REMUNERAÇÃO POR PRODUTIVIDADE. TRANSFORMAÇÃO EM BENEFÍCIO DECORRENTE DE QUANTIDADE FIXA DE QUOTAS MENSAIS. INCORPORAÇÃO. A essência da remuneração por produtividade é exatamente decorrer da variação em razão da mensuração do desempenho do servidor pelo exercício das atribuições próprias de seu cargo ou função. A fixação de remuneração baseada em quantidade preestabelecida e invariável de quotas mensais, atribuíveis a todos os ocupantes do cargo, desnatura a remuneração por produtividade. A incorporação das diferenças remuneratórias decorrentes do prêmio produtividade, conflita flagrantemente com o sistema vigente, posto que afronta a essência da remuneração mediante a produtividade. A fixação da jornada de trabalho de seus servidores é prerrogativa da Administração local, no exercício de sua autonomia constitucional e respeitadas as peculiaridades locais e de cada cargo.
CONSULTA
Encaminhou-nos Prefeitura Municipal consulta na qual formula questão objetiva, nos seguintes termos:
“Solicitamos a emissão de parecer jurídico quanto à legalidade de se transformar o prêmio produtividade a que faz juz o Fiscal de Rendas de acordo com a quantidade de quotas que lhe são atribuídas pelo trabalho fiscal realizado, conforme estabelecido na Lei nº 4028, de 13 de setembro de 1994, em benefício com quantidade fixa de quotas mensais” (negritamos).
Complementarmente, a consulente forneceu cópia integral de expediente interno e da Lei referida, atualizada.
Do referido expediente constam três minutas de projetos de lei, às fls. 2/3, às fls. 13, e ainda outra às fls. 14/15, sem esclarecimento quanto àquela que efetivamente se pretende seja analisada, motivo pelo qual será enfocada somente a de fls. 13, especificamente naquilo que implicar em alteração do sistema de remuneração por produtividade. A opção pela minuta constante de fls. 13 decorre do fato de que nesta consubstanciam-se as disposições de real impacto em relação ao sistema de remuneração por produtividade, objeto específico da consulta acima transcrita.
Nada obsta que, mediante consulta mais direcionada, sejam analisadas futuramente outras propostas.
PARECER
A Lei municipal vigente, de 13 de setembro de 1994, dispõe que:
“Art. 2º - O Fiscal de Rendas sujeita-se à prestação de 44 (quarenta e quatro) horas semanais de trabalho.
(...)
Art. 5º - O Fiscal de Rendas faz jus ao ‘Prêmio Produtividade’, apurado e atribuído mensalmente em quantidade de quotas, na forma a ser estabelecida pelo Poder Executivo, pelo exercício das funções previstas no artigo 1º desta lei, com exceção da fiscalização direta de tributos.
§ 1º - O limite máximo do ‘Prêmio Produtividade’ pelo exercício da fiscalização direta de tributos, para efeito da percepção mensal, é de 75% (setenta e cinco por cento) da quantidade fixada no ‘caput’ deste artigo.
§ 2º - O valor unitário das quotas referidas nesta lei é a importância correspondente a 0,10% (dez centésimos por cento) sobre a referência salarial do Fiscal de Rendas.
§ 3º - revogado
§ 4º - O Prefeito Municipal designará, por portaria, um Fiscal de Rendas para desempenhar a função de Fiscal Revisor, cujas atribuições serão definidas em decreto do Executivo.
§ 5º - O Fiscal de Rendas que estiver no desempenho da função de Fiscal Revisor receberá o Prêmio Produtividade na quantidade fixa de 3.870 (três mil oitocentas e setenta) quotas por mês e não poderá recebê-lo cumulativamente caso também atue na fiscalização direta.
Art. 6º - A atribuição do ‘Prêmio Produtividade’ ao Fiscal de Rendas, que exerça a função de fiscalização direta de tributos, far-se-á com base na respectiva produção realizada no mês.
§ 1º - O trabalho fiscal, programado ou não, será realizado por determinação escrita da respectiva Chefia, salvo nos casos emergenciais em que o Fiscal de Rendas adotará, de plano, todas as medidas necessárias a assegurar e garantir ação fiscal, comunicando à Chefia, posteriormente, no máximo até o dia seguinte ao do início da ação fiscalizadora.
§ 2º - A produção será determinada mediante atribuição de quotas por trabalho fiscal realizado, observando-se, para esse fim, as condições e limites estabelecidos na ‘Tabela de Atribuição de Quotas’, que será elaborada pelo Poder Executivo, via decreto.
§ 3º - Se a produção mensal realizada pelo Fiscal de Rendas ultrapassar o limite de quotas previsto no artigo 5º, o excesso destinar-se-á à compensação de insuficiências verificadas nos meses subseqüentes.
§ 4º - No caso de substituição em quaisquer das funções internas previstas no artigo 1º, o substituto fará jus ao ‘Prêmio Produtividade’ atribuído à respectiva função durante o tempo em que a desempenhar; em ocorrendo no curso do mês, o Fiscal de Rendas fará jus à quotas a que tem direito, calculadas proporcionalmente em relação a cada situação, observado o limite estabelecido no artigo 5º.
§ 6º - Cada fiscal poderá acumular, no máximo, o teto de 15.000 (quinze mil) quotas.
§ 7º - Não haverá, em hipótese alguma, o pagamento das quotas que excederem o teto fixado no parágrafo anterior, inclusive nos casos de aposentadoria, exoneração, demissão e outros.
Art. 7º - Para fins de aposentadoria, a incorporação do Prêmio Produtividade se dará mediante a apuração da média aritmética dos percentuais obtidos em cada ano de serviço prestado com o recebimento do benefício, consecutivos ou não, correspondendo, cada ano, a 1/10 (um décimo) da incorporação, observados os limites fixados nesta Lei.
§ 1º - O servidor titular do cargo efetivo de Fiscal de Rendas, que exerceu ou que estiver no exercício de cargo em comissão, desde que este seja pertencente ao Quadro da Secretaria Municipal da Fazenda, para os fins exclusivamente de aposentadoria, terá assegurado o Prêmio Produtividade na quantidade de quotas fixada no caput do artigo 5º, desta Lei.
§ 2º - Para a incorporação do Prêmio Produtividade na aposentadoria do servidor que tenha recebido o benefício em mais de uma das formas estabelecidas nesta Lei, deverá ser observada a proporcionalidade entre os respectivos períodos.
(...)
Art. 9º - Os benefícios desta lei aplicam-se aos servidores do quadro inativo, aposentados em cargo de Fiscal de Rendas, na mesma forma e proporção do fixado no artigo 5º” (negritamos).
O regramento local indicado evidencia que o embasamento para a remuneração por produtividade decorre de variação constatada em mensuração do desempenho do servidor pelo exercício das atribuições próprias de seu cargo ou função.
O entendimento prevalecente quanto à modelagem da remuneração variável, inclusive na Administração Pública, é no sentido de que o pressuposto essencial para seu funcionamento é o envolvimento, o efetivo comprometimento, dos servidores com as metas a serem alcançadas.
Os termos em que for estabelecido esse compromisso, e a efetiva implementação deste por ambas as partes, serão determinantes para que o comprometimento se consolide e se converta em resultados concretos. Deste comprometimento, representativo do alinhamento de esforços na persecução de metas comuns, espera-se que venham os resultados, dos quais devem decorrer diretamente as “recompensas”, traduzidas no reconhecimento mediante aumento proporcional da remuneração.
Sob o enfoque da Administração, outro aspecto que atende ao interesse público, além do atinguimento de suas metas, é a possibilidade de recompensar os esforços dos servidores sem a oneração de seu custo fixo, ou seja, sem o comprometimento deste em outras oportunidades nas quais os resultados não se apresentem igualmente favoráveis. Isto mesmo que não exista vinculação direta, ou condicionamento, entre o pagamento da premiação e o aumento da arrecadação, decorrente das ações fiscais que venham a ser implementadas.
É indiscutível que somente os incentivos econômicos representados pela remuneração variável não se apresentam como suficientes para a motivação dos servidores. Dentro da concepção de modernização da gestão de pessoal encontra-se a necessidade de adoção de incentivos outros, como a reorganização das atividades, de forma a assegurar a ampliação da participação e autonomia dos servidores, concomitantemente com a busca de maiores oportunidades de seu aperfeiçoamento e desenvolvimento profissional. Mas a somatória de todos estes incentivos apresenta-se como mecanismo eficiente para o aperfeiçoamento do exercício das atribuições da Administração, com os melhores resultados obtidos revertendo para os munícipes.
Mesmo que no caso da consulente o compromisso não se formalize mediante um “acordo de resultados” entre as partes, as disposições legais vigentes e acima transcritas estabelecem, na prática, um “contrato de adesão” ao qual os servidores se vinculam para a percepção da remuneração variável, ou “prêmio produtividade”, na medida em que implementem sua parte no “programa”. Não adimplindo sua parte, deixam de perceber o acréscimo correspondente.
As informações constantes do expediente encaminhado por cópia dão conhecimento de que o referido mecanismo foi implantado originalmente pela Lei municipal de 1975, portanto, reúne experiência nada desprezível de, aproximadamente, 36 anos.
Por seu turno, a minuta constante de fls. 13 (reiterando-se que existe uma às fls. 2/3, e ainda outra às fls. 14/15, o que gera dúvidas quanto àquela que se pretenderia fosse analisada, o que nos leva a enfocar somente a de fls. 23, posto que nesta consubstanciam-se as disposições de real impacto em relação ao sistema de remuneração por produtividade), e que segundo consta do expediente consubstanciaria reivindicação dos fiscais municipais (fls. 9, primeiro parágrafo da informação técnica), tem o objetivo de alterar o teor dos seguintes dispositivos:
“Art. 2º - O Fiscal de Rendas sujeita-se à prestação de 40 (quarenta) horas semanais de trabalho.
(...)
Art. 5º - (...)
§ 1º - O Fiscal de Rendas, pelo exercício da fiscalização direta de tributos, receberá o Prêmio Produtividade na quantidade fixa de 3.525 (três mil, quinhentos e vinte e cinco) quotas por mês.
(...)
Art. 6º - A atribuição do ‘Prêmio Produtividade’ ao Fiscal de Rendas, que exerça a função de fiscalização direta de tributos, far-se-á com base na quantidade fixa de quotas atribuída, por mês”.
Além disso, pretende acrescer ao artigo 5º, da lei, disposição no seguinte teor:
“§ 6º - O Prêmio Produtividade será incorporado à remuneração na proporção das quotas recebidas na quantidade fixa respectivamente na função exercida, como Chefe da Fiscalização, Fiscal Revisor e Fiscal Direto de Tributos, obtidos em cada ano de serviço prestado, consecutivos ou não, correspondendo, cada ano, a 1/10 (um décimo da incorporação, observados os limites fixados nesta Lei” (negritamos).
Trata-se de reivindicação dos próprios ocupantes do cargo de fiscal de rendas, apresentada ao Executivo, cabendo ressaltar-se que a pretensão conflita radicalmente com o espírito da lei vigente, que estabeleceu um sistema de remuneração por produtividade, cuja essência é exatamente decorrer da variação em razão da mensuração do desempenho do servidor pelo exercício das atribuições próprias de seu cargo ou função.
A consequência direta e inafastável da eventual implantação da nova redação proposta para o § 1º do artigo 5º, e o artigo 6º, seria a extinção da remuneração decorrente da produtividade.
Restará revogado o sistema implantado há aproximadamente 36 anos, na medida em que a produtividade deixará de servir de parâmetro para a remuneração. Ademais, em prosperando tal pretensão, obrigatoriamente, por questão de respeito à lógica, deverá ser alterado o nome do instituto, posto que não mais será um “prêmio produtividade”.
A Administração deve atentar para os reais efeitos da alteração reivindicada pelos seus servidores, tendo presente que a preservação tão somente do nome “prêmio produtividade” não impedirá a radical alteração de sua natureza, resultando na extinção do sistema vigente.
A outra pretensão, consistente na incorporação contida na disposição incluída pelo § 6º ao artigo 5º, conflita flagrantemente com o sistema vigente, posto que afronta a essência da remuneração mediante a produtividade.
Ademais disso, o Código de Administração do Município consulente, estabelecido por Lei Complementar de 17 de dezembro de 1991, acerca das possibilidades admitidas para a incorporação à remuneração do cargo ou função, dispõe:
“Art. 135 - O servidor titular de cargo efetivo ou ocupante de função estável pela Constituição Federal que tenha exercido cargo em comissão terá incorporado à remuneração do seu cargo ou função, conforme o caso, o adicional correspondente a 5% (cinco por cento) do valor do respectivo Símbolo, por ano, ininterrupto ou não, até o limite de 60% (sessenta por cento) de cada Símbolo.
§ 1º - Quando se tratar de cargo de Secretário Municipal ou de cargos correspondentes aos Símbolos C-1 e C-A, a incorporação de que trata o caput deste artigo será de 10% (dez por cento) do valor de cada subsídio ou símbolo, por ano, ininterrupto ou não, até o limite de 80% (oitenta por cento) de cada subsídio ou símbolo.
§ 2º - Para fins de incorporação, o período inferior a 1 (um) ano em determinado cargo poderá ser somado para completar o período de outro, devendo, neste caso, ser incorporado o percentual correspondente ao cargo exercício por mais tempo no ano que resultar da soma dos períodos.
§ 3º - O adicional correspondente à incorporação:
I - não será devido durante o período em que o servidor estiver ocupando qualquer cargo em comissão;
II - integrará a remuneração para todos os efeitos legais;
§ 4º - A incorporação dependerá de requerimento do servidor” (negritamos).
A legislação local estabelece, expressamente, a hipótese de incorporação de diferenças remuneratórias, ou seja, simplificadamente, pode ser afirmado que o objetivo destas disposições é garantir àquele servidor que assuma, transitoriamente, em face do caráter inerente ao cargo de provimento em comissão, o exercício de atribuições normalmente revestidas de maior responsabilidade e onerosidade pessoal, e, consequentemente, percebendo maior retribuição salarial mensal, quando vier a retornar ao exercício de seu cargo efetivo, tenha minorado o impacto da diminuição na sua remuneração, passando a ter incorporado à sua remuneração um percentual, ou até mesmo a totalidade, da diferença entre as duas remunerações (proporcionalmente aos períodos anuais que implemente no exercício – de 1 até 10 anos – daquele cargo em comissão).
Não é, em nenhuma hipótese, a situação fática existente e objeto da pretensão apontada.
Há um detalhe relevante que deve ser observado pelo Município. O “prêmio produtividade” consiste em parcela remuneratória que assume feições de vantagem pecuniária, até o momento de natureza temporária, que se pretende incorporar, conforme prevê o § 6º a ser incluído ao artigo 5º, e, como tal, é parte inerente ao tema “regime jurídico de pessoal”, que, nos termos do artigo 40, parágrafo único, inciso V, da Lei Orgânica Municipal, há de ser tratada pela espécie legislativa “lei complementar”. Este é um cuidado que deve ter Município, sob pena de aprovar alteração que conflita flagrantemente com o sistema vigente, sem perder de vista que os artigos 5º a 7º e 9º, da propositura, deveriam ser estabelecidos em lei complementar e não em lei ordinária e somente por aquela é que pode ser modificada.
Em relação à jornada de trabalho de seus servidores, objeto da pretensão contida na nova redação para o caput do artigo 2º, incumbe à Administração fixá-la, no exercício de sua autonomia constitucional e respeitadas as peculiaridades locais e de cada cargo. É a lição de estudo desenvolvido neste Cepam[1]:
“Ao se criarem os cargos, empregos ou funções públicas no âmbito da Administração Pública, fixam-se os respectivos vencimentos a serem percebidos pelos servidores públicos, e aqueles que ingressarem no serviço público, por meio de concurso público ou por nomeação para cargos em comissão, sujeitar-se-ão ao horário e à jornada de trabalho estabelecidos pelo Poder Público, sem qualquer interferência da legislação federal ou estadual.
Queremos, com isso, afirmar que o Município, no contexto de sua autonomia constitucional, tem o poder de fixar as regras a que se submeterão os seus servidores, a envolver a jornada de trabalho de cada qual. (...)
É de se notar que a Suprema Corte brasileira reconhece a autonomia dos Estados-membros da Federação e, por via reflexa, dos municípios, para organizarem os seus serviços, com a fixação do normativo jurídico a que os servidores públicos se submeterão, a incluir a jornada de trabalho de todos, sem exceção" (negritamos).
Assim, este aspecto da propositura, não encontra obstáculo que a inviabilize.
Isto posto, no mais, em relação à fixação de remuneração baseada em quantidade preestabelecida e invariável de quotas mensais, atribuíveis a todos os ocupantes do cargo, restaria desnaturada a remuneração por produtividade, afrontando o sistema vigente, o que se afigura como um inegável retrocesso nos avanços obtidos na gestão de pessoal, introduzidos pela lei vigente.
A pretendida incorporação (§ 6º, do art. 5º) conflita claramente com o referido sistema, visto que contraria a essência da remuneração mediante a produtividade.
É o parecer.
Nota
[1] Parecer Cepam 28.239, de 8 de novembro de 2010.