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Os benefícios e atos não permitidos à pessoa jurídica beneficiária do PAT

30/05/2012 às 15:38
Leia nesta página:

É possível a substituição do item cesta básica para cartão alimentação a todos os funcionários da empresa beneficiária do PAT. Mas é ilegal a implementação de valores diferenciados para os vários cargos existentes na empresa.

A empresa Consulente inicia a consulta aduzindo que distribuía cesta básica a todos os funcionários e por motivos do seu interesse deseja substituir o item cesta básica para cartão alimentação. Informa ainda, que está devidamente inscrita no PAT.

Além disso, o questionamento suscitado também caminha no sentido da possibilidade jurídica de implementar valores diferenciados para os vários cargos existentes, quanto maior o valor da remuneração em razão do cargo, maior o valor do vale alimentação.

Questiona-se: as mudanças tem sustentação legal e jurisprudencial?


PARECER JURÍDICO

De: Dra. Juliana Araújo Simão Curi

Para: Empresa Consulente

Senhor Gerente do Departamento de Recursos Humanos,

Com relação às questões sobre a substituição do item cesta básica para cartão alimentação, e a implementação de valores diferenciados para os vários cargos existentes, passo a analisar os assuntos.

Inicialmente, insta destacar que embora não seja conceituada pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), pois seu artigo 457 apenas define os elementos que a integra – habitualidade, periodicidade, quantificação, essencialidade e reciprocidade -, compreende-se a remuneração tanto como conjunto de vantagens cujo valor é pago diretamente pelo empregador ao empregado (salário), quanto o pagamento feito por terceiros, que corresponde às gorjetas. Ou seja, a remuneração é composta pelo salário e a gorjeta, se houver.

Ademais, haja vista que o salário pode ser pago também em utilidades, de forma habitual e considerada in natura, nos termos do artigo 458, da CLT, Sérgio Pinto Martins (Direito do Trabalho. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 212) define a remuneração como

[…] o conjunto de prestações recebidas habitualmente pelo empregado pela prestação de serviços, seja em dinheiro ou em utilidades, provenientes do empregador ou de terceiros, mas decorrente do contrato de trabalho, de modo a satisfazer suas necessidades básicas e de sua família.

É importante salientar que atualmente não há relação entre o trabalho prestado e o salário pago, haja vista que “[...] a natureza salarial do pagamento não ocorre apenas quando haja prestação de serviços, mas nos períodos em que o empregado está à disposição do empregador, durante os períodos de interrupção do contrato de trabalho ou outros que a Lei indicar” (MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 213).

Tratando-se do salário em utilidades, também conhecido como salário in natura ou salário indireto, ele irá decorrer do contrato ou do costume, de modo que o empregador, além do pagamento em dinheiro, poderá fornecer utilidades ao empregado, como alimentação, habitação, vestuário, dentre outras prestações in natura, exceto bebidas alcoólicas ou drogas nocivas, como o cigarro (parte final do artigo 458, da CLT e inciso II, da Súmula 367, do Tribunal Superior do Trabalho – TST). Para isso, os dois critérios básicos são a habitualidade (artigo 458, da CLT) e a gratuidade, embora não deixe de ter aspecto de compensação econômica pelo trabalho prestado. Logo, se houver cobrança de utilidade pelo empregador, a prestação fornecida ao obreiro deixará de ter natureza salarial.

Os vestuários, equipamentos e acessórios fornecidos ao empregado para a prestações dos respectivos serviços, no local de trabalho, não constituem utilidades (§ 2º, do art. 458, da CLT).

A título de elucidação, brilhantemente, Fernando Pinto Martins (Direito do Trabalho. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2009, p. 222) pondera a possibilidade/interesse do empregador e a necessidade do empregado em receber o salário utilidade:

O ideal seria que a utilidade fosse fornecida pelo empregador em qualquer caso. A lei não deveria determinar que se trata de salário, pois o empregador não irá fornecê-la se ela tiver natureza salarial ou se incidir o FGTS ou a contribuição previdenciária. Assim, deveria ser modificada a redação do art. 458 da CLT, desconsiderando-se a utilidade como salário, pois nesse caso o empregador iria passar a fornecer a utilidade ao empregado, sem se preocupar se a verba tem ou não natureza salarial. Iria também incentivar o empregador a concedê-la. Para o empregado também seria positiva a determinação, pois passaria a receber a utilidade num maior número de hipóteses do que as atuais, sem ter de pagar por ela.

No caso colocado em análise, percebe-se que a empresa é integrante do Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT), criado e regulamentado pela Lei nº 6.321, de 14 de abril de 1976 e pelo Decreto nº 5, de 14 de janeiro de 1991.

Em relação à finalidade do PAT, pode-se dizer que, acima de qualquer outra, é conceder às pessoas jurídicas integrantes do Programa, favor fiscal e indenizatório, haja vista que dispõe sobre a dedução,

[...] do Imposto de Renda devido, valor equivalente à aplicação de alíquota cabível do Imposto de Renda sobre a soma das despesas de custeio realizadas, no período-base, em Programas de Alimentação do Trabalhador (artigo 1º, do Decreto nº 5/91).

As empresas só farão jus ao PAT se forem aprovadas pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social (MTPS), na forma regulamentada pelo Decreto nº 5/91. Os obreiros, por sua vez, arcarão com o montante de até 20% do custo direto da refeição, calculado conforme o período da execução do Programa aprovado pelo MTPS, limitado ao máximo de doze meses (§§1º e 2º, do artigo 2º, do Decreto nº 5/91).

O caput do artigo 2º do Decreto determina que os trabalhadores de renda mais elevada, contratados pela pessoa jurídica beneficiária, só poderão ser incluídos depois que os trabalhadores que auferem renda de até cinco salários mínimos estiverem garantidos pelo Programa.

Em vista da solução do segundo questionamento, a implementação de valores diferenciados para cada cargo há de ser analisada.

Isso porque o parágrafo único, do artigo 3º, da Portaria 3, de 01 de março de 2002, da Secretaria de Inspeção do Trabalho e do Diretor do Departamento de Segurança e Saúde no Trabalho (SIT/DSST 3/2002), não autoriza a diferenciação de valores entre os trabalhadores, mesmo que ocupem cargos e funções diferenciados, bem como independe da duração da jornada de trabalho. Até porque, se houvesse diferenciação nos valores, conforme se questiona, entende-se que seria uma alternativa para camuflar o aumento salarial ou configuraria premiação indireta.

Além disso, tal diferenciação fere o princípio constitucional da isonomia de tratamento consagrados no caput do artigo 5º e nos incisos XXX, XXXI e XXXII, do artigo 7º, da Carta Magna.

Por outro lado, a cartilha elaborada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) esclarece que se a empresa beneficiária do PAT tiver filiais em regiões diferentes, poderá ter referida diferenciação entre os empregados, em razão da variação de custo de vida em cada lugar (condição excepcional). Prevê a cartilha: “poderá conceder benefícios diferenciados por região, desde que os valores dados aos trabalhadores na mesma filial sejam de igual valor e atendam à legislação supracitada”.

Desta forma, se os funcionários referidos na consulta trabalharem na mesma filial, a diferenciação de valores para o pagamento do vale-alimentação é inconstitucional e ilegal.

Consoante o artigo 6º, da SIT/DSST 3/2002, a pessoa jurídica beneficiária não pode:

I- suspender, reduzir ou suprimir o benefício do Programa a título de punição ao trabalhador;

II- utilizar o Programa, sob qualquer forma, como premiação;

III- utilizar o Programa em qualquer condição que desvirtue sua finalidade.

Assim, a pessoa jurídica beneficiária pode oferecer refeições, distribuir alimentos e firmar convênios com entidades fornecedoras de alimentação coletiva, sendo, em qualquer hipótese, responsável pelas irregularidades resultantes da execução do PAT (artigo 4º, Decreto nº 5/91). Ademais, observa-se que a execução inadequada do Programa, “[...] o desvio ou desvirtuamento de suas finalidades acarretarão a perda do incentivo fiscal e aplicação das penalidades cabíveis” (artigo 8º, Decreto nº 5/91).

Apesar da impossibilidade de premiação, a pessoa jurídica beneficiária poderá recompensar os trabalhadores dispensados no período de transição para novo emprego, até o limite de seis meses, e os empregados com contrato de trabalho suspenso para participação em curso ou programa de qualificação profissional, até cinco meses, poderão fazer jus ao benefício, caso assim entendam a pessoa jurídica beneficiária do PAT (§§ 2º e 3º, do artigo 2º, da Lei nº 6.321/76).

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O artigo 6º do Decreto nº 5/91, assim como a Orientação Jurisprudencial da SBDI-1 (OJ SBDI-1) nº 133 esclarecem que a ajuda fornecida, aos trabalhadores, pelas empresas participantes do PAT não integram o salário para nenhum efeito legal. Neste sentido, vale transcrever o artigo 6º:

Nos Programas de Alimentação do Trabalhador (PAT), previamente aprovados pelo Ministério do Trabalho e da Previdência Social, a parcela paga in natura pela empresa não tem natureza salarial, não se incorpora à remuneração para quaisquer efeitos, não constitui base de incidência de contribuição previdenciária ou do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço e nem se configura como rendimento tributável do trabalhador.

 Isso implica que se o vale-alimentação, vale-refeição ou cesta básica, for fornecido nos termos do PAT e com auxílio módico do trabalhador, excepcionalmente, não possuirá natureza salarial, pois, nessas condições, e diante da finalidade do Programa, parece razoável não o considerar salário.

Desta forma, embora não haja dúvida quanto à natureza não salarial do vale-alimentação para as empresas integrantes do PAT, vale transcrever a decisão do Tribunal Regional Federal 2ª Região:

INTEGRAÇÃO DA AJUDA ALIMENTAÇÃO. PAT. INDEVIDA. Excepcionalmente, quando concedida pelo empregador como ajuda de custo, na forma de "vale-refeição ou vale-alimentação", para atendimento do Programa de Alimentação do Trabalhador - PAT, ou ainda, por força de preceito convencional que lhe confira natureza equivalente à do PAT, é que o benefício em tela não se reveste de natureza salarial nem se configura rendimento tributável pela previdência social, não integrando assim, o ganho do trabalhador para qualquer feito reflexo (TRT 2ª Região; 4ª Turma; Recurso Ordinário; Julgamento 01/09/2009; Relator: Ricardo Artur Costa e Trigueiros; Ac. Nº: 20090730881; Processo nº: 00576-2008-085-02-00-1 2009; Turma: 4ª).

Caso a pessoa jurídica não seja aprovada para participar do PAT ou inexistindo-o, aplica-se o disposto na Súmula nº 241, do TST, a qual estabelece que o vale-refeição “fornecido por força do contrato de trabalho, tem caráter salarial, integrando a remuneração do empregado, para todos os efeitos legais”.

Esclarecendo a primeira emblemática do caso, o vale ou ticket alimentação, refeição ou cesta básica, por terem caráter alimentar, podem ser substituídos um pelo outro, desde que assim seja a todos os trabalhadores, pois não há o que se falar, tampouco, em direito adquirido, haja vista que o fim único do PAT é benefício fiscal e indenizatório à empresa.

Outro ponto que se pode depreender da substituição da cesta básica pelo cartão alimentação, conforme se propôs nesta consulta, é a facilidade e, de certa forma, a liberdade de consumo adquirida pelo trabalhador, pois ele pode usar o crédito conforme suas necessidades alimentares.

Nota-se, portanto, que caso queira fornecer vale-alimentação, vale-refeição ou cesta básica destituído de caráter salarial, o empregador deverá ser integrante do PAT, nos termos das condições estabelecidas pelo Regulamento, procedimento este que não lhe acarretará ônus, mas, sim benefício, pois obterá isenções fiscais, conforme aludido anteriormente.

Em face do exposto, considerando os fundamentos jurídicos do PAT, pode-se afirmar que a pessoa jurídica beneficiária do PAT ao oferecer auxílio-alimentação, possui total liberalidade para conceder ou não o benefício a todos os seus empregados, sem distinção, bem como para estabelecer a forma de concessão. No entanto, não poderá diferenciar o valor para os funcionários da pessoa jurídica integrante do PAT de mesma filial e a suspensão, supressão ou redução do valor do vale-alimentação só poderá acontecer coletivamente.

Assim, de acordo com tais conclusões, entendo ser possível a substituição do item cesta básica para cartão alimentação a todos os funcionários da empresa, que é beneficiária do PAT. De outra banda, entendo ser juridicamente inconstitucional e ilegal a implementação de valores diferenciados para os vários cargos existentes na empresa, considerando que os funcionários trabalham na mesma filial.

É o parecer.

Uberlândia, 29 de maio de 2012.

_____________________________

Juliana Araújo Simão Curi

Consultora Jurídica

OAB/MG 136.006

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Sobre a autora
Juliana Araújo Simão Curi

Consultora jurídica em Uberlândia (MG).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CURI, Juliana Araújo Simão. Os benefícios e atos não permitidos à pessoa jurídica beneficiária do PAT. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3255, 30 mai. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/21902. Acesso em: 20 abr. 2024.

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