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A necessidade de revogação do estatuto do desarmamento

A necessidade de revogação do estatuto do desarmamento

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O texto trata de alguns motivos pelos quais o Estatuto do Desarmamento deve ser revogado, tendo em vista que a sua implementação somente aumentou a criminalidade, trazendo sensação de insegurança e impotência ao cidadão comum, frente à criminalidade.

Uma das maiores discussões que existe hoje no Brasil - e bastante polêmica -, refere-se ao armamento ou não da população civil. Argumentos não faltam para ambas as correntes e muitas vezes a paixão aflora durante o debate. Atualmente, está em vigor a Lei n° 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento), que concedeu a algumas categorias o direito de ter armas, mas, regra geral, proibiu o cidadão comum de possuí-la, salvo se atender alguns critérios, dentre eles um de natureza subjetiva: a comprovação de necessidade. Assim prescreve a legislação:

Art. 6o É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria e para:

I – os integrantes das Forças Armadas;

II – os integrantes de órgãos referidos nos incisos I, II, III, IV e V do caput do art. 144 da Constituição Federal e os da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP) (Redação dada pela Lei n° 13.500, de 2017)

III – os integrantes das guardas municipais das capitais dos Estados e dos Municípios com mais de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, nas condições estabelecidas no regulamento desta Lei;

IV - os integrantes das guardas municipais dos Municípios com mais de 50.000 (cinqüenta mil) e menos de 500.000 (quinhentos mil) habitantes, quando em serviço; (Redação dada pela Lei nº 10.867, de 2004)

V – os agentes operacionais da Agência Brasileira de Inteligência e os agentes do Departamento de Segurança do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República;

VI – os integrantes dos órgãos policiais referidos no art. 51, IV, e no art. 52, XIII, da Constituição Federal;

VII – os integrantes do quadro efetivo dos agentes e guardas prisionais, os integrantes das escoltas de presos e as guardas portuárias;

VIII – as empresas de segurança privada e de transporte de valores constituídas, nos termos desta Lei;

IX – para os integrantes das entidades de desporto legalmente constituídas, cujas atividades esportivas demandem o uso de armas de fogo, na forma do regulamento desta Lei, observando-se, no que couber, a legislação ambiental.

X - integrantes das Carreiras de Auditoria da Receita Federal do Brasil e de Auditoria-Fiscal do Trabalho, cargos de Auditor-Fiscal e Analista Tributário. (Redação dada pela Lei nº 11.501, de 2007)

XI - os tribunais do Poder Judiciário descritos no art. 92 da Constituição Federal e os Ministérios Públicos da União e dos Estados, para uso exclusivo de servidores de seus quadros pessoais que efetivamente estejam no exercício de funções de segurança, na forma de regulamento a ser emitido pelo Conselho Nacional de Justiça - CNJ e pelo Conselho Nacional do Ministério Público - CNMP.  (Incluído pela Lei nº 12.694, de 2012)

Para o cidadão comum obter uma arma de fogo legalmente, ele deve atender aos seguintes critérios:

Art. 4o Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá, além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes requisitos:

I - comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos; (Redação dada pela Lei nº 11.706, de 2008)

II – apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa;

III – comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento desta Lei.

O problema maior reside no fato de se exigir a comprovação de necessidade, isto porque essa expressão é vaga e imprecisa, cabendo subjetivismos por parte do Delegado de Polícia Federal, dificultando, em muitos casos, a aquisição de posse ou porte, pelo cidadão comum. Muitas vezes, inclusive, pode existir interferência externa da cúpula do Executivo Federal orientando a negar uma determinada quantidade de posse/porte, ao vislumbrar que está se expedindo um número excessivo, ou mesmo a existência de preferências pessoais do próprio Delegado para concedê-lo. Por isso, necessária uma alteração, para que todos os critérios sejam de origem objetiva e uma vez preenchidos, seja expedido o documento pertinente.

Note-se que há uma distinção entre as formas de obtenção de arma, a posse e o porte. A primeira se refere a possuir uma arma de fogo, legalmente, em sua residência ou em seu local de trabalho, desde que, neste caso, seja o titular ou o responsável legal pelo estabelecimento ou empresa. Na segunda, a arma pode ser trazida consigo, ou seja, o porte permite que o indivíduo ande com a arma fora de seu lar ou do trabalho. Deve, obviamente, existir maior rigor na concessão do porte do que para a posse, basicamente porque com ele há o direito de levar a arma para qualquer lugar, todavia, esse rigor não pode ser tanto a ponto de inviabilizar ou dificultar sobremaneira sua obtenção, como ocorre atualmente com o Estatuto do Desarmamento.

Em que pese haver muita gente que se posiciona contrariamente à liberação de armas para as pessoas civis, não é essa a melhor saída para a diminuição da criminalidade. Primeiramente porque o cidadão civil que quer obter sua arma legalmente, busca sua proteção e de sua família. Não é normal colocar como regra que o brasileiro não tem cultura para ter uma arma e que se tiver sairá por aí atirando, no estilo velho oeste. A questão primordial é a autodefesa, que está sendo negada pelo Estado. Não dá para dizer, depois de 15 anos de Estatuto de Desarmamento, que ele funcionou para o objetivo principal a que pleiteava, qual seja, a diminuição de crimes violentos. Pelo contrário, os homicídios chegam a níveis cada vez maiores, aumentando ano após ano. E mais, serviu para que as pessoas, cada vez mais, tranquem-se em suas casas, e nem mesmo lá se sintam seguras. O criminoso simplesmente perdeu o medo de invadir residências ou atacar as pessoas na rua e fazer todo o tipo de barbárie que quiser, já que não encontrará qualquer resistência por parte da vítima.

Não à toa existe essa “explosão” de criminalidade, já que para o bandido o Estatuto do desarmamento não impede absolutamente nada, uma vez que o mesmo já infringe a lei, não sendo um problema para ele adquirir uma arma ilegalmente. Pelo contrário, qualquer pessoa pode facilmente comprar uma arma ilegal, basta saber procurar e ter dinheiro. Simples assim! Desse modo, a única coisa que o desarmamento fez foi tirar o direito de defesa do cidadão, que trabalha todos os dias, paga seus impostos e quer proteção. Alguns dizem que com isso aumentará o número de homicídios, crimes violentos e que por qualquer banalidade as pessoas resolveriam suas diferenças. Ora, se as pessoas estão buscando obter uma arma legalmente, o que já é bastante difícil, não há porque esse temor. Até mesmo porque a arma e munições estarão em nome do proprietário, facilitando e muito a identificação de qualquer desvio de conduta. O problema da violência nunca foi o cidadão de bem, mas sim os criminosos. Quem tem a índole assassina ou uma personalidade voltada à prática de delitos violentos, os praticarão tendo uma arma de fogo ou não, utilizando uma faca, um bastão, ou qualquer outro objeto. Caso algum civil cometa um crime violento, não há porque culpar a arma, a culpa é da pessoa, que deverá ser punida rigorosamente. Culpar a arma é o mesmo que culpar a vítima de estupro ao invés do autor do crime. Além do mais, não se pode colocar casos pontuais como regras, já que antes do Estatuto do Desarmamento armas eram livremente comercializadas, e não havia tantos homicídios como se tem hoje. Portanto, a relação de número armas por quantidade de homicídios parece bastante equivocada.

Outro ponto importante de se falar é que a polícia não consegue estar em todos os locais ao mesmo tempo, o efetivo e demais fatores lógicos impedem isso. Não somente no Brasil, mas em qualquer país do mundo. Todavia, os crimes não param e qualquer um pode ser eleito a vítima da vez, já que o crime é bastante democrático, atingindo a todos, indistintamente. Por isso, para quem quiser e cumprir os requisitos, que devem ser objetivos, é de fundamental importância que tenha sua arma, já que do outro lado, na grande maioria dos casos, o criminoso estará. Isso não quer dizer que todo mundo vai sair atirando por aí, mas sim que os bandidos pensarão duas vezes antes de adentrar uma casa para furtar, roubar ou praticar qualquer crime que seja.

Imagine a situação de uma mulher estar andando sozinha na rua tarde da noite, voltando para sua casa, depois de um dia cansativo de trabalho, passando por um bairro conhecido por ser perigoso. Por que não pode essa mulher ter uma arma dentro de sua bolsa para se defender de eventual crime, como estupro, por exemplo? Quem poupa o lobo, sacrifica a ovelha, isso é um fato. O que se quer com a facilitação e permissão de compra de armas por um cidadão comum é a proteção. Não significa que as armas serão distribuídas em prateleiras de supermercados, haverá regras para obtenção, como testes psicológicos, comprovação de emprego fixo e residência certa, certidão negativa de antecedentes criminais, capacidade técnica para utilizar a arma, etc.

Não se quer aqui dizer que com a flexibilização na obtenção da posse e do porte, irá se resolver o problema da criminalidade, logicamente que não. Existem inúmeras outras providências a serem tomadas em conjunto pelo Poder Público, para que haja uma diminuição significativa. Dentre elas são necessários investimentos maciços em segurança pública, principalmente para aumentar os índices de solução dos crimes; políticas públicas no combate à criminalidade; maior rigor nas leis penais, para que os criminosos realmente fiquem presos, combatendo-se assim a impunidade, tão presente no cotidiano do brasileiro; retaguarda jurídica aos policiais; dentre outras medidas imprescindíveis, que com vontade política podem sim diminuir a criminalidade.

  


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