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A tabela Price é ilegal?

A tabela Price é ilegal?

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1. Definitivamente a tabela price é ilegal

A conclusão é bastante simples e passa pelo raciocínio lógico que se resume no seguinte:

a)a art. 4º do Decreto Lei n. 22.626/33 proíbe o anatocismo, juros compostos ou juros sobre juros;

b)a tabela price (ou sistema francês) é o sistema de amortização que incorpora juros compostos às amortizações de empréstimos e financiamentos;

c)Conclusão: a tabela price é ilegal.


2. A proibição do anatocismo (cobrança de juros sobre juros)

A premissa maior, que leva à conclusão da proibição da tabela price, passa pela análise do artigo 4º do Decreto 22.626/33, que está assim redigido:

Art. 4°. É proibido contar juros dos juros;...

Aliás, nos ensinam grandes juristas pátrios:

JOSÉ AFONSO DA SILVA:

As cláusulas que estipularem juros superiores são nulas. A cobrança acima dos limites estabelecidos, diz o texto, será conceituada como crime de usura, punido, em todas as suas modalidades, nos termos em que a lei dispuser. Neste particular, parece-nos que a velha lei de usura (Dec. 22.626/33) ainda está em vigor. (José Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional Positivo - 9ª ed. São Paulo - Malheiros - 1994. p. 704).

MARIA HELENA DINIZ:

As partes interessada combinam os juros pelo prazo da convenção, e, se porventura não os fixarem, a taxa será a constante da lei, desde que haja estipulação a respeito. Todavia, é preciso lembrar que o Decreto n. 22.626/33, parcialmente alterado pelo Decreto-lei n. 182/38, ao reprimir os excessos da usura, proibiu a estipulação, em quaisquer contratos, de taxas superiores ao dobro da legal (art. 1°), cominando pena de nulidade para os negócios celebrados com infração da lei, assegurando ao devedor a repetição do que houvesse pago a mais (art. 11). Assim sendo, a taxa de juros não poderá ultrapassar 12% ao ano, sendo vedado receber, a pretexto de comissão, taxas maiores que as permitidas pela lei (art. 2°) e, proibindo-se (art. 4°), ainda, contar juros dos juros... (Maria Helena Diniz. Curso de Direito Civil Brasileiro. Teoria geral das obrigações 13ª ed.. São Paulo, Ed. Saraiva, 1999, p. 369).

ORLANDO GOMES:

A obrigação de pagar juros constitui-se:

a) por estipulação contratual;

b) por disposição legal.

Os juros contratuais são estipulados pelas partes até o limite máximo permitido na lei de repressão à usura. Os juros legais são impostos em determinadas dívidas, tendo aplicação mais freqüente no caso de mora, quando se chamam juros moratórios. A taxa também é fixada em disposição legal de caráter supletivo.

Na determinação contratual dos juros, a intervenção legal não se limita à fixação da maior taxa que pode ser estipulada. Dentre as proibições estatuídas, importa salientar a que visa conter o anatocismo. Não permite a lei que se adicionem os juros ao capital para o efeito de se contarem novos juros. O processo de calcular juros sobre juros para avolumar a prestação é considerado usurário ... (Orlando Gomes. Obrigações. Rio de Janeiro, Ed. Forense, 8ª ed., 1988, p. 65).

A única exceção diz respeito à capitalização anual, ou seja, cobrança de juros de 12% ao ano, de ano em ano e sobre o saldo líquido – já amortizado - em conta corrente, e não de mês em mês como ilegalmente se costuma proceder.

A jurisprudência pátria tem se manifestado acerca do tema, que não é novo:

Súmula 121 do STF: "É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente convencionada."

RT 728/265 Juros - Empréstimo concedido por empresa emitente de cartão de crédito -Anatocismo - Inadmissibilidade - Aplicabilidade do art. 4.º, da "Lei de Usura", também às instituições financeiras, com exclusão dos mútuos rural, comercial e industrial (1.º TACivSP)."Realmente, o C. Superior Tribunal de Justiça, competente, a partir da CF de 1988, para apreciar a matéria, assentou que "a regra do art. 4° do Dec. 22.626/33 não foi revogada pela Lei 4.595, de 1964, além do que o anatocismo repudiado pelo verbete n. 121 as Súmula do STF não guarda relação com o enunciado n° 596 da mesma Súmula." (Resp. 1.258-GO – cf. AI 4.575, de São Paulo, Reg. 90.0006100-3, votação unânime, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo, j. 28.08.90, referido na apelação 467.996-5, Rel. Juiz Antônio de Pádua Ferraz Nogueira, em JTACSP, Lec, 149/117).

Portanto, se a tabela price incorpora juros capitalizados de forma composta, (juros sobre juros ou juros exponenciais), só é admitida, em tese, nos casos de lei que expressamente permita sua aplicação, como, por exemplo, as normas que regulamentam os mútuos rural, comercial e industrial. Discutível a Medida Provisória n. 1963-17 que, a partir de 30 de março de 2000, tencionou liberar o anatocismo apenas às instituições financeiras. Como já afirmamos em outro trabalho, sua inconstitucionalidade é flagrante.

Assim, tratando-se de financiamento imobiliário, contrato de abertura de crédito entre outros financiamentos, resta legalmente vedada a sua aplicação


3. A tabela price contém juros compostos (juros capitalizados ou juros sobre juros)?

Demonstrada a ilegalidade da cobrança de juros compostos, premissa maior do silogismo proposto, resta verificar a premissa menor, ou seja, aquela que sustenta o raciocínio lógico apresentado e está calcada na afirmação da existência de juros compostos na tabela price.

Para se chegar a essa conclusão, inicialmente convém analisar a fórmula da tabela price. Nesse sentido, é possível perceber os juros calculados exponencialmente, uns sobre os outros (juros sobre juros ou juros capitalizados de forma composta) em razão do prazo:

R= P (1 + i)n

x i .

(1 + i)n - 1

Onde:

P = principal ou capital inicial.

i = taxa de juros

n = prazo.

R = prestações (parcelas)

Vamos aclarar a fórmula através de um exemplo que consistirá em calcular o financiamento de R$ 11.255,08, a ser pago em 12 (doze) parcelas mensais e consecutivas, com juros de 1% ao mês de acordo com a tabela price, cujo resultado são parcelas de R$ 1.000,00.

n

Juros

Amorti-
zação

Prestação

Saldo devedor RS

Juros
%

Demonstração de como se aplica
Juros sobre Juros mês a mês.

Saldo devedor x percentual de juros =saldo devedor capitalizado.

0 - - - 11.255,08 1,00% 11.255,08x 1%= 11.367,63-1.000,00=saldo devedor seguinte
1 112,55 887,45 1.000,00 10.367,63 1,00% 10.367,63x1%=10.471,30-1.000,00
= saldo devedor seguinte
2 103,68 896,32 1.000,00 9.471,30 1,00% 9.471,30x1%=9.566,02-1.000,00
=saldo devedor seguinte
3 94,71 905,29 1.000,00 8.566,02 1.00% 8.566,02x1%=8.651,68-1.000,0
=saldo devedor seguinte
4 85,66 914,34 1.000,00 7.651,68 1,00% 7.651,68x1%=7.728,19-1.000,00
=saldo devedor seguinte
5 76,52 923,48 1.000,00 6.728,19 1.00% 6.728,19x1%=6.795,48-1.000,00
=saldo devedor seguinte
6 67,28 932,72 1.000,00 5.795,48 1,00% 5.795,48x1%=5.853,43-1.000,00
=saldo devedor seguinte
7 57,95 942,05 1.000,00 4.853,43 1,00% 4.853,43x1%=4.901,97-1.000,00
=saldo devedor seguinte
8 48,53 951,47 1.000,00 3.901,97 1,00% 3.901,97x1%=3.940,99-1.000,00
=saldo devedor seguinte
9 39,02 960,98 1.000,00 2.940,99 1,00% 2.940,99x1%=2.970,40-1.000,00
=saldo devedor seguinte
10 29,41 970,59 1.000,00 1.970,40 1,00% 1.970,40x1%=1.990,10-1.000,00
=saldo devedor seguinte
11 19,70 980,30 1.000,00 990,10 1,00% 990,10x1%=1.000,000-1,000,00
=saldo devedor seguinte
12 9,90 990,10 1.000,00 0,00    
Som 744,92 11.255,08 12.000,00      

Pelo que se observa, os R$ 11.255,08 iniciais transformaram-se em R$ 12.000,00. Pagou-se, assim, R$ 744,92 de juros.

Com efeito, na coluna da direita é possível visualizar perfeitamente os juros aplicados uns sobre os outros, vez que sempre incidentes sobre o novo valor de capital, antes da amortização.

O problema fundamental da tabela price diz respeito à exigibilidade dos juros.

Nesse sistema os juros tornam-se principal, enquanto o capital torna-se acessório. Isso porque os juros sobre todo o capital acumulado são recebidos primeiro, servindo o resíduo da prestação para amortizar o capital.

O senso comum indica o contrário: os juros devem ser recebidos junto com a parcela de capital a que se referem, não antes, nem depois.

Assim, no primeiro vencimento de um empréstimo de R$ 100.000,00, amortizável em 100 meses, a juros de 1% ao mês, a parcela deveria ser de R$ 1.010,00, sendo R$ 1.000,00 de capital de R$ 10,00 de juros, pois o capital devolvido ficou um mês com o mutuário (R$ 1.000,00 X 1% X 1 mês); no segundo mês, a prestação seria de R$ 1.020,00, com R$ 1.000,00 de capital e R$ 20,00 de juros (R$ 1.000,00 X 1% X 2 meses), e assim por diante, de modo que no 100o. mês, a parcela seria de R$ 2.000,00, distribuída em R$ 1.000,00 e R$ 1.000,00 de juros (R$ 1.000,00 X 1% X 100 meses).

Para que dúvidas não pairem, resta importante comparar como seria pago o empréstimo de R$ 11.255, 08 utilizando a fórmula para cálculo de juros simples que de acordo com JOSÉ DUTRA VIEIRA SOBRINHO (Ob. cit. p. 24) é a seguinte:

S = P x (1+i x n)

Onde:

P = principal

i = taxa de juros

n = prazo.

S = valor futuro

De acordo com esta fórmula, cada parcela seria representada por 1/12 do valor inicial, sendo que as parcelas com vencimentos mais distantes teriam juros maiores em razão do tempo na devolução do capital.

Sendo assim, para o valor de R$ 11.255,08, temos doze prestações de R$ 937,92.

Com juros simples o resultado seria o seguinte:

Parcela nº Juros Amortização Prestação Juros%
         

1

9,38

937,92

947,30

1,00%

2

18,75

937,92

956,67

2,00%

3

28,14

937,92

966,06

3,00%

4

37,51

937,92

975,43

4,00%

5

46,90

937,92

984,82

5,00%

6

56,27

937,92

994,19

6,00%

7

65,65

937,92

1.003,57

7,00%

8

75,03

937,92

1.012,95

8,00%

9

84,41

937,92

1.022,33

9,00%

10

93,79

937,92

1.031,71

10,00%

11

103,17

937,92

1.041,09

11,00%

12

112,55

937,92

1.050,47

12,00%

Soma:

731,55

11.255,08

11.986,59

 

Portanto, nesse pequeno exemplo, usando a tabela price, o devedor pagaria R$ 744,92 de juros, e, ao revés, utilizando juros simples, o pagamento seria menor, ou seja, R$ 731,55.

As diferenças são exacerbadas em razão de prazos maiores, principalmente em razão do cálculo exponencial dos juros no sistema da tabela price.

Antes de passar à proposta alternativa, examinemos alguns exemplos que demonstram a capitalização mensal de juros e a cobrança de juros sobre juros na tabela price:

Avaliemos, agora, o sistema de amortização pela tabela price para um financiamento de R$ 100.000,00 a ser pago em 4 parcelas mensais, com juros de 1% ao mês. Assim, o valor das prestações é calculado em R$ 25.628,11.

Procedendo as amortizações como na tabela price, obviamente, chegará ao resultado que deseja, ou seja, que o saldo devedor seja R$ 0,09 (tendente a zero). É estarrecedor, mas alguns utilizam exatamente esse argumento para justificar que a tabela price não contém juros compostos!

Todavia, utilizado o sistema de juros simples, mantida a mesma parcela calculada pela tabela price, o resultado seria outro, a saber:

1a. parcela:

Saldo inicial: R$ 100.000,00 (somente capital);

Juros sobre a primeira fração de capital: R$ 250,00 (R$ 25.000,00 X 1% ao mês X 1 mês);

Parcela total (tabela price): R$ 25.628,11 (R$ 250,00 de juros e R$ 25.378,11 de amortização de capital);

Saldo no final do mês: R$ 74.621,89 devedor (R$ 100.000,00 – R$ 25.378,11).

2a. parcela:

Saldo anterior: R$ 74.621,89 (somente capital)

Juros sobre a segunda fração de capital: R$ 500,00 (R$ 25.000,00 X 1% X 2 meses);

Parcela total (tabela price): R$ 25.628,11 (R$ 500,00 de juros e R$ 25.128,11 de amortização de capital);

Saldo no final do mês: R$ 49.493,78 devedor (R$ 74.621,89 – R$ 25.128,11).

3a. parcela:

Saldo anterior: R$ 49.493,78 (somente capital)

Juros sobre a segunda fração de capital: R$ 750,00 (R$ 25.000,00 X 1% X 3 meses);

Parcela total (tabela price): R$ 25.628,11 (R$ 750,00 de juros e R$ 24.878,11 de amortização de capital);

Saldo no final do mês: R$ 24.615,67 devedor (R$ 49.493,78 – R$ 24.878,11).

4a. parcela:

Saldo anterior: R$ 24.615,67 (somente capital)

Juros sobre a segunda fração de capital: R$ 1.000,00 (R$ 25.000,00 X 1% X 4 meses);

Parcela total (tabela price): R$ 25.628,11 (R$ 1.000,00 de juros e R$ 24.628,11 de amortização de capital);

Saldo no final do mês: R$ 12,44 credor (R$ 24.615,67 – R$ 24.878,11).

Tendo sido cobrados juros de R$ 2.512,44 (R$ 25.628,11 X 4 – R$ 100.000,00), enquanto os devidos seriam R$ 2.500,00 (R$ 250,00 + R$ 500,00 + R$ 750,00 + R$ 1.000,00), chega-se à mesma conclusão que a memória de cálculo retro: o devedor teria saldo positivo de R$ 12,44, ou 0,4976% a mais em relação aos juros devidos.

Ampliado o mútuo para 15 anos, de forma capitalizada como o é, a diferença corresponderia a 25,0276% sobre os juros contratados.

Ou seja, em 15 anos, juros de 1% ao mês capitalizados mensalmente pela tabela price correspondem a 1,2821% ao mês, de forma simples.

Esta afirmação resta provada abaixo, onde primeiro, calculamos, pela tabela price, a prestação mensal de R$ 1.200,17 para o empréstimo de R$ 100.000,00, amortizável em 180 meses, à taxa de 1% ao mês:

Amortização: tabela price

Valor: R$ 100.000,00

Prazo: 180 meses

Mês

Tx.Juros

Juros Prestação Amort.

Juros

Amort.

Capital

Sdo.

Capital

Sdo.Juros Saldo Total

0

- - - - -

-100.000,00

0,00

-100.000,00

1

1,0000%

-1.000,00

1.200,17

1.000,00

200,17

-99.799,83

0,00

-99.799,83

2

1,0000%

-998,00

1.200,17

998,00

202,17

-99.597,66

0,00

-99.597,66

3

1,0000%

-995,98

1.200,17

995,98

204,19

-99.393,46

0,00

-99.393,46

4

1,0000%

-993,93

1.200,17

993,93

206,24

-99.187,23

0,00

-99.187,23

5

1,0000%

-991,87

1.200,17

991,87

208,30

-98.978,93

0,00

-98.978,93

6

1,0000%

-989,79

1.200,17

989,79

210,38

-98.768,55

0,00

-98.768,55

7

1,0000%

-987,69

1.200,17

987,69

212,48

-98.556,07

0,00

-98.556,07

8

1,0000%

-985,56

1.200,17

985,56

214,61

-98.341,46

0,00

-98.341,46

9

1,0000%

-983,41

1.200,17

983,41

216,76

-98.124,70

0,00

-98.124,70

10

1,0000%

-981,25

1.200,17

981,25

218,92

-97.905,78

0,00

-97.905,78

11

1,0000%

-979,06

1.200,17

979,06

221,11

-97.684,67

0,00

-97.684,67

12

1,0000%

-976,85

1.200,17

976,85

223,32

-97.461,34

0,00

-97.461,34

.....

169

1,0000%

-135,07

1.200,17

135,07

1.065,10

-12.442,05

0,00

-12.442,05

170

1,0000%

-124,42

1.200,17

124,42

1.075,75

-11.366,30

0,00

-11.366,30

171

1,0000%

-113,66

1.200,17

113,66

1.086,51

-10.279,79

0,00

-10.279,79

172

1,0000%

-102,80

1.200,17

102,80

1.097,37

-9.182,42

0,00

-9.182,42

173

1,0000%

-91,82

1.200,17

91,82

1.108,35

-8.074,07

0,00

-8.074,07

174

1,0000%

-80,74

1.200,17

80,74

1.119,43

-6.954,64

0,00

-6.954,64

175

1,0000%

-69,55

1.200,17

69,55

1.130,62

-5.824,02

0,00

-5.824,02

176

1,0000%

-58,24

1.200,17

58,24

1.141,93

-4.682,09

0,00

-4.682,09

177

1,0000%

-46,82

1.200,17

46,82

1.153,35

-3.528,74

0,00

-3.528,74

178

1,0000%

-35,29

1.200,17

35,29

1.164,88

-2.363,86

0,00

-2.363,86

179

1,0000%

-23,64

1.200,17

23,64

1.176,53

-1.187,33

0,00

-1.187,33

180

1,0000%

-11,87

1.199,20

11,87

1.187,33

0,00

0,00

0,00

Totais  

-116.029,63

216.029,63

116.029,63

100.000,00

     

Ao depois, mantivemos o mesmo valor do mútuo, prazo e prestação, e alteramos o sistema de amortização para juros simples, de forma que encontramos a taxa de juros correspondente no patamar de 1,2821% (2a. coluna):

Amortização: juros simples

Valor: R$ 100.000,00

Prazo: 180 meses

 

Mês

Tx.Juros

Juros Prestação Amort.

Juros

Amort.

Capital

Sdo.Capital Sdo.Juros Saldo Total

0

- - - - -

-100.000,00

0,00

-100.000,00

1

1,2821%

-7,12

1.200,17

7,12

1.193,05

-98.806,95

0,00

-98.806,95

2

1,2821%

-14,25

1.200,17

14,25

1.185,92

-97.621,03

0,00

-97.621,03

3

1,2821%

-21,37

1.200,17

21,37

1.178,80

-96.442,23

0,00

-96.442,23

4

1,2821%

-28,49

1.200,17

28,49

1.171,68

-95.270,55

0,00

-95.270,55

5

1,2821%

-35,61

1.200,17

35,61

1.164,56

-94.105,99

0,00

-94.105,99

6

1,2821%

-42,74

1.200,17

42,74

1.157,43

-92.948,56

0,00

-92.948,56

7

1,2821%

-49,86

1.200,17

49,86

1.150,31

-91.798,25

0,00

-91.798,25

8

1,2821%

-56,98

1.200,17

56,98

1.143,19

-90.655,06

0,00

-90.655,06

9

1,2821%

-64,11

1.200,17

64,11

1.136,07

-89.519,00

0,00

-89.519,00

10

1,2821%

-71,23

1.200,17

71,23

1.128,94

-88.390,05

0,00

-88.390,05

11

1,2821%

-78,35

1.200,17

78,35

1.121,82

-87.268,23

0,00

-87.268,23

12

1,2821%

-85,47

1.200,17

85,47

1.114,70

-86.153,54

0,00

-86.153,54

...

169

1,2821%

-1.203,75

1.200,17

1.203,75

-3,58

510,03

0,00

510,03

170

1,2821%

-1.210,87

1.200,17

1.210,87

-10,70

499,32

0,00

499,32

171

1,2821%

-1.218,00

1.200,17

1.218,00

-17,83

481,50

0,00

481,50

172

1,2821%

-1.225,12

1.200,17

1.225,12

-24,95

456,55

0,00

456,55

173

1,2821%

-1.232,24

1.200,17

1.232,24

-32,07

424,48

0,00

424,48

174

1,2821%

-1.239,36

1.200,17

1.239,36

-39,19

385,29

0,00

385,29

175

1,2821%

-1.246,49

1.200,17

1.246,49

-46,32

338,97

0,00

338,97

176

1,2821%

-1.253,61

1.200,17

1.253,61

-53,44

285,53

0,00

285,53

177

1,2821%

-1.260,73

1.200,17

1.260,73

-60,56

224,97

0,00

224,97

178

1,2821%

-1.267,85

1.200,17

1.267,85

-67,68

157,29

0,00

157,29

179

1,2821%

-1.274,98

1.200,17

1.274,98

-74,81

82,48

0,00

82,48

180

1,2821%

-1.282,10

1.199,62

1.282,10

-82,48

0,00

0,00

0,00

Totais  

-116.030,05

216.030,05

116.030,05

100.000,00

     

Entendemos que o cidadão, ao contratar, supõe o cumprimento da legislação. A Lei da Usura (Decreto n. 22.626/33) é bastante clara quando preceitua:

Art. 13. É considerado delito de usura toda a simulação ou prática tendente a ocultar a verdadeira taxa do juro ou a fraudar os dispositivos desta lei, para o fim de sujeitar o devedor a maiores prestações ou encargos, além dos estabelecidos no respectivo título ou instrumento.

O artifício utilizado pelos credores para mascarar a prática do anatocismo é, na tabela price, fazer com que os juros "desapareçam" do total da dívida, cobrando-os na parcela vencida. Ocorre que os juros não são exigíveis mês a mês sobre o débito integral, porque parcelas de capital ainda se vencerão.

A tabela price antecipa os juros vincendos, de forma a onerar mais o mutuário, o que, ressalte-se, também é proibido pela Lei da Usura:

Art. 6º. Tratando-se de operações a prazo superior a (6) seis meses, quando os juros ajustados forem pagos por antecipação, o calculo deve ser feito de modo que a importância desses juros não exceda a que produziria a importância liquida da operação no prazo convencionado, as taxas máximas que esta lei permite.

Demonstraremos abaixo que, excluída a antecipação de juros – e conseqüentemente apropriando nas parcelas vencidas apenas os juros devidos até aquela data, sobre o capital devolvido -, as parcelas calculadas pela tabela price só se mantêm porque os juros são calculados sobre o saldo de capital e o saldo de juros somados.

Amortização: pela tabela price – juros vincendos apartados

Valor: R$ 100.000

Prazo: 180 meses

 

Mês

Tx.Juros

Juros Prestação Amort.

Juros

Amort.

Capital

Sdo.Capital Sdo.Juros Saldo Total

0

         

-100.000,00

0,00

-100.000,00

1

1,0000%

-1.000,00

1.200,17

5,56

1.194,61

-98.805,39

-994,44

-99.799,83

2

1,0000%

-998,00

1.200,17

11,13

1.189,04

-97.616,35

-1.981,31

-99.597,66

3

1,0000%

-995,98

1.200,17

16,73

1.183,44

-96.432,90

-2.960,56

-99.393,46

4

1,0000%

-993,93

1.200,17

22,34

1.177,83

-95.255,07

-3.932,15

-99.187,23

5

1,0000%

-991,87

1.200,17

27,98

1.172,19

-94.082,88

-4.896,05

-98.978,93

6

1,0000%

-989,79

1.200,17

33,63

1.166,54

-92.916,35

-5.852,21

-98.768,55

7

1,0000%

-987,69

1.200,17

39,31

1.160,86

-91.755,49

-6.800,58

-98.556,07

8

1,0000%

-985,56

1.200,17

45,01

1.155,16

-90.600,32

-7.741,14

-98.341,46

9

1,0000%

-983,41

1.200,17

50,72

1.149,45

-89.450,88

-8.673,83

-98.124,70

10

1,0000%

-981,25

1.200,17

56,46

1.143,71

-88.307,17

-9.598,61

-97.905,78

11

1,0000%

-979,06

1.200,17

62,22

1.137,95

-87.169,22

-10.515,45

-97.684,67

12

1,0000%

-976,85

1.200,17

68,00

1.132,17

-86.037,05

-11.424,29

-97.461,34

...

169

1,0000%

-135,07

1.200,17

1.340,14

-139,97

2.299,48

-14.741,53

-12.442,05

170

1,0000%

-124,42

1.200,17

1.351,45

-151,28

2.148,20

-13.514,50

-11.366,30

171

1,0000%

-113,66

1.200,17

1.362,82

-162,65

1.985,55

-12.265,34

-10.279,79

172

1,0000%

-102,80

1.200,17

1.374,24

-174,07

1.811,48

-10.993,90

-9.182,42

173

1,0000%

-91,82

1.200,17

1.385,72

-185,55

1.625,94

-9.700,01

-8.074,07

174

1,0000%

-80,74

1.200,17

1.397,25

-197,08

1.428,86

-8.383,50

-6.954,64

175

1,0000%

-69,55

1.200,17

1.408,84

-208,67

1.220,19

-7.044,21

-5.824,02

176

1,0000%

-58,24

1.200,17

1.420,49

-220,32

999,87

-5.681,96

-4.682,09

177

1,0000%

-46,82

1.200,17

1.432,19

-232,02

767,84

-4.296,58

-3.528,74

178

1,0000%

-35,29

1.200,17

1.443,96

-243,79

524,05

-2.887,91

-2.363,86

179

1,0000%

-23,64

1.200,17

1.455,78

-255,61

268,45

-1.455,78

-1.187,33

180

1,0000%

-11,87

1.199,20

1.467,65

-268,45

0,00

0,00

0,00

Totais  

-116.029,63

216.029,63

116.029,63

100.000,00

     

Observa-se que os juros apropriados equivalem a 1% do saldo total – e não apenas do saldo de capital, como manda a legislação.

Portanto, fica evidenciado o subterfúgio utilizado para esconder o anatocismo através da antecipação de juros vincendos.

Elaboramos o cálculo abaixo para mostrar que, para o valor inicial de R$ 100.000,00 e prazo de 180 meses, obedecida a lei e mantida a parcela calculada pela tabela price, o mutuário, ao final, será credor de incríveis R$ 97.613,43, para o mesmo empréstimo antes analisado!

Amortização: juros simplesjuros vincendos apartados

Valor: R$ 100.000

Prazo: 180 meses

Mês

Tx.Juros

Juros Prestação Amort.

Juros

Amort.

Capital

Sdo.

Capital

Sdo.Juros Saldo Total

0

         

-100.000,00

0,00

-100.000,00

1

1,0000%

-1.000,00

1.200,17

5,56

1.194,61

-98.805,39

-994,44

-99.799,83

2

1,0000%

-988,05

1.200,17

11,08

1.189,09

-97.616,29

-1.971,42

-99.587,71

3

1,0000%

-976,16

1.200,17

16,56

1.183,61

-96.432,68

-2.931,03

-99.363,71

4

1,0000%

-964,33

1.200,17

22,01

1.178,16

-95.254,52

-3.873,35

-99.127,86

5

1,0000%

-952,55

1.200,17

27,42

1.172,75

-94.081,77

-4.798,47

-98.880,24

6

1,0000%

-940,82

1.200,17

32,80

1.167,37

-92.914,39

-5.706,49

-98.620,89

7

1,0000%

-929,14

1.200,17

38,14

1.162,03

-91.752,36

-6.597,50

-98.349,86

8

1,0000%

-917,52

1.200,17

43,44

1.156,73

-90.595,63

-7.471,58

-98.067,21

9

1,0000%

-905,96

1.200,17

48,71

1.151,46

-89.444,17

-8.328,83

-97.773,00

10

1,0000%

-894,44

1.200,17

53,94

1.146,23

-88.297,93

-9.169,34

-97.467,27

11

1,0000%

-882,98

1.200,17

59,13

1.141,04

-87.156,89

-9.993,19

-97.150,08

12

1,0000%

-871,57

1.200,17

64,29

1.135,88

-86.021,01

-10.800,47

-96.821,48

...

169

1,0000%

687,55

1.200,17

-465,48

1.665,65

70.420,51

5.120,23

75.540,73

 

170

1,0000%

704,21

1.200,17

-529,49

1.729,66

72.150,17

5.294,94

77.445,11

 

171

1,0000%

721,50

1.200,17

-601,64

1.801,81

73.951,98

5.414,79

79.366,78

 

172

1,0000%

739,52

1.200,17

-683,81

1.883,98

75.835,97

5.470,50

81.306,47

 

173

1,0000%

758,36

1.200,17

-778,61

1.978,78

77.814,74

5.450,25

83.265,00

 

174

1,0000%

778,15

1.200,17

-889,77

2.089,94

79.904,69

5.338,63

85.243,32

 

175

1,0000%

799,05

1.200,17

-1.022,95

2.223,12

82.127,80

5.114,73

87.242,53

 

176

1,0000%

821,28

1.200,17

-1.187,20

2.387,37

84.515,17

4.748,81

89.263,98

 

177

1,0000%

845,15

1.200,17

-1.398,49

2.598,66

87.113,83

4.195,47

91.309,30

 

178

1,0000%

871,14

1.200,17

-1.688,87

2.889,04

90.002,87

3.377,74

93.380,61

 

179

1,0000%

900,03

1.200,17

-2.138,88

3.339,05

93.341,93

2.138,88

95.480,81

 

180

1,0000%

933,42

1.199,20

-3.072,30

4.271,50

97.613,43

0,00

97.613,43

 
Totais  

-18.416,20

216.029,63

18.416,20

197.613,43

       

Ocorre que o mercado opta por financiamentos com prestações fixas, esse é, aliás, um imperativo da Lei n. 4.380, supedâneo do Sistema Financeiro da Habitação:

Art. 6° O disposto no artigo anterior somente se aplicará aos contratos de venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão, ou empréstimo que satisfaçam às seguintes condições: (...) c) ao menos parte do financiamento, ou do preço a ser pago, seja amortizado em prestações mensais sucessivas, de igual valor, antes do reajustamento, que incluam amortizações e juros

Para fazer frente ao desafio de provar quanto aquele mutuário que tomou R$ 100.000,00 emprestados, a juros de 1% ao mês, sem capitalização, teria que pagar mensalmente, construímos o demonstrativo abaixo, que indica como parcela mensal o valor de R$ 954,04, necessária e suficiente para quitá-lo nos 180 meses previstos:

Amortização: juros simplesjuros vincendos apartados – nova prestação

Valor: R$ 100.000

Prazo: 180 meses

Mês

Tx.Juros

Juros Prestação Amort.Juros Amort.

Capital

Sdo.Capital Sdo.Juros Saldo Total

0

         

-100.000,00

0,00

-100.000,00

1

1,0000%

-1.000,00

954,04

5,56

948,48

-99.051,52

-994,44

-100.045,96

2

1,0000%

-990,52

954,04

11,09

942,95

-98.108,56

-1.973,87

-100.082,44

3

1,0000%

-981,09

954,04

16,60

937,44

-97.171,13

-2.938,36

-100.109,48

4

1,0000%

-971,71

954,04

22,09

931,95

-96.239,18

-3.887,98

-100.127,15

5

1,0000%

-962,39

954,04

27,56

926,48

-95.312,70

-4.822,81

-100.135,50

6

1,0000%

-953,13

954,04

33,01

921,03

-94.391,66

-5.742,93

-100.134,59

7

1,0000%

-943,92

954,04

38,43

915,61

-93.476,05

-6.648,42

-100.124,47

8

1,0000%

-934,76

954,04

43,83

910,21

-92.565,84

-7.539,34

-100.105,19

9

1,0000%

-925,66

954,04

49,22

904,82

-91.661,02

-8.415,79

-100.076,81

10

1,0000%

-916,61

954,04

54,58

899,46

-90.761,55

-9.277,82

-100.039,38

11

1,0000%

-907,62

954,04

59,91

894,13

-89.867,43

-10.125,52

-99.992,95

12

1,0000%

-898,67

954,04

65,23

888,81

-88.978,62

-10.958,97

-99.937,59

...

169

1,0000%

-31,96

954,04

673,47

280,57

-2.915,02

-7.408,21

-10.323,23

170

1,0000%

-29,15

954,04

676,12

277,92

-2.637,10

-6.761,24

-9.398,34

171

1,0000%

-26,37

954,04

678,76

275,28

-2.361,82

-6.108,85

-8.470,67

172

1,0000%

-23,62

954,04

681,39

272,65

-2.089,17

-5.451,08

-7.540,25

173

1,0000%

-20,89

954,04

684,00

270,04

-1.819,12

-4.787,98

-6.607,10

174

1,0000%

-18,19

954,04

686,60

267,44

-1.551,68

-4.119,57

-5.671,25

175

1,0000%

-15,52

954,04

689,18

264,86

-1.286,82

-3.445,91

-4.732,73

176

1,0000%

-12,87

954,04

691,76

262,28

-1.024,54

-2.767,02

-3.791,56

177

1,0000%

-10,25

954,04

694,32

259,72

-764,81

-2.082,95

-2.847,76

178

1,0000%

-7,65

954,04

696,87

257,17

-507,64

-1.393,73

-1.901,37

179

1,0000%

-5,08

954,04

699,40

254,64

-253,00

-699,40

-952,41

180

1,0000%

-2,53

954,94

701,93

253,01

0,00

0,00

0,00

Totais  

-71.728,10

171.728,10

71.728,10

100.000,00

     

Nesse caso o total das parcelas a pagar corresponderia a R$ 171.728,10 (última linha dessa tabela), sendo R$ 100.000,00 de capital a ser devolvido e R$ 71.728,10 de juros.

Comparando essa soma com aquela que se observou quando aplicada a tabela price, no valor de R$ 216.029,63, com R$ 116.029,63 de juros, observa-se que o mutuário pagaria a mais, apenas pelo descumprimento da proibição do anatocismo, a quantia de R$ 44.301,53 (R$ 116.029,63 – R$ 71.728,10), ou 61,7631% além do devido.

Surgem, então, duas questões fundamentais.

Primeira: a tabela price cumpre a legislação? Definitivamente, NÃO, como demonstramos.

Segunda: há outros sistemas que possam cumprir a Lei? A resposta é SIM, como também mostramos.

Cumpre ressaltar que não há sistemas de amortização neutros, todos eles servem a determinados fins, ora sobrecarregando o devedor, ora aliviando-lhe a carga. O que, entendemos ser correto é escolher o sistema que melhor corresponde à lei.

Portanto, não pairam dúvidas quanto ao fato: a tabela price enseja a cobrança de juros sobre juros através de subterfúgio matemático consubstanciado em receber, antecipadamente, juros vincendos.

Esses aspectos são evidentes, evidentíssimos aliás e, bem por isso dispõe JOSÉ DUTRA VIEIRA SOBRINHO:

A denominação tabela price se deve ao matemático, filósofo e teólogo inglês Richard Price, que viveu no século XVIII e que incorporou a teoria dos juros compostos às amortizações de empréstimos (ou financiamentos). A denominação "Sistema Francês", de acordo com o autor citado, deve-se ao fato de o mesmo ter-se efetivamente desenvolvido na França, no Século XIX. Esse sistema consiste em um plano de amortização de uma dívida em prestações periódicas, iguais e sucessivas, dentro do conceito de termos vencidos, em que o valor de cada prestação, ou pagamento, é composto por duas parcelas distintas: uma de juros e uma de capital (chamada amortização). (JOSÉ DUTRA VIEIRA SOBRINHO. Matemática Financeira. 6a. ed. São Paulo, Atlas, 1997, p. 220).

Não de forma diferente, dispõe WALTER FRANCISCO: Tabela price é a capitalização dos juros compostos (Matemática Financeira, São Paulo, Atlas, 1976).

Trabalho profundo e efetivamente científico sobre o assunto decorre da tese de doutoramento de MÁRIO GERALDO PEREIRA (Plano básico de amortização pelo sistema francês e respectivo fator de conversão – FCEA – Universidade de São Paulo, 1965).

É neste trabalho que se baseia a afirmação, às vezes injustamente criticada, de JOSÉ DUTRA VIEIRA SOBRINHO.

Afirma o cientista MARIO GERALDO PEREIRA:

De fato, não resta a menor dúvida que ao Dr. Richard Price, Filósofo, teólogo e matemático inglês, que viveu no século XVIII, se deve a incorporação da teoria dos juros compostos à amortização dos empréstimos.

Segundo ele, na tabela price:

Ao final de cada período o que se paga é P, a prestação...e o que se amortiza é At...

Decompõe-se, portanto, a prestação P em duas parcelas At e Jt, sendo esta os juros de ordem t ou correspondente ao tº período, o que, aliás, é perfeitamente natural, pois – SENDO O EMPRÉSTIMO PELO SISTEMA FRANCÊS UMA OPERAÇÃO FINANCEIRA SUJEITA A JUROS COMPOSTOS – o mutuário deverá pagar juros nessas condições. Assim, em cada prestação uma parte se destina à amortização ou extinção da dívida e a outra corresponde aos juros calculados sobre o saldo anterior.

A capitalização composta é aquela em que a taxa de juros incide sobre o capital inicial, acrescido dos juros acumulados até o período anterior. Nesse regime de capitalização a taxa varia exponencialmente em função do tempo.(José Dutra Vieira Sobrinho. Ob. cit. p. 34).

Nesse sentido, a tabela price pode ser definida como o sistema em que, a partir do conceito de juros compostos (juros sobre juros), elabora-se um plano de amortização em parcelas periódicas, iguais e sucessivas, considerado o termo vencido.

Nesse caso, as parcelas são compostas de um valor referente aos juros, calculado sobre o saldo devedor amortizado, e outro referente à própria amortização.

Trata-se de juros compostos na exata medida em que, sobre o saldo amortizado, é calculado o novo saldo com base nos juros sobre aquele aplicados, e, sobre este novo saldo amortizado, mais uma vez os juros, e assim por diante.

É preciso insistir no fato de que a capitalização dos juros é classificada em simples (linear) ou composta (juros sobre juros). Essa classificação não se confunde com aquela decorrente dos sistemas de amortização, cujas espécies mais utilizadas são: sistema francês (tabela price); sistema constante (SAC – sistema de amortização constante) e sistema misto (SAM – sistema de amortização misto).

No caso de tabela price, por definição, os juros são compostos (juros sobre juros).

Há, portanto, sistema de amortização francês, e juros, quanto à capitalização, classificados como compostos (juros sobre juros).

Posta assim a questão, é de se dizer que os juros aplicados aos contratos não podem embutir capitalização composta (tabela price), conforme o artigo 4° do Decreto 22.626/33 - Lei da Usura, Súmula 121 do STF e remansosa jurisprudência.

Convém lembrar que a tabela price pode ser utilizada com qualquer taxa de juros e qualquer periodicidade.


4. Equívocos utilizados para justificar o injustificável

Às vezes se comete um engano – proposital ou não – na tentativa de justificar um fato que é impossível, qual seja: que a tabela price não embute juros compostos (juros sobre juros ou juros exponenciais). Ora, o tema implica em conhecimentos de matemática, ciência exata.

Normalmente essa tentativa parte de um sofisma, ou seja, através de argumento que parte de premissas verdadeiras, ou tidas como verdadeiras, se chega a uma conclusão inadmissível, apresentada como resultado das regras formais do raciocínio.

Com efeito, do valor financiado acrescido de juros mês a mês, descontam o valor das parcelas já acrescidas do coeficiente da tabela price e, portanto, de juros compostos, isso na exata medida em que o valor das parcelas, já calculada a tabela price, por natureza, em virtude da fórmula, já embute os juros compostos.

Ora, é evidente que, ao descontar esse valor do saldo devedor acrescido dos juros, ao final, o saldo será zero (ou bem próximo de zero).

Portanto, o sofisma para justificar que o cálculo não embute juros compostos parte, como dito, das parcelas já acrescidas de juros da tabela price, exatamente como na demonstração que fizemos acima, mas com conclusão absolutamente equivocada.

Outro argumento utilizado - evidentemente por pessoas sem formação jurídica – diz respeito ao art. 993 do Código Civil, dispositivo que comprovaria a inexistência de juros compostos em sistemas de amortização.

O art. 993 comprova exatamente o contrário, mormente que determina a completa separação de juros e capital, impedindo a acumulação de juros vencidos no capital para contagem de novos juros.

Profissionais tecnicamente despreparados para a análise da tabela price argumentam, ainda, o seguinte: o débito dos juros, efetuado na data de cada parcela é decrescente e, portanto, não haveria capitalização.

Não há nada mais incongruente.

Como se trata de um sistema de amortização, é evidente que os juros são decrescentes. Todavia, o fato de ocorrer amortizações não significa, como prova MARIO GERALDO PEREIRA, que os juros calculados são capitalizados sobre o saldo amortizado.

Não é incomum encontrarmos quem diga que primeiro se paga juros sobre todo o capital. Este argumento só se justifica se o contrato for mensal, ou seja, se for tomado um empréstimo hoje para devolução em 30 dias, quando serão pagos os juros totais e o capital integral.

Não é o caso de empréstimos que duram 5, 10, 15 ou 20 anos, como os que normalmente são vinculados à aquisição da casa própria.

Em suma, os argumentos normalmente apresentados não vislumbram outro sistema de amortização que não seja a tabela price (TP) para justificar-se. Em outras palavras, partem das conclusões da própria tabela price para validar os princípios da mesma e se valem dos princípios da tabela price para chegar às mesmas conclusões.

São meros sofismas: se os princípios da tabela price forem considerados corretos, é evidente que suas conclusões também serão.

Enfim, as falhas decorrem da análise levada a efeito por profissionais sem capacitação técnica e científica para a análise da capitalização (juros compostos) existente na tabela price.

Antes de cometer verdadeiros dislates na análise da tabela price é de bom alvitre a qualquer profissional um estudo aprofundado do científico trabalho de MARIO GERALDO PEREIRA (Plano básico de amortização pelo sistema francês e respectivo fator de conversão – FCEA – Universidade de São Paulo, 1965).


5. Os tribunais e a tabela price

A evidência matemática que expusemos – capitalização composta de juros na tabela price – bem como sua relação com a proibição do anatocismo contido no art. 4º do Decreto n. 22.626/33 passou longo período sob a capa do desconhecimento matemático que impera no meio jurídico.

Todavia, recentemente, os tribunais e juízes vêm identificando esses aspectos e coibindo o uso da tabela price, providência salutar tendo em vista os funestos efeitos sociais de sua utilização.

Vejamos alguns trechos dessas decisões:

Com efeito, a avença fala num sistema de amortização "TP"que, ao que tudo indica, seja mesmo o da tabela price como afirmam os recorrentes, até porque está expressamente mencionada na certidão imobiliária de fls. 17, o qual incorpora, por excelência, os juros compostos (cf. Luiz Antonio Scavone Junior, Obrigações – abordagem didática, Editora Juarez de Oliveira, 1999, pág.. 188), o que contraria as Súmulas ns. 121 e 596 do STF, e 93 do STJ. (Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo - Agravo de Instrumento n. 886.106-1 - São Paulo – SP – Relator: Juiz SILVEIRA PAULILO, Julgamento: 27.09.1999 )

Nos autos do processo n. 320/97, perante a 5a. Vara Cível de Goiânia – GO, asseverou o Juiz Carlos Alberto França:

Já em relação à capitalização de juros e utilização da tabela price, cuja ocorrência foi confirmada na perícia realizada, bastando verificar no laudo pericial anexado aos autos, tem razão o inconformismo dos autores.

O fato de inexistir limitação legal de juros, vez que este juízo entende que o art. 193, §3º, da Constituição Federal ainda não está em vigor, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal, não significa permissão para a capitalização mensal e a utilização da tabela price, que representa também capitalização mensal ou anatocismo.

Ao responder os quesitos de nº 3 e 12, formulados pelos autores, fls. 266 e 268, o Sr. Perito deixou claro a cobrança de juros capitalizados mensalmente e a utilização da tabela price.

A capitalização mensal de juros não tem amparo legal para o caso em debate, devendo a capitalização acontecer somente anualmente e a utilização da tabela price representa enriquecimento sem causa do credor, vez que capitaliza juros sobre juros de forma antecipada, durante todo o período de vigência do contrato, não podendo ser aplicada, conforme reiteradamente tem decidido o E. Tribunal de Justiça do Estado de Goiás.


5. A tabela price e o princípio da transparência do Código de Defesa do Consumidor

A tabela price é um sistema de amortização absolutamente inacessível, mormente em razão de sua intrincada fórmula matemática, inacessível ao homem médio.

Ademais, tem sido utilizada, principalmente no mercado imobiliário, como forma de não demonstrar o valor total envolvido no negócio jurídico.

Portanto, o sistema francês é utilizado para mascarar o preço real pretendido, principalmente nos contratos de compra e venda de imóveis (cf. Luiz Antonio Scavone Junior. Os Contratos Imobiliários e a previsão de aplicação da Tabela Price – Anatocismo. São Paulo, Revista de direito do consumidor n. 28 – Ed. Revista dos Tribunais – outubro/dezembro/1998, p. 129; Obrigações, abordagem didática – 2a. edição, São Paulo, Editora Jurez de Oliveira, 2000).

De fato, algumas empresas utilizam o artifício de prever contratualmente a tabela price, que é incluída somente após a conclusão das obras quando o infeliz adquirente já está absolutamente engolfado no financiamento.

Nesse sentido, mesmo sem entender, o contratante acaba aceitando o abissal acréscimo no valor das parcelas em virtude da inclusão dos juros capitalizados mensalmente, decorrentes da aplicação da tabela price.

Outrossim, a publicidade freqüentemente afronta a Lei n. 8.078/90 . Basta abrir os jornais e perceber que os anúncios, quando mencionam o fato, o fazem em letras miúdas, praticamente ilegíveis, utilizando a sigla "TP".

Aliás, já dissemos alhures que, a título de curiosidade, passamos a anotar os termos utilizados pelos clientes que nos procuram quando indagados acerca do significado de "TP": tabela progressiva, tabela padrão, tabela particular, taxa de prefixação; tabela preliminar; taxa preliminar e taxa de preparação, entre outros.

Mesmo aqueles que conhecem o significado, dificilmente sabem demonstrar os labirínticos cálculos envolvidos e prever o alcance dos aumentos que serão carreados às parcelas em decorrência da aplicação da tabela price.

Sendo assim, ainda que a tabela price não contivesse juros compostos, restaria inviável sua utilização no âmbito das relações de consumo em virtude do princípio da transparência esposado pelo Código de Defesa do Consumidor.

Ensina ROBERTO SENISE LISBOA que o direito à informação plena é fator de desenvolvimento da concorrência entre os fornecedores. Em qualquer modelo contratual, o direito à informação clara e precisa é de suma importância, verificando-se a sua ocorrência em razão do princípio da boa-fé entre as partes. A obrigação do predisponente de prestar a informação devida é pertinente desde a oferta, por qualquer meio, sob pena de responsabilização pré-contratual, se resultar dano a terceiro interessado, na formação do negócio jurídico em questão. A incompatibilidade com a boa-fé não pode, de qualquer forma, se verificar nas relações de consumo, por ser concepção norteadora de todo o sistema consumerista brasileiro (art. 4° , III, parte final, da Lei 8.078/90). Assim, qualquer infringência aos deveres de informação, segurança, lealdade e cooperação mútua, por meio de dispositivo negocial, caracteriza a nulidade do mesmo. (Roberto Senise Lisboa. Contratos difusos e coletivos. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais. 1997. pp. 158, 159 e 354).


Autores


Informações sobre o texto

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GOMES, Pedro Afonso; SCAVONE JÚNIOR, Luiz Antonio. A tabela Price é ilegal?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 49, 1 fev. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/736. Acesso em: 25 abr. 2024.