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Valor do auxílio-transporte do servidor federal: valor do ressarcimento

04/08/2011 às 14:38
Leia nesta página:

O “custeio parcial” do auxílio-transporte não se refere ao valor do ressarcimento, mas ao fato de não contemplar as despesas realizadas nos deslocamentos em intervalos para repouso ou alimentação, durante a jornada de trabalho (art. 2º, § 2º, da MP n° 2.165- 36/2001).

PARECER JURÍDICO DA OUVIDORIA GERAL/FDUFBA Nº 01/2011

REFERÊNCIA: Manifestação Anônima nº 36/2011

REQUERENTE: Corpo técnico-administrativo da FDUFBA e da FACED, através de seus representantes de fato.

EMENTA: AUXÍLIO-TRANSPORTE EM PECÚNIA. PISO LEGAL INCONTROVERSO. LIMITAÇÃO ABSOLUTA AO DESCONTO DE 6%. O valor do Auxílio-Transporte, cuja natureza jurídica é de verba indenizatória integral, em hipótese alguma poderá ser inferior ao valor mensal da despesa efetivamente realizada com o transporte pelo servidor, prevalecendo, pois, a capacidade econômica do beneficiário em detrimento do desconto de 6%.


RELATÓRIO

1. Origina-se o presente parecer de consulta verbal, com pedido de sigilo, formulada por representantes de fato dos servidores da carreira dos técnico-administrativos da Universidade Federal da Bahia - UFBa, lotados nas Unidades de Ensino dos Cursos de Graduação da Faculdade de Direito - FDUFBA e da Faculdade de Educação – FACED. A consulta em apreço insurge-se contra o desconto de 6% do valor da remuneração sobre o valor do auxílio-transporte, que é tabelado em R$ 136,95 (centro e trinta e seis reais e noventa e cinco centavos). Desconto este reputado, pelos requerentes, como de profunda injustiça visto que, por sua conta, o valor mensal do auxílio-transporte efetivamente auferido pelos servidores é inferior à despesa efetivamente realizada com o transporte para translado casa/trabalho – trabalho/casa.

2.Objetiva a presente consulta obter fundamento jurídico para instruir recurso administrativo, com amparo no at. 8º [01] da Lei nº 9.784/99, que regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. O aludido recurso objetiva formular pedido de revisão (ex nunc) do auxílio-transporte somado a pedido de restituição dos valores retroativo (ex tunc) relativos às diferenças percebidas, conforme o caso, desde sua instituição em 2001 ou a partir da investidura na Entidade Autárquica, se esta se deu em momento posterior a 2001.

É o Relato


PARECER

3.A Medida Provisória n° 2.165- 36, de 23 de agosto de 2001, institui o Auxílio-Transporte em pecúnia, pago pela União, de natureza jurídica indenizatória, destinado ao custeio parcial das despesas realizadas com transporte coletivo municipal, intermunicipal ou interestadual pelos servidores das Autárquicas Federais, como é o caso da Universidade Federal da Bahia- UFBa, nos deslocamentos de suas residências para os locais de trabalho e vice-versa, excetuadas aquelas realizadas nos deslocamentos em intervalos para repouso ou alimentação, durante a jornada de trabalho, e aquelas efetuadas com transportes seletivos ou especiais (art. 1º).

4. Em outros temos, o auxílio-transporte pago em pecúnia, instituído pela MP nº 21.165-36/01, modificou a forma de pagamento deste benefício, que deixou de ser concedido em bilhetes de ônibus pré-pagos e passou a ser remunerado em dinheiro.

5. O auxílio-transporte pago em pecúnia objetiva ressarcir as despesas efetivamente realizadas pelo servidor público federal com o traslado casa/trabalho e vice-versa e é, por isso, que o caput do art. 1º MP nº 21.165-36/01 aduz que possui natureza jurídica indenizatória.

6. Sobre a medida ou alcance do ressarcimento, é preciso estabelecer com precisão o sentido e o alcance da locução "custeio parcial" presente no conceito legal do benefício do auxílio-transporte acima transcrito. O termo parcial não se refere ao valor do ressarcimento, mas tão somente as formas de transporte coletivo amparadas pelo benefício. Senão vejamos.

A MP n° 2.165- 36/01 considera transporte coletivo apenas 02 (duas) categorias de condução, quais sejam: 1º) o transporte coletivo municipal; 2º) e intermunicipal, conforme o caput de seu art. 1º supracitado. Além de definir apenas dois tipos de condução como sendo transporte coletivo, na parte final do texto, exclui os transportes seletivos ou especiais.

7. A Orientação Normativa (IN) nº 4, de 08 de abril de 2011, expedida pela Secretaria de Recursos Humanos (SRH) do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG) - IN 4/11 SRH/MPOG, que estabelece orientação quanto ao pagamento de auxílio-transporte aos servidores nos deslocamentos residência/trabalho/residência, por sua vez, ampliou o rol taxativo aludido acima, pois incluiu no conceito legal de transporte coletivo: a) o ônibus tipo urbano; b) o trem; c) o metrô; d) os transportes marítimos; e) fluviais; d) e lacustres; f) dentre outros, desde que revestidos das características de transporte coletivo de passageiros e devidamente regulamentados pelas autoridades competentes (art. 2º).

Note que além de ampliar o elenco do rol taxativo constante do art. 1º da MP n° 2.165- 36/01, a IN 4/11 SRH/MPOG, introduz em sucedâneo um rol exemplificativo. Além disso, como base no conceito jurídico indeterminado constante da norma: "dentre outros", pode-se asseverar que foi conferida autonomia à autoridade competente de cada Órgão ou Entidade para considerar outros tipos de condução como transporte coletivo amparados pelo auxílio-transporte a fim de atender as particulares locais e regionais, desde que preencham os requisitos vinculantes ali previstos, quais sejam: "desde que revestidos das características de transporte coletivo de passageiros e devidamente regulamentados pelas autoridades competentes".

8. Por fim, o auxílio-transporte é parcial porque não contempla as despesas realizadas nos deslocamentos em intervalos para repouso ou alimentação, durante a jornada de trabalho (art. 1º, da MP n° 2.165- 36/01).

9. Pelo exposto até aqui, fica evidente que a parcialidade do auxílio-transporte refere-se exclusivamente aos modos (itens 6 e 7 supra) e tipos (item 8 supra) de deslocamento efetuados pelo servidor em função do serviço.

10. Superada essa fase preliminar, tomar-se-á a partir de agora como pressuposto que a locução "custeio parcial" constante no conceito legaldo auxílio-transporte pago em dinheiro, criado pela MP n° 2.165- 36/01, não se refere ao valor dessa verba indenizatória.

11.Neste ponto, é possível passar ao enfrentamento da questão central apresentada alhures. A questão a ser elucidada no presente parecer diz respeito ao desconto de 6% do valor do vencimento (salário básico) incidente sobre o valor de tabela do auxílio-transporte.

O problema de fato que reclama solução é o seguinte: como dito acima, os servidores da carreira de técnico-administrativos Universidade Federal da Bahia – UFBa cujo vencimento (salário básico) médio é R$ 2 mil estão sofrendo desconto médio de R$ 120,00 sobre o valor do auxílio-transporte, que, por tabela, é tem o valor máximo de R$ 136,95. Deste modo, o valor efetivamente auferido por mês a título de auxílio-transporte é, em média, R$ 16,95, valor inferior aos R$ 110,00, no mínimo, de despesa mensal efetivamente realizada com transporte coletivo em função do serviço.

Em resumo, o desconto de 6% aplicado pela Autarquia está se afigurando confiscatório, ou seja, está prevalecendo em detrimento da capacidade econômica de seus beneficiários, fazendo com que estes tenham que custear por sua conta e risco as despesas com transporte coletivo realizadas exclusivamente em função do serviço, o que implica em redução injusta da remuneração.

12. Segundo o art. 2º da MP n° 2.165- 36/, a forma de apuração do auxílio-transporte é a seguinte:

Art. 2º  O valor mensal do Auxílio-Transporte será apurado a partir da diferença entre as despesas realizadas com transporte coletivo, nos termos do art. 1º, e o desconto de seis por cento do:

[...]

II - vencimento do cargo efetivo ou emprego ocupado pelo servidor ou empregado, ainda que ocupante de cargo em comissão ou de natureza especial;

[...]

13. Para evitar que o desconto de 6% fosse confiscatório, andou muito bem o legislador ao prescrever no § 2º, art. 2º, da MP n° 2.165- 36/01 o seguinte:  

O valor do Auxílio-Transporte não poderá ser inferior ao valor mensal da despesa efetivamente realizada com o transporte, nem superior àquele resultante do seu enquadramento em tabela definida na forma do disposto no art. 8o.

A regra supracitada estabelece o piso do auxílio-transporte e o teto do desconto de 6%. O piso do auxílio-transporte, ou seja, o valor mínimo que o servidor deve receber mensalmente em qualquer hipótese está previsto na primeira pare do § 2º, art. 2º, da MP n° 2.165- 36/01 que deve ser lido da seguinte forma: "O valor do Auxílio-Transporte [em hipótese alguma] não poderá ser inferior ao valor mensal da despesa efetivamente realizada com o transporte...". E isso se coaduna o previsto no caput do art. 2º que assim determina: O valor mensal do Auxílio-Transporte será apurado a partir da diferença entre as despesas realizadas com transporte coletivo [..] e o desconto de seis por cento ...".

14. O teto do valor desconto de 6%, por seu turno, é o valor igual ao valor máximo de tabela do auxílio-transporte. No caso da Universidade Federal da Bahia – UFBa o valor máximo do auxílio-transporte é de R$ 136,95 (cento e trinta e seis reais e noventa e cinco centavos). Logo, o valor do desconto de 6% não poderá ser superar o valor de tabela do auxílio-transporte (R$ 136,95) para evitar que ele exorbite o benefício e alcance o vencimento do servidor. Essa limitação é óbvia e dispensa maiores investigações porque o servidor não poderá sofrer desconto em folha de pagamento relativo ao auxílio-transporte superior ao proveito que faz jus para que não remunere um benefício. Se isso ocorresse, não seria um benefício, mas um pagamento.

15. Surge aqui uma questão, determinar a finalidade do desconto de 6% previsto na lei. Pois bem. Com base na índole do regime jurídico-administrativo que tem o vezo de editar normas que visam evitar ilegalidades, como também como base no fato de que muitos Órgãos e Entidades têm autonomia para o valor de tabela de seu auxílio-transporte, pode-se asseverar que o desconto de 6% é uma medida de controle preventivo, estabelecida a priori na lei objetivando evitar pagamentos exorbitantes a título de auxílio-transporte. Por isso mesmo, o legislador cuidou para que ele não se tornasse confiscatório. Para tanto, institui um piso do auxílio e um teto para o desconto de 6%, ambos no § 2º, art. 2º, da MP n° 2.165- 36/01, como visto acima. Repita-se:

"O valor do Auxílio-Transporte não poderá ser inferior ao valor mensal da despesa efetivamente realizada com o transporte [Piso], nem superior àquele resultante do seu enquadramento em tabela definida na forma do disposto no art. 8º [Teto]."

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16.O que foi dito até aqui pode ser demonstrado no gráfico 1 abaixo:

 

Piso do auxílio-transporte

 

Desconto de 6%

 

Teto

Não poderá ser inferior ao valor mensal da despesa efetivamente realizada com o transporte.

Norma de controle preventivo. Vedação a pagamentos exorbitantes.

Valor da tabela, R$ 136,95 (cento e trinta e quatro reais e noventa e cinco centavos).

17. A título exemplificativo, para um servidor cujo vencimento (salário básico) é de R$ 2 mil reais, que realiza despesa mensal de R$ 110,00 (cento e dez reais) com transporte e cujo valor máximo de tabela do auxílio-transporte em seu Órgão ou Entidade é de R$ 136,95 (cento e trinta e seis reais e noventa e cinco centavos), teríamos o seguinte:

a) piso do auxílio-transporte a ser recebido mensalmente seria igual a R$ 110,00;

b) valor do desconto de 6%, em abstrato, igual a R$ 120,00;

c) valor efetivo do desconto de 6%, como base na limitação imposta pelo piso e pelo teto, igual a R$ 26,95;

O que, de igual modo, pode ser representado no gráfico 2 abaixo:

 

Piso do auxílio-transporte

 

Desconto de 6%

 

Teto

 

R$ 110,00

 

R$ 26,95

 

Valor da tabela, R$ 136,95.

Somente assim estar-se-ia cumprimento fielmente a lei, atendendo:

- à função indenizatória (de ressarcimento) do benefício do auxílio-transporte;

- à finalidade do desconto de 6%, que é a de coibir pagamentos exorbitantes e não a de ser um desconto confiscatório;

- ao teto do desconto de 6% que o proíbe de superar o valor máximo do benefício previsto em tabela para evitar sua invasão no vencimento do servidor, transformando um benefício em um pagamento;

- e, por fim, atenderia o piso do auxílio-transporte que determina que o valor do Auxílio-Transporteem hipótese alguma poderá ser inferior ao valor mensal da despesa efetivamente realizada com o transporte.


DA CONCLUSÃO

Portanto, fica evidente que está havendo um grande equívoco por parte da Universidade Federal da Bahia – UFBa na aplicação do desconto de 6% previsto em lei, pois está aplicando-o integralmente, ou seja, em detrimento da capacidade econômica e da função indenizatória do benefício. A Entidade Autárquica, pelo visto, está ignorando o piso do auxílio-transporte previsto no § 2º, art. 2º, da MP n° 2.165- 36/01, como visto acima. Piso este que foi instituído como uma importante garantia a favor do servidor público federal e como forma de garantir que o desconto atendesse a sua finalidade de coibir práticas reprováveis sem que se tornasse uma medida confiscatória. Logo, ao ignorar a regra cogente prevista § 2º, art. 2º, da MP n° 2.165- 36/01, a UFBa está ressarcindo apenas em parte o valor mensal da despesa efetivamente realizada com o transporte do servidor de suas residências para os locais de trabalho e vice-versa, o que desnatura a finalidade da norma.

É o parecer.

Salvador, 26 de maio de 2011.


Nota

01 Art. 8º. Quando os pedidos de uma pluralidade de interessados tiverem conteúdo e fundamentos idênticos, poderão ser formulados em um único requerimento, salvo preceito legal em contrário.

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Sobre o autor
Paulo Sérgio Souza Andrade

Graduado em Direito pela Universidade Federal da Bahia - UFBa.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ANDRADE, Paulo Sérgio Souza. Valor do auxílio-transporte do servidor federal: valor do ressarcimento. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2955, 4 ago. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/19696. Acesso em: 23 abr. 2024.

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