Conclusão
O contrato de parceria transferirá o trabalho e os encargos da formação da floresta para a empresa, parceira outorgada. E durante os anos em que os donos dos imóveis dela receberem adiantamentos por conta de entrega futura de madeira, e não entregarem madeira alguma, não ocorrerá fato gerador da obrigação de pagar imposto de renda em razão do cultivo em parceria. Isso, repisando, porque o fato gerador ocorrerá somente com a entrega da madeira.
Nada existe de estranhável no fato de, durante os sete anos de formação das árvores, os donos dos imóveis não auferirem receita. O tipo de cultivo é que é de longa duração, e no seu decorrer não haverá percepção de receita e, pois, nem resultado a tributar. O anexo Parecer Normativo CST nº 30/80, embora não cuide especificamente de elucidar essa questão, traz em suas entrelinhas essa noção. Vejamos o conteúdo do subitem 8.2 desse ato:
8.2 Isto posto, entendemos que os lucros resultantes da venda de toras de árvores plantadas em terrenos objeto de parceria rural somente serão beneficiados pela tributação reduzida de que trata o Decreto-Lei nº 1.382, de 26/12/74, se referidas toras se originarem:
a) de árvores plantadas pelas empresas agrícolas, nestas terras; e/ou
b) de árvores recebidas dos parceiros-outorgantes em fase de formação e, a partir daí, alvo de cuidados próprios por parte das empresas outorgadas, até a formação final das florestas de que tais árvores façam parte.
Está o dispositivo dizendo que a parceira outorgada, ou seja, a empresa que em lugar do dono das terras tomou a si o encargo de formar a floresta mercê do contrato de parceria, efetuou gastos durante o cultivo e auferirá o lucro tributável na ocasião da venda da madeira. O proprietário do imóvel terá sua parte tributável nessa mesma oportunidade. Aliás, seria no mínimo curioso que em um contrato de parceria, em razão do qual o resultado tributável surge no mesmo momento para as duas partes contratantes, uma ficasse obrigada a pagar imposto de renda em época diferente da outra.
De sorte que, se sobre os adiantamentos recebidos da parceira outorgada nos anos anteriores ao da entrega da madeira os donos da terra efetuarem pagamentos a título de imposto de renda, não estarão cumprindo obrigação de pagar tributo, porque esta jamais surge antes da ocorrência do fato gerador. Os pagamentos serão indevidos e darão direito a restituição, na forma estabelecida no artigo 165 do Código Tributário Nacional.
O Fisco, por sua vez, tenham ou não sido efetuados os pagamentos indevidos pelo parceiro outorgante, ficará com o direito de efetuar o lançamento quando da ocorrência do fato gerador, ou seja, com a entrega da madeira. E se efetuar de ofício o lançamento, o crédito tributário virá integrado por multa proporcional ao imposto.
Pela legislação atual, o crédito tributário que vier a ser constituído de ofício compreenderá o imposto de renda devido, multa do lançamento de ofício, de no mínimo setenta e cinco por cento do imposto, e juros de mora calculados pela Selic (taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia para títulos federais – SELIC, acumulada mensalmente). Os contribuintes ficarão apenas com o direito de pedir restituição do valor que indevidamente terão recolhido a título de imposto de renda, acrescido de juros contados da data do pagamento indevido.
Nem mesmo a título de antecipação do tributo que no futuro será devido, pode o contribuinte efetuar esses pagamentos sobre os adiantamentos recebidos. Ele só pode antecipar pagamento de tributo se a lei o permitir, e obviamente se tiver tributo a pagar. Só é possível a antecipação de pagamento de tributo depois de ocorrido o fato gerador da obrigação tributária principal, que é a de pagar o tributo.
Falo de antecipação de pagamento porque entre o momento da ocorrência do fato gerador da obrigação de pagar e o momento definido em lei para o pagamento existe sempre um prazo. Como já foi dito acima, no caso de renda auferida por pessoa física e classificada como rendimento, será no ano seguinte ao da ocorrência do fato gerador, e no caso de ganho de capital, no mês seguinte ao recebimento da correspondente receita.
Para o caso de imposto de renda devido pelas pessoas físicas, existe permissão legal para antecipação do pagamento devido: está no art. 7º da Lei nº 8.383, de 30 de dezembro de 1991, verbis: "Art. 7° Sem prejuízo dos pagamentos obrigatórios estabelecidos na legislação, fica facultado ao contribuinte efetuar, no curso do ano, complementação do imposto que for devido sobre os rendimentos recebidos." Ver bem: "fica facultada (a lei grafou "facultado") complementação do imposto que for devido". E o imposto só é devido depois do sucesso do seu suporte fático, que a lei chamou de fato gerador da obrigação tributária principal. Esse artigo 7º da Lei nº 8.383/1991 está reproduzido no artigo 113 do Regulamento do Imposto de Renda.
De modo que os pagamentos feitos pelo contribuinte ao desamparo do suporte fático da obrigação tributária principal não têm valor e nem o poder de evitar tributação ex officio. Os ingressos financeiros deles decorrentes nem mesmo podem ser considerados receita tributária para o poder público, na forma definida pela Lei nº 4.320/1964, que estatui normas de direito financeiro para a União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Por isso, não evitam lançamento de ofício.
Os donos dos imóveis rurais estarão apenas contraindo dívidas enquanto estiverem recebendo quantias a título de adiantamento por conta da partilha dos produtos da parceria, se no mesmo ano não for entregue madeira de sua parte na produção.
Malgrado a possibilidade de interpretações destoantes desse entendimento, o tratamento aqui defendido deflui das normas de regência da matéria, como demonstrado.
É o meu parecer, salvo melhor juízo.
Anexo
PN CST 30/80 - PN - Parecer Normativo COORDENADOR DO SISTEMA DE TRIBUTAÇÃO - CST nº 30 de 20.08.1980
D.O.U.: 26.08.1980
EMENTA - A participação de empresa agrícola em contrato de parceria rural, como parceria-outorgada, não interrompe, para esta, o gozo de favor fiscal de que seja detentora pela exploração de atividade incentivada, desde que tal contrato vise dar continuidade à exploração de atividade rural também beneficiada por incentivo fiscal. No caso de parceria rural, somente serão alcançados pela tributação reduzida de que trata o Decreto-Lei nº 1.382/74 os lucros resultantes da venda de toras de árvores plantadas pelas empresas outorgadas ou de árvores recebidas dos parceiros-outorgantes em fase de formação. Não se beneficiam do favor fiscal já mencionado as empresas agrícolas que fizerem objeto de parcerias rurais florestas já formadas e em ponto de corte definitivo, por representarem participações contratuais dessa natureza mera intermediação mercantil.
1. Empresas agrícolas dedicadas às atividades de plantio de árvores, pretendendo celebrar contratos de parceria com proprietários de terras nuas e de terras dotadas de florestas, algumas destas em fase de formação e outras já formadas em ponto de corte, desejam saber se os lucros oriundos da venda de toras de árvores plantadas nesses terrenos estariam beneficiados pela tributação reduzida a que se refere o art. 1º do Decreto-Lei nº 1.382, de 26/12/74.
2. No caso em estudo, a partir da celebração dos contratos de parceria, e paralelamente à venda de madeira bruta proveniente de árvores plantadas pelas citadas empresas em suas próprias terras, passariam elas a vender, também, toras:
a) oriundas de árvores por elas plantadas em terrenos de terceiros, ou seja, dos parceiros;
b) procedentes de florestas em fase de crescimento, plantadas pelo outro parceiro em terreno a ele pertencente;
c) originadas de matas em ponto de corte recebidas em parceria, matas essas formadas pelo outro parceiro em suas próprias terras.
3. Para se solucionar a questão, três aspectos fundamentais precisam ser examinados: primeiramente, qual o alcance do Decreto-Lei nº 1.382/74, notadamente no que se refere às atividades desenvolvidas por empresas dedicadas às atividades de plantio de árvores; em segundo lugar, se a parceria estabelecida entre produtor rural e empresa agrícola tira desta a condição de beneficiária de incentivo fiscal de que seja detentora; por último, se, em qualquer das situações relacionadas sob as letras a, b e c do item 2, as empresas estariam agindo na condição de produtor rural, ou seja, se estariam vendendo produto para cuja obtenção teriam contribuído, como produtoras, em substituição aos agricultores beneficiários de favor fiscal.
4 Quanto ao primeiro aspecto, ou seja, sobre o alcance do Decreto-Lei nº 1.382, de 26/12/74, o que se entende é que o grande objetivo desse diploma foi incrementar as atividades de produção do setor agropecuário, criando, para tanto, um regime especial de tributação para tais empreendimentos quando desenvolvidos em bases empresariais. E entre essas atividades produtivas e, por isso mesmo, incentivadas, não há dúvida de que se inclui a do plantio de árvores.
5. A propósito, cumpre salientar que o incentivo fiscal da redução de alíquota (art. 1º do Decreto-Lei nº 1.382/74) tem por condição o exercício exclusivo de atividades incentivadas (Parecer Normativo CST nº 145/75, item 2), razão porque o favor legal não alcança os lucros das empresas dedicadas a florestamento e reflorestamento que prestem serviços a terceiros, inclusive os de manutenção e administração de empreendimentos florestais, ou que exerçam quaisquer outras atividades não incentivadas.
Por aproveitar ao exame do segundo aspecto da questão, vejamos, liminarmente, o que diz o art. 4º do Decreto nº 59.566, de 14/11/66 - Regulamento das Seções I, II e III do Capítulo IV do Título III do Estatuto da Terra (Lei nº 4 504/64):
"Art. 4º Parceria rural é o contrato agrário pelo qual uma pessoa se obriga a ceder à outra, por tempo determinado ou não, o uso específico de imóvel rural, de parte ou partes do mesmo, incluindo, ou não, benfeitorias, outros bens e facilidades, com o objetivo de nele ser exercida atividade de exploração agrícola, pecuária, agroindustrial, extrativa-vegetal ou mista; e/ou lhe entrega animais para cria, recria, invernagem, engorda ou extração de matérias-primas de origem animal, mediante partilha de riscos de caso fortuito e da força maior do empreendimento rural, e dos frutos, produtos ou lucros havidos nas proporções que estipularem, observados os limites percentuais da lei (art. 96. , IV, do Estatuto da Terra).
6.1 O art. 4º do Decreto nº 59.566/66, acima transcrito, em seu parágrafo único nos dá o sentido das expressões parceiro-outorgante e parceiro-outorgado: o primeiro é o cedente, proprietário ou não, que entrega os bens, enquanto que o segundo é a pessoa, ou grupo de pessoas, que recebe esses bens para os fins próprios da parceria.
6.2 Pelo que se infere dos conceitos expostos, o que caracteriza a parceria é a partilha, pelos parceiros outorgante e outorgado, dos riscos e dos frutos, produtos ou lucros havidos. Na parceria rural, o parceiro-outorgado assume a condição de co-produtor em relação ao parceiro-outorgante, respondendo por encargos que normalmente caberia a este e adquirindo, em contrapartida, direitos sobre a produção.
7. À vista do que consta do item anterior, parece-nos claro que o fato de figurar em contrato de parceria rural, como parceira-outorgada, não tira da empresa agrícola a condição de beneficiária de favor fiscal de que seja detentora, pela exploração de atividade incentivada, desde que tal contrato tenha por objeto dar continuidade à exploração de atividade rural igualmente alcançada por incentivo fiscal.
8. Por último, cabe examinar em que situações específicas uma empresa rural, que não preste serviços a terceiros, seria detentora do incentivo fiscal referido no art. 1º do Decreto-Lei nº 1.382/74, no caso de figurar como outorgada em contrato de parceria rural.
8.1 Ao que nos parece, para que haja o benefício fiscal mencionado, dando-se a hipótese de parceria rural de que trata, será preciso que se verifique a substituição do produtor (no caso, parceiro-outorgante) pela empresa (parceira-outorgada) em todos os encargos que normalmente caberiam a ele, produtor, tais como os de arar a terra, cultivá-la, cuidar das plantações, até que se complete o ciclo produtivo da espécie vegetal plantada. Tratando-se de árvores para corte, até que estas estejam em condições de serem abatidas e seccionadas.
8.2 Isto posto, entendemos que os lucros resultantes da venda de toras de árvores plantadas em terrenos objeto de parceria rural somente serão beneficiados pela tributação reduzida de que trata o Decreto-Lei nº 1.382, de 26/12/74, se referidas toras se originarem:
a) de árvores plantadas pelas empresas agrícolas, nestas terras; e/ou
b) de árvores recebidas dos parceiros-outorgantes em fase de formação e, a partir daí, alvo de cuidados próprios por parte das empresas outorgadas, até a formação final das florestas de que tais árvores façam parte.
8.3 Em sentido contrário, não se beneficiam do favor fiscal já mencionado as empresas que fizerem objeto de contratos de parceria rural florestas em ponto de corte, pode tal fato configuraria mera intermediação com vistas à venda de produto já pronto para consumo ou utilização industrial.
9. Tendo em vista o entendimento consubstanciado no item 6 do Parecer Normativo CST nº 145/75, um contrato de parceria firmado nas condições descritas no subitem 8.3 traria como conseqüência, para a empresa outorgada, a afetação das atividades típicas de agricultura e a decorrente perda do favor fiscal de que a empresa seja detentora.
10. Entretanto, como algumas espécies de árvores rebrotam após cortadas, proporcionando ao todo até três cortes, como é o caso do eucalipto, poderá o contrato de parceria ser celebrado mesmo às vésperas de um dos abates sem que a empresa outorgada perca o benefício da tributação mais favorecida, desde que tenha por objeto a exploração agrícola do empreendimento até, pelo menos, a ocasião do corte seguinte.
Aristeu Bernardes Filho - Fiscal de Tributos Federais
Jimir S. Doniak - Coordenador do Sistema de Tributação