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Parecer sobre a restituição da taxa de iluminação pública

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01/05/1999 às 00:00
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B - Da contestação apresentada pelo Município de Campo Grande:

Despida de qualquer sensatez é afirmação deste réu de que "não há nada de ilegal ou arbitrário na decisão do Município de Campo Grande em instituir a taxa de iluminação pública, pois assim agiu revestida de legalidade", não merecendo qualquer comentário a respeito, a não ser requerer aqui também a condenação deste réu por litigância de má-fé, posto que agiu no processo exatamente como a ré Enersul.

2) Do não cabimento da repetição de indébito:

Outra afirmação ilógica e nada jurídica, afirmada por este réu, é aquela de que "somente haveria a possibilidade de repetição de indébito nos casos em que o autor-contribuinte provasse a não-utilização dos serviços de iluminação, ou quando os serviços não fossem prestados a contento". Tal assertiva é feita apenas para tumultuar o andamento do processo, posto que o réu pouco está se importando com a imensidão de cidadãos que não têm iluminação pública em seus bairros e no entanto são achacados todos os meses com a cobrança da famigerada "taxa". Palavras, simplesmente palavras que não têm o condão de ludibriar um Juiz de Direito que tão bem conhece a realidade do sofrido povo campograndense.

Todos, até o leigo agora sabe, que os serviços essenciais devem ser custeados pelo Poder Público por conta dos impostos gerais que arrecadam, sendo indevido qualquer pagamento feito pelo cidadão que já paga seus impostos.

Democracia, justiça social, legalidade, verdade e transparência é tão somente discurso de palanque. A realidade para o povo é efetivamente dura, ingrata e injusta.

Vê-se, por mais esse motivo, que também essa proposição do Município só tem o condão de ratificar sua má-fé, não só no processo como na vida real.

3) Da prescrição qüinqüenal:

Apesar da apresentação intempestividade da contestação do Município e da, conseqüente, necessidade do desentranhamento da predita peça dos autos, far-se-á aqui, "ad cautela", uma breve análise da alegada prescrição qüinqüenal.

Ao final, o Município afirma que a pretensão dos autores só poderiam circunscrever-se aos últimos cinco anos, pois se aplicaria as normas tributárias relativas à prescrição qüinqüenal da cobrança de créditos tributários.

Em realidade, está-se diante de direito pessoal, sendo certo que tal cobrança não tem natureza tributária. Efetivamente, trata-se de um encargo do Município, que tem a obrigação de fazer frente aos gastos despendidos com o fornecimento de energia elétrica para se tornar possível a iluminação pública. Ora, se assim o é, onde está a natureza tributária da predita "taxa"? O simples fato de os autores terem pago um débito do Município não dá caráter tributário a este pagamento indevido, mesmo porque é princípio consagrado no Direito Tributário de que o nomem iuris da obrigação não é suficiente para caracterizá-la como um tributo.

Independentemente de quem seja o responsável pelo pagamento dos gastos despendidos com iluminação pública, o fornecedor da energia usada para esse serviço é uma empresa particular e cobra (ou pelo menos deveria cobrar) pelo produto que oferece, nos limites quantitativos gastos, sendo impossível se falar de relação tributária, mesmo porque a empresa distribuidora relaciona-se contratualmente com o município-consumidor.

Os tribunais pátrios, entre eles o Superior Tribunal de Justiça, já se posicionaram pela prescrição vintenária no caso de fornecimento de energia elétrica, estando, portanto, pacificada a questão:

"PRESCRIÇÃO - Ação de repetição do indébito - Inocorrência - Impossibilidade do benefício do curto prazo prescricional do Decreto n. 20.910/32 - Entidade estatal que explora atividade econômica - Prazo indeterminado - Súmula 39 do Superior Tribunal de Justiça - Tarifa de energia elétrica que não tem natureza tributária - Recurso parcialmente provido." (Relator: J. Roberto Bedran - Apelação Cível n. 224.772-1 - São Paulo - 29.03.94)

"PRESCRIÇÃO - Eletropaulo - Concessionária de serviço público - Remuneração por meio de tarifa e não por meio de tributo - Não sujeição ao prazo qüinqüenal - Inaplicabilidade do Decreto n. 20.910/32 - Prescrição inocorrente. Não tendo a tarifa de energia elétrica natureza tributária, é vintenário o prazo prescricional." (Relator: J. Roberto Bedran - Apelação Cível n. 224.772-1 - São Paulo - 29.03.94).

"ADMINISTRATIVO. REPETIÇÃO DE INDEBITO. TARIFA DE ENERGIA ELETRICA. PRESCRIÇÃO. DECRETO-LEI N. 20.910/32. PRAZO. INAPLICABILIDADE.

A tarifa de energia elétrica não e considerada de natureza tributária. sendo assim, o prazo prescricional é vintenário.

Data da Decisão 02/10/1995 Órgão Julgador T2 - SEGUNDA TURMA Decisão

POR VOTAÇÃO UNÂNIME, CONHECER DO RECURSO E DAR-LHE PROVIMENTO. (Acórdão RESP 30847/SP; RECURSO ESPECIAL DJ DATA:23/10/1995 PG:35648 Relator Ministro HÉLIO MOSIMANN 1093). Grifo nosso."

"PRESCRIÇÃO QUINQUENAL

. ENERGIA ELÉTRICA. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. SUCUMBÊNCIA.

I - consoante já decidiu esta corte, a remuneração pelo fornecimento de energia elétrica constitui preço público, não constituindo imposto, taxa ou contribuição. assim, dada a natureza da aludida tarifa como não tributária, é vintenário o prazo prescricional. precedentes.

II - positivado ser inaplicável a prescrição qüinqüenal, não há que se falar do disposto no art. 21 da lei adjetiva civil, por não ter decaído de nenhuma parte do pedido, devendo o ônus da sucumbência ser atribuído apenas a recorrida.

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III - recurso conhecido e provido.

Data da Decisão 22/11/1993 Órgão Julgador T2 - SEGUNDA TURMA Decisão.

POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E DAR-LHE PROVIMENTO. (Acórdão RESP 8570/SP ; RECURSO ESPECIAL DJ DATA:13/12/1993 PG:27426 Relator Ministro JOSÉ DE JESUS FILHO 1040). Grifo nosso."

"ADMINISTRATIVO. TARIFA DE ENERGIA ELÉTRICA. RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO. PRESCRIÇÃO (DEC. 20.910/32 - DECRETO-LEI Nº 4.597/42). ILEGITIMIDADE UNIÃO FEDERAL. LEGITIMIDADE COMPANHIA PAULISTA DE FORÇA E LUZ - CPFL. PLANO CRUZADO. CONGELAMENTO. (DECRETOS-LEIS 2.283 E 2.284/86. PORTARIAS 38/86 E 45/86). SÚMULAS 282 E 356/STF, 83 E 211/STJ.

1. A tarifa de energia elétrica não tem a natureza tributária.

2. A empresa distribuidora relaciona-se contratualmente com o consumidor.

3. A CPFL, quanto ao prazo prescricional, qüinqüenal, não está favorecida pelo tratamento assegurado às autarquias ou outras entidades paraestatais albergadas legalmente. As suas dívidas passivas sujeitam-se ao prazo vintenário.

4. Legitimidade da concessionária de energia elétrica.

5. No eito de jurisprudência uniformizada em Embargos de Divergência, é ilegítima a majoração da tarifa de energia elétrica estabelecida por Portarias (DANEE ns. 38 e 45/86).

6. Precedentes da jurisprudência - Súmula 83/STJ.

7. Recurso improvido.

Data da Decisão 20/08/1998 Órgão Julgador T1 - PRIMEIRA TURMA Decisão

Por unanimidade, negar provimento ao recurso. (Acórdão RESP 168411/SP ; RECURSO ESPECIAL Relator Ministro MILTON LUIZ PEREIRA 1097). (Grifo do autor).

Para finalizar tal parecer, mister se faz registrar que apesar de os autores terem se voltado tão somente contra a "taxa de iluminação pública", pode o juiz, em face de ser o direito do consumidor de ordem pública e de interesse social (inteligência do artigo 1º da Lei 8.078/90), determinar que as devoluções e as abstenções se operem também em relação às cobranças relativas "às tarifas de conservação e manutenção de energia elétrica", da mesma forma e pelos mesmos fundamentos inconstitucionais. Mesmo porque a intenção dos autores é se livrar de um encargo indevido, posto que estão pagando dívida de terceiro, o que não é justo nem legal.

Além do mais, a obrigação do autor é dar os fatos, para que o juiz aplique o direito(11), sendo que a esse princípio deve-se somar o da economia processual.


III) CONCLUSÃO E PEDIDOS DO MP:

e das inúmeras arbitrariedades cometidas pelo Município de Campo Grande e pela Empresa de Energia Elétrica do Mato Grosso do Sul na instituição e cobrança da "taxa de iluminação pública", o Ministério Público é pela total procedência da presente ação, para que os réus sejam condenados à restituição dos valores pleiteados pelos requerentes e a se absterem de fazer qualquer lançamento futuro de qualquer valor tendente a cobrir custos com iluminação pública nos boletos de cobrança de energia elétrica domiciliar ou comercial e nos carnet de IPTU.

O Ministério Público concorda com o julgamento antecipado da lide, conforme requerido pela Enersul, após esta empresa fornecer em juízo a comprovação de todos os valores pagos pelos autores a título de iluminação pública ou desde que os réus sejam condenados a restituir, solidariamente, os valores pleiteados na inicial.

Por oportuno, requer o Ministério Público a condenação dos réus como litigantes de má-fé.

Campo Grande, 04 de março de l999.

Amilton Plácido da Rosa
19º Promotor de Justiça da Capital,
em exercício na Promotoria de Justiça do Consumidor

Código de Processo Civil Comentado, Vol. II, Ed. Forense, VI edição, 1986, p. 40.

5. Elementos de Direito Constitucional, 6ª edição, 2ª tiragem, 1989, Editora RT, p. 44.

6. "Art. 103. Nas ações coletivas de que trata este Código, a sentença fará coisa julgada: (....);

III - erga omnes, apenas no caso de procedência do pedido, para beneficiar todas as vítimas e seus sucessores, na hipótese do inciso III do parágrafo único do art. 81."

7. "Art. 118. Este Código entrará em vigor dentro de 180 (cento e oitenta) dias a contar de sua publicação."

8. "Art. 1806. O Código Civil entrará em vigor no dia 1º de janeiro de 1917."

9. Art. 6º. São direitos básicos do consumidor: (....);

VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências."

10. "Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: (....);

VI - estabeleçam inversão do ônus da prova em prejuízo do consumidor".

11. São os princípios da "jura novit curia" e da "da mihi factum , dabo tibi jus"

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Sobre o autor
Amilton Plácido da Rosa

Procurador de Justiça do Estado do Mato Grosso do Sul.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROSA, Amilton Plácido. Parecer sobre a restituição da taxa de iluminação pública. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 31, 1 mai. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/16275. Acesso em: 24 abr. 2024.

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