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Liminar em ACP contra dolarização em contratos de leasing

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Liminar em ACP do Movimento das Donas de Casa e Consumidores de Minas Gerais, contra a dolarização no financiamento de veículos

          Processo 024.99.005 622-8

23ª Vara Cível / BH

Vistos, etc

Versam os autos sabre uma AÇÃO CÍVIL PÚBLICA, com pedido de liminar, ajuizada pelo MOVIMENTO DAS DONAS DE CASA E CONSUMIDORES DE MINAS GERAIS contra as seguintes instituições financeiras:

01 - ABN AMRO ARRENDAMENTO MERCANIL

02 - UNIBANCO LEASING S/A - ARRENDAMENTO MERCANTIL

03 - FORD LEASING S/A - ARREFIDAMENTO MERCANTIL

04 - FINASA LEASING ARRENDAMENTO MERCANTIL SIA

05- FIAT LEASING S/A - ARRENDAMENTO MERCANTIL

06 - CITIBANK LEASING S/A

07- PONTUAL LEASING S/A ARRENDAMENTO MERCANTIL

08- RMG LEASING S/A

09 - BCN LEASING ARRENDAMENTO MERCANTIL S/A

10- CCF BRASIL LEASING ARRENDAMENTO MERCANTIL S/A

11-GM LEASING S/A

12- DIBENS LEASING S/A

13- SANTANDER N. L A MERCANTIL S/A

14- COMPANHIA REAL DE ARRENDAFAMENTO MERCANTIL

15 - CONTINENTAL BANCO S/A

16- BEKANO, SIMONSEN LEASING S/A-ARRENDAMENTO MERCANTIL

17- ITAÚ LEASING ARRENDAMENTO MERCANTL S/A

18 -VOLKSWAGEN SERVIÇOS S/A

19. BANCO CIDADE LEASING ARRENDAMENTO MERCANTL S/A

20- AUTOLATINA LEASING S/A - ARRENDAMENTO MERCANTIL.

O objetivo desta ação civil pública, segundo a inicial, é proteger milhares de consumidores que assinam contratos de "leasing" indexados ao dólar ameriano que, nos últimos dias, em face de mudanças operadas na política econômica do Governo Federal, com a liberação do câmbio, porvocou aumentos exagerados nos valores das prestações assumidas.
Busca-se, através da tutela jurisdicional, a revisão contratual, para que o reajuste das prestações deixe de ser determinada pela variação cambial, beneficiando, assim, uma grande massa de consumidores. Junto à longa inicial, de vinte e quatro páginas, vieram os documentos de fls. 25/144. Vieram-me os autos conclusos, agora, para os fins cabíveis. Este, o breve relatório.

Tudo muito bem visto e joeirado, DECIDO: registra-se, de início, que a Entidade/Autora está legitimada para postular a tutela judicial protetora dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos dos consumidores (Artigo 82, inciso IV CDC), sendo própira a via eleita. É que a ação civil pública pode ser utilizada para a proteção de interesses difusos como coletivos, e mesmo os denominados individuais homogêneos. Importante ressaltar que, no regime do CDC são admissíveis todas as espécies de ações capazes de propiciar a adequada e efetiva tutela. Busca-se, através desta ação judicial coletiva, a revisão contratual, para a revisão de todos os contratos firmados pelos consumidores, com correção cambial ou monetária vinculada ao dólar americano. Isto decorre em face da maxisdesvalorização da moeda dos referitos pactos, ensejando, então, o pedido revisional, com fundamento no Artigo 6º, inciso V do CDC.

Tenho como legítima a postulação estampada na peça vestibular, pelo menos neste enfoque superficial, visando o exame da liminar pleiteada, por entende que a liberação do câmbio, da forma como foi promovida pelo Governo Brasileiro, de maneira abrupta, caracteriza a situação de "fato superveniente", constante da letra da lei. Diante da maciça propaganda do Governo, afirmando que o REAL não seria desvalorizado em relação ao DÓLAR, os consumidores foram induzidos a erro, assumindo compromissos tendo a moeda norte-americana como indexador. É evidente que todos os brasileiros, em face do que alardeava o Governo federal, acreditavam na estabilidade da moeda nacional.

A propaganda governamental alardeava a estabilidade da moeda nacional, informando sobre a erradicação completa da inflação. A população passou a acreditar num verdadeiro "milagre brasileiro", passando, então, a assumir suas obrigações indexadas em dólar. Entretanto, com a liberação do câmbio, as obrigações assumidas assumiram proporções descomunais, abalando o orçamento de milhões de brasileiros. Ninguém, em sã consciência, poderia prever, da noite para o dia, a desvalorização de 40% do real, acarretando, então, verdaeira disparada na cotação do dólar. Assim, todos aqules que haviam firmado contratos atrelados ao dólar americano viram, como num passe de mágica, todas as suas obrigações excessivamente oneradas.

Não se deve perder de vista, em absoluto, que as cláusulas de correção, em qualquer contrato, são criadas para restabelecer o valor de compra da moeda - e não para favorecer o enriquecimento exagerado de uma das partes, justamente a mais forte, que são as Entidades Financeiras. É óbvio que a prestação contratual, em havendo expressão econômica, deve manter-se durante toda a avença. Caso contrário, estaremos diante do enriquecimento ilícito para um das partes, o que o Direito repugna. Entendo, pois, que os consumidores têm direito à revisão dos contratos, em face do fato superveniente descrito, acarretando o desequilíbrio contratual e, via de conseqüência, agravando sua situação.

Neste ponto a Justiça, quando convocada, deve interferir, valendo assinalar que o "PACTA SUNT SERVANDA" deve, sempre, ser compatibilizado com a cláusula "REBUS SIC STANTIBUS", conforme já decidiu o Coledo Superior Tribunal de Justiça ( RESP 128 307/MG). Vale lembrar que IMPREVISÃO é todo fato que possa vir inesperadamente, de improviso e sem ser esperado (cf. Vocabulário Jurídico/ De Plácido e Silva/ 15ª Edição).
FACE AO EXPOSTO, e tudo mais que dos autos consta, invocando aqui, ainda, os princípios gerais de Direito, estou acolhendo o primeiro pedido de antecipação de tutela formulado na inicial, para determinar que as Entidades Financeiras indicadas no polo passivo façam emitir, no prazo máximo de 10 dias, novas boletas bancárias, para quitação dos débitos dos consumidores que tenham celebrado contratos com correção cambial, corrigindo-se as parcelas vencíveis a partir do corrente mês de janeiro, pela variação do INPC, índice que reflete a inflação máxima registrada em relação à moeda nacional. Fica estabelecida a multa diária de R$500,00, para o caso de descumprimento da presente determinação judicial. Deixo de acolher os demais pedidos de antecipação de tutela (itens 4, 5 e 6) , por entender que o "periculum in mora", relativamente às questões ali enfocadas, não restou caracterizado. Podem as questões ali suscitadas serem tratadas, oportunamente, quando do julgamento de mérito, impondo-se às Financeiras/Rés, se for o caso, a devolução de eventuais valores pagos a maior, com aplicação das sanções legais cabíveis.

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Determino, pois, a regular CITAÇÃO de todas as Entidades Financeiras indicadas no polo passivo desta demanda, por via postal, conforme requerido. Dar ciência do ajuizamento desta ação civil pública ao MINISTÉRIO PÚBLICO DE MINAS GERAIS, através da Promotoria de Defesa do Consumidor ( Artigo 92 CDC). Remeter cópia desta decisão,  ainda, à Delegacia Regional do BANCO CENTRAL DO BRASIL , para as anotações perientes, na área administrativa. Publicar edital, obediente ao comando do Artigo 94, do CDC.

P.R.I.

Belo Horizonte, 28 - JANEIRO - 1999.

PAULO ROBERTO PEREIRA DA SILVA
Juiz de Direito da 20ª Vara Cível
PLANTÃO FORENSE

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Sobre o autor
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Paulo Roberto Pereira. Liminar em ACP contra dolarização em contratos de leasing. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 30, 1 abr. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/jurisprudencia/16314. Acesso em: 28 mar. 2024.

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