destacam-se: Lei №. 2.889/56, que define e pune o crime contra o genocídio; Lei №. 5.250/67, que regula a liberdade de pensamento e informação, vedando a difusão de preconceito e raça; Lei №. 6.620/78 que define os crimes contra a segurança nacional, como a incitação ao ódio ou à discriminação racial; Lei №. 6.815, Estatuto do Estrangeiro; Lei №. 8.081/90, que estabelece as penas aplicáveis as atos discriminatórios ou de preconceito de raça, cor, religião, etnia ou procedência nacional, praticados pelos meios de comunicação ou por publicações de quaisquer natureza; Lei №. 8.069/90, dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente, prevendo que nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de discriminação; Lei №. 8.213/91, em proteção aos portadores de Deficiência, que garante vaga em emprego de empresa privada ( além de garantia constitucional de empregos públicos, consoante o art.37, inciso VIII ); Lei №. 6.001/73, proteção das sociedades indígenas pelo Estatuto do Índio; Lei №. 7.210/84, que instituiu a Execução penal, proibindo distinção de natureza racial, social, religiosa ou política na aplicação da lei de execução penal; Lei №. 8.78/90, que dispõe sobre a proteção ao consumidor, proibindo toda publicidade enganosa, discriminatória ou que incite à violência; Lei №. 9.029/95, que proíbe práticas discriminatórias para efeitos admissionais ou de permanência da relação jurídica de trabalho; Lei №. 9.455/97, que, ao definir e punir o crime de tortura, prevê constituir crime de tortura constranger alguém com emprego de violência ou grave ameaça, causando-lhe sofrimento físico ou mental, em razão de discriminação racial ou religiosa, entre outras.

            3.3 O BRASIL E A CONVENÇÃO INTERNACIONAL SOBRE TODAS AS FORMAS DE ELIMINAÇÃO DE DISCRIMINAÇÃO RACIAL

            Primeiramente, cumpre observar que, somente a partir do processo de democratização do país em 1985, o Estado Brasileiro passou a ratificar relevantes tratados internacionais de direitos humanos.

            Importante destacar a relação entre o processo de democratização do Brasil e o processo de incorporação de relevantes instrumentos de proteção dos direitos humanos, uma vez que, se o processo de democratização permitiu a ratificação de importantes tratados de direitos humanos, essa ratificação desencadeou o fortalecimento do processo democrático, através da ampliação e do reforço do universo de direitos fundamentais por ele assegurado.

            Conforme salienta Flávia Piovesan (43) "o marco inicial do processo de incorporação de direitos humanos pelo Direito Brasileiro foi a ratificação, em 1989, da Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes". Foi a partir dessa ratificação que outros instrumentos internacionais voltados à proteção dos direitos humanos foram incorporados pelo Direito Brasileiro, sob a luz da Constituição Federal de 1988, cabendo destacar as seguintes ratificações:

            a)a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura, em 20 de julho de 1989;

            b)a Convenção sobre os Direitos da Criança, em 24 de setembro de 1990;

            c)o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, em 24 de janeiro de 1992;

            d)o Pacto Internacional do Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, em 24 de janeiro de 1992;

            e)a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, em 27 de novembro de 1995.

            A CIEFDR foi adotada pelas Nações Unidas em 21 de dezembro de 1965, tendo sido ratificada pelo Brasil em 27 de março de 1968.

            Como já foi dito anteriormente, os dois aspectos centrais da CIEFDR são combater a discriminação racial e promover a igualdade, portanto, combina uma vertente repressiva com uma vertente promocional, no que diz respeito à implementação do direito à igualdade. Pode-se dizer que, no tocante à matéria, a ênfase do direito brasileiro centra-se na vertente repressiva.

            No que tange ao impacto desta no Direito Brasileiro, observa-se que a CIEFDR introduz relevantes mecanismos internacionais de monitoramento dos direitos que enuncia, o que exige do Estado Brasileiro, por exemplo, a apresentação de relatórios que evidenciem o modo pelo qual o Brasil tem cumprido os dispositivos da mesma.

            Como já foi mencionado, o envio do décimo relatório periódico ao Comitê sobre a Eliminação da Discriminação Racial foi fato marcante, tendo em vista que o Brasil havia deixado de apresentar os relatórios por vários anos consecutivos. O novo relatório foi muito elogiado pelos membros do CERD, pois o mesmo se produziu sob a influência da respeitável revisão da postura brasileira sobre o problema da discriminação racial, mostrando que o fenômeno da discriminação e do racismo devem ser combatidos com determinação. (44)

            Portanto, a consideração desse relatório pelo respectivo comitê, em 1996, assinalou a definitiva incorporação do Brasil ao conjunto de países que mantém com a comunidade internacional um diálogo sereno, franco e objetivo sobre seus problemas de direitos humanos.

            Até pouco tempo o governo brasileiro, apesar de ser signatário da CIEFDR, não reconhecia a competência do Comitê Internacional para a eliminação do racismo, desta forma o Comitê não podia receber e analisar denúncias de violações dos direitos humanos decorrentes de crime de racismo.

            Somente através do Decreto №. 4.738, de 12 de junho de 2003, promulgou-se a Declaração Facultativa prevista no art. 14 da CIEFDR, reconhecendo a competência do Comitê Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial para receber e analisar denúncias de violação dos direitos humanos cobertos na mencionada Convenção.


4 AÇÕES AFIRMATIVAS E O RACISMO

            4.1 IDÉIA GERAL

            Pode-se dizer que, nos países com longo passado de escravidão, a idéia de neutralidade estatal tem-se revelado um verdadeiro fracasso. Portanto, nas palavras de Joaquim B. Barbosa Gomes (45) "é indispensável o reconhecimento de que a reversão de um tal quadro só será viável com a renúncia do Estado à sua histórica neutralidade em questões sociais, devendo assumir, ao contrário, uma posição ativa, até mesmo radical se vista à luz dos princípios norteadores da sociedade liberal clássica".

            Dessa imposição de atuação ativa do Estado nasceram as Ações Afirmativas, concebidas originariamente nos Estados Unidos, mas hoje já adotadas em diversos países europeus, asiáticos e africanos, com as adaptações necessárias a situação de cada país.

            Inicialmente, as Ações Afirmativas eram definidas como um encorajamento por parte do Estado, para que tanto as escolas como as empresas refletissem em sua composição a representação de cada grupo na sociedade ou no respectivo mercado de trabalho.

            Porém, nos anos 70, deu-se início a um processo de alteração conceitual do instituto, o qual passou a ser associado à idéia de realização da igualdade de oportunidades através da imposição de cotas rígidas de acesso de representantes das minorias a determinados setores do mercado de trabalho e a instituições educacionais.

            Atualmente, nos dizeres de Joaquim B. Barbosa Gomes, podemos definir ações afirmativas:

            Como um conjunto de políticas públicas e privadas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário, concebidas com vistas ao combate à discriminação racial, de gênero e de origem nacional, bem como para corrigir os efeitos presentes da discriminação praticada no passado, tendo por objetivo a concretização do acesso de bens a bens fundamentais como a educação e o emprego. (46)

            Portanto, elas têm como objetivo não apenas coibir a discriminação do presente, mas sobretudo eliminar os efeitos da discriminação do passado, os quais tendem a se perpetuar. Esses efeitos podem ser vislumbrados nas profundas desigualdades sociais entre grupos dominantes e grupos marginalizados.

            Em suma, trata-se de políticas e de mecanismos de inclusão concebidas por entidades públicas, privadas e por órgãos dotados de competência jurisdicional, voltados para a concretização de um objetivo universalmente reconhecido, qual seja o da efetiva igualdade de oportunidades a que todos os seres humanos têm direito.

            Flávia Piovesan entende que as ações afirmativas:

            ...constituem medidas especiais de proteção ou incentivo a grupos ou indivíduos, com vistas a promover sua ascensão na sociedade até um nível de equiparação com os demais. As ações afirmativas constituem medidas especiais e temporárias que, buscando remediar um passado discriminatório, objetivam acelerar o processo de igualdade, com o alcance da igualdade substantiva por parte de grupos socialmente vulneráveis, como as minorias étnicas e raciais, dentre outros grupos. (47)

            Portanto, são medidas adotadas para remediar um passado discriminatório, objetivando transformar a igualdade formal em igualdade material ou substantiva.

            Porém, este projeto de ‘medidas compensatórias’ sobre as desvantagens sofridas no passado pelas populações excluídas e correção dessa disparidade é inovador na ordem jurídica brasileira e a expressão ‘ação afirmativa’ é recente e pouco assimilada na doutrina nacional.

            4.2 AÇÕES AFIRMATIVAS E A CONVENÇÃO SOBRE TODAS AS FORMAS DE ELIMINAÇÃO DA DISCRIMINAÇÃO RACIAL

            Respaldada pelas idéias de que "a doutrina da superioridade baseada em diferenças raciais é cientificamente falsa, moralmente condenável, socialmente injusta e perigosa" e de que "a discriminação entre as pessoas por motivo de raça, cor ou origem étnica é um obstáculo às relações amistosas e pacíficas entre as nações e é capaz de perturbar a paz e a segurança entre os povos e a harmonia de pessoas vivendo lado a lado", constantes de seu preâmbulo, a CIEFDR, tem o grande mérito de convalidar as políticas de ação afirmativa enquanto remédios temporários de inclusão social de grupos étnicos e raciais. O art. 1o, ítem 4, é claro nesse sentido, de modo semelhante ao estabelecido pela Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher:

            Não serão consideradas discriminação racial as medidas especiais tomadas com o único objetivo de assegurar o progresso adequado de certos grupos raciais ou étnicos ou de indivíduos que necessitem da proteção que possa ser necessária para proporcionar a tais grupos ou indivíduos igual gozo ou exercício de direitos humanos e liberdades fundamentais, contanto que tais medidas não conduzam, em conseqüência, à manutenção de direitos separados para diferentes grupos raciais e não prossigam após terem sido alcançados os seus objetivos.

            A norma em favor da aplicação de políticas de ação afirmativa é reforçada pelo artigo 2o, item 2, da Convenção, que dispõe:

            Os Estados-partes tomarão, se as circunstâncias o exigirem, nos campos social, econômico, cultural e outros, medidas especiais e concretas para assegurar, como convier, o desenvolvimento ou a proteção de certos grupos raciais ou de indivíduos pertencentes a esses grupos, com o objetivo de garantir-lhes, em condições de igualdade, o pleno exercício dos direitos humanos e das liberdades fundamentais. Essas medidas não deverão, em caso algum, ter a finalidade de manter direitos desiguais ou distintos para os diversos grupos raciais, depois de alcançados os objetivos, em razão dos quais foram tomadas.

            Portanto, o próprio texto da CIEFDR, prevê a possibilidade de "discriminação positiva". O artigo 1o, sugere medidas especiais que podem ser elaboradas e implementadas pelos Estados, a fim de proteger os direitos e as liberdades fundamentais de grupos que sofrem discriminação e que, portanto, se encontram numa situação de desigualdade. São medidas especiais que não podem ser vistas e consideradas como medidas discriminatórias, desde que, em primeiro lugar, têm o objetivo e o efeito de promover, efetivamente, os direitos daqueles grupos que sofrem discriminação. Em segundo lugar, são medidas temporárias que vão existir, durante um certo tempo, enquanto a igualdade não for atingida. A partir do momento em que essa igualdade for atingida, as medidas especiais devem ser abolidas, até porque a sua continuidade acabaria resultando na produção de uma nova desigualdade, agora em favor daquele grupo beneficiário.

            Vale ressaltar, a Convenção 111 da OIT e a Convenção Relativa à Luta Contra a Discriminação no Campo do Ensino, ambas ratificadas pelo Brasil em 1968: "Nos termos desses tratados, o País assume o compromisso de formular e aplicar uma política nacional que tenha por fim promover, por métodos adequados às circunstâncias e aos usos locais, a igualdade de oportunidades de tratamento, respectivamente, em matéria de emprego e de ensino".

            4.3 FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS DA AÇÃO AFIRMATIVA

            Antes de abordar o tema da constitucionalidade das ações afirmativas, é necessário fazer menção que na história do ‘Estado de Direito‘, duas noções de princípio da igualdade têm sido recorrentes nos textos constitucionais. De um lado, na acepção de igualdade formal, fala-se na necessidade de vedar ao Estado toda sorte de tratamento discriminatório negativo, ou seja, de proibir todos os atos administrativos, judiciais ou expedientes normativos do Poder Público que visem à privação do gozo das liberdades públicas fundamentais do indivíduo com base em critérios suspeitos tais como a raça, a religião ou a classe social. De outro, sustenta-se que, além de não discriminar arbitrariamente, deve o Estado promover a igualdade material de oportunidades por meio de políticas públicas e leis que atentem para as especificidades dos grupos menos favorecidos, compensando, desse modo, as eventuais desigualdades de fato decorrentes do processo histórico e da sedimentação cultural. (48)

            A igualdade formal se reduz à frase de que "todos são iguais perante a lei", o que significou um decisivo avanço histórico decorrente das modernas Declarações de Direitos do final do século XVIII, as quais consagravam a ótica contratualista liberal, pela qual os direitos humanos se restringiam à liberdade, segurança e propriedade, complementados pela resistência e opressão. Portanto, eram nestas circunstâncias que se introduzia a concepção formal de igualdade, como um dos elementos a demarcar o Estado de Direito Liberal.

            Porém, esta concepção de igualdade puramente formal, começou a ser questionada, quando se verificou que a igualdade de direitos não era, por si só, suficiente para tornar acessíveis a quem era socialmente desfavorecido as oportunidades de que gozavam os indivíduos socialmente privilegiados, ou seja, não se pensava no valor da igualdade sob a perspectiva material e substantiva (49).

            Torna-se assim necessário repensar o valor da igualdade, a fim de que as especificidades e as diferenças sejam observadas e respeitadas. Somente mediante essa nova perspectiva é possível transitar-se da igualdade formal para a igualdade material ou substantiva. Vale dizer, ao lado do direito à igualdade, nasce o direito à diferença, o que propicia o chamado processo de especificação do sujeito de direito (50).

            Dessa nova visão resultou o surgimento em diversos ordenamentos jurídicos nacionais e na esfera do Direito Internacional dos Direitos Humanos de políticas sociais de apoio e de promoção de determinados grupos socialmente fragilizados. A essas políticas sociais, que nada mais são do que tentativas de concretização da igualdade material ou substancial, dá-se o nome de ação afirmativa.

            As ações afirmativas se definem como políticas públicas e privadas voltadas à concretização do princípio constitucional da igualdade material e à neutralização dos efeitos da discriminação racial, de gênero, de idade e de origem nacional.

            Sendo assim, não se pode perder de vista o fato de que na história universal não há nenhum exemplo de nação que tenha se erguido de uma condição periférica à de potência econômica e política, digna de respeito no cenário político internacional, mantendo no plano doméstico uma política de exclusão em relação a parcela expressiva de seu povo.

            É preciso uma ampla conscientização sobre o fato de que a marginalização sócio-econômica a que são relegadas as minorias, principalmente as raciais, resulta de um único fenômeno: a discriminação.

            Cabe ao Estado, a opção entre duas posturas distintas: manter-se na posição de neutralidade e permitir a total sujeição dos grupos inferiorizados e desprovidos de força política ou, ao contrário, atuar ativamente no sentido de acabar com as desigualdades sociais, as quais têm como público alvo precisamente as minorias raciais, étnicas, sexuais e nacionais.

            Portanto, essa nova concepção, ainda tão recente, apresenta duas metas básicas, que visam à implementação do direito à igualdade. São elas: o combate à discriminação e a promoção da igualdade, as quais não podem ser dissociadas (51).

            A Constituição brasileira é pródiga em dispositivos que não só possibilitam a adoção de ações afirmativas por parte do Estado e de particulares, mas de fato criam verdadeiro mandamento de sua implementação sob pena de inconstitucionalidade por omissão. A adoção do princípio da igualdade material, a par do prestígio da igualdade formal consolidada na fórmula do artigo 5 o, inciso I, não poderia ser mais explícita.

            Ao proclamar a Carta da República em vigor, os constituintes declaram ter sido reunidos para instituir um Estado Democrático de Direito, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, e a promover a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos. A mensagem é clara no sentido do próprio reconhecimento da existência das desigualdades e do dever de combatê-las.

            Vale ressaltar também, que, o artigo 3 o, que define os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, é enfático ao consignar tanto a redução das desigualdades sociais (inciso III) e regionais como a erradicação da pobreza e marginalização, de um lado, e a promoção do bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, de outro (inciso IV).

            Também o artigo 170 o da Constituição reforça, uma vez mais, o objetivo de erradicação da desigualdade já manifestado nos objetivos da República no seu inciso VII.

            Com base nesses fundamentos, a professora Carmem Lúcia Antunes Rocha mostra que, não obstante tenha o princípio da igualdade sido uma constante e todos os textos constitucionais brasileiros, é notável que, na Constituição de 1988, atingiu a sua máxima dimensão, criando-se, na sua feliz expressão, uma nova isonomia, mais rigorosa e diretamente relacionada à igualdade no sentido material que descreve. Em suas palavras:

            Verifica-se que todos os verbos utilizados na expressão normativa – construir, erradicar, reduzir, promover – são de ação, vale dizer, designam um comportamento ativo. O que se tem, pois, é que os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil são definidos em termos de obrigações transformadoras do quadro social e político retratado pelo constituinte quando da elaboração do texto constitucional. (52)

            E mais, deve-se ressaltar a familiaridade da ordem constitucional vigente com o instituto da ação afirmativa voltada a beneficiar os segmentos populacionais historicamente discriminados. Prova exemplar disso é a proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, conforme o disposto no inciso XX, do artigo 7o.

            Na verdade, nem mesmo a fixação de cotas - faceta mais ousada da ação afirmativa - é estranha ao ordenamento jurídico-constitucional brasileiro. Basta lembrar, que o inciso VII, do artigo 37 o, da Carta Política de 1988 determina a reserva legal de percentual de cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência, o que se concretizou com a publicação, em 1990, da Lei №.º 8.112.

            Portanto, não há o que se dizer que a referida política seria insconstitucional, ao contrário, realizaria com extrema profundidade a intenção constitucional, visto que a Cata Magna, em seu Preâmbulo, impõe ao Estado Brasileiro que assegure a concretização do bem-estar, da igualdade e da justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos e fundamentada na cidadania e na dignidade humana. " Se o Preâmbulo é o espírito da Constituição-cidadã, claro está que ela determina ao Estado que não meça esforços na busca dos instrumentos necessários, reais e possíveis para alcançarem-se aqueles resultados de forma verdadeira e pragmática e não somente formal" (53)

            Pode-se concluir que o Direito Constitucional brasileiro abriga não somente o princípio e as modalidades implícitas e explícitas de ação afirmativa, mas também as que emanam dos tratados internacionais de direitos humanos assinados pelo nosso país.

            4.4 AÇÕES AFIRMATIVAS E A DOUTRINA NACIONAL

            Como já foi mencionado, a expressão "Ação Afirmativa" é recente e ainda pouco assimilada pela doutrina nacional. Porém, em 1997, o Grupo de Trabalho Interministerial para a Valorização da População Negra ( GTI ) elaborou um conceito brasileiro próprio para o termo ‘ação afirmativa’, servindo para a implementação de políticas públicas para negros no país:

            As ações afirmativas são medidas especiais e temporárias, tomadas ou determinadas pelo Estado, espontânea ou compulsoriamente, com o objetivo de eliminar desigualdades historicamente acumuladas, garantindo a igualdade de oportunidades e tratamento, bem como de compensar perdas provocadas pela discriminação e marginalização, decorrentes de motivos raciais, étnicos, religiosos, de gênero e outros. Portanto, as ações afirmativas visam combater os efeitos acumulados em virtude das discriminações ocorridas no passado (GTI, 1997).

            Deste conceito, é notório que a correção das desigualdades raciais provocadas por discriminações históricas depende de uma intervenção estatal, e mais, a cor dos indivíduos, é um dos critérios fundamentais para que esses grupos possam ou não ser beneficiados por algum tipo de ação afirmativa.

            Quando houve a elaboração do conceito de ações afirmativas pelo GTI, em 1997, provavelmente não se pensava no emprego ou educação como uma provável área de implantação das ações compensatórias ou projetos de mobilidade social como áreas prioritárias.

            Por mais que haja empenho do governo nessa política, principalmente no que diz respeito a questão racial, pode-se falar em um problema cultural, tendo em vista que a sociedade brasileira não aceita existir uma obrigação moral em relação aos grupos sociais inferiores que sofreram com a discriminação histórica ocorrida no passado e a vivenciada no presente. A idéia de que o Brasil é "um caldeirão de raças e culturas em harmonia impediu que negros e índios denunciassem o racismo e requisitassem melhores condições" (54). O resultado da crença de que não há racismo foi, um dos piores tipos de racismo que se conhece, pois a forma mais eficiente de reforçar o preconceito é achar que ele não existe.

            Vale ressaltar, que o mito da democracia racial no país é muito forte a ponto do indivíduo mostrar-se intolerante com a questão da cor. Prova disso, é que somente 10% dos brasileiros admitem ser, eles mesmos, racistas.

            Em relação a essa questão, Wagner Camilo lembra que:

            Enquanto na nossa sociedade, ainda se esconde a existência do racismo sutil arraigado no dia-a-dia e se difunde uma falsa idéia de democracia racial; por outro lado, muito mais corajosa e honrada fora a sociedade norte-americana, que na metade do século XX admitira ao mundo que era racista, mas que desejava mudar e lutar bravamente contra tamanha infâmia à dignidade humana. Hoje, apesar de o racismo naquele país ainda encontrar-se arraigado e muito difundido, percebem-se enormes avanços e modificações para o alcance da verdadeira isonomia de raças em uma sociedade, e os negros norte-americanos possuem muito mais condições hoje, de ascenderem socialmente e de viverem dignamente do que há cinqüenta anos atrás, alcançando postos(e inúmeros, não um ou outro, como mera figuração ou simbologia de uma falsa democracia) na política, no serviço público, nas artes, nos esportes, enfim, em todos os ramos da sociedade ianque (55).

            As principais propostas para vencer o preconceito estão agrupadas na categoria das chamadas ‘ações afirmativas’, as quais reconhecem que existem grupos com menos oportunidades e, para que tenham as mesmas chances, oferecem a eles alguns privilégios até que o problema se resolva.

            Porém, é importante esclarecer que as ações afirmativas não se reduzem à concessão de cotas, são apenas uma das estratégias de aplicação dessas ações.

            4.5 COTAS PARA NEGROS

            As cotas, como são denominadas certas políticas públicas mais radicais objetivando a concretização da igualdade material, nasceram no bojo ações afirmativas, mas com essas não se confundem.

            Já existem no Brasil algumas leis afirmativas em relação a mulheres e deficientes, mas as políticas em relação a negros só agora dão os primeiros passos.

            Contudo, um dos grandes avanços na adoção de políticas públicas em busca da igualdade, é o Projeto de Lei №. 650, relativo às cotas para negros nas universidades, uma espécie de reserva de mercado, um sistema pelo qual o governo pretende estabelecer percentual obrigatório de negros em todas as instituições de ensino superior.

            O autor do projeto de lei justifica a sua proposição recordando que o desfavorecimento da população negra constitui um dos componentes mais claros do quadro de injustiça social do País. Em reforço à tese, cita o Relatório do Desenvolvimento Humano no Brasil, de 1996, elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento ( PNDU ) em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ( IPEA ). O documento informa que os negros recebem salários muito menores que os brancos e apresentam índices mais altos de analfabetismo, atraso escolar e reprovação. Logo, embora o Brasil tenha a segunda maior população negra do mundo, esta detém uma parcela mínima de poder.

            Sob o ponto de vista jurídico-constitucional, inexiste vício na adoção de qualquer tipo de ação afirmativa ( inclusive cota ) que se destine a promover a igualdade efetiva entre as raças. Ressalte-se que a medida prevista no artigo 1 do Projeto de Lei №. 650, de 1999, está isenta de punição legal, nos termos do artigo 5 da Constituição Federal, pois não constitui discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais. Em vez de ferir o princípio isonômico que impede favoritismos ou perseguições, ela empresta concretude à Lei Maior, no sentido em que visa promover a redução das desigualdades sociais e, consequentemente, o bem de todos.

            Os defensores afirmam que elas funcionam: nos Estados Unidos, por exemplo, a classe média negra, que era quase inexistente, aumentou consideravelmente por meio dessas políticas. Os críticos, por sua vez, falam que a solução é melhorar o ensino médio e fundamental gratuito e, de quebra, auxiliar a população de baixa renda. Porém essa estratégia pode ser muito demorada, "estudos demonstram que se por um milagre as escolas públicas básicas se tornassem hoje tão boas quanto as particulares, seriam precisos mais de 30 anos para resolver as desigualdades entre pretos e brancos". (56)

            "Além disso, o ensino básico já foi bem melhor e não ajudou a população negra". (57)

            No entanto, há mitos sobre a questão das cotas:

            O primeiro mito é supor-se que um programa de cotas elimina o processo competitivo. É falsa essa visão. O processo continua a ser competitivo entre os indivíduos que compõem o grupo discriminado. Ë como se tivéssemos duas portas de entrada para a universidade, um do grupo discriminado e a que sempre existiu. O vestibular é o mesmo, o processo é competitivo. Cada indivíduo vai estar competindo com os indivíduos do grupo que faz parte. (58)

            A partir dessa análise há um problema jurídico a ser superado, no que se refere à constitucionalidade dessas políticas adotadas pelo governo, como empenho no desenvolvimento de projetos institucionais e sérios, para que elas não se resumam somente em palavras ou slogans e que a própria discriminação não possa ser encarada apenas como um problema individual, mas institucional, que reclama medidas enérgicas, sob pena de não vingar e nesse sentido, há muito que se conquistar em termos de equalização de direitos.

            No tocante a esse tema, o professor Joaquim B. Barbosa, é categórico:

            Como se vê, em lugar da concepção estática da igualdade extraída das revoluções francesa e americana, cuida-se nos dias atuais de se consolidar a noção de igualdade material ou substancial, que longe de se apegar ao formalismo e à abstração da concepção igualitária do pensamento liberal oitocentista, recomenda, inversamente, uma noção dinâmica de igualdade, na qual necessariamente são devidamente pesadas e avaliadas as desigualdades concretas existentes na sociedade, de sorte que as situações desiguais sejam tratadas de maneira dessemelhante, evitando-se, assim, o aprofundamento e a perpetuação de desigualdades engendradas pela própria sociedade. (59)

            Neste contexto da busca da igualdade para os grupos mais desfavorecidos, especialmente sob o ponto de vista do sujeito de direito individualizado, a lição da professora Flávia Piovesan é no sentido de:

            ...buscar a implementação da igualdade do ente abstrato, genérico, destituído de cor, sexo, idade, classe social, dentre de outros critérios, emerge o sujeito de direito concreto, historicamente situado, com especificidades e particularidades. Daí apontar-se não mais ao indivíduo genérica e abstratamente considerado, mas ao indivíduo especificado, considerando-se categorizações relativas ao gênero, idade, etnia raça, etc. (60)

            Neste aspecto, a legislação parece ser o objetivo mínimo (mas não o único) e o principal instrumento de combate ao racismo, mas ainda há necessidade de mobilização social. O Brasil ao ratificar a CIEFDR, foi incentivado, e em alguns casos, obrigado a fazer com que se diminuam os níveis exacerbados de desigualdades e a tomar medidas e políticas compensatórias para atingir esse resultado e por isso, a legislação talvez seja o meio mais eficaz de sustar os efeitos dessa discriminação.

            Relativamente às políticas de ações afirmativas implantadas nos EUA, foram resultados diretos e longos de lutas dos movimentos norte-americanos, sendo considerada exemplar pelos defensores das cotas de afro-descendentes nas universidades, visto que depois da adoção dessa política, na década de 60, os negros americanos dobraram a escolaridade e ascenderam socialmente. O avanço chegou a tal ponto que, algumas associações negras já defendem o fim das cotas porque já se sentem preparadas para enfrentar a concorrência com os brancos em igualdade de condições.

            Porém, aqui no Brasil, não se pode afirmar com precisão se a adoção da mesma política terá condições de produzir o mesmo efeito, até porque uma parte da população negra é contra essa política por entender que ela beneficia apenas um grupo de negros: a classe média e não a população negra como um todo (61).

            No entanto, nota-se que os principais beneficiários dos direitos oriundos de eventual política de mobilização social seriam os negros, deixando de fora outros grupos sociais e minorias, excluídos dessa política libertária, como índios, imigrantes, homossexuais, etc. Talvez porque os negros, no Brasil, sempre estiveram em situação de desvantagem em relação aos brancos e sempre foram a maioria entre os pobres, sendo o racismo determinante para essa condição, havendo, como conseqüência, uma relação íntima entre a pobreza e a questão da cor, assim como em muitos outros países onde existem populações pobres e negras.

            Em relação aos resultados concretos das ações afirmativas nos EUA, afirma a ativista norte-americana no combate à discriminação racial, Gay Macdougall:

            É importante olhar para o contexto histórico: 350 anos de escravidão e depois mais 50 de política de estado e discriminação e segregação racial. Mas nesta curta experiência que temos tido com a ação afirmativa - apenas desde 1968, basicamente – os americanos têm testemunhado que essas ações levam a resultados positivos, como a que ocorreu dentro das Forças Armadas americanas após a II Guerra Mundial, inteiramente segregada racialmente, ou seja, apartados os contingentes de soldados brancos e negros e que numa decisão do então Presidente dos Estados Unidos de cumprir um programa de ação afirmativa nessa área para acabar coma segregação. Isso comprova que, se aplicada com convicção e seriedade, a ação afirmativa tem sucesso. (62)

            Cabe dizer que a defesa das minorias discriminadas, remetem aos grandes paradigmas enfrentados pelas sociedades humanas contemporânea, sendo que a compreensão e aceitação das diferenças implica numa revolução individual e coletiva, na busca da construção de novos valores sociais e de equidade efetiva entre as populações humanas.

            Neste sentido, é essa a opinião de Emerson Gazda:

            É preciso portanto, ter sempre em conta na apreciação das questões inerentes à busca da efetiva igualdade entre as pessoas, que as medidas adotadas para tal fim têm sempre o sentido de corrigir distorção anterior causada pela própria forma de organização da sociedade. Não há, no caso, alguém que seja superior a outrem, mas uma pessoa que recebeu melhor tratamento que outra em momento anterior, o que justifica a adoção de medidas corretivas, inclusive com imposições de agir à iniciativa privada, em nome do princípio da função social da propriedade ( e aqui falo tanto da função social da propriedade material, quanto da imaterial...) (63)

            Portanto, quando se busca uma verdadeira equalização de direitos, surge a necessidade de análise de um primeiro elemento, que é a adoção de atitudes firmes na implementação de políticas realmente efetivas no combate à discriminação, no sentido de buscar não só na legislação a garantia da universalidade do direito à diferença, como também, na mobilização institucional de grupos e organizações no combate à discriminação.

            O segundo elemento é a necessidade de um estudo de maior enfoque sobre os efeitos gerados por essas políticas públicas que podem vir a causar sobre esses grupos politicamente inferiorizados.

            Deve-se tomar muito cuidado para não conduzir a criação desses programas sociais em defesa da apartação das minorias a um instrumento de discriminação contrária. Portanto, a finalidade desse sistema de proteção que privilegia um determinado grupo não pode voltar-se contra o seu enfoque principal, que é o de eliminar as injustiças praticadas contra esses grupos sociais.

            Uma vez adotadas as políticas públicas necessárias à eliminação desse tratamento diferenciado, será preciso precaução para não surgir outro instrumento de discriminação ‘às avessas’, que sendo criado para determinado fim e passados os efeitos desejados, acabe por construir um objetivo oposto ao afastamento das diferenças existentes entre os seres humanos.

            Deve-se ressaltar ainda, que falta ao Direito Brasileiro um maior esclarecimento das modalidades e das técnicas que podem ser utilizadas na implementação das ações afirmativas. Fala-se exclusivamente dos sistema de cotas, mas uma outra variante de ação afirmativa, semelhante a proposta de cotas, é o modelo utilizado no Canadá e em muitos lugares dos Estados Unidos: a proposta de metas. Ao contrário das cotas, que estabelece previamente o percentual dos indivíduos que vai se beneficiar com aquela política, estabelece-se a meta para determinado prazo. "Se hoje, por exemplo, há 2% de negros na universidade brasileira, poderíamos estabelecer uma meta de num prazo ’x’, cinco ou dez anos, chegar a 40%. Para fazer esse processo de mudança são criados programas". (64)

            Existem também, outras técnicas de implementação das ações afirmativas que podem ser utilizadas, tais como: o método do estabelecimento de preferências, o sistema de bônus e os incentivos fiscais ( como instrumento de motivação do setor privado ).

            É, portanto, amplo e diversificado o respaldo jurídico às medidas afirmativas que o Estado Brasileiro resolva empreender no sentido de resolver esse que talvez seja o mais grave de todos os problemas sociais - a marginalização do negro na sociedade brasileira. No plano jurídico, não há dúvidas quanto à sua viabilidade, como se tentou demonstrar. Resta, tão somente, escolher os critérios, as modalidades e as técnicas adaptáveis à nossa realidade, cercando-as das devidas cautelas.


5 CONCLUSÃO

            Os direitos humanos têm um lugar cada vez mais considerável na consciência política e jurídica contemporânea e os juristas só podem se regozijar com seu progresso. Implicam eles com efeito um estado de direito e o respeito das liberdades fundamentais sobre as quais repousa toda democracia verdadeira, e pressupõem a um tempo um âmbito jurídico pré-estabelecido e mecanismos de garantia que assegurem sua efetiva implementação. Os direitos humanos tendem a tornar-se, por todo o mundo, a base da sociedade.

            Impende, portanto, reconhecer que tanto os direitos fundamentais explícitos como os implícitos se incluem na estrutura da constituição brasileira e têm natureza dogmática.

            Consequentemente, embora as normas enunciadoras de direitos humanos nos tratados internacionais se incorporem, formalmente, por via de decreto legislativo no Direito Positivo nacional o fato é que tais normas têm natureza jurídica de normas materialmente constitucionais e integram, implicitamente, a estrutura da Constituição, tendo valor dogmático - vale dizer - são direitos com "status" de cláusulas pétreas.

            Nos dias de hoje, portanto, os direitos que asseguram a igualdade racial não são mais apenas belas fórmulas retóricas jusnaturalistas destituídas de eficácia, mas direitos constitucionalizados e dotados de juridicidade e efetiva aplicabilidade imediata. Não são, pois, pautas normativas divorciadas da realidade, mas enunciações de decisões políticas com pretensão de impositividade.

            Muito embora a efetividade e a eficácia dessas normas seja ainda incipiente e seja trágica a realidade dos países em desenvolvimento como o nosso, em matéria de Direitos de Igualdade Racial, é de se reconhecer, contudo, que a redemocratização vem alimentando a consciência de cidadania e do direito a ter direitos.


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NOTAS

            1 LINDGREN ALVES, José Augusto. A Arquitetura Internacional dos Direitos Humanos. São Paulo: FTD, 1997, p. 84.

            2 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Max Limonad, 2002, p. 188.

            3 DALLARI, Dalmo de Abreu. Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo: Moderna, 1998, p.7.

            4 COMPARATO, Fábio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. 2.ed., São Paulo: Saraiva, 2001, p.227.

            5 Texto aprovado em 1966 e entrada em vigor no dia 3 de janeiro de 1976.

            6 Texto aprovado em 1966 e entrada em vigor no dia 3 de janeiro de 1976.

            7CANÇADO Trindade, Antonio Augusto. A proteção Internacional dos Direitos Humanos. São Paulo: Saraiva, 1991, p.25.

            8 PIOVESAN, Flávia. Op. cit., p.190-191.

            9 Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as Formas de Discriminação Racial.

            10Sobre o assunto ver: LINDGREN ALVES, José Augusto. Op. cit., p. 87.

            11 A respeito ver: LINDGREN ALVES, José Augusto. Op. cit., p.87-89.

            12 Mais detalhes sobre este assunto ver: PIOVESAN, Flávia. Ob. cit., p.191.

            13 LINDGREN ALVES, José Augusto. Op. cit., p. 90.

            14 LINDGREN ALVES, José Augusto. Op. cit., p. 93.

            15 Mais detalhes acerca deste assunto ver: LINDGREN ALVES, José Augusto. Op. cit., p. 92.

            16 LINDGREN ALVES, José Augusto. Op. cit., p. 92.

            17 CANÇADO TRINDADE, Antonio Augusto. Op. cit., p. 29.

            18 Mais detalhes sobre este assunto ver: PIOVESAN, Flávia. Op. cit., p.194.

            19 CANÇADO TRINDADE, Antonio. Op. cit., p. 98.

            20 LINDGREN ALVES, José Augusto. Op. cit., p. 95.

            21 Mais sobre o assunto ver: CANÇADO TRINDADE, Antonio Augusto. Op. cit., p. 26-27.

            22 Mais sobre o assunto ver: LINDGREN ALVES, José Augusto. Os Direitos Humanos como tema Global. São Paulo: Fundação Alexandre de Gusmão, 1994.

            23 Sobre o assunto: Disponível em: >. Acesso em: 20 abr. 2003.

            24 LINDGREN ALVES, José Augusto. Os Direitos Humanos como Tema Global. São Paulo: Fundação Alexandre de Gusmão, 1994, p. 65.

            25 LINDGREN ALVES, José Augusto. Os Direitos Humanos como Tema Global. São Paulo: Fundação Alexandre de Gusmão, 1994, p. 66.

            26LIMA JUNIOR, Jayme Benvenuto. A Emergência dos Direitos Economicos, Sociais e Culturais. Disponível em: <http://www.social.org.br/Relatorios/artigos%202000/direitos%20economicos.htm>. Acesso em: 12 junh. 2003.

            27 Sobre o assunto: O Racismo na Sociedade Brasileira - Um processo histórico. Disponível em: < www.racismo.hpg.ig.com.br>. Acesso em: 20 mai. 2003.

            28 DA SILVA, Jorge. Direitos Civis e Relações Raciais no Brasil. Rio de Janeiro: Luam, 1994, p. 20.

            29 FARIA, Sheila de Castro. A Colônia brasileira: Economia e diversidade. São Paulo: Moderna, 1997, p.58.

            30 KENSKI, Rafael. Vencendo na raça. Revista Super Interessante. Edição 187, abril 2003, p.44.

            31 MUNANGA, Kabengele. As idiossincracias raciais brasileiras na formulação das políticas públicas em vista da eliminação do apartheid formal na África do Sul em Estratégias e políticas de Combate à Discriminação racial. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1996, p. 35.

            32Sobre o assunto ver: Comissão Pastoral da Terra e o trabalho escravo no Brasil. Disponível em: . Acesso em: 22 mai.2003

            33Sobre o assunto: Cotia entre a história e duas figuras ímpares. Disponível em: . Acesso em: 23 mai.2003.

            34 Sobre o assunto: A proteção dos direitos humanos no sistema constitucional brasileiro. Disponível em: . Acesso em: 23 mai. 2003. AQUI O NOME DA AUTORA É FLAVIA PIOVESAN, PORTANTO DA PARA COLOCAR NAS REFERENCIAS E ARRUMAR AQUI

            35 DA SILVA, Jorge. Direitos Civis e Relações Raciais no Brasil. Rio de janeiro: Luam, 1994, p.126.

            36 DA SILVA, Jorge. Direitos Civis e Relações Raciais no Brasil. Rio de janeiro: Luam, 1994, p.126.

            37OLIVEIRA, Carlos Alberto de. Disponível em: <http://www.portalafro.com.br/oab/entrevistas.htm >. Acesso em 20 mar. 2003.

            38 PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 34.

            39 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição de 1988. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2001, p. 60.

            40 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Comentários à Constituição Brasileira de 1988. Volume I. São Paulo: Saraiva, 2000, p.19.

            41 DA SILVA, Jorge. Op. cit., p. 132.

            42 Nos termos do artigo 1º da CIEFDR, a expressão discriminação racial significa qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferência, baseadas em raça, cor descendência ou origem nacional ou ética que têm por objetivo ou efeito anular ou restringir o reconhecimento, gozo ou exercício em um mesmo plano ( em igualdade de condição) de direitos humanos e liberdades fundamentais no domínio político, econômico, social, cultural ou em qualquer outro domínio de vida pública.

            43 PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. São Paulo: Max Limonad, 1998, p.32.

            44Mais sobre o assunto ver: SABOIA, Gilberto Vergne: O Brasil e o Sistema Internacional dos Direitos Humanos. Disponível em:. Acesso em: 26 jun. 2003.

            45 GOMES, Joaquim Barbosa. Ação Afirmativa & Princípio Constitucional da Igualdade. Rio de Janeiro e São Paulo: 2001, p. 37.

            46 GOMES, Joaquim Barbosa. Op. cit., p. 20.

            47 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Max Limonad, 2002, p.190.

            48 Sobre o assunto: CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. Coimbra: Almedina, 1999, p. 399-405.

            49 Mais sobre o assunto ver: GOMES, Joaquim B. Barbosa. O Debate Constitucional Sobre as Ações Afirmativas. Revista de Direitos Difusos. São Paulo, Ano II, Vol. 9, Outubro 2001.

            50 PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 129.

            51 PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. São Paulo: Max Limonad, 1998, p. 131.

            52 ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Ação Afirmativa – O Conteúdo Democrático do Princípio da Igualdade Jurídica. Revista Trimestral de Direito Público. N.º 15, 1996, p. 92.

            53 CAMILO, Wagner. O Racismo e a política de cotas nas universidades. Disponível em: <http://www.pgi.mt.gov.br>. Acesso em: 15 jul. 2003.

            54 KENSKI, Rafael. Vencendo a raça. Revista Super Interessante. Edição 187, abril 2003, p. 49.

            55 CAMILO, Wagner. Op. cit. Acesso em: 15 jul. 2003.

            56 KENSKI, Rafael. Op. cit., p. 50.

            57 in KENSKI, Rafael. Op. cit., p. 50.

            58 ROLAND, Edna. Garantias e Violações dos Direitos Humanos no Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Assembléia Legislativa do RS, 2002, p.169.

            59 GOMES, Joaquim B. Barbosa. O debate constitucional sobre as ações afirmativas. Revista de Direitos Difusos. São Paulo, Ano II, Vol. 9, outubro 2001.

            60 PIOVESAN, Flávia. Temas de Direitos Humanos. São Paulo: Max Limonad, 1998, p.130.

            61 Pesquisa promovida pela Folha de São Paulo, 1995, p.78: "A hipótese de discriminação positiva brasileira foi colocada nos seguintes termos pela pesquisa: Diante da discriminação passada e presente contra os negros, tem pessoas que defendem a idéia de que a única maneira de garantir a igualdade racial é reservar uma parte das vagas nas universidades e dos empregos nas empresas para a população negra. Você discorda ou concorda? As proporções dos que concordaram totalmente e dos que discordaram totalmente foram, respectivamente: entre os negros: 40% x 35%; entre os pardos, 35% x 39%; entre os brancos, 32%x 42%; entre os outros, 36%x 35%."

            62 Mais sobre o assunto ver: MACDOUGALL, Gay. A luta antiracista em escala global. Disponível em: <www.afirma.inf.www.afirma.inf.br/arquivo.htm>. Acesso em 19/ jul. 2003.

            63GAZDA, Emerson. Reflexões sobre o princípio da igualdade e ações afirmativas. Direito e Justiça. Caderno do jornal O Estado do Paraná, 07 de abril de 2002.

            64 ROLAND, Edna. Op. cit, p.169.



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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOUZA NETTO, Flávia Emanuelle de. A convenção internacional sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial e o ordenamento jurídico brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 634, 3 abr. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/6488. Acesso em: 19 abr. 2024.