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Desnecessidade de licitação para táxis

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Parecer defende que é desnecessária a realização de licitação para outorga de permissões a taxistas, tendo em vista a existência de preço tarifado e as condições especiais para o exercício da atividade.

1. Atividade de taxista – serviço público – imprescindibilidade de permissão - art. 175, par. único, I, da Constituição Federal e Lei 8.987/95, art. 2º, IV;

2. Atividade de taxista – serviço público – predicamentos especiais para sua execução – preço tarifado – inviabilidade de competição - licitação – inexigibilidade – inteligência do art. 25, caput, da Lei 8.666/93;

3. Atividade de taxista – serviço público – eventual procedimento licitatório para gestar permissão – município – incompetência – préstimos intermunicipais e interestaduais;

4. Atividade de taxista – leis municipais – compatibilidade com o texto constitucional – extirpação do cenário jurídico – via judicial ou revogação pela Câmara de Vereadores;

5. Atividade de taxista – serviço público – inocorrência de licitação – obediência à teoria do fato consumado e ao princípio da razoabilidade – manutenção da integridade do interesse público primário – satisfação da população;

6. Atividade de taxista – serviço público – inocorrência de licitação pelo ente municipal – inconformismo do MP – ação civil pública – via inadequada - efeitos erga omnes – declaração de inconstitucionalidade perante o Tribunal de Justiça – única modalidade juridicamente aprovável.

7. Atividade de taxista – serviço público – eventual litígio agitado pelo Ministério Público Estadual - citação da globalidade dos taxistas – obrigatoriedade:


I – Das consultas:

O Sindicato Dos Condutores Autônomos De Veículos Rodoviários De Rondonópolis - MT, portador do CNPJ 03.944.774/0001-69, com sede própria a Rua dos Radialistas, 319, Jardim Bela Vista, Rondonópolis-MT. através de seu presidente Gerson Eduardo Leite, tendo como seu porta-voz o bacharel em direito Amilton Vitor Scheffer e a advogada Ana Paula Feitosa Prates - formula-me as questões seguintes:

  • a) É necessária licitação pra permissão de transporte público mediante táxi dotado de taxímetro?

  • b) Se mesmo diante de abstrata viabilidade jurídica de licitação, esta poderia ser inexigível para o caso em debate?

  • c) Se a municipalidade não vislumbrar a inexigibilidade licitatória, tendo em vista que os táxis de Rondonópolis atingem municípios circunvizinhos e até mesmo outros estados, o dito ente público tem competência para realizá-la?

  • d) A Lei Municipal nº 655/79 foi recepcionada pela Constituição de 88? E a também Lei Municipal nº 5.070/07 está em conformidade com o texto constitucional? Se positivas as respostas, elas poderiam ser desconsideradas pelo Poder Executivo sem que se obtenha sua inconstitucionalidade por decisão judicial ou sua completa revogação pela Câmara dos Vereadores?

  • e) Ainda persistindo a via licitatória, haveriam implicações sócio-políticas com o seu desfecho alusivamente a todos os taxistas que se encontram labutando hodiernamente? Poder-se-ia contextualizar tal descalabro com a teoria do fato consumado, o princípio da razoabilidade e o do pleno atendimento do interesse público primário?

  • f) Não se conformando o MP, caso o município de Rondonópolis não efetue a licitação por ele recomendada, qual o caminho jurídico a ele franqueado? Qual o órgão jurisdicional seria competente e, ainda, deveriam todos os taxistas atualmente cadastrados perante a Prefeitura Municipal de Rondonópolis participarem da eventual lide?


II – Dos fundamentos jurídicos do parecer:

II.1: Dos serviços públicos - permissão – atividade de táxi – enquadramento:

Toda a análise jurídica, para encontrar fundamento de validade, haverá de obedecer à conhecida pirâmide de Hans Kelsen, como nô-lo ensina Fábio Ulhoa Coelho, ao gizar que: "Segundo Hans Kelsen, uma norma inferior só é legalmente válida se estiver em conformidade com as normas hierarquicamente superiores a ela..." (01)

Em sendo assim, principiaremos toda a exegese através da Carta Constitucional, que, no tanto que interessa, vaticina: "Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A lei disporá sobre: I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão".

Não se pode deslembrar, infelizmente, que o constituinte, por maior que tenha sido sua boa intenção, utilizou-se de termos dotados de semântica equivocada, mormente por se dirigir às permissões, fazendo grafar os vocábulos contrato e rescisão, próprios apenas aos regimes das concessões.

Como não poderia deixar de ser, estes desavisos foram percebidos a contento pelo indisputável Professor da PUC/SP e consagradíssimo administrativista Celso Antonio Bandeira de Melo, ao pontificar: "... conquanto o artigo 175,I da CF que trata conjuntamente de concessões e permissões fale em contrato, evidentemente o fez com imprecisão técnica de redação, pois a expressão obviamente só pode estar reportada às concessões, embora, do modo como está posta a linguagem normativa, abarcasse a ambas. Acrescenta ainda que o intérprete assisado, entretanto, percebe de imediato que o constituinte simplesmente expressou-se com impropriedade, incidindo, por descuido redacional, em erro grosseiro. É dizer: vê-se, desde logo, que não pode ter pretendido atribuir à permissão de serviço público - ato unilateral que é - o caráter de contrato. Com efeito: se a permissão fosse um contrato, desapareceria como figura autônoma."(02)

É de dizer-se, então, que os serviços de transporte alternativos, se contratados diretamente com o Poder Público - a guisa de exemplo: se determinado município almejar que seus funcionários, de uma certa secretaria, sejam conduzidos por essa modalidade de locomoção -, haverá de, por meio de licitação, deflagrar um contrato de concessão e não se cuidará, em situação tal, de permissão.

Não é a toa que, regulamentando o diploma constitucional suso referido, veio à baila a Lei 8.987/95, onde precisamente averba: "Art. 2º. Para os fins do disposto nesta Lei, considera-se: (...) IV - permissão de serviço público: a delegação, a título precário, mediante licitação, da prestação de serviços públicos, feita pelo poder concedente à pessoa física ou jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco" (ausentes parênteses, reticências e destaques na fonte).

Destarte, quanto à atividade de transporte urbano mediante táxi, o liame jurídico entre a Administração Pública e o particular, seja empresa ou pessoa física, é o da permissão, por se cuidar de um regramento opi legis, ou em linguajar comum, por força de comando estrita e meramente normativo.

II.2 – Da atividade de taxista – licitação – inexigibilidade – art. 25, caput, da Lei 8.666/93:

Embora tanto a Constituição Federal (art. 175, caput) quanto o art. 2º, IV, da Lei 8.987/95, atrelem as permissões à previa existência de licitação, o fazem de um modo global e abstrato, cabendo pois ao intérprete e aplicador do direito modulá-los a cada casuística.

É de se socorrer, desta feita, ao conceito de licitação, que, no caso presente, é dotado de total coerência na pena do pranteado Hely Lopes Meirelles, ao ajuntar que: "Licitação é o procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse." (03)

No caso posto em exame, acode-nos fatores externos que nos remete a maiores reflexões, pois veja-se:

a) O transporte de passageiros mediante táxi, como é cediço, dá-se por empresa ou pessoa física que tenha tal intento como primazia de sua atividade, ou seja, uma vez taxista, até que disso se desligue, sempre sê-lo-á, de modo que não poderá exercer tal mister como mais uma labuta secundária. É bem por isso que a Administração Pública, além de lhe conferir a respectiva permissão, lhe fiscalizará por meio de seu poder de polícia, como se destaca também desta frase contida no art. 2º, IV, da Lei 8.987/95: "que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco";

b) A remuneração do traslado das pessoas, ou como se costuma dizer, o "pagamento das corridas", não é livremente ajustado entre as partes (como ocorre nas atividades meramente privadas), mas, sim, com preço pré-fixado pelo ente público, melhor dizendo, é ele "tarifado".

Debruçando-me agora sobre as leis orgânicas municipais que regem a matéria (Leis nº. 655/79 e 5.070/07, respectivamente), aquilata-se que exige-se do taxista uma condição especial, quase que intuitu personae,, seja empresa ou pessoa física (rememore-se aqui o art. 2º, IV, da Lei 8.987/95), como se lê:

I – Pessoa física: Lei 5.070/07: "Art. 4º - Os profissionais autônomos permissionários e condutores auxiliares, para exercerem as atividades, deverão cumprir às seguintes exigências: I – Estar devidamente há no mínimo 01 (um) ano e apto para exercer atividade remunerada, em conformidade com a legislação federal; II – Atestado de sanidade física e mental, fornecido por órgão ou profissional devidamente autorizado pelo órgão competente, apto para a atividade; III – Comprovante de residência no município de Rondonópolis e, no mínimo, 02 anos, mediante declaração reconhecida em cartório..." (ver anexo I no final do parecer).

II – Pessoa jurídica: Lei 655/79: "Art. 5º - As empresas que se candidatarem à PERMISSÃO, deverão comprovar as seguintes exigências: I – estar legalmente constituída, sob a forma de empresa comercial, com Capital Social registrado não inferior ao valor correspondente a 1.000 (um mil) Valores de Referência Fiscal – VRF, à data de sua constituição; II – dispor de sede própria ou Escritório na cidade de Rondonópolis; III – apresentar folha corrida de antecedentes criminais relativamente a cada um dos sócios..." (ver anexo II no final do parecer).

Ora, não é qualquer sociedade ou qualquer indivíduo que pode se enquadrar como pretendente a ver-se agraciado por permissão para ser um taxista, mas, sim, aquele que pretenda ter neste ramo sua principal função, isso é o querido pela legislação municipal, mormente para se evitar exploração mercantilista por quem apenas almeje lucro.

Demais disso, ainda calcado no viés da especialidade da profissão de taxista, novamente vem à baila a questão da remuneração, como se extrai do seguinte texto da Lei Municipal nº. 5.070/07, verbis: "Art. 27 As tarifas inerentes à atividade de transporte individual de passageiros serão definidas, por solicitação fundamentada da categoria e, posterior comprovação de elevação dos custos, por equipe técnica designada pelo órgão gestor, publicadas via decreto."

Estas circunstâncias exógenas são suficientes para afastar a incidência de licitação na espécie, como de há muito já trilhava na mesma senda o saudoso Hely Lopes Meirelles, ao registrar: "Vimos anteriormente que o contrato administrativo exige licitação prévia, só dispensável, inexigível ou vedada nos casos expressamente previstos em lei, e que constitui uma de suas peculiaridades, de caráter externo." (04)

Logo, se as condições para atender ao serviço público de transporte alternativo, mediante táxi, no campo objetivo (externo, pois) exige que os carros da dita frota tenham de atender a certo limite de idade de sua fabricação (cf. art. 5º, IV, da Lei Municipal 655/79 e art. 4º, VII, da Lei Municipal 5.070/07 – constantes integralmente nos anexos deste parecer), as empresas haverão de portar sede e garagem próprias, etc., bem como os condutores dos ditos automóveis terão que possuir predicamentos peculiares (CNH’s de determinada categoria, tempo mínimo de domicílio no município, folha de antecedentes criminais, etc.).

Isso tudo desagua, a bem da verdade, na inviabilidade de seleção de melhores propostas por dois motivos: nivelamento entre os prestadores do serviço e preço tarifado.

Se, como declinado antecedentemente, inocorre possibilidade de torneio, que em linguagem de direito administrativo significa existência de diversas propostas com dimensões pessoais e numéricas desiguais, não se há falar em licitação, cujo fito é a escolha do melhor lance, considerando-se o apuro técnico e o menor preço, o que concorre para o instituto da inexigibilidade deste procedimento.

Explicando: se todos os carros deverão estar em uma margem limitada do tempo de fabricação deles, se todos os motoristas/condutores carecerão de preencher os requisitos elencados na norma municipal e se os preços dos trajetos serão aferidos por taxímetro, cuja margem é declinada pelo ente municipal através de decreto, como cogitar de se escolher um ou alguns mais aptos e com remuneração menor dentre eles? Esvai-se, pois, o objetivo que se alcançaria mediante a licitação, dando causa, repita-se, à sua inexigibilidade, como emerge da lição inolvidável de Maria Sylvia Zanella Di Pietro, ao assercionar: "Nos casos de inexigibilidade, não há possibilidade de competição, porque só existe um objeto ou uma pessoa que atenda às necessidades da Administração; a licitação é, portanto, inviável." (05)

Poder-se-ia, por esforço de imaginação, embora o ponto central para inexigibilidade aqui exibida resida no caput do art. 25, da Lei 8.666/93 [01], pretender que os incisos que grassam a referida norma fossem taxativos e, como consequência, asseverar que o serviço público de taxista autônomo não estaria ali arrolado. Acontece, todavia, que as hipóteses de inexigibilidade de licitação são enunciativas, exatamente para adequar-se a cada caso concreto, ou seja, somente ter-se-á procedimento licitatório onde exista viabilidade de competição, desinteressando-se a espécime do serviço prestado.

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Vale-se novamente da lira da nunca demais lembrada Zanella Di Pietro, ao obtemperar: "Com efeito, a inexigibilidade é decorrência da inviabilidade de competição; o próprio dispositivo prevê algumas hipóteses, o que não impede que outras surjam na prática. Se a competição inexiste, não há falar em licitação." (06)

Extirpando-se qualquer dúvida do sustentado neste parecer por minha pessoa como sendo uma criação cerebrina, embora, é certo, argamassada pela lição dos doutos, em ocorrência similar a esta, a emérita procuradora do Estado de São Paulo Mirna Cianci escandira que:

"... a Lei 8666/93 trata das licitações e contratos administrativos e, sendo o estágio final da licitação a convocação do vencedor para a assinatura do contrato, a permissão simples não se encontra submissa a essa exigência, por se constituir em ato administrativo, de natureza precária, unilateral.

Não fosse suficiente a incompatibilidade do ato administrativo com a exigência de licitação, verdade é que, no caso em exame, se está diante de hipótese de inexigibilidade de licitação.

ANTONIO ROQUE CITADINI (15) preleciona que a lei considera inexigível a licitação quando inviável a competição. Menciona a hipótese de fornecedor exclusivo e de serviços técnicos de natureza singular, por notória especialização.

(...)

ANTONIO ROQUE CITADINI (19) afirma que inexistindo, assim, a possibilidade de confrontarem as propostas dos contratantes, a realização do certame constituir-se-ia em uma farsa, não atendendo, sua realização, aos objetivos do próprio instituto da licitação.

(...)

Licitação. Inexigibilidade. Permissão de uso remunerado de unidades atacadistas no CEASA. O tabelamento prévio de preços, com impossibilidade de modificação por parte dos interessados, torna inexigível a licitação por inviabilidade de competição. Deve-se elaborar cadastramento prévio dos interessados mediante critérios objetivos de seleção que assegurem isonomia entre os interessados (20)

(...)

De fato, o procedimento deve ser instaurado com o edital, seguido basicamente da habilitação, classificação, homologação e adjudicação.

Várias dessas fases seriam inconcebíveis no caso sob exame. Por exemplo: não haveria a oferta de propostas; a classificação, que é seguida da análise do melhor preço e da melhor técnica seria inviável, porque previamente fixada a tarifa e as condições técnicas de prestação do serviço. Também não tem cabimento a adjudicação, na medida em que esta resulta da consagração do vencedor, e, no caso em exame, inexiste a necessária competição.

(...)

EROS ROBERTO GRAU, em obra específica adverte que "Competindo à União os poderes que a ela tenham sido conferidos e aos Municípios aqueles inerentes à sua autonomia para dispor sobre quanto diga respeito ao interesse local, aos Estados são deferidos todos os demais, que são ditos residuais: problemas de interesse predominantemente comuns a mais de um Município, quando não expressamente de âmbito federal, seja porque não assim designadas para Constituição, seja porque não se manifestem sobre territórios de mais de um Estado, e quando não se incluam entre os definidos por relação de vizinhança, haverão de ser tidos como de interesse Estadual". (22).

Conclui o autor que é "importante observar que os problemas de interesse regional, podendo ser de duas ordens, ora dirão respeito à competência federal, ora à estadual: tratando-se de questão comum a municípios que se situem em territórios de mais de um Estado - regional inter-estadual - a competência para dela tratar é da União; tratando-se de questão comum a municípios que se situem no território de um só Estado - regional intra-estadual - a competência é estadual", afirmando ainda que " a autonomia municipal será assegurada, entre outros poderes, pelo de administração própria, no que respeite ao seu peculiar interesse". (23)

Especificamente quanto ao tema em questão, o mesmo Autor faz lembrar que "não é costumeira a alegação, pelos Municípios, de que este ou aquele problema seja de interesse predominante ou peculiarmente local, salvo as hipóteses relativas à regulamentação e controle do uso e ocupação do solo, que manifestam reflexos incisivos e notórios sobre as potencialidades tributárias do município. No mais, impassíveis e silentes, os Municípios assistem a absorção de certas funções governamentais, que originariamente eram suas, pelos outros níveis de poder, especialmente pelos Estados, mesmo porque disso advém uma sensível redução no volume de suas responsabilidades administrativas. Esta absorção de funções municipais é fenômeno notório, de resto cometida ao abrigo da disposição constante do parágrafo 1º ao artigo 13 da Constituição vigente" (24).

(...)

CONCLUSÕES

1 - A permissão não tem natureza contratual e, portanto, revela-se inexigível a licitação. A norma constitucional refere-se às permissões qualificadas que, na verdade, revelam verdadeira concessão.

2 - A ausência de busca da melhor oferta, em razão da prévia fixação do preço, muito embora possível a participação de inúmeros cadastrados, traduz ainda hipótese de inexigibilidade de licitação, por ausência de competição.

3 - O Estado tem competência para gerir assuntos ligados ao transporte público que transbordem os limites municipais, na seara metropolitana.

HELY LOPES MEIRELLES afirma que ocorre a inexigibilidade de licitação quando há impossibilidade jurídica de competição entre contratantes, quer pela natureza específica do negócio, quer pelos objetivos sociais visados pela Administração." (07)

Conclusivamente, não há como ter por exigível a licitação recomendada pelo Parquet nos ofícios nº 128/2008 (Geap 014095-10/2007) e 229/2009 (GEAP 014095-10/2007) – retratados no anexo III deste parecer, face a incidência do art. 25, caput, da Lei 8.666/93.

II.3 – Da situação geográfica de Rondonópolis – cidade polo da região sul matogrossense – raio de abrangência dos veículos "táxis" – intermunicipalidade – processo licitatório – competência do Estado:

A exegese jurídica, recomenda na atualidade quanto àquele que a maneja, propugna por uma visão que vá além do puro normativismo, ou seja, que enxergue as angulações sociais e políticas dela decorrentes, alicerçando-se sempre nas situações do cotidiano, sem a busca de raciocínios metafísicos.

Abebera-se aqui, por oportuno, ao texto da Professora da PUC/RS Kelly Susane Alflen da Silva, ao deitar as seguintes considerações: "Concretamente, Th.Viehweg distingue dois graus de tópica. De acordo com o primeiro, deve-se proceder por intermédio de uma seleção arbitrária de uma série de pontos de vista mais ou menos ocasionais para buscar, a partir destes, uma orientação por meio de determinados pontos de vista, i.e., uma orientação por meio de sobpostas premissas objetivamente adequadas e fecundas, a fim de levar a conseqüências iluminadas. Dessa forma, procede-se quase sempre no cotidiano, procedimento que é chamado tópica de primeiro grau(16). Com base na insuficiência deste procedimento primeiro, procede-se ao dos repertórios de pontos de vista - já preparados anteriormente -, os quais são ajustados a problemas determinados. Assim, produzem-se os catálogos de tópicos. O procedimento que se utiliza destes catálogos de tópicos, destarte, é chamado tópica de segundo grau(17), que tem seu fundamento precisamente na conversão da projeção aristotélica de um catálogo de tópicos para os problemas pensáveis por Cícero e seus sucessores, como meio auxiliar do pensar o problema do modo mais prático possível, com o que se produziu uma trivialização." (08)

De efeito, há de ser mensurada a localização geográfica da cidade de Rondonópolis, onde se colhe:

  • a) Semelhança a um coração, de onde se partem várias ramificações sanguíneas para vivificar o corpo, tal como retratado na Wikipedia: "Rondonópolis faz limite com os municípios de Juscimeira, Poxoréo, Itiquira, São José do Povo, Pedra Preta e Santo Antônio do Leverger. (...) A cidade está localizada em posição privilegiada, no entroncamento das rodovias BR-163 e BR-364, e, em breve, através da Ferronorte, ligada por ferrovia com os principais portos do país." (09)

  • b) Trata-se de centro médico que agracia diversas municipalidades, como se visualiza: "A região Sul mato-grossense tem o município de Rondonópolis como cidade pólo para o consórcio, com 18 municípios de abrangência e atendimento populacional de 372.539 habitantes." (10)

  • c) O aeroporto de grande porte situa-se no município de Várzea Grande, distando cerca de 200 km de Rondonópolis e é comum a utilização por empresários de táxis, seja para levá-los até o mesmo ou para de lá os apanhar.

É de todo certo, pois, que os táxis de Rondonópolis, obviamente, trafegam com muita intensidade além dos lindes deste município para atender às demandas acima elencadas exemplificativamente, o que entremostra o caráter de intermunicipalidade, para não dizer também de interestadualidade, de tais cometimentos, sendo isto fato notório, dispensador de qualquer outra prova (art. 334, I, do Código de Processo Civil [02]).

A jurisprudência, em vertente conjuntura, posiciona-se neste rumo: "A contrario sensu, se a atividade desenvolvida pelos recorrentes é remunerada, devem eles se submeter à licitação - promovida pelo Estado, e não pelo Município, uma vez que se trata de transporte intermunicipal." (11)

Sendo assim, se se acolher a remota hipótese de processo licitatório para conferir permissão aos filiados do consulente (conferir listagem dos mesmos que figura no anexo IV deste parecer), tal procedimento só poderia ser espocado pelo Estado de Mato Grosso, nunca pelo município de Rondonópolis, dado ser ele incompetente para tal certame.

II.4 – Das leis Municipais 655/79 e 5.070/07 – conformação ao texto constitucional – retirada do ordenamento jurídico – decisão judicial ou revogação:

A Lei Municipal 655/79, em seu âmago, apenas retrata uma gama de exigências para fazer jus o interessado à obtenção de permissão do ente público para desenvolvimento da atividade de taxista, que é blindada por inúmeras peculiaridades.

No mesmo diapasão, sem intromissão de significantes elementos diferenciadores, vem a pelo a Lei 5.070/07, que, por sua vez, assevera que a atividade em questão é tarifada pela Administração Pública (art. 27).

Em nada, pois, confronta os citados textos normativos com o art. 175 da Carta de Outubro, de jeito que o primeiro normativo municipal restou recepcionado pela nova ordem constitucional e o segundo, por não afrontá-la, vê-se plasmado de completo fundamento de validade.

O abalizado constitucionalista Michel Temer alumia a questão da recepção, ao apontar: "É o fenômeno da recepção que se destina a dar continuidade às relações sociais sem necessidade de nova, custosa, difícil e quase impossível manifestação legislativa ordinária." (12)

Não se pode acreditar, em sã consciência, que o município de Rondonópolis, através de seu parlamento, houvesse de criar nova lei exatamente com os mesmos termos da de número 655/79, para satisfazer a ordem constitucional. Isso seria a prova mais contundente de irracionalidade jurídica, para dizer o menos!

Noutro giro, a Lei Municipal 5.070/07, em obediência ao art. 175 da Carta Magna, em todo o seu texto alude à permissão e, por óbvio, somente não exigiu o procedimento licitatório porque vislumbrara que o mesmo é inexigível para o serviço público alternativo de taxista autônomo, o que é, aliás, permitido igualmente pela Carta da República pelo art. 37, XXI, litteris: "ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações." (frisou-se)

Essa excepcionalidade grafada no texto constitucional e que acabamos de entremostrar, consagrada também pela mencionada Lei Municipal, é a supedaneada no art. 25, caput, da Lei 8.666/93 dantes aludida, razão pela qual o texto normativo regional somente se voltara para as qualificações do objeto (ano de fabricação do carro, requisitos para pessoa jurídica, etc.) e de seus condutores (antecedentes criminais, tempo de residência nesta urbe, etc.), máxime diante da flagrante incompossibilidade de competição (preço tarifado), nada tendo, então, de qualquer nódoa de inconstitucionalidade.

Se as ditas legislações, a seu turno, são constitucionais, seja pelo fenômeno da recepção quanto à primeira, e pela conformação textual no que tange à segunda, a licitação para a atividade debatida neste parecer permanece inexigível, até mesmo pela incompetência do município para engrendrá-la (outro evidente motivo do silêncio das normas municipais quanto ao declinado certame). Destarte, tais normativos somente serão extirpados se declarados inconstitucionais pelo Tribunal de Justiça ou se virem a ser revogadas pelo Legislativo, que aqui é a Câmara de Vereadores (art. 2º, caput, da Lei de Introdução ao Código Civil [03]).

Melhor dizendo: o Executivo, seja através do seu chefe (prefeito) ou de secretários das respectivas pastas, não poderá por meio de decretos, portarias, etc. retirar a força de uma lei normativa vigente, como se infere da substanciosa lição do saudoso Professor da PUC/SP Silvio Rodrigues, onde anota: "Dessa regra decorre corolário importante: a lei só se revoga por outra lei. Não pode, por conseguinte, um regulamento, ou uma portaria, ou um aviso ministerial, dar fim à existência de uma lei." (13)

Com o feitio de aclarar eventual perplexidade, colige-se o escólio de Manoel Carlos de Almeida Neto, no que se refere à declaração de suposta inconstitucionalidade das leis municipais, verbo ad verbum: "Deste modo, conclui-se que uma lei municipal pode violar tanto a Constituição Federal, quanto as Cartas Estaduais, sendo que na primeira hipótese é completamente inadmissível o controle abstrato ou concentrado (11) perante o STF, restando portanto a via difusa ou incidental (12). Todavia, na segunda hipótese, ou seja, no caso de uma lei ou ato normativo municipal violar uma Constituição Estadual, ainda que esta seja uma norma de repetição da Carta Magna, admite-se a ADIn, sendo competentes para o julgamento os Tribunais de Justiça dos Estados." (14)

Corroborando o escólio retro transcrito, colhe-se orientação do Supremo Tribunal Federal: "É inviável o controle abstrato de lei municipal perante a Constituição Federal por meio da ação direta de inconstitucionalidade, cujo objeto é restrito a leis e atos normativos federais ou estaduais (CF, art. 102, I, a)". (15)

Por sua vez, a Constituição do Estado de Mato Grosso escande: "Art. 96 Compete privativamente ao Tribunal de Justiça: I - processar e julgar, originariamente: (...) d) as representações sobre inconstitucionalidade de leis ou ato normativo estaduais ou municipais" e "Art. 124 São partes legítimas para propor a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo estadual ou municipal em face desta Constituição: (...)III - o Procurador-Geral de Justiça; (...) IX - o Prefeito, a Mesa da Câmara de Vereadores ou partido político com representação nesta seara, quando se tratar de lei ou ato normativo municipal." (não figuram parênteses e reticências no original).

Logo, para representar sobre a inconstitucionalidade das referidas leis municipais, somente têm legitimidade o Procurador-Geral de Justiça, o Prefeito, a Mesa da Câmara de Vereadores ou partido político com representação nesta sede, ninguém além deles e tal ação terá como foro privativo o Egrégio Tribunal de Justiça.

Sintetizando: jamais o Prefeito Municipal, por si só ou mediante a Secretaria respectiva, poderá deflagrar o procedimento de licitação antes de se ter por inconstitucionais as citadas leis munícipes ou de que elas tenham sido revogadas pelo Legislativo local, quanto ao serviço público alternativo de táxi, sob pena de vilipendiar o princípio da tripartição dos Poderes insculpido no art. 2º da Constituição Federal [04].

Em singelas palavras, uma norma só perde seu fundamento de validade quando – e se – for declarada inconstitucional, como bem apregoa Hans Kelsen: "A tese de Kelsen fundamenta-se no princípio da presunção de validade das normas jurídicas, o qual implica no reconhecimento dos efeitos de uma norma, enquanto não foi declarada sua inconstitucionalidade, considerando que a mesma goza de obrigatoriedade geral até ser declarada inconstitucional, por ter, até este momento, fundamento na Constituição." (16)

II.5 – Da teoria do fato consumado – serviço de táxi de Rondonópolis – perfeita adequação – respeito ao princípio da razoabilidade e do bom atendimento à população:

O assunto que ora é tratado por mim tem gerado polêmicas na plaga brasileira, principalmente porque, se de pronto houver a licitação, estranhos à atividade - alguns até mesmo com certo despreparo por falta de afeição ao objeto em pauta – entrarão nesse mercado e os atuais ocupantes dele sofrerão inenarráveis prejuízos, mormente porque ao longo dos anos fizeram investimentos consideráveis (v.g., financiamento de automóveis para labutarem como taxistas, endividamentos para manutenção dos veículos programação para o futuro contando com a continuidade da atividade de taxista, etc) para dar à população otimizado meio de transporte alternativo, e de um momento para o outro ver-se-ão, em linguagem menos polida, "no olho da rua", devendo, por curial, serem indenizados pela Municipalidade.

Vejamos o exemplos do que aconteceu em Joaçaba: "Os pontos de táxi de Joaçaba, no Meio-oeste catarinense, poderão passar a ser concedidos por meio de licitação. O projeto que prevê a regulamentação do serviço está em debate na Câmara de Vereadores e deverá alterar os procedimentos em relação à exploração do espaço público destinado aos táxis (...) O taxista Aníbal Huf, 67 anos, que trabalha na praça da Prefeitura há 13 anos, afirma que ficou perplexo em saber das novas alterações, que se entram em vigor se a lei for aprovada. Para ele, a licitação não pode prejudicar quem trabalha há anos. "Se entrarem pessoas novas no ramo e nós tivermos que sair, vou procurar meus direitos na Justiça..." (17)

E observe-se bem que a situação fática narrada antecedentemente não viera a lume por recomendação ministerial, mas, sim, em virtude de um projeto de lei local, o que, no mínimo, daria ensanchas a uma discussão por meio de uma audiência, o que deve ser o norte em um Estado Democrático de Direito. Ao contrário do que se daria se o alcaide, de logo, atendesse ao Parquet, porque, se assim o fosse, o telado processo licitatório nasceria de uma simples canetada, sem qualquer discussão popular, seja para ouvir a categoria dos taxistas ou os próprios usuários!

É sabido que no passado a população rondonopolitana ficava a desoras na estação rodoviária ou nas praças aguardando o início do funcionamento dos chamados coletivos e, acresça-se a isso, que uma corrida de táxi era um privilégio de poucos pelo seu alto custo, o que levou a municipalidade a tarifá-la e também a exigir um número adequado de veículos e em bom estado de conservação, munidos de motoristas devidamente preparados para derruir o caos de então.

Vige hodiernamente a teoria do fato consumado, o que se traduz, em verve simplificada, na chamada conservação das coisas no estado em que estão, se assim o for melhor para a coletividade e isso, exatamente isso, a meu sentir, é o que se materializará se não houver o procedimento licitatório, que desatende até mesmo os elementos sociais da norma.

De revés, criar-se-ia uma convulsão social pelos inúmeros desempregados e suas respectivas famílias ao desabrigo; a população, notadamente, ver-se-ia insatisfeita, dada a descontinuidade de um serviço que a está beneficiando – e muito bem -; malgastando com todas as letras a lógica do razoável e, em última análise, prejudicando o interesse público primário, que sempre quer traduzir o desejo da Administração em colimar o melhor para os seus súditos.

Argamassando o que vem de ser dito, colhe-se o seguinte: ""A teoria do fato consumado pressupõe que a situação de fato, embora pendente de julgamento, em face da demora na prestação jurisdicional – demora considerável, de anos -, se encontre já consolidada, tenha atingido estabilidade tal que torne "desaconselhável" sua alteração..."" (18) "O princípio da razoabilidade pode ser definido como aquele que exige proporcionalidade, justiça e adequação entre os meios utilizados pelo Poder Público, no exercício de suas atividades - administrativas ou legislativas - e os fins por ela almejados, levando-se em conta critérios racionais e coerentes." (19)

Em suma, acredita-se piamente que o que a Administração Pública de Rondonópolis anela, no caso do transporte por intermédio de táxi, é a satisfação da população e isso, como está, tem se configurado e nunca, é certo, o desejo do governante em, eventualmente com o advento de um certame licitatório, inserir apaniguado seu, ou demais disso, o ingresso de pessoas físicas ou jurídicas com intuito puramente mercadológico, já que isso se distanciaria a não mais poder do que é cognominado de interesse público primário.

Põe-se fecho com esta lapidar doutrina de Márcio Soares Berclaz: "Os interesses primários englobam a Administração Pública no real e genuíno exercício do seu ofício, como ente imparcial, enquanto que os interesses secundários são decorrência do desempenho das suas atividades de gestão, desta feita como certa parcialidade, não objetivando fins tão nobres, mas, isto sim, a própria sobrevivência ou higidez dos cofres públicos, ainda que isto potencialize afronta à lei." (20)

Portanto, de qualquer perspectiva que se anteveja a questão, a licitação pretendida pelo órgão ministerial não se mostra, com todo o respeito, viável para a cidade de Rondonópolis, sob pena de se criar, em nome de uma pseudolegalidade, revolvimento injustificável no seio social, semelhante a atirar-se uma pedra em lago límpido e sereno e isso, feriria o art. 5º da por nós sempre lembrada Lei de Introdução ao Código Civil [05].

Finaliza este tópico, evocando com indisfarçável saudade, a escrita do Professor Silvio Rodrigues, que Poe de cal sobre este assunto: "A lei disciplina relações que se estendem no tempo e que florecerão em condições necessariamente desconhecidas do legislador. Daí a idéia de se procurar interpretar a lei de acordo com o fim a que ela se destina (...) O intérprete, na procura do sentido da norma, deve inquirir qual o efeito que ela busca, qual o problema que ela almeja resolver. Com tal preocupação em vista é que se deve proceder à exegeses de um texto." (21)

II.6 – Da ação civil pública – pleito de inconstitucionalidade das leis municipais – inviabilidade – declaração de inconstitucionalidade como meio apto - competência do Tribunal de Justiça – eventual outro litígio - citação de todos os taxistas – obrigatoriedade:

Se o Ministério Público, mesmo ciente do conteúdo desse parecer, o qual detém mero crivo opinativo, entender que faz impostergável a licitação para se conceder permissão aos protagonistas do serviço público alternativo de táxi, não poderá manejar a ação civil pública, isto porque a dita lide alcançaria toda coletividade de Rondonópolis e não apenas os filiados do consulente, ou seja, estaria dotada de eficácia erga omnes.

Em ocorrência que tal, na mesma linha de pensamento deste parecerista, está a boa doutrina contemporânea na fala dos eminentes Professores Alexandre de Moraes e Arruda Alvim, como se apreende: "Assim, o que se veda é a obtençao de efeitos erga omnes nas declarações de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo em sede de ação civil pública, não importa se tal declaraçao consta como pedido principal ou como pedido incidenter tantum, pois mesmo nesse a declaração de inconstitucionalidade poderá não se restringir somente às partes daquele processo, em virtude da previsão dos efeitos nas decisões em sede de ação civil pública dada pela Lei nº 7.347 de 1985. Analisando esse complexo tema, especificamente em relação às declarações de inconstitucionalidade incidenter tantum em sede de ação civil pública que acabam gerando efeitos erga omnes, Arruda Alvim expõe que "o que se percebe, claramente, é que, não incomumente, propõem-se ações civis públicas, de forma desconectada de um verdadeiro litígio, com insurgência, exclusivamente, contra um ou mais de um texto, e, o que se pretende na ordem prática ou pragmática é que, declarada a inconstitucionalidade de determinadas normas, não possam mais elas virem a ser aplicadas, no âmbito da jurisdição do magistrado ou do Tribunal a esses sobrepostos. Ou, se, linguisticamente, não se diz isso, é o que, na ordem prática resulta de uma tal decisão. Ora, se se pretende que determinados textos não possam vir a ser aplicados, dentro de uma dada área de jurisdição, disto se segue tratar-se efetivamente de declaração in abstracto, da inconstitucionalidade, ainda que possa ter sido nominado de pedido de declaração incidenter tantum". e conclui o referido autor, que "por tudo que foi dito, afigura-se-nos que inconstitucionalidade levantada em ação civil pública, como pretenso fundamento da pretensão, mas em que, real e efetivamente o que se persiga seja a própria inconstitucionalidade, é a argüição incompatível com essa ação e, na verdade, com qualquer ação por implicar usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal". (22)

Todavia, em se incoando a ação civil pública, merece ser ponderado:

a) Se houver o desejo do Parquet em ver-se declarada a inconstitucionalidade, a mesma deve ser formulada através de ação declaratória de inconstitucionalidade perante o Tribunal de Justiça, sendo legitimado para tanto o Procurador-Geral de Justiça;

b) Ainda que assim não o fosse, e se nominasse como ação civil pública o desejo de se declarar inconstitucionais os textos municipais, que não exigem licitação para a permissão de serviço público alternativo de táxi, essa demanda teria que possuir como única causa de pedir o telado vício, sob pena de receber pronta fulminação judicial, como nô-lo entremostra o STJ: "Não há óbice à propositura de ação civil pública fundada na inconstitucionalidade de lei, desde que a declaração de inconstitucionalidade seja causa de pedir e não faça parte do pedido principal ou subsidiário. Precedentes do Supremo e do STJ." (23)

Não poderá na mesma lide, por exemplo, pugnar pela inconstitucionalidade das leis municipais e, conjuntamente, dar vazão a um pleito cominatório para que o ente municipal providencie o certame licitatório;

c) O órgão competente para julgar a virtual ação civil pública, a despeito da enorme discussão doutrinária, ao que parece, seria o Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, porque ele o é quanto à declaratória de inconstitucionalidade de leis municipais, tal como registrado anteriormente com a transcrição textual da Constituição deste Estado;

d) Seja como for, em havendo ação civil pública, imprescindível que todos os taxistas ora cadastrados pelo município de Rondonópolis, ponto este exigido pela Administração Municipal (art. 15, da Lei 655/79 [06]), figurem na dita lide, como se extrai da jurisprudência: "AÇÃO CIVIL PÚBLICA - TÁXI - PERMISSÃO AOS TAXISTAS POR ALVARÁ - NECESSIDADE DE LICITAÇÃO - LITISCONSORTE PASSIVO NECESSÁRIO - ACOLHER PRELIMINAR. - O litisconsórcio é instituto jurídico que tem, por finalidade, garantir a efetividade do provimento jurisdicional, na medida em que, devendo a sentença estender seus efeitos a pessoas que não estejam envolvidas no processo, sua eficácia restará prejudicada, em contradição aos escopos da jurisdição. - Em ação civil pública cujo objeto é a realização de licitação para prestação dos serviços de transporte de passageiros na modalidade de Táxi, existe necessidade dos taxistas integrarem o pólo passivo da lide, pois com o julgamento da ação haverá repercussão direta em todos os taxistas que atualmente possuem alvará de concessão do serviço, uma vez que afetará a atividade por ele realizadas, sem que lhes seja assegurado o direito de defesa." (24)

Todos esses pormenores, por óbvio, haverão de ser aquilatados e joeirados pelo Parquet, já que farão parte do Inquérito Civil GEAP nº 14095-10/2007.

De todo o exposto, passo às respostas dos questionamentos que se me foram dirigidos.

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Sobre os autores
Emerson Odilon Sandim

Procurador Federal aposentado e Doutor em psicanalise

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

PRATES, Ana Paula Feitosa ; SANDIM, Emerson Odilon. Desnecessidade de licitação para táxis. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2158, 29 mai. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/16891. Acesso em: 26 abr. 2024.

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