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O patrimônio imobiliário da União Federal e o ordenamento jurídico

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01/11/2001 às 01:00
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4:- Ordenamento Jurídico Combatido

O Consulente e se insurge contra a vigência de lei e respectivo regulamento que ordena e re-ordena a administração dos imóveis pertencentes a União Federal, incluindo nesse bojo, o espaço aéreo, o espaço líquido, ilhas, praias, terras de marinha, prédios públicos, leitos carroçáveis e tudo quanto diz respeito no entendimento do termo partrimônio imobiliário pertencente a União Federal, conforme expresso pelo art. 20 da Magna lei e outros diplomas ordinários e títulos de propriedade, por interpretar que os efeitos decorrentes da legislação ora vigente são contrários a normas e princípios expressos na mesma Constituição Federal que escandalosamente é violada e, igualmente violentar princípios fundamentais outros, indispensáveis a sobrevivência do Estado brasileiro, promovendo conseqüências irreparáveis, nefastas ao povo como um todo e parcela individualmente e também nefastas ao interesse patrimonial do país e do povo como um todo e parcela individualmente.

Assim, de início, insta destacar que a ementa da malsinada lei federal n.9636/98 dispõe que o objetivo é regular e administrar os aforamentos e alienações do patrimônio imobiliário, alterando dispositivos legais e ultimando outras providências, inclusive regulamentando disposição transitória da Constituição Federal.

Com a atenta leitura se observará que a realidade expressa pelo texto, de muito ultrapassa a dita regulamentação e pretensa administração dos imóveis da União Federal, demonstrando-se assim, com nítida visão que o legislador, não quis de forma alguma, estampar qualquer atenção a realidade escrita no corpo legislativo aprovado, salientando-se, ao que parece, má fé dos que elaboraram tamanho ordenamento que está gerenciando, com poderes inclusive de alienação, patrimônio imobiliário incalculável, cujo interesse, na atual era moderna, de escassez de espaços territoriais e recursos naturais, torna-se de elevada valia e procura universal.

Trata-se, indubitavelmente, de autorização legislativa para que o Poder Executivo pratique atos que expressamente estão arrolados. Com a autorização legal, o servidor público passa a ter delegação expressa para celebrar convênios com a iniciativa privada, nacional ou estrangeira, ou com outras pessoas jurídicas de direito público interno e substituindo a União Federal, exercite poderes próprios do Príncipe, isto é, administre o imóvel e exerça poder de polícia sobre o mesmo, inclusive tributando-o e valendo-se das prerrogativas próprias do proprietário, de usar e gozar e igualmente, seus ocupantes ou titulares de direitos reais sobre coisas alheias cobrando pelo uso e gozo civil, que redunda em valores desviados do próprio patrimônio público para de terceiros conveniados. Cria-se verdadeiro feudo, capitania ou figura jurídica semelhante, instituídas na distante idade média e renascidas pela forma apresentada.

A lei, já regulamentada, cria figura típica do reino, transformando ou permitindo que haja a transformação de imóveis pertencentes a União Federal,em Capitanias Hereditárias para serem gerenciadas e exploradas por particulares, nacionais ou estrangeiros, titulares de direitos que extrapolam aos direitos do proprietário e adentram ao poder típico do Poder Público.

Os convênios e contratos autorizados pela legislação em tela, admitem a percepção de comissão resultante dos serviços prestados, de modo a remunerar a empresa ou a pessoa política que vier administrar ou alienar esses bens, e conseqüentemente, pondo em amplo desfavor o tradicional ocupante particular ou público, que deverá pagar pela ocupação ou aquisição, em valores nem sempre acessíveis, atribuídos em estimativas realizadas por quem haverá de receber participação do resultado auferido, criando a probabilidade de que as avaliações sejam bem altas, favorecendo a participação remuneratória daqueles.

O exercício do direito de posse, consoante a tradicional doutrina romanesca e as disposições constantes na legislação pátria em vigor e histórica, é desprezada e inovada, de forma que só será considerada posse para efeitos da lei, o exercício do direito da forma que a lei prevê, reduzindo os modos, expressos notadamente pelo animus e corpus inerentes. Um minus em desfavor do possuidor. ( sic art. 6º da lei )

A lei também autoriza a emissão sumária da União Federal na posse exercida irregularmente, de modo a violar outros princípios jurídicos pré-estabelecidos tradicionalmente no direito civil, processual e constitucional. Salienta-se que o direito a ampla defesa, apenas lembrando, textualmente vigente de modo pétreo na CF é desfigurado.

O absurdo se esbalda quando em defesa do patrimônio imobiliário, a lei admite que a força policial poderá ser auxiliada pelas forças armadas, que serão requisitadas pela própria União Federal, ou pelas pessoas jurídicas conveniadas, isto é, inclusive pessoa de direito privado, de origem estrangeira, jurídica ou física, que esteja exercendo o poder do Príncipe por contrato celebrado.( capítulo I, secção III da lei )

A lei estabelece procedimento de avaliação expedita, criando figura jurídica que põe em risco os interesses de ocupantes ou possuidores já estabelecidos sobre esses prédios e favorecendo amplamente os interesses pecuniários das pessoas conveniadas com o fim de avaliar e alienar ditos prédios. O direito clausulado na CF a ampla defesa é nitidamente abalado.

A legislação também estabelece normas a serem adotadas no que se refere à concessão de aforamento, uso e alienação desses prédios. Normas que, de um modo geral, são demasiadamente rigorosas, que trarão imensos prejuízos a ocupantes e foreiros tradicionais, notadamente face a dificuldade e a cultura para serem cientificados dos termos dos editais e notificações decorrentes. Rigores favorecendo a União Federal em detrimento de comunidades e de um modo geral os ocupantes desses imóveis, face o formalismo, a imposição de prazos decadenciais e a ignorância da situação jurídica que esses imóveis se encontram nos diversos recantos do imenso país. Sítios privilegiados pela natureza serão arrebanhados sorrateiramente de particulares ou mesmo da União Federal, para empreendedores que haverão de exercer as faculdades da legislação em favor dos interesses que representam.

Não há disfarce qualquer.O contexto da lei e seu regulamento deixa patente que o objetivo do novo ordenamento é indubitavelmente a alienação do patrimônio imobiliário da União, independente de sua localização e da nacionalidade e poder econômico do pretenso adquirente.

A legislação é intencionalmente favorecedora a determinadas pessoas que serão eleitas beneficiárias de favores, a ponto de ter expressa autorização para que prédios sejam cedidos graciosamente, a critério do Poder Executivo Federal, a quem seja eleito merecedor de tais favorecimentos ( art. 18 - II ),

Trata-se de lei escancaradamente direcionada a privilégios e favorecimentos, em dissonância ao que tutela a CF no art. 37, violando ou possibilitando a violação da impessoabilidade coibida, entre tantas outras possibilidades.

Interessante anotar que a lei permite que a cessão poderá atingir águas públicas e espaço aéreo e se efetivará inclusive por servidores subalternos, que recebem pelo novo ordenamento delegação do Chefe do Executivo para tanto. Diversas benesses são expressas favorecendo terceiros que poderão adquirir dito patrimônio.

As normas ordenam também as condições para alienação, estipulando valor de mercado, júros e correção monetária do saldo devedor, garantidos através de instrumentos de hipoteca ou promessa de venda e compra, deixando bem evidenciado que parcela mínima da população terá acesso as condições de aquisição, o que levará comunidades de pescadores, apenas exemplificando, afastarem-se de seus lugares tradicionais... Ajunte-se os habitantes de quilombos e aldeamentos indígenas et alllis.

O diploma normatiza venda, permuta, doação estabelecendo autorização legislativa indispensável para que o Chefe do Poder Executivo, ou a quem for delegada a atribuição se desfaça do patrimônio público objeto.

Chama atenção igualmente que a lei determina, de forma ordenatória, que o produto obtido pela alienação ou exploração dos imóveis nela objetivados, ou seja, todo o patrimônio imobiliário arrolado pela CF e outros títulos judiciais, extra-judiciais ou legislativos, será integralmente destinado ao pagamento de dívidas públicas de responsabilidade do tesouro nacional. (art. 45 )

Enfim de um modo geral, o ordenamento aqui tratado é assim disposto, causando perplexidade pelo modo e forma que trata o assunto, permitindo-se que o Consulente, ou qualquer outra pessoa física ou jurídica que tome conhecimento do seu teor, também assim insurja-se e provoque pretensa mobilização no sentido de sua suspensão integral ou parcial, em favor da defesa da sociedade e do próprio Estado nacional.


5:- Ações a serem ultimadas pelo Consulente

O Consulente e demais interessados na revogação da legislação deverá propor medidas judiciais adequadas para suprimir a execução e assim impedir seus efeitos e, igualmente, poderá também ultimar medidas salientemente políticas com o fim de obter legislação que revogue o referido ordenamento.

Aliás, diante do quadro decorrente do que se observa pela leitura do texto legislativo, o ideal será sempre a revogação pura e simples do mesmo, para que, a sociedade possa participar na construção de ordenamento outro, que atenda os interesses elementares da própria sociedade brasileira e igualmente do Estado, já que, a primeira vista, a legislação atenta também contra a soberania do país.

Assim, inicia-se a abordagem no que toca a suspensão da execução da lei, por meio de medidas judiciais adequadas ao caso.

Numa plana inicial, insta destacar que qualquer medida de cunho judicial restrito ao interesse da parte,se limitará a jurisdicionar os litigantes, patenteando-se aqui, o interesse do Consulente em obter medida cuja jurisdição se realize de forma a concretizar a suspensão da legislação, em todo ou em parte, em sentido amplo, sem exclusão, isto é, erga omnis.

Nessa linha portanto, o Consulente deverá ter condições jurídicas de legitimidade e, buscar a ação adequada que realize a jurisdição de modo coletivo, indistintamente, ou seja, ultimando ação civil pública ou de inconstitucionalidade, já que se couber, a ação popular será privativa de cidadãos brasileiros, excluíndo-se pois, as pessoas jurídicas dessa qualidade.

No que toca à ação judicial, observa-se na plana inaugural que, mesmo a legislação provocando, em tese, prejuízos ao patrimônio coletivo e indistinto da sociedade, não poderá se valer o Consulente da ação civil pública, por tratar-se de lei vigente, devidamente formalizada nos trâmites do processo constitucional, pelo menos aparentemente.

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Assinala a doutrina e os julgados o impedimento de modo inequívoco e de conhecimento generalizado entre os estudiosos, motivando assim, a eliminação desse remédio em favor dos interesses difusos da sociedade.

A ação civil pública é o remédio jurídico disposto à toda sociedade, por meio das pessoas e agentes legitimados, para reparar atos concretos, de natureza privada ou administrativos.

Resta o Consulente se valer, se houver causa que justifique, da ação de inconstitucionalidade, representando seu entendimento a qualquer das personalidades referidas expressamente na CF.

Para tanto, há de se observar com critérios, se existem violências concretas a Magna Lei, ou a princípios que a norteiam, de forma a permitir-se que proceda a representação. Em existindo o arbítrio contra a CF ou seus fundamentos, poderá então o Consulente propor a representação, denunciando as inconstitucionalidades a qualquer ou todas as pessoas arroladas no texto constitucional, de modo que estas ultimem a propositura da ação adequada se também interpretarem que o ordenamento nos termos que se encontra viola ditos direitos constitucionais.

Enfim, ao Consulente caberá, se for o caso, denunciar a uma das pessoas indicadas na Carta a violação, para que esta, se concordar, promova a ação declaratória de inconstitucionalidade.


6:- Princípios e Normas Constitucionais Violados

Iniciando-se a análise acurada da legislação em tela, observa-se que há violações diversas feitas pelo legislador ordinário contra o Magno texto. A lei e seu regulamento violam diversos princípios e normas vigentes constantes na Constituição Federal e igualmente entra na seara de competência de diversos outros institutos jurídicos ordinários que tradicionalmente já regulavam assuntos de súbita importância para a sociedade e para o Estado soberano nacional.

Anote-se apenas para esclarecer que princípios, asseveram os doutrinadores, tratar-se de mandamento nuclear, fonte de programa ou um alicerce que concede os fundamentos normativos do direito positivo a ser aplicado, enquanto que as normas, os doutrinadores destinguem daqueles chamados princípios, por serem regras, impostas e vinculantes, extraídas e de conformidade aos anteriores princípios. Assim, quando é expresso que há violação da CF no que tange aos princípios e normas, não se pretende apenas apontar esses conceitos a título de sinonímia como pode aparentar aos menos avisados, mas tornam bem saliente que a violação é profunda, nuclear e periférica, causando violação do documento maior que organiza o Estado brasileiro.

Assim, dentre os princípios basilares da República Federativa do Brasil, podemos buscar alguns deles já no pórtico de seu preâmbulo e assinalar a violação que advém dos ordenamentos ordinários aqui combatidos.

O preâmbulo não poupou palavras diretas e claras no sentido de informar o interesse do Constituinte reunido na Assembléia como tal, com a nobre disposição de instituir um Estado democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem estar, o desenvolvimento a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional com a solução pacifica das controvérsias

Seguindo à risca o ordenamento primário constitucional, somos então remetidos a adentra-la e já no seu título vestibular, podemos observar o rol de princípios fundamentais, destacando-se como contrariados pelos efeitos das normas ordinárias aqui tratadas e objeto, o art.1,I, e o art. 3 como adiante será desenhado.

Todas as disposições constitucionais, anote-se, hão de estar sempre em harmonia com o preâmbulo e o título I da Magna lei, sob pena de tratar-se, por incrível que possa revelar, de norma constitucional inconstitucional e, assim, todo ordenamento jurídico ordinário comum, igualmente sob as mesmas penas e considerações.

Tudo porque esses princípios serão os que sempre haverão de dar a coordenação e a indispensável coerência geral ao sistema político implantado pelo Estado criado e submetido à égide da CF. - Por outras palavras, ou o Brasil é, ou não será o Estado que se propôs a ser, nos moldes da CF e as normas da CF bem como outras inferiores deverão sempre harmonizarem-se com os ditos princípios.

Daí, inegavelmente fica patente que o país soberano previsto no texto é claramente abalado nessa condição conforme os dispositivos previstos na legislação combatida.

A norma permitindo seja o bem público nacional, isto é, suas águas internas ou externas, seu espaço aéreo, o subsolo e o solo alienados por qualquer servidor público federal por delegação, está admitindo que repentinamente o território, elemento constituinte do Estado, consoante a tradicional doutrina, seja desfalcado de forma saliente. A título de exemplo, cite-se a alienação do caudal do rio Tocantins, na divisa estadual do Mato Grosso e Tocantins ou da ilha do Marajó, no Pará ou do Parque Nacional de Caparaó, em Minas Gerais.... Na mesma linha, vale recordar-se que a União Federal já iniciou e está em experiência o atual ordenamento ordinário, colocando para exploração particular, que poderá ser de pessoa jurídica ou física, nacional ou estrangeira, o Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha, no Estado de Pernambuco e no futuro, quem sabe o território Antártico e a base Comandante Ferraz. A base aeroespacial de Alcântara, no Maranhão será alugada com restrições impostas pelo locatário... E não se trata de conjuctura ou elocubração, outrossim fato real.

Nessa linha expositiva, insta lembrar que o nordeste da vizinha Bolívia foi paulatinamente ocupado por brasileiros que, ao longo dos anos, na condição de proprietários ou meros possuidores, acabaram por provocar um movimento bélico, dando origem a intervenção internacional, solucionada pelo tratado de Petrópolis, Rj e anexando um vasto território ao solo nacional.

Nessa linha expositiva, recorda-se que os atuais Estados norte americanos, Texas e Novo México, outrora pertenceram ao México e, em idêntica situação ao que foi narrado sobre a questão do Acre, os EE.UU. acabaram por conquistar aqueles territórios. (... )

A soberania fica fragilizada, quando a lei autoriza que próprios federais possam ser alienados, por qualquer servidor público federal, a ponto de sítios estratégicos, valorizados por obra da natureza ou do progresso econômico, serem entregues a adquirentes e estes, transformarem bases militares em hotéis, shopping centers ou empreendimentos imobiliários segundo conviniências meramente especulativas. Em S. Paulo, no valorizado bairro do Ibirapuera, na região sul dos Jardins, já foi demolido todo o quartel situado na tradiconal Invernada dos Bombeiros, à rua Manoel da Nóbrega, Tutói e Abílio Soares restando campanário que poderá ser entregue a especulação imobiliária, para aproveitamento por particulares ao invés de manter-se o quartel do Exercito Brasileiro como construído no princípio do século XX. e estratégicamente situado na grande capital. Trata-se de exemplo real extraído entre inúmeros desconhecidos face a amplitude do território brasileiro. Nessa ordem, os fortes situados na costa brasileira, erguidos em passado histórico da vida da então Colônia portuguêsa em breve se transformarão em hoteis, risortes ou colônias turísticas exploradas economicamente por empresas comerciais, pertencentes a conglomerados nem sempre brasileiros... Na mesma linha, as Universidades, as Escolas públicas e todos os demais próprios federais, pertencentes a União Federal que deles poderá se desfazer para obter rendas. Segue-se de maneira mais ampla a amazônia brasileira, com mais de quinhentos mil quilometros quadrados de terras devolutas federais, e os inúmeros parques nacionais, como o da Ilha do Bananal, no Estado do Tocantins; do Pantanal, em Mato Grosso do Sul, ou de Superaguí no litoral do Paraná etc...

A legislação abre a possibilidade interminável e coloca os interesses da sociedade e do Estado na vontade individual, já liberada, do Chefe do Executivo Federal, que pode delega-la... na forma já apontada, prevista no texto da lei em discussão.

O princípio disposto no interesse da sociedade, na moralidade e demais outros expressos pelo art. 37 da CF foram abandonados pelo legislador ordinário.

Observando-se com atenção o art.4º da lei federal em tela, percebe-se nitidamente, que fica autorizada a expedição de instruções, o que significa que atos de natureza administrativa, de autoria de agentes púbicos burocratas de níveis inferiores no escalão da administração federal, haverão de legislarem a alienação e demais disposições pertinentes previstas na referida norma, violando pois, o principio democrático estatuído na CF, que exige publicidade e facilitando conseqüêntemente a violação do princípio da impessoalidade, posto que a dita legislação implica na previsão de valer-se de atos sumários com o objetivo de apurar valores de alienação, de locação e igualmente para cessões graciosas. ( sic )

Com a autorização legislativa, encalcado no art. 87º da CF o Ministro de Estado poderá subdelegar suas atribuições, a ponto da avaliação sumária, a cessão ou o ato de permissibilidade de uso ou o convênio, vir a ser celebrado por agente público burocrata regional, descaracterizando o interesse do Constituinte em manter o patrimônio público integro e amarrado, com dificuldades para ser dilapidado.

A legislação permite também que sejam celebrados convênios para a consecução das atribuições previstas no art. 4º do atual ordenamento jurídico, inclusive com a iniciativa privada, nacional ou estrangeira, física natural ou jurídica ficta.

Vale dizer que observado o procedimento licitatório comum ordinário, qualquer empresa poderá habilitar-se a prestar esses serviços e, assumir a qualidade do príncipe e seus poderes, de forma a cobrar pelo uso, arrecadando e repassando o saldo à União Federal e, assim ter o comando da permissibilidade de se necessário, convocar ou provocar a convocação das forças armadas ou policiais para a defesa da propriedade pertencente à União Federal, ocorrendo então a situação paradoxal de pessoa jurídica de direito privado, ou pessoa natural, ter autoridade para a prática de atos até então exclusivos a agentes públicos de alto escalão, v.g. governadores, Presidentes de Tribunais...Convocar as referidas forças públicas, inclusive militares, afrontando mais uma vez a CF ( sic art.142, et allis ) Trata-se de ato de fôrça muito grande para ser atribuído de modo genérico.

A lei federal inova tanto que, enquanto o Estado, o Município, o Distrito Federal ou os Territórios, não têm autoridade para convocar as forças armadas, sendo competência exclusiva da autoridade federal, o prestador de serviço, de nacionalidade qualquer, poderá o faze-lo em defesa do patrimônio da União Federal que lhe toca administrar, submetendo a autoridade militar aos caprichos decorrente do interesse econômico advindo da participação decorrente do resultado financeiro. E se não tiver tal autoridade, freada por medidas administrativas, poderá pelo menos provocar o impulso de autoridade pública para tal.

Pelo art. 19 da lei, existe a possibilidade da cessão de direitos, inclusive gratúita, de domínio útil ou direitos reais, em afronto ao principio da moralidade estampado na Magna Carta.

A imoralidade da lei em debate é tão gritante, que o art. 45, expressamente concede ao pagamento de dívida de responsabilidade do tesouro, as importâncias arrecadadas, tornando bem saliente o objetivo principal da lei em dilapidar o patrimônio imobiliário da União Federal, consistente nos bens arrolados no art. 20 da CF, entre outros tantos, também usar dos valores advindos para destinação voltada para interesses internacionais e não sociais.

A título de esclarecimento, insta lembrar também que incluem-se entre os bens da União Federal, os terrenos de marinha, que não são próprios, como já julgado pelo STF em 1908 e as áreas de fronteiras, cuja existência tem por fim, a segurança do Estado, nos seus limites internacionais. Anote-se que o dec. federal n.87.042/82 que regulamenta a lei ordinária que organiza o usucapião especial, que permitia aquela época a aplicação do novel instituto de direito civil e agrário especial inclusive sobre imóveis públicos, excepcionou-se da permissibilidade, tanto as área de fronteiras, como as marinhas, por serem espaços destinados a proteção do território, nos seus limites matírimos ou secos e agora, repentinamente, poderão serem alienados, inclusive para estrangeiros, colocando em risco a segurança nacional.

Há menos de 20 anos as aludidas áreas eram preservadas por questão de segurança e agora, são alienadas, por questão econômica, sem se considerar o ideário histórico do direito brasileiro e até o pensamento do Constituinte que, nessa parte, nada alterou com o advento da Carta de 5 de outubro de 1988.

A lei em tela torna o patrimônio arrolado no art. 20 da CF, cujo interesse do constituinte fôra, sem dúvida, patentear uma defesa para se evitar que fossem dissipados, repentinamente como um acervo posto a disposição de quem pagar mais, a critério exclusivo do Chefe do Poder Executivo e seus delegados ou sub delegados, para queima de estoque...

Anote-se que surge também o perigo em relação as terras indígenas, mesmo sendo estas, como são, inalienáveis. É preciso esclarecer bem, nesta parte, que a demarcação poderá ser alterada pela própria União Federal, ou terceiros conveniados, e na ganância desses interesses financeiros, promover a alienação de áreas que lhe pertencem, por serem devolutas e não mais aos índios... Basta nessa ordem lembrar do distrito de S. Miguel Paulista, na cidade de S. Paulo ou de Aldeia da Serra, em Barueri, também no Estado de S. Paulo, antigos aldeamentos indígenas, ocupados por milhões de pessoas e que serão colocados a venda pública.

O mesmo se diga em relação aos remanescentes de quilombos, as cavidades, as ilhas etc... Sempre ficará a possibilidade de autorizada, como foram as alienações do patrimônio imobiliário, serem então alteradas eventuais restrições de natureza administrativas que limitam o exercício do direito de propriedade.

Finalizando o rol de absurdos arbitrários impostos pelo referido ordenamento, anote-se que o direito a ampla defesa também foi esquecido, pois basta a inadimplência por três parcelas seguidas, que o promitente comprador, independente de interpelação prévia estará sujeito a rescisão do contrato. A CF é expressa no sentido contrário, ou seja, na observância do direito histórico e tradicional brasileiro, pelo qual todo acusado tem direito ao contraditório e é tido como inocente até julgamento derradeiro, merecendo sempre o direito ao devido processo legal e ampla defesa.

Assim, inúmeros princípios e normas estão pondo em risco a República Federativa do Brasil, e arranhando sua Magna Lei, motivo que a mesma merece das altas personalidades que podem arguir sua inconstitucionalidade erga omnis, assim o fazerem, pleiteando de imediato a suspensão de sua execução.

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Sobre o autor
Roberto J. Pugliese

advogado, professor da Faculdade de Direito de Joinville (SC), coordenador-geral do Instituto de Defesa da Cidadania e Direitos Humanos

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PUGLIESE, Roberto J.. O patrimônio imobiliário da União Federal e o ordenamento jurídico. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 6, n. 52, 1 nov. 2001. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/16437. Acesso em: 24 abr. 2024.

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