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Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro

Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro

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Texto elaborado anteriormente à Lei nº 10.792/2003, que instituiu novas regras para o interrogatório no processo penal. Contudo, o texto contém referências às mudanças que estavam por vir.


SUMÁRIO: INTRODUÇÃO; I - DELAÇÃO PREMIADA, 1.1 - Motivações fáticas e ideológicas, 1.2 - Direito Comparado, 1.2.1 - Na Itália, 1.2.2 - Nos Estados Unidos, 1.2.3 - Na Espanha, 1.2.4 - Na Alemanha, 1.2.3 - No combate aos crimes transnacionais, II - DELAÇÃO PREMIADA NO BRASIL, 2.1 - Disciplinas normativas, 2.2 - Motivações fáticas, 2.3 – Conceito, 2.4 - Benefícios e requisitos para sua concessão, 2.4.1 - Perdão Judicial, 2.4.2 - Causa de diminuição de pena, 2.5 - Momento da delação, 2.6 - A delação como meio de prova, 2.6.1 - Natureza jurídica de prova, 2.6.2 - Valor como prova, 2.7 - O princípio do contraditório na delação, III - ASPECTOS CRÍTICOS, 3.1 - A ética e a delação premiada, 3.1.1 - Diferença entre ética, moral e direito, 3.1.2 - A eticidade da delação premiada, 3.2 - A demonstração de ineficácia do Estado no combate à criminalidade, 3.3 - O menosprezo de valores fundamentais, 3.4 - A falta de condições por parte do Estado em garantir a integridade física do delator e de sua família, 3.4.1 - Fundamento da proteção, 3.4.2 - A lei nº 9.807/99, 3.4.3 - Da proteção do colaborador preso, 3.4.4 - Da proteção do colaborador em liberdade, CONCLUSÃO, BIBLIOGRAFIA.


RESUMO

O Presente Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) aborda o tema "Apontamentos e críticas à delação premiada no Direito Brasileiro", instituto de estímulo à colaboração com a Justiça. Durante o desenvolvimento do tema, após uma análise das motivações fáticas e ideológicas da criação da colaboração premial, do instituto da delação premiada no Direito Comparado e como forma de elucidação dos crimes transnacionais, trata-se da delação no Direito Brasileiro, seu conceito, requisitos, benefícios, momento, bem como aborda-se seu valor como meio de prova. Por fim, faz-se constar as críticas dirigidas ao instituto, concluindo-se que a colaboração premiada é muito importante no combate ao crime organizado, que apresenta alto grau de ousadia e sofisticação.

Palavras-chave: Delação Premiada - Benefícios - Prova - Críticas.


ABSTRACT

The Present Work of College Degree (TCC) approaches the subject "Notes and criticizes to the delation awardee in the Brazilian Right", institute of stimulation to the contribution with justice. During the development of the subject, after an analysis of the fatical and ideological motivations of the creation of the contribution´´s benefit to the institute of the delation awardee in the Comparative Right and as form of briefing of the transnational crimes, is about the delation in the Brazilian Right, its concept, requirements, benefits, moment, as well as approaches its value as evidence. Finally, one becomes to consist the critical ones directed to the institute, concluding itself that the contribution awardee is very important in the combat to the organized crime, that presents high degree of audacity and sophistication.

Key-words: Delation Awardee - Benefits - Evidence - Critical.


INTRODUÇÃO

Diante da insegurança pública que há tempos paira sobre o Brasil, como uma solução para a diminuição da criminalidade, que gradativamente vem adquirindo novas feições, o legislador introduziu, por meio da Lei nº 8.072/90 e, posteriormente, nas Leis nos 9.034/95, 9.080/95, 9.613/98 e 9.807/99, o instituto da delação premiada no ordenamento jurídico pátrio.

A figura da delatio, objeto de estudo no presente Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), faz-se presente em países como Itália (pattegiamento), Estados Unidos (bargain), Alemanha, Espanha, França e Inglaterra.

Consiste na confissão, pelo acusado, de sua participação no delito que lhe é imputado, com a concomitante atribuição da participação de outro (s) no mesmo fato. Mostra-se deveras polêmico, posto que o acusado, ao confessar e incriminar seu (s) comparsa (s), poderá ser beneficiado com a diminuição de pena ou o perdão judicial, desde que preenchidos alguns requisitos, fato este que demonstra a importância de um estudo mais aprofundado acerca do tema.

Sob o prisma de sua natureza, trata-se de prova anômala, admissível no ordenamento jurídico brasileiro. Entretanto, quanto à sua força condenatória, paira profunda divergência na doutrina e jurisprudência, concernente à violação ou não do princípio do contraditório.

Há quem vislumbre a colaboração ativa, na sua essência, como um ato de traição, indefensável, o que a torna eticamente reprovável.

Concomitantemente, surgem críticas no sentido de que há, com a introdução da delação premiada no Direito Pátrio, demonstração da ineficácia do Estado em combater as mais diversas modalidades de ação criminosa.

De outro lado, observa-se uma problemática que reside em torno da concessão de benefícios ao colaborador, posto que alguns doutrinadores acreditam que assim se sucedendo, estar-se-ia menosprezando valores fundamentais como "equidade" e "proporcionalidade".

Por fim, considerando que, ao delatar seu comparsa, o réu colaborador fica entregue à própria sorte, necessitando de efetiva proteção para que seja garantida a preservação de seus direitos humanos, alguns acreditam que não poderia, na prática, o instituto da delação premiada ter aplicação ante à falta de condições por parte do Estado em garantir a integridade física do delator e de sua família.

Para abordagem do tema em si, utilizar-se-á método dedutivo, vez que, com o intuito de demonstrar a importância do instituto da delação premiada no Direito Brasileiro rechaçando suas críticas, partir-se-á do geral para o particular.

No Primeiro Capítulo, tratar-se-á da delação premiada no Direito Comparado e nos crimes transnacionais, abordando, além, quais as razões fáticas e ideológicas que determinaram sua criação.

O Segundo Capítulo tratará da delação premiada no Direito Brasileiro. Sua edição será contextualizada expondo-se um breve histórico acerca das disciplinas normativas que tratam do instituto no Brasil, as razões fáticas do legislador ordinário, o conceito de delação premiada, seus requisitos e benefícios, o momento para a delação, sua natureza e valor como prova, bem como a delação em face do Princípio Constitucional do Contraditório.

No Terceiro Capítulo, serão analisadas as principais críticas dirigidas ao instituto.

Mister consignar que este trabalho não visa esgotar toda a matéria, mas, valendo-se dos pontos de vista de renomados estudiosos do Direito, destina-se a traçar respostas às questões polêmicas dirigidas à figura da delatio, induzindo, destarte, a uma reflexão acerca do tema.


I - DELAÇÃO PREMIADA

1.1 Motivações fáticas e ideológicas

A moderna realidade social, somada ao acentuado avanço tecnológico experimentado pelo homem nos tempos atuais, serve para, além de trazer uma melhor qualidade de vida, fazer emergir novos tipos de crimes, marcando a vida contemporânea pelo fenômeno que já se chamou, com exatidão, de "inexorável expansão do crime".

A criminalidade evoluiu, logrando fragmentar a estrutura de diversos países, sem que quase nenhum tenha podido frear-lhe o ímpeto crescente.

As organizações criminosas são um fenômeno novo, nesse sentido Thales Tácito Pontes Luz de Pádua Cerqueira, cita trecho da palestra proferida pela professora Denise Frossard para os alunos do curso de Direito da PUC – Minas Contagem, em 19 de novembro de 1996:

Suas origens são tão antigas quanto as pirâmides do Egito e os bandos ordenados de ladrões, que pilhavam as câmaras onde eram depositados os tesouros dos faraós, ou ainda, nos bandos ordenados de ladrões, que se moviam em perseguição a Jesus Cristo, liderados por Barrabás. (on-line)

No entanto, independentemente do nível de desenvolvimento dos países, a incidência da macrocriminalidade parecia aumentar em todos eles, sendo as multinacionais do Crime Organizado conhecidas por vários nomes: Mafiya ou Organizacija (Rússia); Tríade Chinesa (Hong Kong, Taiwan e Pequim); Yakuzá (Japão); Narcoscartéis (Colômbia); Cosa Nostra (Sicília); Camorra (Nápoli); `Ndrangheta (Calábria); Máfia Americana ou US.Máfia (Estados Unidos); Comando Vermelho (Rio de Janeiro); Bicheiros ou Zoodroga (São Paulo e Rio); Máfias polonesa (Puzkow, Ozarow e Wolominde), mexicana, nigeriana e venezuelana (MAIEROVIRCH, on-line, a).

A criminalidade organizada foi um dos maiores desafios do final do século passado e parece ser a afronta deste século a ser enfrentada pelo aparato estatal de prevenção e manutenção da Ordem Pública, pois, sem fronteiras se proliferaram comprometendo a paz social.

Urgiu, portanto, a necessidade de reação para o combate da criminalidade, ao menos, sua redução a um nível que pudesse ser suportado pela sociedade.

Dessa feita, na Itália, o magistrado Giovanni Falcone, internacionalmente conhecido por sua luta contra a Máfia, com o intuito de obstruir o crescimento do poder das Máfias italianas, inovou, estimulando a colaboração do acusado, o que foi extremamente útil naquele país.

A colaboração foi implantada em diversos países sempre tendo em vista o combate à estrutura cada vez mais desafiante do crime organizado, como uma medida de política criminal.

Assim sendo, essa orientação de política criminal, consubstanciada no Direito Premial, consagrada no Direito Positivo de vários países, visa encontrar brechas na organização criminosa explorando a infidelidade criminal.

Infidelidade esta consubstanciada na quebra da affectio societatis, que configura um dos fatores positivos no combate mais enérgico de determinadas modalidades de crimes. Assim, com o rompimento de um dos principais elementos para a sobrevivência das organizações criminosas atuais, os Estados logram êxito na persecução criminal e, por isso, a delação não foi ignorada no sistema legal moderno.

1.3 Direito Comparado

Embora seja uma experiência nova no Brasil, a delação premiada, desde há muito está consolidada em outros países.

Assim, demonstra-se necessário informar acerca da existência da figura da colaboração premial no Direito Comparado, tecendo-se breves comentários.

1.3.1 Na Itália

Na Itália, houve um endurecimento das leis, o que provocou baixas na Máfia, estimulando a colaboração. A "Operação Mãos Limpas" (Operazione Mani Puliti), que visa restabelecer a punibilidade na Itália, conseguiu diminuir a violência no país.

A história da Máfia é antiga. Há quem sustente que surgiu com a unificação da Itália, em 1860, quando latifundiários perderam o direito de ter milícias privadas e formaram, em contrapartida, grupos armados para manter a estabilidade das relações econômicas entre camponeses e seus patrões.

Ocorre que, com o passar dos anos, a Máfia se consolidou. Tomando, inicialmente, as administrações locais, em seguida a magistratura e os órgãos de segurança. Tornando-se, desta forma, mais séria e sólida do que o próprio Estado, com leis claras e rigorosos códigos de ética.

[...] a máfia é uma associação nascida para delinqüir e com a finalidade de conseguir enriquecimento ilícito para os seus associados. Coloca-se parasitariamente como intermediária, impondo-se, com emprego de meios violentos, entre a propriedade e o trabalho, entre a produção e o consumo, entre o cidadão e o Estado. (MAIEROVITCH, on-line, b)

Essa realidade intensificou-se entre os anos 1950 e 1970, entretanto, apenas nos anos 80 a estrutura das organizações mafiosas começou a ser desvendada.

Os principais projetos de lei italianos contra associações criminosas são da autoria dos juízes Giannicola Sinisi e Giovanni Falcone, dentre os quais um, que estimula a participação dos chamados colaboradores da Justiça, converteu-se em lei (QUEIROZ, 1998, p. 87).

Visando conseguir o arrependimento, a confissão e a delação como instrumento de desarticulação do crime organizado atuante na Itália, criou-se, em 29 de maio de 1982, a Lei misure per la difesa dell´´ordinamento constituzionale.

A colaboração premiada nos moldes italiano apresenta-se de duas formas: os pentiti (arrependidos) e os dissociati (dissociados). Os primeiros tratam-se de criminosos que, antes da sentença condenatória, retiram-se da associação e fornecem informações acerca da estrutura da organização à Justiça. Quando a veracidade de suas denúncias é comprovada, logram a extinção da punibilidade e, tanto o colaborador quanto seus parentes próximos, passam a receber salário, moradia e plano de saúde do Estado, que se torna responsável por sua integridade física (SILVA, 1999, p. 04).

Os dissociati, de maneira diversa, esforçam-se para, antes da sentença, impedir ou diminuir as conseqüências danosas ou perigosas de crimes, obtendo a diminuição de um terço da pena (idem).

Interessante trazer que o primeiro a romper omertá, "Lei do Silêncio", foi o mafioso Tommaso Buscetta, dando início, assim, ao fenômeno dos pentiti, os arrependidos.

Os benefícios concedidos na Itália aos colaboradores situam-se principalmente no campo dos crimes cometidos contra a segurança interior do Estado, que seria, por exemplo, crime de seqüestro por motivo de terrorismo ou subversão, e contra a liberdade individual.

Assim, o artigo 289, §3º, do Código Penal italiano, reduz a pena do colaborador que possibilita que a vítima adquira a liberdade. Além disso, mesmo que tenha ocorrido a morte da vítima em decorrência do seqüestro, há redução em menor patamar, óbvio, se houve colaboração.

A ordem premial também se faz presente no artigo 630, §5º, do mesmo Codex, que substitui a pena de prisão perpétua pela de reclusão de 12 a 20 anos, bem como diminui de um a dois terços as demais penas ao partícipe que evitar que se produzam as conseqüências do delito ou ajudar na colheita de provas decisivas para a individuação ou captura dos demais co-autores ou partícipes.

Percebe-se também o prêmio aos colaboradores da justiça no âmbito do narcotráfico, havendo a diminuição de pena àquele que evitar as ulteriores conseqüências da atividade delituosa ou ajudar a impedir o cometimento de delitos, favorecendo a ação repressiva.

A técnica de relevância premial italiana é exclusivamente direcionada ao desmantelamento da Máfia e visa derrocar sua estrutura de atuação eficiente e sigilosa.

1.3.2 Nos Estados Unidos

O Direito norte-americano, igualmente, contempla a plea bargaining, instituída como medida de política criminal que não passa de instrumento de autocomposição de litígios.

No sistema americano, repousa a idéia de que a verdade é fruto de uma decisão consensual sistematicamente negociada. Isto vale para a barganha que se faz entre a promotoria e a defesa, quando o réu se declara culpado (plea bargain ou plea guilty) (LIMA, 1999, p. 28).

Assim, é comum nos Estados Unidos existir prêmio àqueles que colaboram para a elucidação de delitos, principalmente em se tratando de crimes complexos cometidos por evoluídas organizações.

Apesar das críticas que o sistema americano sofre por apresentar diferentes soluções para os conflitos por meio do Judiciário e da promotoria e polícia - com suas diferentes bargains -, o mais importante é que sua lógica é una e inequívoca: a verdade pública é fruto de uma negociação explícita e sistemática entre as partes interessadas (ibidem, p. 29).

Wálter Fanganiello Maierovitch com propriedade destaca:

[...] é largamente aplicada no Processo Penal norte-americano, com os mais surpreendentes e espantosos acordos (agreement). Inúmeros são os casos de avenças disparadas: admite-se trocar homicídio doloso típico por culposo; tráfico por uso de drogas; roubo qualificado pelo emprego de arma de fogo por furto simples. Para os críticos mais severos, trata-se de prática lúdica, quando se nota que dez crimes variados são trocados pela declaração de culpabilidade (plea of guilty) de apenas um, que pode ser até o menos grave. A plea bargaining visa, fundamentalmente, a punição, ainda que branda e socialmente injusta. É justificada como poderoso remédio contra a impunidade, diante do elevado número de crimes a exigir colheita de prova induvidosa da autoria, coma conseqüente pletora de feitos e insuportável carga de trabalho do judiciário. (1989, p. 15)

Importante trazer que a experiência mais antiga de proteção a colaboradores da justiça iniciou-se em 1789, com a criação do US Marshall’s Service, nos Estados Unidos da América.

O US Marshall’s Service destinava-se, inicialmente, à proteção de membros do Poder Judiciário e testemunhas de acusação em crimes federais.

Devido ao crescimento do poder subversivo dos grandes grupos criminosos, e da necessidade de enfrentar — e vencer — o desafio do aumento da criminalidade organizada, o US Marshall’s sofreu, a partir de 1960, uma considerável mudança, passando a compreender outros tipos de crimes.

Atualmente, o US Marshall’s Service atua por meio do programa Witness Security Program que garante a segurança de pessoas ameaçadas, que arriscam suas vidas colaborando com a justiça americana no combate ao crime organizado e demais atividades criminais significativas (FELIX, 2000, p. 293).

Este programa protege, além das vítimas e testemunhas, os delatores.

1.3.3 Na Espanha

Na opinião de alguns pesquisadores, a Espanha foi um dos países que importou a "Lei dos Arrependidos".

Encontra-se presente na Espanha a figura do arrependimento processual que estabelece a atenuação da pena.

Para isso, mister a presença de algumas condições: a) abandono das atividades delituosas; b) confissão dos fatos delituosos nos quais tenha participado; e c) ajuda a impedir a produção do delito ou auxiliar na obtenção de provas para a identificação ou captura dos demais, ou, ainda, cooperação eficaz para a consecução de provas que impeçam a atuação ou desenvolvimento das organizações criminosas em que tenha participado.

Na verdade, o legislador espanhol consagra a colaboração tanto preventiva quanto repressiva, exigindo que a colaboração seja eficaz para a concessão da benesse.

Trata-se, no caso, da figura do testigo de La Corona, pela qual o Estado, por razões de interesse público, concede imunidade ao acusado, o qual perde tal condição ou sequer chega a adquirir esse status (OLIVEIRA JUNIOR, 2001, p. 275).

1.3.4 Na Alemanha

Na Alemanha, existe a Kronzeugenrelegelung, em que o Estado concede um prêmio ao acusado que colabora com a justiça.

O Código Penal alemão trata do arrependimento post delictum em que há a exclusão da responsabilidade criminal em decorrência de uma colaboração eficaz do agente, ou seja, quando logra evitar que o resultado antijurídico se efetive.

Por outro lado, o aludido Codex estabelece o benefício à colaboração não impeditiva do resultado, mas que, ao menos, diminua o perigo provocado, impeça que a atividade criminosa seja levada a efeito ou sucedida por outra ou contribua para que a associação criminosa se extinga. Nesse caso, quando o resultado é completo e eficaz, é concedida a impunidade total ao delinqüente.

A Lei de 9 de junho de 1989 prevê a faculdade do Estado abrir mão da persecução penal, quando o acusado prestar informações idôneas para impedir ou esclarecer o delito de terrorismo ou conexo ou capturar seus autores (Ibidem, p. 274).

Ademais, se o agente atuar voluntária e seriamente para impedir a resistência de associações criminosas ou a realização de seus objetivos, revelando à autoridade tudo o que sabe, pode receber as benesses da diminuição da pena ou do perdão judicial.

1.3 No combate aos crimes transnacionais

As organizações criminosas existentes no mundo vêm multiplicando seus interesses e investimentos para além das fronteiras dos seus países de origem, o que acarreta uma integração crescente dos vários grupos criminosos do mundo inteiro numa teia interligada.

As organizações criminosas dos vários países conectaram-se por meio da chamada netwoork criando seu Mercado Comum, cuja instituição é anterior à data da celebração do Tratado de Maastrich, que instituiu o Mercado Comum Europeu (Maierovitch, on-line, a).

Wálter Fanganiello Maierovitch abordando a questão escreve:

Em síntese e usando de uma imagem, o mapa-múndi é uma grande cabeça tomada pelas metástases decorrentes de um tumor maligno chamado crime organizado transnacional. E os cancros proliferam pela incredulidade dos que não temem pela perda da cidadania e da paz.(on-line, a)

O crime organizado transnacional inclui ameaças como o narcotráfico internacional, o contrabando de armas, a lavagem de dinheiro, a evasão fiscal internacional, a corrupção administrativa, os seqüestros, os assassinatos, a violência, a violação de direitos humanos e os crimes ambientais, entre outras (BRINDEIRO, 2000, p. A-3).

No entanto, a transnacionalidade contribui principalmente para o sucesso da lavagem de capitais, fato este que se caracteriza por um conjunto de operações pelas quais bens ou dinheiro resultantes da atividade criminosa, ocultando tal procedência, integram-se no sistema econômico ou financeiro.

Importante ressaltar que embora a lavagem de capitais esteja intimamente ligada ao fenômeno da transnacionalidade, o narcotráfico, a corrupção, dentre outros geralmente gravitam em torno da lavagem de dinheiro.

O combate do crime transnacional exige cooperação internacional, inclusive o Doutor Geraldo Brindeiro, sobre o tema, ponderou:

O Ministério Público brasileiro, o interamericano e o internacional [...] têm, nos últimos cinco anos, estreitado a cooperação no interesse comum e discutido intensamente novas formas de atuação no sentido do aprimoramento das investigações, da persecução criminal e da cooperação internacional no combate à criminalidade. Discussões, debates doutrinários e de direito comparado, especialmente à luz dos modelos adotados nos países de "common law" e de "civil law" (quanto a direção das investigações, a inquéritos policiais e a juizados de instrução, magistrados e Ministério Público), têm havido sobre a modernização da legislação nacional para fazer frente aos presentes desafios.

Pretendemos ainda a institucionalização de novos instrumentos jurídicos para a maior eficiência da ação da Justiça.

Em vários países, em alguns casos no Brasil, foram criados programas de proteção a testemunhas, de formas de "plea bargaining" com réus colaboradores, de agilização da quebra de sigilo bancário e fiscal, de bloqueio de contas e de confisco de bens em ações civis nas hipóteses de bens ou rendas de origem não-comprovada.

Isso além da utilização informal de moderna tecnologia (fax, telefonemas, e-mails, home pages), para maior comunicação entre os membros do Ministério Público, e da formação de forças-tarefa com agilidade no combate ao crime, nacional ou transnacional, organizado.

A melhoria da cooperação internacional abrange também a necessidade de aprimoramento e de inovações no uso tradicional dos sistemas de extradição, de tratados de assistência jurídica recíproca (mutual legal assistance treaties), considerando a diversidade jurídica de modelos, e sua revisão, especialmente quando há nacionais envolvidos em tráfico de drogas, além da instalação - que se pretende no médio prazo, a despeito dos votos contrários de dois membros do Conselho de Segurança da ONU: Estados Unidos e China - do Tribunal Penal Internacional, cuja criação foi aprovada, em julho de 1998, em Roma, na reunião dos plenipotenciários das Nações Unidas, com voto favorável do Brasil.

Em abril deste ano, em Viena, sob os auspícios das Nações Unidas (United Nations Office for Drug Control and Crime Prevention), foi elaborado o texto da Convenção Multilateral contra o Crime Transnacional Organizado, que foi aprovado em conferência da ONU realizada na semana passada na cidade de Palermo, na Sicília (Itália).

Não há lugar nesse combate para a ação isolada individual: o trabalho é de equipe e em parceria com outros órgãos responsáveis. Além disso é indispensável a realização de reformas no Judiciário, para evitarmos a lentidão da prestação jurisdicional, os recursos protelatórios, a prescrição e a impunidade.

No Estado Democrático de Direito, todavia, não podem ser violados princípios constitucionais para uma suposta maior eficiência na luta contra o crime. (2000, p. A-3).

Com efeito, nova política criminal, com medidas efetivas anti-reciclagem; dever de vigilância das instituições financeiras e adoção de institutos processuais novos, como, por exemplo, o Direito Premial, aos colaboradores da justiça, e programa de proteção a testemunhas, fazem-se imprescindíveis no combate ao crime internacional.

Já em 1970, os Estados Unidos elaboram a primeira legislação anti-reciclagem que registrava e investigava depósitos bancários superiores a US$ 10.000, entretanto, por meio de depósitos de US$ 9.999, em diversas agências bancárias as organizações burlavam a lei (Maierovitch, on-lineI,a).

Verifica-se, portanto, que o incentivo do acusado para a indicação do local onde esteja o produto da lavagem ou da ocultação, por exemplo, constitui um importante meio de enfrentar uma organização criminosa.

Na Europa, por exemplo, foi dispensada uma atenção especial ao problema, com a edição de normas destinadas ao combate da criminalidade organizada internacional, como a Recomendação de 20 de dezembro de 1996, do Conselho da Europa, cujo objeto são colaboradores da justiça contra a modalidade delitiva aludida (OLIVEIRA JUNIOR, 2001, p. 275).

A União Européia, como organização supranacional, que unificou os países daquele continente, eliminando barreiras, visava, como objetivo inicial, apenas a integração econômica e monetária. Atualmente, visa maiores integrações, inclusive no campo da Sociologia Jurídica e do Direito.

Surgiu, portanto, o Direito Comunitário com capacidade de criar um direito igual para toda a União Européia, inovando e superando em muitos aspectos as organizações internacionais tradicionais, o que facilita, sobremaneira, o combate aos crimes transnacionais.


II - DELAÇÃO PREMIADA NO BRASIL

2.1 Disciplinas normativas

Seguindo uma tendência político-criminal moderna, o legislador disciplinou a colaboração premiada no Brasil.

Tratando do tema em comento, Eduardo Araújo da Silva afirma:

Reforça-se, portanto, o instituto da colaboração premiada no Direito nacional, com a introdução da figura assemelhada aos pentiti do Direito italiano, como forma de possibilitar aos agentes do Estado romper as rígidas regras da lei do silêncio que caracterizam a criminalidade organizada (a omertá das organizações mafiosas italianas). (1999, p. 05)

A primeira lei a cuidar da delação premiada no Brasil foi a Lei n.º 8.072, de 26 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, a qual previu a redução da pena de 01 (um) a 02 (dois) terços para o participante ou associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento. Após, não obstante os mais diferentes termos utilizados, diversas legislações trouxeram-na em seu corpo.

Em 03 de maio de 1995, foi sancionada a Lei n.º 9.034 que dispõe "sobre a utilização de meios operacionais para a repressão de ações praticadas por organizações criminosas", considerando, nos moldes da lei anterior, a delação causa de diminuição de pena.

Houve, no entanto, uma suavização da expressão utilizada na Lei que dispõe sobre Organizações Criminosas em relação à dos Crimes Hediondos, vez que nesta o legislador foi explícito ao utilizar o verbo "denunciar" enquanto naquela teve primazia a expressão "colaboração espontânea", consoante se verifica das transcrições:

Lei nº 8.072/90, art. 8º, parágrafo único – O participante que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu desmantelamento, terá a pena reduzida de 1 (um) a 2/3 (dois terços).

Lei nº 9.034/95, art. 6º - Nos crimes praticados em organização criminosa, a pena será reduzida de um a dois terços, quando a colaboração espontânea do agente levar ao esclarecimento de infrações penais e sua autoria.

Após, a Lei nº 9.080, de 19 de julho de 1995, também tratou da delação premiada ao acrescentar um dispositivo à Lei nº 7.492/86, chamada de Lei dos Crimes de Colarinho Branco, que trata dos crimes contra o Sistema Financeiro Nacional, prevendo a delação premiada nas infrações praticadas em co-autoria ou por quadrilha, mediante a redução da pena de 01 (um) a 02 (dois) terços, utilizando, no entanto, a expressão "confissão espontânea".

Importante também a Lei nº 9.269/96, que alterou o artigo 159, §4º, do Código Penal, estabelecendo a delação premiada com a redução de pena acima exposta, quando o crime for cometido em concurso e o concorrente denunciar à autoridade, facilitando a libertação do seqüestrado.

Na Lei de Lavagem de Dinheiro (Lei nº 9.613/98), foi disciplinada a diminuição de pena para o "colaborador espontâneo". Esta Lei quis abranger a iniciativa do criminoso em colaborar com o Estado na apuração da materialidade e autoria do delito ou na localização do seu objeto material.

Lei nº 9.613/98, art. 1º, § 5º - A pena será reduzida de um a dois terços e começará a ser cumprida em regime aberto, podendo o juiz deixar de aplicá-la ou substituí-la por pena restritiva de direitos, se o autor, co-autor ou partícipe colaborar espontaneamente com as autoridades, prestando esclarecimentos que conduzam à apuração das infrações penais e de sua autoria ou à localização dos bens, direitos ou valores objeto do crime.

Com efeito mais significativo, a Lei n.º 9.807/99 estabeleceu a possibilidade de perdão judicial e a conseqüente extinção da punibilidade ao acusado colaborador (art. 13, da Lei n.º 9807/99), dispondo:

Lei nº 9.807/99, art. 13 - Poderá o juiz, de ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a conseqüente extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que dessa colaboração tenha resultado:

I - a identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa;

II - a localização da vítima com a sua integridade física preservada;

III - a recuperação total ou parcial do produto do crime.

Parágrafo único. A concessão do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiado e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso.

Além de disciplinar a delação premiada, esta Lei prevê a aplicação de medidas especiais de segurança e proteção à integridade física do réu colaborador, demonstrando um avanço em relação às demais legislações.

2.2 Motivações fáticas

As notícias oferecidas sobre a delação premiada, nas legislações penais permitem verificar a preocupação, sempre crescente, do legislador pátrio com o estímulo à busca da verdade material na persecução penal.

Acerca da busca da verdade real no processo penal, José Frederico Marques (2000, pp. 352/353) cita a observação de Jean Patarin, no sentido de que a defesa da sociedade e o interesse da repressão exigem que se empreguem todos os meios para a descoberta do culpado e para a aquisição de exato conhecimento de todas as circunstâncias da infração, no entanto, traz limitações à investigação e à prova afirmando ser inadmissível, na Justiça Penal, a adoção do princípio de que os fins justificam os meios para legitimar a procura da verdade por qualquer fonte.

Em fins da década de 80, o Brasil apresentava índices crescentes da prática de tráfico de entorpecentes, furtos, roubos, extorsões mediante seqüestro, dentre outros delitos considerados violentos pela sociedade em geral (FRANCO, 1994, p. 78/100 passim).

Embora o Brasil não tenha efetivamente sofrido com o terrorismo político como a Alemanha, a Itália, a França e a Inglaterra, sofreu algumas ações isoladas de grupos e organizações, surgindo assim, a necessidade de resposta enérgica e eficaz (ibidem, p. 315).

A criminalidade e a violência acentuavam-se e a divulgação emotiva dos índices de criminalidade pela mídia contribuiu sobremaneira para a edição de leis penais na década de 90, pois fazia com que a sociedade reclamasse soluções imediatas e eficientes.

José Augusto de Souza Rodrigues contextualiza:

As metáforas utilizadas pela grande imprensa ao longo dos anos oitenta para narrar o que era definido então como a selvagem irrupção da barbárie nas ruas do Rio, tinham a sua raiz no diagnóstico de que a cidade caminhava inexoravelmente para o modelo de Medellin de guerra civil não declarada entre, de um lado, o poder público corrupto e omisso e, de outro, um estado paralelo representante do poder bandido. A partir disso, todo o noticiário sobre violência urbana passou a interpretar todos os acontecimentos como prefigurações desse futuro sombrio. (1996, p. 275)

Nesse ambiente de medo e insegurança, legisladores brasileiros audazes, inseriram, na legislação comum, mais precisamente na Lei dos Crimes Hediondos, o instituto da delação premiada.

O fundamento da introdução da delação premiada na legislação pátria é exclusivamente político, pois se objetivou instituir um estímulo à colaboração com a justiça.

Damásio Evangelista de Jesus, um dos grandes penalistas brasileiros, em sua obra Novíssimas questões criminais, consigna que:

Criaram-se as figuras que batizamos, respectivamente, de delação premiada e traição benéfica (Anotações à Lei 8.072/90 – crimes hediondos, Fascículos de Ciências Penais, Porto Alegre, n. 4, p. 11, 1990). Recheados de imperfeições, expressões dúbias e termos tecnicamente impróprios, como se tivessem sido elaborados por leigos em matéria penal, os dispositivos que instituíram os dois casos de delação premiada deram-nos intenso trabalho de interpretação [...] (Ob. Cit. p.27)

Alberto Silva Franco, ao comentar a criação da delação premiada, assim conclui:

É lamentável que o legislador de 90, tão pressuroso em alongar penas, não tenha observado que o único benefício, por ele concedido, encerre uma conseqüência punitiva tão injusta e signifique até um estímulo para a formação de quadrilha ou bando. (1994, p. 142)

A consagração de artigos de lei tratando especificamente da delação premiada como medida de estímulo ao agente do crime, mitigando sua pena, induzem ao pensamento de que sua função principal é a de conceder benefícios ao agente do crime que, arrependido, contribui para o combate da macrocriminalidade.

No entanto, com a Lei dos Crimes Hediondos, vislumbrava-se a explícita finalidade de libertar o seqüestrado, provocando o comprometimento e conseqüente punição dos demais autores ou partícipes do delito. Incoerente, pois, a afirmação de que se tratava, neste caso, de um instituto com fim precípuo de premiar o colaborador (ibidem, p. 319).

Consoante o entendimento do mesmo Alberto Silva Franco:

Através do expediente de premiar o delator (crownwitness), o legislador de 90 procurou atenuar a responsabilidade criminal do delinqüente que empreste sua colaboração, fornecendo à autoridade dados úteis que facilitem a libertação do seqüestrado. O prêmio punitivo, conforme a observação de Emiro Sandoval Huertas, constitui "uma nova forma de reforçar a tutela de interesses basicamente individualistas mediante manipulação dos parâmetros punitivos" (ob. cit. p. 61). E tanto é exato que a delação premiada foi incluída, no ordenamento penal comum, na figura delituosa da extorsão mediante seqüestro, ou seja, no tipo que tutela, de forma explícita, os interesses de pessoas do mais alto segmento social e econômico do país. (2002, p. 1238)

O Estado nacional, com a ajuda da delação, procurou atingir o objetivo da luta contra o crime, em defesa da segurança social.

Com efeito, nos sistemas penais modernos, denota-se a presença marcante de inovações no combate à criminalidade, entretanto, nos moldes em que foi instituída no Brasil, a delação premiada consistiu em uma inovação de aplicação reduzida, vez que, inicialmente, era empregada apenas em relação à extorsão mediante seqüestro e à quadrilha ou bando.

Ademais, no início, o Estado não garantia a segurança do colaborador, o qual fatalmente seria exterminado pelos demais criminosos.

O juiz federal Élio Wanderley de Siqueira Filho (1995, p. 43), ao tecer comentários acerca da Lei nº 9.034/95, ressalta que a delação é uma figura jurídica que, caso bem empregada, muito auxiliará na busca da verdade material acerca das infrações penais.

Importante salientar que, embora o instituto tenha sido repetido em legislações subseqüentes à Lei dos Crimes Hediondos, a omissão acerca da proteção perdurou. Tão-somente com a Lei nº 9.807, de 13 de julho de 1999, que dispõe, dentre outras coisas, sobre a proteção de acusados ou condenados que tenham voluntariamente prestado efetiva colaboração à investigação policial e ao processo criminal, pôde-se vislumbrar um avanço rumo a diminuição da impunidade.

Destarte, por visar a proteção e a integridade dos réus colaboradores e a satisfação do "princípio da verdade real", que deve nortear o processo penal pátrio, a legislação supra gerou a crença de que, a partir de sua vigência, muitos crimes seriam esclarecidos. Ocorre que, após 04 (quatro) anos de sua entrada em vigor pouca coisa mudou.

2.3 Conceito

O verbo delatar significa denunciar o autor do crime; trair (BUENO, 1996, p. 184).

De Plácido e Silva, em sua obra Vocábulo Jurídico (1982, p. 23), ao definir delação consigna que: originado de delatio, de deferre (na sua acepção de denunciar, delatar, acusar, deferir), é aplicado na linguagem forense mais propriamente para designar a denúncia de um delito [...].

Segundo José Q. T. de Camargo Aranha (1999, p. 122), delação, ou chamamento de co-réu, trata-se da afirmativa feita por um acusado, ao ser interrogado em juízo ou ouvido na polícia, e pela qual, além de confessar a autoria de um fato criminoso, igualmente atribui a um terceiro a participação como seu comparsa.

Fernando Capez (2003, p. 298) define a delação premiada como sendo a afirmativa feita por um acusado, ao ser interrogado em juízo ou ouvido na polícia. Além de confessar a autoria de um fato criminoso, igualmente atribui a um terceiro a participação como comparsa.

Assim, tem-se que delação premiada é a atribuição da prática de um crime a terceiro, realizada pelo acusado, em seu interrogatório, concomitantemente com a confissão de sua participação no delito.

A delação não é confissão (strictu sensu), pois para sua configuração o fato é tão somente dirigido a quem depõe.

Também não se trata de testemunho, porque quem presta seu testemunho mantém-se eqüidistante das partes.

Assim, se o interrogado apenas atribuir o fato a terceiro, sem confessar, estará somente prestando seu testemunho, uma vez que a delação somente ocorre quando o réu também confessa.

Trata-se de um estímulo à verdade processual, semelhantemente à previsão da confissão espontânea como circunstância atenuante no Código Penal (art. 65, III, "d", do Código Penal), sendo, portanto, instrumento que ajuda na investigação e repressão de certas formas de crimes, notadamente aqueles que apresentam conotações organizadas.

2.4 Benefícios e requisitos para sua concessão

2.4.1 Perdão Judicial

A Lei de proteção a vítimas, testemunhas e réus colaboradores (Lei nº 9.807/99) concedeu duas benesses ao réu colaborador, quais sejam, o perdão judicial e a redução de pena de um a dois terços.

David Teixeira de Azevedo assim define o perdão judicial:

O perdão judicial é medida de política-criminal por meio da qual, reconhecida a existência de todos os pressupostos de existência do delito, e com fundamento na prevenção especial e geral de crimes, considera-se extinta a punibilidade do delito, para o qual a pena se mostra desnecessária e inútil. Trata-se, como adverte Mario Duni, de um desvio lógico do magistério punitivo, que deixará de punir uma conduta que preenche todos os requisitos legais de punição. (1999, p. 06)

Guilherme de Souza Nucci (2002, p. 346) admite tratar-se da clemência do Estado para determinadas situações expressamente previstas em lei, quando não se aplica a pena prevista para determinados crimes, ao serem preenchidos certos requisitos objetivos e subjetivos que envolvem a infração penal.

Logo, tem-se que o perdão judicial é a regra pela qual o juiz, não obstante comprovada a prática do delito pelo acusado, deixa de aplicar a pena em face de justificadas particularidades. O Estado abdica, por meio da declaração do magistrado, na própria sentença, à pretensão da imposição da pena.

Para a concessão do supramencionado benefício, deverá o réu ser primário e ter colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, bem como deverá sua colaboração ter resultado na identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa, na localização da vítima com a sua integridade física preservada ou na recuperação total ou parcial do produto do crime.

Não obstante muitos asseverem ser um direito subjetivo do réu delator, o qual, desde que preenchidos os requisitos legais de natureza objetiva e subjetiva, fará jus ao benefício, há quem diga que não se trata de puro direito subjetivo público, vez que, após a verificação de que o acusado preenche todos os requisitos objetivos expressos em lei, o magistrado, consoante seu prudente arbítrio, apreciará os requisitos subjetivos (NUCCI, 2002, p. 06).

Destarte, foi dada ao julgador a possibilidade de não conceder o perdão judicial, mesmo presentes todos os requisitos, no entanto, deverá o juiz substituir pela redução da pena.

Urge ressaltar que a expressão "poderá" disposta no artigo legal não tem natureza de simples faculdade, no sentido de o magistrado, sem fundamentação, dispensar ou não a pena.

Os requisitos objetivos, para a obtenção dessa benesse, consistem na colaboração efetiva com a investigação e o processo criminal decorrente da identificação dos demais co-autores ou partícipes do delito, ou a localização da vítima com sua integridade física preservada, ou a recuperação total ou parcial do produto do crime, consoante já noticiado.

A colaboração efetiva deve ter sido eficaz, ou seja, permitindo os efeitos exigidos pela norma (identificação dos demais co-autores ou partícipes da ação criminosa, a localização da vítima com sua integridade física preservada, ou a recuperação total ou parcial do produto do crime) (JESUS, 1999, p. 05).

Vale salientar que acerca da eficácia, David Teixeira Araújo assim entende:

O requisito da efetividade da colaboração não se confunde, portanto, com sua eficácia, dada a condição prevista na parte final do dispositivo. Para a concessão do perdão judicial, deve a colaboração ser voluntária, efetiva e de algum modo ser eficaz, a produzir ao menos um dos efeitos desejados que empolgaram o acusado a colaborar [...] A eficácia, destarte, coloca-se como resultado posterior que independe da natureza da colaboração. Isto é, sendo a colaboração voluntária e efetiva, dela poderá surgir ou não um dos três resultados previstos nos incisos, qualquer deles capazes de justificar o perdão judicial, que se funda, como se verá a seguir, na menor culpabilidade do agente e na finalidade da sanção penal em face dessa menor reprovabilidade. Se, todavia, nenhum dos resultados advier de uma colaboração caracteristicamente voluntária e efetiva, faltará um requisito de ordem objetiva. (1999, p. 06)

A Lei menciona em seu artigo 13, inciso I, "identificação dos demais co-autores ou partícipes". Assim, não é possível conceder o perdão judicial se não forem identificados todos os participantes da ação criminosa.

O requisito que se refere à localização da vítima com sua integridade física preservada (artigo 13, inciso II, da Lei nº 9.807/99) impede que se conceda a benesse se for verificado que a vítima sofreu maus-tratos, não bastando que o sujeito passivo seja encontrado vivo.

Como a Lei menciona "vítima" no singular, o entendimento mais coerente é no sentido de que quando houver mais de um sujeito passivo, ou seja, concurso de vítimas, a localização de apenas uma delas não permite a concessão do perdão judicial (JESUS, 1999, p. 05).

Por último, tem-se a recuperação total ou parcial do produto do crime (artigo 13, inciso III, da Lei nº 9.807/99), que dispensa maiores comentários.

Na verdade, tratam-se de requisitos alternativos, ou seja, uma vez atendido um deles, o réu colaborador poderá, se preencher os requisitos subjetivos, receber o perdão judicial.

Há quem entenda que não existe uma cumulatividade, tampouco uma alternatividade propriamente dita e sim condições cumulativas restritas ao tipo penal, isto é, uma cumulatividade temperada ou condicionada (KÖNIG, 2000, p. 06).

Para o advogado Sérgio Donat König (2000, p. 06), se houver co-autores e partícipes todos deverão ser identificados, se, além disso, houver vítimas também deverão ser libertadas todas as vítimas com sua integridade física preservada. Por fim, nos crimes em que há co-autores ou partícipes, vítimas e produtos do crime, devem todos ser identificados, todas as vítimas localizadas e com sua integridade física preservada e os produtos do delito recuperados total ou parcialmente.

Com isso, para que o acusado goze do direito ao perdão judicial, deve satisfazer todos os incisos do artigo 13, da Lei nº 9.807/99, voluntariamente.

Contudo, não é esta a opinião que prevalece, pois os pré-requisitos de ordem objetiva, como já salientado acima, devem ser alternativamente considerados.

Consoante Antré Stefan Araújo Lima:

Os requisitos do art. 13 são alternativos, de modo que não é preciso sempre permitir a identificação dos demais autores, mais a recuperação do produto do crime e mais a libertação da vítima. Fossem cumulativos os requisitos, somente a extorsão mediante seqüestro o admitiria. (on-line)

As condições pessoais ou subjetivas são a voluntariedade da colaboração; a primariedade e personalidade favorável do beneficiado (art. 13, caput e parágrafo único, da Lei nº 9.807/99).

No que refere à voluntariedade, a doutrina é unânime ao asseverar ser desnecessária a espontaneidade do ato.

A lei requer unicamente que o ato seja voluntário e, portanto, conclui-se que a exigência da espontaneidade para aplicação do benefício é ilegal.

Ademais, saliente-se que há nítida diferença, realizada pelo próprio legislador pátrio, entre ato voluntário e ato espontâneo.

O ato espontâneo reveste-se da qualidade do arrependimento, é um ato que nasce unicamente da vontade do agente sem qualquer interferência na idéia inicial. A pessoa, por si só, julga conveniente tomar certa atitude.

Já o ato voluntário é aquele sem qualquer coação, no qual a idéia inicial pode ou não ter partido do agente, sendo irrelevante o motivo que o fez tomar tal atitude.

Nesse sentido é que David Teixeira de Azevedo Araújo (1999, p. 06) explica a voluntariedade, asseverando que o imprescindível é ter sido a contribuição voluntária e efetiva, isto é, não resultante de nenhuma coação externa irreversível e caracterizada pela presença positiva e interessada do acusado.

Alberto Silva Franco salienta que:

Para que se possa reconhecer a delação premiada, a conduta do delator deve ser relevante do ponto de vista objetivo e voluntária, sob o enfoque subjetivo. [...] A atitude do delator deve ser voluntária, isto é, uma manifestação própria, pessoa, no sentido de abandonar quer o propósito de protrair a duração do seqüestro, quer o de conseguir o proveito econômico. Pouco importa que tal conduta não tenha sido espontânea. Tem o mesmo significado a declaração que resulte do um arrependimento efetivo e sincero, ou que tenha sido feito por mero cálculo, ou que tenha decorrido de um sentimento de vingança. Não interessa para efeito da delação a motivação do delator. (1994, p. 320)

O segundo requisito pessoal a ser analisado pelo magistrado trata-se da primariedade.

Entende-se por primário aquele que não possui sentença penal condenatória transitada em julgado contra si. Assim, não basta que o colaborador possua bons antecedentes, a lei exige que ele seja primário.

Por derradeiro, tem-se a apreciação da personalidade do acusado, e a natureza, circunstâncias, gravidade e repercussão social do delito. Todas essa questões estão diretamente ligadas à atividade estatal de avaliar adequação, oportunidade e conveniência de se aplicar o perdão judicial mediante a apreciação da culpa do agente e da finalidade da resposta jurídica da qual se vai abdicar. Aí repousa a coerência legislativa de permitir ao magistrado a aplicação ou não do instituto (ARAÚJO, 1999, p. 06).

O perdão judicial deve ser aplicado na sentença de mérito, sendo inadmissível no inquérito policial e sua natureza jurídica, conforme orientação jurisprudencial, é declaratória da extinção da punibilidade (art. 107, IX, do Código Penal) (RT 608/352, 607/319, 604/359, 610/367, 624/369, 626/310, dentre outras).

Constitui instrumento de despenalização, descabendo, destarte, a inclusão do nome do réu no rol dos culpados e sua condenação em custas, conforme pronunciamento do Superior Tribunal de Justiça.

2.4.2 Causa de diminuição de pena

O artigo 14, da Lei nº 9.807/99 prevê a diminuição da pena dispondo que, se o indiciado ou acusado colaborar voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação dos demais co-autores ou partícipes do crime, na localização da vítima com vida e na recuperação total ou parcial do produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de 01 (um) a 02 (dois) terços.

Portanto, se embora o acusado tenha colaborado voluntária e eficientemente com a justiça, mas desta colaboração não houver decorrido a eficácia, ou seja, um dos resultados legalmente previstos, o juiz poderá reduzir a reprimenda de 01 (um) a 02 (dois) terços.

O requisito para a diminuição da pena é a colaboração voluntária e efetiva.

Nesse sentido:

Como requisito traz a contribuição voluntária e efetiva, efetividade não obstante omitida do texto legal, contudo requisito conatural à concessão do benefício. Não há referência, como se viu à efetividade de tal colaboração, mas esse dado é da natureza do instituto. Não se refere também o legislador à consecução do resultado consistente na identificação dos ‘comparsas’, na localização da vítima ou na recuperação total ou parcial do produto do crime. (AZEVEDO, 1999, p. 07)

Mister ressaltar, ainda, que mesmo não tendo o legislador ordinário estabelecido requisitos para a redução da pena, não fazendo, inclusive, menção à primariedade, há, em certos casos, uma certa facultatividade para sua concessão, principalmente quando não se fizer presente a efetividade.

Destarte, a lei não fez maiores exigências para a concessão da redução da pena, no entanto, a redução poderá advir ou da não efetividade da colaboração ou da ineficácia da mesma.

Assim, se o réu colaborar na investigação voluntariamente, mas sem muito esforço, ou seja, sem o real fornecimento de informações e sem caráter contínuo, a colaboração não terá efetividade, mas mesmo assim permitirá a redução da reprimenda (AZEVEDO, 1999, p. 07).

Por outro lado, se houver colaboração voluntária e efetiva, mas sem eficácia, de rigor a diminuição da pena.

Dessa forma, tem-se que, se não houver efetividade na colaboração, poderá haver a redução. Ora, se apenas não se fizer presente a eficácia, tendo o réu se empenhado na descoberta da realidade delituosa fornecendo dados, informações e trabalhando permanentemente junto à polícia ou ao juízo, pontual deverá ser a diminuição.

Explica Paulo Martini que:

O quantum da diminuição é exatamente idêntico ao previsto nos casos de tentativa e arrependimento posterior, fato este que faz a delação, ainda que não tenha sucesso, ter os mesmos efeitos de tais institutos, conquanto apresentem desvalor social diferentes. (2000, p. 29)

É de todo conveniente salientar, que o instituto da delação premiada está ligado a uma corrente de política criminal que dá especial relevo ao fornecimento de dados verossímeis e úteis à investigação criminosa.

2.5 Momento da delação

Segundo Damásio Evangelista de Jesus (1999, p. 05), a oportunidade para a colaboração se dá durante a investigação criminal ou a ação penal.

Em torno do momento juridicamente apropriado para a delação repousa questão interessante.

Gonçalo Farias de Oliveira Júnior (2001, p. 281) considera que, pelo fato das leis regulamentadoras da delação premiada não fixarem qualquer limite temporal para o oferecimento das informações delatoras, a delação pode ser oferecida em qualquer fase da persecutio, sendo possível até mesmo posteriormente ao trânsito em julgado da sentença, estando ou não o condenadosubmetido à execução penal.

Ocorre que a colaboração do réu após o trânsito em julgado não se encontra expressamente contemplada na lei, no entanto, a ausência de disposição explícita a esse respeito não autoriza a negação da validade dessa argumentação jurídica (NASCIMENTO, on-line).

Assente é que o Direito Penal permite analogia de normas não-incriminadoras, e que os dispositivos relativos ao Direito Premial não descrevem qualquer figura típica, tratando-se, na verdade, de normas não-incriminadoras de caráter permissivo (ibidem, on-line).

A analogia para beneficiar o réu é sempre bem vinda no Direito Penal, merecendo destaque o ensinamento de Aníbal Bruno:

A proibição da analogia, que vigora para as normas de incriminação, resulta de um princípio que se insere no próprio contexto da lei penal. A analogia é inadmissível se dela resulta definição de novos crimes ou de novas penas, ou, se, de qualquer modo, se agrava a situação do agente. [...] Nas normas não incriminadoras, que escapam ao absoluto rigor dêsse princípio, e onde não há também que falar em excepcionalidade ou não excepcionalidade, porque essas normas não são exceções às normas incriminadoras, mas expressões, por si mesmas, de princípios gerais que se aplicam à matéria de que elas se ocupam, o processo de integração, por analogia, de possíveis lacunas tem todo cabimento, desde que não conduza a agravar a situação do delinqüente. É a chamada analogia in bonam partem. Não se apóia, portanto, essa aplicação da analogia em razões sentimentais, mas em princípios jurídicos, que não podem ser excluídos do Direito Penal, e mediante os quais situações anômalas podem escapar a um excessivo e injusto rigor. (1967, p. 211)

Diante das colocações transcritas, entende-se que as normas penais não-incriminadoras podem ser integradas por meio da aplicação analógica.

Diga-se, por conseguinte, que, quando a norma for permissiva, poderá ser estendida para o caso não disciplinado, desde que para suprir a omissão legislativa existente o aplicador da lei obedeça ao critério do favorabilia amplianda (NASCIMENTO, on-line).

Não bastasse a fundamentação trazida, os argumentos práticos expendidos por Antônio Vicente da Costa Júnior de que a melhor ocasião para se efetuar a delação é na fase de execução penal são deveras interessantes:

[...] durante a execução da pena, o abatimento pela ‘derrota’ enseja o momento de verdade. Os elos da cumplicidade são vencidos, os vínculos do solidarismo espúrio são dissolvidos, o temor do revide é desaquecido e, então, a fala da verdade é externada. Escassos serão os casos de colaboração efetiva e voluntária, durante a investigação ou o processo, ainda que insinuantes as compensações. E ainda quando ocorrerem constituirão afronta aos fundamentos da ordem jurídica que repele a impunidade, em troca de um dever de informação, convertido em obséquio à Justiça. (on-line)

Somando-se essas ponderações à disposição do artigo 621, inciso III, do Código de Processo Penal, que admite a revisão criminal quando, após a sentença, forem descobertas circunstâncias que determinem ou autorizem a diminuição especial da pena, coerente é a aplicação da analogia para permitir que o réu colabore com a justiça e receba o prêmio, mesmo após o trânsito em julgado da sentença.

2.6 A delação como meio de prova

Prova, do latim probatio, trata-se do conjunto de atos praticados pelas partes, pelo juiz e por terceiros visando levar ao juiz a certeza sobre a existência ou não de um fato, da falsidade ou veracidade de uma afirmação. Trata-se de qualquer meio de compreensão empregado com a finalidade de demonstrar a veracidade de uma alegação (CAPEZ, 2003, p.251).

Com a prova, o que se busca é a configuração real dos fatos sobre as questões a serem decididas no processo. Para a averiguação desses fatos, é da prova que se serve o juiz, formando ao depois sua convicção.

No Brasil, vigora o sistema da verdade real, ou da persuasão racional para apreciação das provas, portanto tem o juiz a liberdade de formar sua certeza.

O sistema ou princípio do livre convencimento ou da persuasão racional consiste no fato de que o juiz só pode decidir de acordo com as provas existentes no bojo dos autos. Mas, na sua apreciação, tem inteira liberdade de valorá-las. Não há hierarquia de provas. Se é certo ficar ele adstrito às provas constantes dos autos, não é menos certo que não fica subordinado a nenhum critério apriorístico no apurar, por meio delas, a verdade real - princípio norteador do Direito Processual Penal.

Em decorrência desse sábio princípio, a pacífica jurisprudência brasileira firmou a seguinte posição:

É válido, de acordo com o sistema adotado pelo Código de Processo Penal, que o Juiz forme sua convicção através de prova indireta, ou seja, a partir de indícios vementes que induzam àquele convencimento de maneira induvidosa.(RT 673/357)

José Q. T. de Camargo Aranha (1999, p. 122) consigna que o elemento essencial da delação é a confissão, pois admite que com a escusa de modo algum poderá atingir a pessoa apontada.

Assim, conforme já foi afirmado no item 2.3, quando o interrogado apenas confere o fato a terceiro, sem confessar, estará apenas prestando seu testemunho.

Ada Pelegrini Grinover abordando o dogma da verdade material afirma que:

O termo verdade material há de ser tomado em duplo sentido; de um lado, no sentido da verdade subtraída à influência das partes, por seu comportamento processual, queiram exercer sobre ela; de outro, no sentido de uma verdade que, não sendo ´´absoluta´´ ou ´´ontológica´´, há de ser antes de tudo uma verdade judicial prática, sobretudo, não uma verdade obtida a todo preço: uma verdade, isto é, processualmente válida. (1982, pp. 34/35)

Sendo assim, a delação, quando efetuada sem abusos por parte de agentes estatais, é apta a formar a convicção do magistrado, vez que se trata de prova processualmente admitida.

2.6.1 Natureza jurídica de prova

No que diz respeito à sua natureza como prova, mister algumas ponderações.

A delação não pode ser considerada tão-somente confissão, que vem a ser apenas a aceitação pelo réu das acusações que lhes são feitas, porque carece, para sua configuração, além da confissão, que o réu impute o mesmo fato a outrem.

Por outro diapasão, não pode ser considerada testemunho, pois neste há uma pessoa estranha ao feito que firma a existência do fato sem se comprometer.

Por isso, com acerto José Q. T. de Camargo Aranha (1999, p. 123) assevera não haver semelhança entre a delação e qualquer outra prova nominada. Concluindo tratar-se de prova anômala.

2.6.2 Valor como prova

Relativamente ao seu valor como prova, repousa divergência na doutrina e jurisprudência nacionais, havendo quem atribua à delação força incriminadora e quem renegue, podendo apenas ser valorada se tiver respaldo nas demais provas constantes dos autos.

Fernando Capez (2003, p. 289), com propriedade, atribui à delação força incriminadora salientando que tem o valor de prova testemunhal na parte referente à imputação e admite reperguntas por parte do delatado (Súmula n. 65 da Mesa de Processo Penal da USP).

José Q. T. de Camargo Aranha, ao emitir sua opinião a respeito, sustenta:

Temos para nós que a camada do co-réu, como elemento único de prova acusatória, jamais poderia servir de base a uma condenação, simplesmente porque violaria o princípio constitucional do contraditório.

Diz o art. 5º, LV, da Constituição Federal, que a instrução criminal será contraditória.

Ora, se ao atingido pela delação não é possível interferir no interrogatório do acusado, fazendo perguntas ou reperguntas que poderão levar à verdade ou ao desmascaramento, onde obedecido o princípio do contraditório? Se as partes, o acusado com seu defensor, obrigatoriamente devem estar presentes nos depoimentos prestados pelo ofendido e pelas testemunhas, podendo perguntar e reperguntar, sob pena de nulidade por violar o princípio do contraditório, como dar valor pleno à delação, quando no interrogatório e na ouvida só o juiz ou a autoridade policial podem perguntar?

No modesto entender não vale como prova incriminatória. E se outras existem, a condenação será uma resultante delas e não da chamada do co-réu. (1999, p. 125-126)

Malgrado o posicionamento supra, entende-se que não obstante seja o interrogatório um ato personalíssimo do juiz, o mesmo é realizado na presença do membro do Ministério Público e, eventualmente, na assistência do defensor tanto do delator quanto do delatado. Assim, o ato é fiscalizado pelo Ministério Público, por imposição legal, e também pelos defensores casualmente presentes, não se olvidando que, independentemente de tal "fiscalização", o juiz, que goza de absoluta idoneidade e de indiscutível imparcialidade, preside a marcha processual sempre tendo em vista o princípio da verdade real, ou seja, visando determinar os acontecimentos exatamente como se sucederam, a fim de permitir a justa resposta estatal, como já frisado anteriormente.

Ademais, é um momento em que o julgador tem a possibilidade de analisar minuciosamente todos os gestos, feições e palavras do réu.

Pode-se afirmar, sem dúvidas, que o interrogatório é um dos atos processuais penais mais importantes. É o meio pelo qual o juiz ouve o acusado sobre o fato que lhe é imputado e ao mesmo tempo colhe dados para o seu convencimento.

Ademais, o Código de Processo Penal determina que o juiz, ao interrogar o réu, lhe inquira a respeito de todas as circunstâncias que envolveram o fato, bem como se foi ele o seu autor, além de outros questionamentos indispensáveis.

Primeiramente, há o interrogatório de qualificação, ao réu será perguntado seu nome, naturalidade, filiação, residência, meios de vida ou profissão, lugar onde exerce a sua atividade e se sabe ler e escrever (artigo 188, caput).

Após, o réu será cientificado pelo juiz de qual acusação pesa sobre ele, passando, então, a ser interrogado acerca do mérito.

Assim, será o réu perguntado sobre onde estava ao tempo em que foi cometida a infração e se teve notícia desta (inciso I); se, tem conhecimento das provas contra ele apuradas (inciso II); conhece a vítima e as testemunhas (inciso III); sabe qual o instrumento com que foi praticada a infração ou qualquer dos objetos que com esta se relacione e tenha sido apreendido (inciso IV); ainda, se verdadeira a imputação que lhe é feita (inciso V).

O réu tem inteira liberdade de dizer o que quiser e bem entender, sendo assim, pode negar ou admitir a acusação, total ou parcialmente, ou ainda, calar-se.

Se o acusado admitir a acusação, reconhecendo ser o autor do delito, ou seja, confessar, deve o juiz indagar a respeito dos motivos que o levaram a cometer a infração e em que circunstância o fato ocorreu (artigo 190, do Código de Processo Penal), bem como sobre todos os demais fatos e pormenores que conduzam a elucidação dos antecedentes e circunstâncias da infração (inciso VII, do artigo 188, do Código de Processo Penal).

Neste caso, o acusado deve informar ao magistrado todas as circunstâncias que envolveram o crime, inclusive se havia co-autores ou partícipes.

Aqui entra o chamamento de co-réu e, possivelmente, a delação premiada.

Frise-se que ao magistrado é facultada a formulação de quaisquer perguntas que julgar pertinentes para a elucidação da verdade.

Na opinião de Fernando da Costa Tourinho Filho (1999, p. 389), a regra do artigo 188, do Código de Processo Penal, trata-se de excelente roteiro que não merece censura.

A maioria dos doutrinadores admite a natureza híbrida do interrogatório, isto é, que ele é tanto um meio de prova quanto de defesa.

Portanto, concomitantemente com sua defesa, o acusado ministra ao juiz elementos úteis à apuração da verdade, seja pelo confronto com provas existentes, seja por circunstâncias e particularidades das próprias declarações que presta.

Sendo assim, não há porque não admitir o valor condenatório da delação, cuja oportunidade para sua realização, embora ampla, se dá principalmente no interrogatório.

A esse respeito alguns julgados:

As declarações do co-réu de um delito têm valor quando, confessando a parte que teve no fato incriminatório, menciona também os que nele cooperaram como autores, especificando o modo em que consistiu essa assistência ao delito. (ACrim 20.994, TASP, Rel. Cunha Camargo, RT 419/295)

Confissão minudente e harmoniosa de comparsas na Polícia e em Juízo,supre a posição evasiva de réu que nega a co-autoria do delito. (Rv. Crim. 129.827, Rel. Ferreira Leite)

Prova. Confissão de co-autor. No campo probatório são valiosas tanto a palavra da vítima como as declarações de co-autor que, confessando sua atuação no delito, menciona o nome de outro participante, bem como a forma pela qual ele se deu.(JTACrim, 71/190)

PROVA CRIMINAL - Palavra de co-réus - Valor probante - Condenação. As palavras de co-réus que se mostram desprovidas de qualquer interesse ou paixão podem servir de suporte à condenação, na veemente prova circunstancial colhida nos autos. (TJMS-AP-Rel. José Rizkallah - RT 660/330)

A chamada de co-réu, que, na fase policial, não visou a eximir-se da própria responsabilidade, é suficiente para condenar o parceiro de roubo surpreendido na posse da res furtiva, quando, escoteiro a negativa deste, a prova testemunhal também confirmou, no contraditório, a apreensão em poder do mesmo, de parte do produto do crime e a delação do co-autor. (TACRIM-SP-AP - Rel. Haroldo Luis - RJD 20/147).

A chamada co-réu, isto é, a confissão do acusado envolvendo também outro personagem do crime, constitui valioso elemento probatório, ensejando a condenação da pessoa referida, se com apoio em outros elementos do processo. (TJSC-RC - Rel. Marcílio Medeiros - RT 479/381)

Percebe-se, no entanto, que a jurisprudência só admite valor probatório à delação quando o réu, além de assumir a sua culpa, indica seus comparsas na ação delitiva.

Danilo Lovisaro do Nascimento assim consigna:

A Lei não se afastou evidentemente desta orientação pretoriana, pois, caso contrário, seria um grande estímulo a todo criminoso que por vingança ou imbuído exclusivamente pelo sentimento de eliminar o concorrente, resolvesse, por meio de afirmações falsas, delatar seus inimigos.

Sem assumir qualquer responsabilidade e ainda buscado a auto-exculpação com suas declarações, uniria o útil ao agradável. Não confessa o crime, delata os inimigos e é beneficiado no processo em que não confessou e em outros para os quais sequer colaborou efetivamente, como determina a lei. (on-line)

Destaque-se que, por tratar-se o interrogatório de um meio de prova pelo qual, por meio de questionamentos que o juiz pode fazer ao acusado, é possível chegar à verdade dos fatos, obtendo-se, ademais, tanto a confissão quanto a delação, pode, certamente, fundamentar a sentença condenatória, não se olvidando que, em casos de delação, deve esta se respaldar em outros elementos de convicção, bem como observar o princípio do contraditório.

2.7 O princípio do contraditório na delação

Contraditoriedade significa participação, participação ativa de contraposição (PEDROSO, 1994, p. 65).

Dentre os princípios constitucionais do processo, o contraditório, é extrema garantia concedida ao cidadão, por isso nunca pode faltar dentro do processo penal.

Toda vez que houver uma alegação por uma das partes, deve ser concedida oportunidade à parte contrária para manifestar-se a respeito, mantendo assim igualdade de tratamento entre ambas. Nisto consiste o contraditório.

Segundo o artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.

Não se tratam de garantias absolutas. Há situações em que o contraditório não pode ser garantido desde logo, tendo sua aplicação diferida, como ocorre nos casos de delação, sob pena de total insucesso da verdade material.

Necessário nesta hora fazer uma pausa para algumas reflexões. A assertiva não declara a inexistência do contraditório no chamamento de co-réu, apenas afirma que nesses casos o contraditório é realizado após a colheita da prova, ou seja, em momento posterior ao da delação.

Relativamente ao contraditório no chamamento de co-réu, tem-se os seguintes julgados:

CRIMINAL. PROVA. CONDENAÇÃO. DELAÇÃO DE CO-RÉ INVOCAÇÃO DO ART. 5º, INCISOS LIV E LV, DA CONSTITUIÇÃO: AFRONTA INOCORRENTE.

É certo que a delação, de forma isolada, não respalda decreto condenatório. Sucede, todavia, que, no contexto, está consentânea com as demais provas coligidas.

Mostra-se, portanto, fundamentado o provimento judicial quando há referência a outras provas que respaldam a condenação.

Ademais, deixando a defesa de requerer o procedimemento previsto no art. 229 do Código de Processo Penal - a acareação descabe, ante a preclusão, argüir a nulidade do feito.

Em verdade, o recorrente, embora sustente a existência uma questão de direito, consistente na suposta ofensa aos incisos e LVI do art. 5º da Constituição, busca, na verdade, o reexame questão de fato, pretendendo que esta Corte reavalie a convicção instância ordinária.

Recurso não conhecido.

(Recurso Extraordinário nº 213.937-8 - Pará - Relator: Min. Ilmar Galvão em 36.03.1999)

Não basta a mera e simples delação de um co-réu para se afirmar a culpabilidade de outro acusado. É preciso que ela venha acompanhadas de outros elementos de informação processual produzidos no curso da instrução judicial contraditória, formando um todo coerente e encadeado, designativo de sua culpa. A adoção dessa declaração isolada do co-réu como base e fundamento de pronunciamento condenatório constitui profunda ofensa ao princípio constitucional do contraditório consagrado no art. 5º, LV, da Carta Magna, porque acolhe-se como elemento de convicção um dado probante sobre o qual imputado não teve a mínima oportunidade ou possibilidade de participar ou influir ou reagir. (TACRIM-SP – AP – Rel. Márcio Bártoli – 10ª C. – j. 02.06.1993 – RT 706/328).

Assegurando-se, portanto, ao imputado como co-réu ou partícipe as garantias constitucionais do contraditório, a delação formará, juntamente com as demais provas dos autos, prova apta a ensejar um decreto condenatório.

Qualquer acusação realizada em processo penal tem, sem exceção, que ser acompanhada da defesa, trata-se do sistema de provas e contra-provas, como já dito. Havendo oportunidade para reperguntas pelo defensor do réu, não existirá qualquer desequilíbrio processual desfavorável ao delatado, tampouco violação ao princípio do contraditório. Outrossim, merece destaque o fato de que, para garantir o contraditório, doutrinadores sugerem que o delator seja arrolado como testemunha do juízo e inquirido no curso da instrução.


III - ASPECTOS CRÍTICOS

3.1 A ética e a delação premiada

3.1.1 Diferença entre ética, moral e direito

É de suma importância diferenciar ética, moral e direito para, em um segundo momento, verificar se a delação premiada é realmente, do ponto de vista ético, reprovável, como acreditam alguns.

Embora as três áreas se distingam, também têm grandes vínculos e, às vezes, até se sobrepõem.

Mister, neste momento, algumas considerações.

É assente que o vocábulo "lei" tem o significado de norma imperativa do comportamento humano, ou seja, lei ética, moral ou humana. O saudoso André Franco Montoro (1993, p. 301), de maneira ímpar, lecionava que o mundo jurídico faz parte do mundo ético.

Outrossim, a título de explicação da assertiva supra, tem-se que, em sentido amplíssimo, há a lei da natureza, cósmica ou universal, que se divide em natural e moral (ética ou humana) (Ibid, 1993, p. 295).

A lei moral fundamenta-se na consciência e a lei jurídica é imposta pela autoridade social.

Assim, tem-se, em ordem decrescente, a lei geral ou universal, a lei humana, a lei ética ou moral e, por fim, a lei jurídica.

Tanto a moral como o direito se baseiam em regras que visam estabelecer uma certa previsibilidade para as ações humanas. Ambas, porém, diferenciam-se por sua natureza.

A norma ética (moral) é a lei do "ser" (do que é) e a jurídica, a do comportamento, é a do "dever ser" (do agir).

Portanto, a norma moral estabelece regras que são assumidas pela pessoa, como uma forma de garantir sua harmonia. A jurídica, por sua vez, busca estabelecer o regramento de uma sociedade delimitada pelas fronteiras do Estado.

Ambas, porém, têm uma base ética comum e constituem normas de comportamento (DINIZ, 1995, p. 343).

Há quem afirme que o direito é sub-conjunto da moral e, por isso, toda a lei é moralmente aceitável. Acredita-se ser essa assertiva equivocada, vez que a moral e o direito, apesar de se referirem a uma mesma sociedade, podem ter perspectivas discordantes.

A ética, diferentemente da moral e do direito, faz um estudo do que é bom ou mau, buscando justificativas para as regras propostas pela moral e pelo direito. Não estabelece regras, apenas reflete acerca da ação humana. Assim, percebe-se que a ética corresponde a uma espécie de delimitação do que é certo, sendo este próprio e determinado pelo indivíduo.

Éticae moral são, em realidade, duas faces da mesma moeda, pois uma está voltada para o interior e a outra se volta para o mundo.

3.1.2 A eticidade da delação premiada

Por que queimaram Judas? Não será para punir a delação? Castigar a traição?

Efetivamente, a traição sempre foi repugnada na sociedade, mesmo assim, Judas, por apenas trinta moedas, traiu Jesus Cristo; César foi apunhalado por Brutus; Joaquim Silvério dos Reis, pelo simples perdão de uma dívida, dedurou Tiradentes e assim por diante.

Para muitos, a colaboração premiada é imoral tendo em vista que a traição demonstra fraqueza de caráter (MOREIRA, on-line).

Nesse cariz, há quem sustente que a lei deve sempre indicar condutas sérias, moralmente relevantes e aceitáveis, o que não ocorreu quando da introdução da delatio no Brasil.

Para esses doutrinadores falta, antes de tudo, um fundamento minimamente ético para a delação premiada.

Dá-se o prêmio punitivo por uma cooperação eficaz com a justiça sem importar com o que motiva o colaborador, de quem não se exige nenhuma postura moral, muito pelo contrário, estimula-se a deslealdade, a perfídia, enfim, a traição.

Acredita-se que, na equação "custo-benefício", só há valoração às vantagens que possam advir ao Estado no combate à criminalidade, não se atribuindo qualquer relevância aos reflexos negativos que podem surgir, como por exemplo, a rotulação eterna do delator (FRANCO, 1994, p.211).

Destarte, verifica-se que a questão, efetivamente, suscita polêmica.

Com efeito, Luigi Ferrajoli (apud SILVA, 1999, p. 05) questiona a moralidade da colaboração premiada, percebendo o perigo dos agentes estatais utilizarem os benefícios para pressionar o réu, influenciando seu livre arbítrio, de modo a transformar as delações na linha mestra dos processos, passando-se a negligenciar as demais modalidades probatórias.

Sérgio Moccia (1999, p. 75) comenta que há uma lógica contratual entre o Estado e o colaborador que reduz a delação premiada a um sistema útil para encorajar os acusados, quando deveria, na verdade, ser atribuído valor às delações que fossem a verdadeira expressão da livre vontade individual, sem qualquer provocação por parte do Estado.

Eduardo Luiz Santos Cabette (on-line), ao abordar o instituto da delação premiada no Direito Brasileiro, salienta que se pode constatar uma "quase" promiscuidade entre Ética e Direito.

Posicionam-se em sentido oposto, autorizados pensadores.

Eduardo Araújo da Silva, em brilhante trabalho publicado no Boletim IBCCrim nº 85, dezembro de 1999, comenta:

Malgrado o questionamento sobre a moralidade do instituto, hodiernamente dupla é a sua vantagem: permite ao Estado quebrar licitamente a lei do silêncio que envolve as organizações criminosas, assim como colaborar para o espontâneo arrependimento de investigado ou acusado. (1999, p. 05)

Tratando do tema em comento, David Teixeira de Azevedo sustenta:

Oportuna, portanto, a legislação brasileira, que se põe na linha de frente da política criminal orientada de um lado na proteção dos direitos da vítima e de outro no âmbito da efetividade da persecução penal na prevenção e repressão de graves formas delituosas, cujo deslinde depende, e em muito, da efetiva colaboração da vítima, do destemor das testemunhas e, também, da eficaz e eficiente colaboração dos co-autores e partícipes.(1999, p. 05/06)

E enfatiza:

O perdão judicial e a diminuição da pena previstos na nova legislação embebem-se de eticidade, não se constituindo num desprestígio ao direito punitivo, nem numa barganha sombria do Estado com o criminoso para a busca e soluções fáceis para a investigação penal e para o processo penal à custa e sacrifício de princípios morais.

Como assinala Jorge Alberto Romeiro, "o sentimento reflexo de bondade, pois salvo raras exceções, a indulgência determina também, na generalidade dos indivíduos, por uma espécie de mimetismo psicológico, sentimentos reflexos de altruísmo. Assim, o perdoado de um mal pretérito poderia sentir o dever de compensá-lo com um futuro bom comportamento".

Aliás, o fazem bem ao próximo desencadeia sentimentos e posicionamentos positivos e favoráveis com relação a quem fez o bem. As Escrituras Sagradas pontuam: "Portanto, se o teu inimigo tiver fome, dá-lhe de comer; se tiver sede, dá-lhe de beber; porque, fazendo isto, amontoarás brasas de fogo sobre a sua cabeça". O "amontoarás brasas de fogo sobre a cabeça" significa, aqui no texto, justamente despertar sobre quem praticou a má ação um sentimento de arrependimento e de reversão da postura de colisão com os valores negados com a ação ilícita.

Portanto, sob os princípios de uma ética cristã, o instituto do perdão judicial e da causa de diminuição de pena particularmente previstos na nova lei, estariam plenamente justificados.(Ibidem, p. 06)

Damásio Evangelista de Jesus (1999, p. 05), ao traçar suas primeiras idéias acerca do tema, concluiu que a medida deve ser empregada com prudência, devendo ser reservada para casos de relevância.

Malgrado os posicionamentos contrários, induvidoso o fato de que a delação premial está imbuída de nobre propósito, pois, na verdade, trata-se de oportunidade concedida ao criminoso de rever seus atos, assumir a culpa e contribuir com a justiça no combate à criminalidade.

Nesse aspecto, não há uma efetiva traição, mas sim união de esforços do Estado com o delator, que, arrependido, insatisfeito por haver violado a lei, age de maneira a tentar restaurar a ordem perturbada.

Pesa sobre o delator um sentimento de dor por sua conduta criminosa, uma vontade que o impulsiona a mudar de rumo e colaborar com a justiça.

Cumpre ressaltar que deve haver rígido controle judicial para aplicação da delação premiada, de modo a evitar qualquer constrangimento em relação à vontade do colaborador.

Outrossim, mister cautela no recebimento da delação, vez que o legislador pátrio não criminalizou a falsa colaboração como o fez o italiano. Por isso, imprescindível a consideração de alguns critérios consagrados pela jurisprudência para a validade das palavras do co-réu delator: a) verdade da confissão; b) inexistência de ódio, em qualquer das manifestações; e c) inexistência de atenuação ou mesmo eliminação da própria responsabilidade (SILVA, 1999, p. 05).

Nessa ótica, o instituto reveste-se de eticidade, sendo que o que pode ser considerado moralmente reprovável é qualquer abuso por parte dos agentes estatais para a obtenção da delação.

Eduardo Araújo da Silva obtempera:

Em verdade, o que se apresenta reprovável moralmente, é o abuso por parte dos agentes estatais para a obtenção da delação premiada, impondo-se especial atenção dos magistrados nesse particular, de modo a assegurar as garantias do Estado Democrático de Direito. (1999, p. 05)

Efetivamente, a delação premial trata-se de um instrumento importante para a investigação da criminalidade nos moldes em que esta se apresenta na atualidade e, por isso, deve, sempre que possível, ser utilizada. No entanto, como já exposto, abusos por parte de agentes do Estado em sua aplicação prática podem ocorrer, comprometendo, assim, a dignidade do acusado, o que faz imprescindível o prudente controle judicial.

3.2 A demonstração de ineficácia do Estado no combate à criminalidade

Paira sobre esse instituto a idéia de demonstração da inoperância do Poder no combate ao crime.

Há quem assevere que, ao inserir a colaboração premial no ordenamento jurídico brasileiro, o Estado reconhece sua impotência, tanto para investigar quanto para punir a prática de crimes, necessitando, sobremaneira, da boa vontade do investigado ou acusado em colaborar com a justiça, delatando.

Partindo-se desse entendimento, o Estado estaria falido no cumprimento de um de seus objetivos básico, qual seja, a segurança pública e por isso, ressalte-se, tão-somente por isso, buscou substituir os meios normais e tradicionais de investigação pela delação premiada (MACHADO, on-line).

Observa Alexandre Demetrius Pereira:

É realmente uma situação iníqua, em que o Estado mais uma vez reconhece sua incompetência para investigar e punir a criminalidade. De fato, não vislumbro outra maneira de entender a proposta contida em tais artigos, senão com a confissão pública e expressa do Estado, que parece dizer "não tenho como investigar o crime. Não tenho como punir o criminoso". Se, não obstante, tiver o criminoso vontade de delatar seus comparsas, identificando-os ou dizendo onde está a res, receberá a clemência do Estado, ficando impune. (on-line)

Contrariando essa posição doutrinária, encontra-se o entendimento de que mesmo sendo amplamente criticada, a figura da delatio tem grande eficácia e configura uma atitude coerente no combate ao crime organizado. Ainda, caminha ao lado dos demais meios de investigação, como um trunfo em prol da justiça.

No dizer de Roberto Porto, promotor de justiça integrante do Gaeco - Grupo de Atuação Especial de Repressão ao Crime Organizado:

Só para também ressaltar: até 1995, o estado negava a existência de crime organizado no Brasil e já havia em São Paulo a Máfia Chinesa, um caso em que temos atuação desde 1985. O PCC é outro em que o Gaeco atua, ou seja, todas essas organizações nasceram e ganharam porte em cima da omissão do Estado. Foi criada essa lei de repressão ao crime organizado, mas na verdade já existia na legislação, e um dos trunfos dessa lei é um dispositivo copiado da Itália: a delação premiada. É a forma de o sujeito se tornar colaborador e Ter a pena reduzida. A redução é substancial, de um a dois terços da pena. Na Itália foi a maior arma nas operações Mãos Limpas. Aplicamos no caso da "Máfia dos Fiscais". Nunca tinha sido aplicada esse lei, e o dispositivo tem uma eficácia tremenda. Como teve. E aí fomos supercriticados, inclusive todos os livros doutrinários criticam esse instituto, porque no Brasil instituíram que o sujeito que colabora é delator. Então, essa lei baseia-se na traição, e por isso é imoral. No mundo inteiro ela é aplicada, mas no Brasil há uma resistência. (2003, p. 32)

Na linha acima, percebe-se que a tendência atual em matéria de investigação e repressão criminal ruma no sentido da união de esforços já citada. O Estado deixou de ser omisso e vem procurando combater as práticas delituosas que se disseminaram rapidamente.

A exemplo da Itália que já se apresentou como palco de cenas de terror desenvolvidas por agentes mafiosos, a delação premiada teve relevante papel no combate às organizações criminosas.

Observa Carlos Alberto Marchi de Queiroz:

Giannicola Sinisi, um dos criadores da Fundação Goivanni e Francesca Falcone, é, na atualidade, um dos magistrados mais temidos pela Máfia na Itália, principalmente por ter um de seus projetos convertidos em lei, mais especificamente, aquele que estimula a participação de colaboradores nos processos movidos pela Justiça contra o crime organizado italiano. (1998, p. 63)

Existe crime organizado no Brasil e isso faz com que haja mudança de atitude por parte do Estado, que prescinde de atualização.

Ainda, as organizações criminosas têm características peculiares como: a) o chefe situa-se em posição eqüidistante dos demais integrantes; b) existe uma estrutura hierárquico-piramidal, com divisão de tarefas; c) nem todos os integrantes sabem exatamente qual a finalidade das ações criminosas; d) só sobrevive com a participação efetiva do Estado (BLAT, 2003, p. 31).

Desta forma, torna-se deveras difícil encontrar, por exemplo, quatro pessoas devidamente identificadas nas organizações, o que torna a colaboração premial relevante.

Muitas vezes, devido à estrutura hierárquico-piramidal das organizações criminosas, o investigado ou acusado detido não sabe quem é o chefe, o qual mor das vezes está bem situado na sociedade e não "suja as mãos" (ibidem, p.32), mas tem conhecimento de quem são seus superiores imediatos. Assim, pela colaboração do criminoso, o Estado poderá romper a estrutura de maneira gradativa, coisa que não conseguiria sem o auxílio face à estrutura de teia apresentada pelas organizações criminosas.

Portanto, não se trata de demonstração de impotência do Estado, mas sim de adequação deste à realidade fática.

Destarte, sem qualquer abalo às estruturas jurídicas, premiar o criminoso que coopera faz parte de uma política criminal atual no combate à criminalidade que vem sendo utilizada em vários países com sucesso.

Ademais, a título de ilustração, os Estados Unidos, um exemplo no combate ao crime organizado, possuindo um Poder Judiciário extremamente ágil, apoiado por uma Polícia moderna, eficiente e cumpridora de leis enérgicas e duras, faz, constantemente, uso do instituto da delação premiada, inclusive transaciona com aos acusados.

Por isso, não existe qualquer amparo a alegação de que, por fazer uso da colaboração premiada, o Brasil demonstra a falência do Estado na garantia da segurança pública, vez que os benefícios concedidos pelo instituto da delação premiada não configuram qualquer desprestígio ao Direito Penal.

3.3 O menosprezo de valores fundamentais

Dentro da corrente doutrinária que critica a delação premiada, encontram-se presentes os que acreditam estar menosprezando valores fundamentais como "equidade" e "proporcionalidade".

A Constituição Federal, no quadro das garantias individuais e sociais, procurou seguir as exigências de aperfeiçoamento do homem e o respeito à sua integridade física e moral. A preservação de sua personalidade e a proteção contra as penas infamantes, a condenação sem processo contraditório, a supressão de algumas penas, a afirmação de que somente o delinqüente pode sofrer a pena, sem atingir os que dele dependem, definem uma orientação que qualifica perfeitamente o regime e os princípios fundamentais da Constituição.

Muito se tem discutido acerca do princípio da proporcionalidade.

O princípio da proporcionalidade requer um juízo de ponderação em relação à gravidade do fato e à gravidade da pena. Sendo assim, sempre que restar demonstrado um grande desequilíbrio nessa relação haverá uma inadmissível desproporção.

O princípio da proporcionalidade é destinado tanto ao poder legislativo, encarregado de estabelecer penas em abstrato que sejam proporcionais à gravidade do delito, quanto ao juiz, que impõem penas aos autores dos delitos.

O artigo 5º, XLVI, da Constituição Federal, determina que a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos. Trata-se do princípio da individualização da pena, imprescindível para a avaliação da proporcionalidade.

A individualização divide-se em três fases: a cominação, quando o legislador valora as condutas, cominando-lhes penas que variam de acordo com a importância do bem a ser tutelado; a aplicação, que se dá quando há o cometimento da infração e abre-se a oportunidade para o Estado individualizar a pena, por meio da decisão condenatória do julgador; e, por fim, tem-se a execução, efetivada após o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Importante, in casu, atentar para a segunda fase da individualização da pena, na qual o juiz somente poderá aplicar a pena na justa medida do necessário, atendendo, assim, a determinação contida no artigo 59, caput, do Código Penal, o qual determina que a pena será estabelecida conforme seja necessária e suficiente para reprovação e prevenção do crime.

Certo é que o princípio da proporcionalidade exige que a pena seja proporcional ao mal produzido pela conduta típica, ilícita e culpável do agente.

Cesare Beccaria, no século XVIII, já asseverava:

O interesse de todos não é somente que se comentam poucos crimes, mas ainda que os delitos mais funestos à sociedade sejam os mais raros. Os meios que a legislação emprega para impedir os crimes devem, pois, ser mais fortes à medida que o delito é mais contrário ao bem público e pode tornar-se mais comum [...] Bastará que o legislador sábio estabeleça divisões principais na distribuição das penas proporcionadas aos delitos e que, sobretudo, não aplique menores castigos aos maiores crimes. (1999, p. 85)

Feitas essas anotações, demonstra-se necessário analisar a finalidade da pena, isso é, para que serve, o que visa.

Pena é a sanção aflitiva imposta pelo Estado, mediante ação penal, ao autor de uma infração (penal), como retribuição de seu ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico, e cujo fim é evitar novos delitos (SOLER, apud JESUS, 1988, p. 517).

Claro está que de nada adiantaria o preceito se não houvesse a sanção, pois é ela que assegura a coercibilidade do ordenamento jurídico positivo.

Com efeito, a pena tem como finalidade a retribuição do mal praticado. No entanto, a prevenção apresenta como seu primordial objetivo.

A política criminal, para atingir suas finalidades, atua tanto pela prevenção geral quanto pela especial.

A prevenção especial consiste em afastar o criminoso do convívio social. Acredita-se que o fato do indivíduo ter cometido um delito demonstra sua periculosidade e a necessidade de uma reeducação para o convívio social. Por isso a pena é aplicada.

Sendo assim, a pena tem um caráter ressocializador e deve fornecer condições para que o condenado se recupere e volte à comunidade.

Feitas essas notas, percebe-se que a delação premiada não menospreza os valores fundamentais acima citados.

Para ter coragem, o acusado ou investigado deve ser movido pelo senso de colaboração com a justiça, pois tem noção das conseqüências que poderão advir de seu ato.

Essa atitude provavelmente implicou uma mudança de opinião com respeito à criminalidade, e esta mudança de opinião vai seguida de uma alteração correspondente dos sentimentos com respeito de suas atitudes passadas, uma necessidade de regenerar.

David Teixeira de Azevedo assinala:

Se a reprimenda já não potencialmente atingirá a finalidade retributiva ou preventiva, seja especial ou geral, positiva ou negativa, é caso de dispensa de pena. Como acrescenta Donnedieu de Vabres, lembrado por Wagner Brussolo Pacheco, "dizer que o perdão judicial é, hoje, um ato de política criminal não significa que ele constitui um favor, uma manifestação de generosidade arbitrária. O seu domínio é determinado pelos fins sociais que a lei tem em vista ao criá-lo". E também para Manzini, igualmente citado pelo mesmo articulista, a não imposição da pena, em determinados casos, pode; levar à prevenção da delinqüência e também ao aprimoramento ético em geral. (1999, p. 07)

Ninguém, em sã consciência, delata por delatar. Para fazê-lo deve estar movido por sentimentos de notáveis valores e com o intuito de amenizar o sentimento de pesar, embora isso não seja requisito essencial consoante já exposto.

Corrobora essa assertiva o fato de que a confissão espontânea sempre atenua a pena e, pelo fato do legislador não ter determinado o parâmetro dessa atenuante, por analogia, pode-se chegar ao limite máximo de dois terços, nos moldes da delação. Assim, o acusado não precisaria delatar para receber a benesse da redução de pena, bastaria confessar.

Ao confessar, o infrator dá um importante passo rumo à sua recuperação, objetivo da pena, e ao delatar, não se vislumbra qualquer outro motivo senão recompensar a sociedade do mal que causou juntamente com seus comparsas, o que é louvável.

E por que não conceder o perdão judicial ou a redução de pena àquele que, embora tarde, se emendou moralmente? Àquele que cooperou com o Estado na persecução criminal? Àquele que depositou sua confiança e vida nas mãos do Poder Público?

De nada serviria a pena para esse indivíduo. Sua própria contrição encarregou-se de regenerá-lo. Por outro lado, não se vislumbra a necessidade de retribuição. Houve um fato criminoso sim, mas seu co-autor além de admitir, ou seja, confessar, delata, virando uma página de sua vida, contrapondo-se ao crime, protegendo, dessarte, a sociedade.

Realmente, o Direito Penal é imprescindível ao controle social, mas é verídico que atualmente as penas não mais satisfazem suas razões e, por isso, tem que ser reconhecida a relevância da doutrina a intervenção mínima, para a qual o Direito Penal só deve intervir nas questões socialmente mais relevantes.

Frente a esta nova tendência de buscar a minimização de utilização do Direito Penal merece destaque a proposição da despenalização que se fundamenta na supressão da pena diante de situações próprias a serem observadas no caso concreto.

3.4 A falta de condições por parte do Estado em garantir a integridade física do delator e de sua família

Neste espaço, forçosas certas observações antes de alavancar a questão em si.

3.4.1 Fundamento da proteção

A Defesa dos Direitos Humanos e da Cidadania é uma resposta firme dada pelo Estado às graves violações à liberdade e à igualdade cometidas.

O direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal, consoante dispõe o artigo III, da Declaração Universal dos Direitos Humanos, é regra a todo ser humano (ONU, on-line).

Na visão atual do processo, exige-se uma atuação mais séria e protetora do Estado em relação àquele que elucidar ou proporcionar esclarecimento de um fato criminoso.

Isso se dá pelo crescimento desenfreado da criminalidade e por sua alta complexidade que, por vezes, possui organização superior à dos órgãos persecutórios, os quais, sem a ajuda de pessoas, não conseguem realizar a justiça.

É assente que o Brasil encontra-se comprometido com os valores democráticos e de respeito aos direitos humanos consagrados na Declaração Universal, e por isso, o Governo tem procurado corresponder às expectativas, e aos compromissos assumidos com a plena inserção do país no sistema internacional de proteção e promoção dos direitos humanos.

O Programa Nacional de Direitos Humanos [01], elaborado pelo Governo Federal, por meio do Ministério da Justiça em conjunto com organizações da sociedade civil, assim justifica sua implantação:

A falta de segurança das pessoas, o aumento da escala de violência, que a cada dia se revela mais múltipla e perversa, exigem dos diversos atores sociais e governamentais uma atitude firme, segura e perseverante no caminho do respeito aos direitos humanos. O Programa Nacional de Direitos Humanos aponta nessa direção, e está dirigido para o conjunto dos cidadãos brasileiros. O programa é uma clara afirmação do Governo Federal com os compromissos assumidos, pelo Brasil, externamente e com a população na luta contra a violência geral. (on-line)

Assim, a implantação de serviços para proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas tem seu marco na proposta prevista no Programa Nacional de Direitos Humanos de 1996.

Entretanto, apenas no ano de 1999, por meio da Lei n.º 9.807/99, o Governo Federal instituiu no Brasil um programa de proteção a testemunhas e vítimas de crimes, dispondo, inclusive, sobre a proteção aos indiciados, acusados ou condenados colaboradores da polícia ou da justiça.

Na opinião de Eudes Quintino de Oliveira Júnior:

Tal lei já era reclamada não só pelas pessoas que ora são tuteladas como também pelas próprias autoridades encarregadas da investigação policial e do processo criminal que encontravam sérios entraves em coletar um depoimento incriminador com total segurança ao agente que prestava. (1999, p. 49)

No mesmo sentido, convém colacionar o pensamento de André Estefan Araújo Lima:

O ordenamento jurídico brasileiro, já há muito tempo, carecia de um diploma normativo que implementasse um programa de proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas. Trata-se de instrumento fundamental para o combate à criminalidade, sobretudo organizada. (on-line)

Regulamentado, por meio do Decreto n.º 3.518, de 20 de junho de 2000, o Programa Federal de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas visava formar e capacitar 380 profissionais para operarem no sistema.

A competência para adoção e implementação de programas de proteção é da União, Estado e Distrito Federal, cada ente no âmbito de suas respectivas competências. Ademais, a lei autoriza a celebração de convênios entre União e Estados ou Distrito Federal.

Há, na verdade, um grande comprometimento do Estado para com as testemunhas e vítimas ameaçadas, com o fito de garantir-lhes a integridade física e mental decorrente de um pacto de responsabilidade, no qual o cidadão deve dizer a verdade e, em conseqüência, o Estado lhe concede toda a segurança necessária.

3.4.2 A Lei nº 9.807/99

Convém comentar que a Lei nº 9.807/99, já citada neste trabalho, foi dividida em dois capítulos. O primeiro traz regras de conteúdo programático e estabelece normas para a proteção de vítimas e testemunhas ameaçadas. O segundo, que mais interessa, institui regras destinadas aos réus colaboradores.

Foi estabelecido, portanto, um sistema misto: de um lado os programas de proteção de vitimas e testemunhas; e, de outro, os órgãos de segurança pública, que devem atender às demais situações de proteção, principalmente aquelas relacionadas aos réus colaboradores.

No entanto, percebe-se que o réu colaborador não foi inserido em nenhum programa de proteção, como é permitido às vítimas e às testemunhas ameaçadas (NASCIMENTO, on-line).

Os programas elencados no artigo 7º, da aludida lei, destinam-se apenas às vítimas e testemunhas, sendo que a proteção prevista para o réu colaborador restringe-se à adoção de medidas especiais de proteção e integridade física do réu preso ou em liberdade (NASCIMENTO, on-line).

Assim, as vítimas e testemunhas ameaçadas poderão ser beneficiadas com segurança na residência, incluindo o controle de telecomunicações; escolta e segurança nos deslocamentos da residência; transferência de residência ou acomodação provisória em local compatível com a proteção; preservação da identidade imagem e dados pessoais; ajuda financeira mensal para prover as despesas necessárias à subsistência individual ou familiar; suspensão temporária das atividades funcionais, sem prejuízo dos respectivos vencimentos ou vantagens, quando servidor público ou militar; apoio e assistência social, médica e psicológica; sigilo em relação aos atos praticados em virtude da proteção concedida e poderá haver, em certos casos extremos, a mudança de identidade.

No tocante aos réus colaboradores, o entendimento mais adequado consiste em se dilatar os benefícios de proteção concedidos às vítimas e testemunhas.

André Estefan Araújo Lima fundamentou seu entendimento justificando:

a Lei permite a adoção de medidas especiais de segurança e de proteção à integridade física. Tais medidas podem ser aplicadas ao réu preso ou solto. Se preso provisoriamente, permanecerá separado dos demais. Se se tratar de condenado cumprindo pena em regime fechado, poderão ser efetuadas medidas que garantam sua segurança dentro da prisão. As medidas de proteção e segurança ao réu colaborador não vêm especificadas no art. 15. Nada impede, ao que tudo indica, sejam aplicadas a ele quaisquer das medidas de proteção previstas no art. 7.º da Lei. (on-line)

Ressalte-se que não é novidade que em decorrência do encontro da verdade, se o delator sofrer coação, o Estado se vê obrigado a tutelá-lo, quer em razão da plenitude de sua cidadania, quer pelo relevante serviço prestado à justiça (OLIVEIRA JÚNIOR, 1999, p. 50).

Ocorre que há exceção à proteção. Estão excluídas as pessoas cuja personalidade ou conduta sejam incompatíveis com as restrições de comportamento necessárias à proteção, os condenados que estejam cumprindo pena e os indiciados ou acusados sob prisão cautelar em qualquer de suas modalidades.

Por outro lado, não há razão jurídica lógica para a exclusão dos réus colaboradores da proteção, nos moldes concedidos às testemunhas e vítimas.

O mesmo entendimento é adotado por André Estefan Araújo Lima:

Este rol de excluídos tem recebido severas críticas. Apenas como exemplo, no ano de 1997 mais de 1.091 pessoas ingressaram no programa italiano; destas, somente cerca de 50 não tinham nenhuma relação com o mundo do crime. (on-line)

Ademais, em relação aos presos por sentença condenatória ou prisão cautelar, a proteção não será oferecida nos moldes do programa, mas também não será negada, vez que a tutela da integridade física será exercida por parte dos órgãos de segurança pública, no local onde estão segregados (OLIVEIRA JÚNIOR, 1999, p. 52).

A lei também elenca como medida de proteção, que durante a prisão provisória o colaborador fique em dependência separada dos demais, podendo durante a instrução criminal ser determinado pelo juiz medidas cautelares necessárias à eficácia da proteção e, por fim, na fase de execução da pena, podem ser adotadas medidas especiais destinadas a garantir a segurança do colaborador em relação aos demais presos.

3.4.3 Da proteção ao colaborador preso

Eclode da legislação supra, que a delação pelo investigado ou acusado permite a redução de pena ou o perdão judicial.

No tocante ao benefício da redução de pena, tem-se que poderá, após a colaboração, ser o indivíduo encarcerado e, por isso, necessitar de máxima proteção para não ser alvo de vingança por parte dos demais criminosos, ora seus algozes.

Sem pretender o aprofundamento no tema, mas tão-somente deixando consignado, ao preso é assegurado o respeito à sua individualidade, integridade física e dignidade pessoal (art. 3º, da Resolução no 14, de 11/11/94), bem como, tem o condenado à pena de reclusão em regime fechado, direito a cela individual, a qual deve obedecer os requisitos básicos de insalubridade (art. 88, LEP).

Verifica-se, todavia, que a realidade dos estabelecimentos penais no Brasil é diversamente outra.

Na maioria dos estabelecimentos prisionais, os presos não possuem assistência à saúde, jurídica e educacional adequadas, e a demanda é deveras maior que a oferta.

Há também o reconhecimento de que, mesmo existindo regras para individualizar os presos de modo a separá-los por categorias, falta estrutura física para tal afastamento.

A situação torna-se ainda mais grave diante do insuficiente número de agentes penitenciários na supervisão da população carcerária, bem como ante a falta de treinamento adequado, e má remuneração oferecida pelo Estado aos agentes carcerários.

A soma dessas circunstâncias culmina na formação de um sistema paralelo, com normas de sobrevivência não escritas, instituídas pelos detentos, cujo não cumprimento é punido com rigor.

Comentando o assunto, o médico Dráuzio Varela obtempera:

[...] Em cativeiro, os homens, como os demais grandes primatas [...], criam novas regras de comportamento com o objetivo de preservar a integridade do grupo. Esse processo adaptativo é regido por um código penal não escrito, como na tradição anglo-saxônica, cujas leis são aplicadas com extremo rigor [...] Pagar a dívida assumida, nunca delatar o companheiro [...] O desrespeito é punido com desprezo social, castigo físico ou pena de morte [...]. (1999, p. 10).

Descobertos, os delatores são quase sempre punidos com a morte, principalmente para dar exemplo aos demais.

Com efeito, a estrutura atual dos estabelecimentos prisionais no Brasil revela-se como uma agressão e desrespeito à dignidade do preso, principalmente do preso colaborador.

O jurista Júlio Fabbrini Mirabete adverte que:

[...] ainda nos dias de hoje no recinto das prisões respira-se um ar de constrangimento, repressão e verdadeiro terror, agravado pela arquitetura dos velhos prédios em que há confinamento de vários presos em celas pequenas, úmidas, de tetos elevados e escassas luminosidade e ventilação [...]. (1996, p. 431)

Portanto, mesmo estando determinado em lei que o juiz criminal pode determinar medidas especiais, que proporcionem a segurança do colaborador em relação aos demais apenados, diante da realidade apresentada pelos estabelecimentos de recolhimento, tal determinação legal torna-se irrelevante.

Anote-se que é necessário uma reestruturação das cadeias nacionais, com a construção de novas penitenciárias, adaptação das já existentes, dentre outras providências, como melhor treinamento aos funcionários, contratação de maior número de agentes penitenciários, desenvolvimento de programas de recuperação e reintegração, etc.

Por todos esses motivos, André Luís Callegari (2003, p. 179) acredita que os companheiros das atividades criminais não perdoam os traidores, e o arrependido estaria, ao ter reduzida sua pena, condenado à morte. Assim, o interessante para o arrependido seria o perdão judicial, desde que implantado um sistema que garanta sua segurança.

Por outro lado, seria interessante que o réu fosse condenado a cumprir a pena reduzida em regime aberto, pois, desse modo, a proteção dar-se-ia de maneira similar à do que recebeu a benesse do perdão judicial.

Entretanto, para a concretização do acima exposto, faz-se mister prévia alteração legislativa, posto haver, em alguns casos, restrição legal para tal.

Cumpre ressaltar que, efetivamente, a realidade do sistema de execução penal brasileiro revela a existência de vários problemas, dentre eles, o de não garantir a integridade física do colaborador condenado, que recebeu o benefício da redução da pena e deverá cumpri-lo em regime fechado.

3.4.4 Da proteção ao colaborador em liberdade

Após receber o perdão judicial, o colaborador não pode, simplesmente, sair andando pelas ruas como se nada tivesse ocorrido, pois, conforme já mencionado, as organizações criminosas não perdoam os traidores e os condenam à morte.

No entender do Procurador de Justiça Antonio Vicente da Costa Júnior (on-line), os baixos índices de colaboração no Brasil justificam-se pelo fato de que, ao delatar, o indivíduo está praticando um procedimento abominável no Código da Selva que a eles rege.

Segundo o citado autor:

Ao menos, dificultável, portanto, o almejo dessa aliança com o criminoso. A efêmera proteção não os livra do desfecho fatal. E todos os que militam nestas hordas são intimidados por este ritual. Os serviços de inteligência das comunidades criminosas têm aprimorados critérios de busca sempre acionadas com o ímpeto de uma vingança incontrolável, o que os credencia para o êxito, na maioria das empreitadas sinistras. Raro, portanto, que um integrante da associação criminosa não se deixe intimidar por essa inexorável tradição. (on-line)

Apesar da intimidação empreendida pelas associações criminosas, nos Estados Unidos, por exemplo, há bastante tempo o governo mantém um programa de proteção a testemunhas e vítimas de crimes e a maioria dos protegidos são criminosos. Isto se dá pelo fato do governo norte-americano lograr êxito na proteção.

No Brasil, o Programa de Proteção garante às testemunhas (e aos colaboradores) segurança por um prazo de dois anos, prorrogáveis por mais dois, o que, para os colaboradores, torna-se inviável, vez que tal período não serviria para amenizar o aborrecimento causado aos integrantes de seu ex-grupo.

Acerca do limite máximo para a proteção Luciana Ribeiro Aro adverte:

Este dispositivo praticamente fulmina a garantia da proteção, por não fornecer uma segurança completa para a pessoa ameaçada, pois de nada adiantaria a proteção oferecida pelo Estado se esta ficasse limitada apenas a um período, e ainda tão exíguo, sendo possível que ao término deste a pessoa protegida voltasse a ficar sujeita a todos os riscos anteriores, tornando-se preza fácil para as vinganças. (1999, s/p)

É certo que a lei previu, em seu art. 11, parágrafo único, a prorrogação do prazo de dois anos de proteção, mas deixou de estipular em quais hipóteses pode ser prorrogado, ou seja, quais são as "circunstâncias excepcionais" que autorizam a prorrogação.

O correto seria o Estado propiciar a proteção enquanto perdurassem os motivos que a ensejaram, sem qualquer limitação de tempo, uma vez que não teria sentido cessar a proteção enquanto não cessassem as suas causas (ARO, 1999, s/p).

Até o final do ano de 2002, quinze Estados brasileiros participam oficialmente do Sistema Nacional de Proteção a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas, integrado por entidades voluntárias da sociedade civil em parceria com o Poder Público.

A rede de proteção atua nos seguintes Estados: Acre, Amazonas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Minas, Pará, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e São Paulo [02].

Nos demais, o responsável é a Gavta, órgão da Secretaria de Estado dos Direitos Humanos.

Urge mencionar que, quem efetivamente garante a proteção das vítimas e das testemunhas coagidas ou expostas a grave ameaça em razão de colaborarem com inquérito policial ou com o processo criminal, são as ONGs.

Conforme determinação da Lei nº 9.807/99, existem alguns requisitos para o ingresso nos programas de proteção, quais sejam: situação de risco; colaboração; personalidade e conduta compatíveis; inexistência de limitações à liberdade e anuência do protegido.

Portanto, pode-se anotar, como potenciais beneficiários do programa, as pessoas que se encontram em situação de risco decorrente da colaboração prestada a procedimento criminal, que estejam no gozo de sua liberdade e cuja personalidade e conduta sejam compatíveis com as restrições de comportamento exigidas, ao qual desejam voluntariamente aderir.

Insurgem, assim, aqueles que necessitam de proteção mas não se enquadram nos requisitos exigidos tal.

Nesses casos, mesmo não preenchendo os requisitos, não serão privados de eventuais medidas que lhe assegurem a integridade física e psíquica.

A Lei nº 9.807/99 não alterou o dever constitucional dos órgãos de segurança pública de garantir a preservação da incolumidade física das pessoas (art. 144, da Constituição Federal), muito pelo contrário, assegura, em seu artigo 2º, §2º, que os indivíduos que, mesmo estando em situação de risco não se adequarem às hipóteses de inclusão no programa de proteção, receberão dos órgãos de segurança publica o atendimento necessário a garantir a sua proteção.

Acerca da proteção, Paulo César Corrêa Borges (2002, p. 85) entende que faz-se mister a criação de uma rede de proteção, constituída por organizações e cidadãos voluntários, mas assevera que a carência de recursos constitui o maior obstáculo a ser superado.

Realmente, não há como discordar dessa opinião, vez que no ano de 2001 o Governo disponibilizava R$ 10.062.210,00 (dez milhões, sessenta e dois mil, duzentos e dez reais) para manter o Programa de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas, nos moldes em que se encontra [03].

De maneira semelhante, em 2002, disponibilizou R$ 10.246.300,00 (dez milhões, duzentos e quarenta e seis mil, duzentos e dez reais) para garantir a manutenção do Programa [04].

Já, para 2003, o orçamento é de R$ 14,4 milhões, verba que deve ser repartida com centros de atendimento a vítimas de violência [05].

Destarte, mesmo havendo dotação financeira destinada ao Plano Nacional de Segurança Pública (PNSP), a parcela repassada ao Programa de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas acaba sendo exígua, diante da quantidade crescente de necessidades, vez que os custos do programa são muito elevados.

Nessa ótica, Luciana Ribeiro Aro observa:

É lamentável que além dos empecilhos citados para a concessão da proteção a vítimas e testemunhas, o legislador criou uma hipótese de serem ignoradas todas as medidas de proteção previstas na lei, ao prever, no artigo 6º, parágrafo único, que "a execução (do programa de proteção) ficará sujeita à disponibilidade orçamentária" (acrescentamos o texto entre parênteses), assim, poderá ocorrer que, após todo o trâmite para a concessão de proteção à vítima e testemunha, e o seu deferimento, a respectiva execução das medidas efetivas de proteção poderão ser ignoradas pela simples falta de disponibilidade orçamentária. (1999, s/p)

Por outro lado, conclui-se, por ora, tendo em vista a situação financeira dos nossos entes públicos, que as proteções elencadas na lei tratam-se de hipóteses utópicas, uma vez que dificilmente tais medidas serão aplicadas na realidade.

Assim, não obstante seja imprescindível correção e aprimoramento no que diz respeito à proteção dos possíveis colaboradores e seus familiares, com o desenvolvimento de programas eficazes que possibilitem, por exemplo, a troca de identidade, de endereço, ou até, mudança do país, a fim de que estes tenham condições de sobrevivência, sem qualquer comprometimento de sua integridade, o Governo não dispõe de recursos suficientes para arcar integralmente com o custo das medidas.

Concomitantemente com o custo das medidas propriamente ditas, tem que ser levado em conta que existem despesas fixas de pagamento de pessoal, de infra-estrutura e beneficiários, e que as verbas antes mencionadas, destinam-se à manutenção anual do Programa no âmbito federal e estadual.

Portanto, independente dos recursos oficiais, faz-se mister a captação de recursos alternativos, como convênios, colaboradores, movimentos com artistas, etc., para o sucesso do programa.

O primeiro passo para a obtenção de êxito seria o estabelecimento de critérios obrigatórios e exatos para a captação de recursos financeiros para o Programa de Proteção.

É sabido que o Governo não possui recursos para serem aplicados nas áreas mais básicas como: saúde, educação, instrução, moradia etc., e, por conseguinte, deverá ser difícil, a previsão e a existência de verbas orçamentárias significativas para a proteção de colaboradores ameaçados. Entretanto, se houver perseverança e paciência, além da colaboração da sociedade para meios alternativos de obtenção de recursos, em um futuro não muito distante a proteção eficiente poderá ser regra.

Interessante salientar que não há, por enquanto, um programa para a inclusão do colaborador no mercado de trabalho, o que demonstra, claramente, o descaso do Estado para com o futuro daquele após a efetiva proteção.

Por outro lado, um programa assim pode ser útil tanto ao colaborador quanto ao Estado, pois este, após inserir aquele no mercado de trabalho, se desoneraria.

Deve ser considerado, também, que a implantação do Programa de Proteção no Brasil é recente, e ainda está em fase de ampliação e adequação, mas, mesmo assim, vem funcionando de maneira ativa.

Óbvio que, mesmo tendo o Governo brasileiro se baseado nos programas de outros países, deve adaptá-los à realidade nacional e adequá-los à verba disponível, o que vem sendo feito. Saliente-se que não é tarefa fácil.

No entanto, uma boa perspectiva emerge, pois mesmo diante das imperfeições ainda existentes, o Programa de Proteção tem surtido os efeitos almejados, ou seja, vem encorajando, de maneira tímida, os indiciados, acusados ou sentenciados, a delatar e colaborar no desmantelamento das organizações criminosas, garantindo, assim, a segurança de pessoas ameaçadas ou coagidas por colaborar em processos criminais.


CONCLUSÃO

Com o presente trabalho, verificou-se que a delação premiada no Direito Brasileiro revela-se um instrumento vantajoso no combate à criminalidade organizada.

Constatou-se assim, que, no Brasil, a aprovação da Lei n.º 9.807/99 representou avanço nesse sentido, pois além de estabelecer normas para a organização e a manutenção de programas especiais de proteção a vítimas e a testemunhas ameaçadas que podem ser estendidas aos réus colaboradores, institui o Programa Federal de Assistência a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas, dispõe sobre a proteção de acusados ou condenados que tenham voluntariamente prestado efetiva colaboração à investigação policial ou ao processo, bem como acerca dos benefícios a serem concedidos aos colaboradores.

Os propósitos da lei são os melhores possíveis pois, com a introdução de novos mecanismos em busca da verdade material, seguiu-se uma tendência de política criminal mundial bem atendendo aos anseios e necessidades que emergiam da sociedade.

Aparentemente, a delação premiada efetua-se de forma simples, em qualquer momento da persecução penal ou mesmo na execução e, os requisitos objetivos para a concessão dos benefícios do perdão judicial ou da redução de pena são alternativos.

Não há necessidade de eficácia na colaboração para que o delator se beneficie da redução da pena, podendo, inclusive, ter a pena reduzida sem colaborar efetivamente.

No que se refere ao seu valor probante, verificou-se que tem o condão de fundamentar a sentença condenatória sempre que se respaldar em outros elementos de convicção e observar o princípio do contraditório.

Restou demonstrado que a colaboração premiada não é imoral, vez que além de estar revestida de insigne propósito, não induz o indiciado, acusado ou sentenciado à traição, mas sim a se engajar na restauração da ordem perturbada. Deve, no entanto, existir um severo controle judicial para aplicação da delação premiada, visando evitar qualquer abuso pelos agentes estatais, o que é moralmente reprovável.

Ademais, a colaboração premial não demonstra a inutilidade do Estado brasileiro no combate ao crime, pois constitui uma tendência atual em matéria de investigação e repressão criminal. Importante, porém, citar que devido à estrutura complexa apresentada pelas organizações criminosas, a delação premiada trata-se de instrumento de altíssima relevância na identificação dos membros das organizações, de sua maneira de atuar, enfim, no desmantelamento das associações delituosas.

Por outro lado, não há qualquer menosprezo ao princípio da proporcionalidade vez que, considerando que a pena privativa de liberdade há muito tem-se demonstrado ineficiente para atingir os fins a que se destina, bem como que a colaboração do réu que se contrapõe ao crime demonstra a desnecessidade de regeneração e ressocialização, não há justificativas para a não concessão do perdão judicial.

Apesar de incontestável que, o sistema penitenciário nacional carece de reestruturação, essa realidade se intensifica face o criminoso delator que teve sua reprimenda reduzida, pois o tratamento oferecido pelo Estado ao colaborador quando de sua custódia, seja por falta de estrutura física, ou mesmo por ausência de treinamento condizente aos agentes carcerários, não lhe garante proteção à integridade física, o que culmina por prejudicar a aplicação do instituto.

Não se pode negar, ainda, que a situação do colaborador que foi agraciado com o perdão judicial, embora melhor, também apresenta-se complicada.

O Brasil prescinde de recursos suficientes para, diante das mais perversas e organizadas modalidades de organizações criminosas, proteger eficazmente além das testemunhas e vítimas, os colaboradores. Contudo, o Governo vem, através de um plano estratégico de segurança pública, possibilitando que o Programa de Assistência a Vítimas e Testemunhas Ameaçadas seja implementado por meio de convênios celebrados, e que funcione.

A "Lei do silêncio", imposta pelas organizações criminosas, faz com que as pessoas, tanto testemunhas e vítimas, quanto réus, sintam-se intimidados e não colaborem com a polícia e com a justiça, no entanto, a garantia de segurança posterior os estimula.

Na verdade, a qualidade da proteção oferecida pelo Estado aos delatores é que determinará aos mesmos se é viável colaborar e, conseqüentemente, demonstrará a amplitude da aplicação do instituto no Brasil.

Ao que tudo indica, adequações ainda devem ser feitas, pois a Lei é recente e, embora nenhum protegido pelo programa tenha sido exterminado ou sofrido qualquer tipo de agressão, diante da realidade apresentada, não há como dizer que o sistema de proteção encontra-se implantado da melhor maneira possível.

Existe, na verdade, um momento delicado enfrentado pelo Estado no combate à macrocriminalidade e uma considerável evolução pelo mesmo nesse âmbito, o que leva a crer que, após os necessários ajustes no que se refere à proteção do colaborador, a delação premiada será amplamente utilizada e deveras vantajosa na persecução criminal.

Sendo assim, o presente trabalho demonstrou que, atualmente, a colaboração ativa é um instrumento eficaz no combate ao crime organizado, no entanto, faz-se imprescindível correção e aprimoramento no que diz respeito à proteção dos possíveis colaboradores e seus familiares, a fim de que tenham condições de sobrevivência sem qualquer comprometimento de sua integridade.


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NOTAS

01 Na verdade, o projeto básico do Programa Nacional de Direitos Humanos foi elaborado pela Universidade de São Paulo/Núcleo de Estudo da Violência - NEV/USP - em decorrência do Contrato de Prestação de Serviços n.º 001/95, Processo Administrativo n.º 08000.021201/95-79, firmado com esta finalidade pelo Ministério da Justiça.

02 Cf. Regras rígidas e sigilo garantem a segurança. O Estado de São Paulo. São Paulo, 12 jan. 2003, "Cidades". Disponível em: http://www.estado.estadao.com.br/editorias/2003/01/12/cid022.html.

03 Cf. Dados obtidos no site oficial do Ministério do Planejamento: www. http://www.planejamento.gov.br/planejamento_investimento/conteudo/programas_estrategico/junho_01/situacao_junho_21_30.HTM.

04 Cf. Relatório de Situação - Novembro/Dezembro/2002 disponível no site do Ministério do Planejamento: www.planejamento.gov.br.

05 Cf. Regras rígidas e sigilo garantem a segurança. O Estado de São Paulo. São Paulo, 12 jan. 2003, "Cidades". Disponível em: http://www.estado.estadao.com.br/editorias/2003/01/12/cid022.html.



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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

KOBREN, Juliana Conter Pereira. Apontamentos e críticas à delação premiada no direito brasileiro. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 987, 15 mar. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/8105. Acesso em: 26 abr. 2024.