Inexigibilidade de licitação para treinamento profissional

22/05/2017 às 16:06
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Trata-se de parecer jurídico exarado com o objetivo de orientar a Administração Pública Municipal nas eventuais contratações de serviços técnicos especializados para treinamento de seu pessoal.

PARECER JURÍDICO Nº 432/2017

REFERÊNCIA: PROCESSO ADM. Nº XXX/2017

INTERESSADO: COMISSÃO DE LICITAÇÕES

ASSUNTO: SERVIÇOS DE CURSO DE GRADUAÇÃO PARA SERVIDORES PÚBLICOS – CUMPRIMENTO DA LEI Nº 8.666/93 – INEXIGIBILIDADE.


I - RELATÓRIO

1.    Trata-se de expediente encaminhado para análise e emissão de parecer quanto à realização de procedimento de inexigibilidade de licitação para contratação de serviços de formação superior para servidores do município.

2.    Os documentos vêm para análise, despacho da Comissão de Licitação, autorização do Prefeito Municipal, parecer contábil indicando a dotação e parecer orçamentário indicando a disponibilidade financeira, cumprindo o art. 38 da Lei nº 8.666/93.

3.    Verifico o cumprimento o art. 15 da Lei de Licitações porque há comprovação de que houve pesquisa de mercado. 

4.    É indicado o valor total da pretensa contratação de R$ XXXXX.

5.    É o relatório, passo a opinar.


II - FUNDAMENTAÇÃO

6.    Cabe iniciar dizendo que, a teor do art. 37, XXI da Constituição Federal, o processo licitatório prévio à contratação é a regra, sendo outras hipóteses de não prescindência a exceção.

7.    A comissão indica como inexigível a licitação, porém nos termos do art. 25 da Lei nº 8.666/93, está disposto: 

Art. 25. É inexigível a licitação quando houver inviabilidade de competição, em especial:

[...]

II - para a contratação de serviços técnicos enumerados no art. 13 desta Lei, de natureza singular, com profissionais ou empresas de notória especialização, vedada a inexigibilidade para serviços de publicidade e divulgação;

8.    Os serviços estão assim enumerados no art. 13:

Art. 13.  Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos profissionais especializados os trabalhos relativos a:

I - estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos;

II - pareceres, perícias e avaliações em geral;

III - assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias;

IV - fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços;

V - patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas;

VI - treinamento e aperfeiçoamento de pessoal;

VII - restauração de obras de arte e bens de valor histórico.

9.    Na senda do aperfeiçoamento de pessoal, trago a Decisão nº 439/98 do TCU, da lavra do Min. Adhemar Paladini Ghisi: 

O Tribunal Pleno, diante das razões expostas pelo Relator, DECIDE: 1. considerar que as contratações de professores, conferencistas ou instrutores para ministrar cursos de treinamento ou aperfeiçoamento de pessoal, bem como a inscrição de servidores para participação de cursos abertos a terceiros, enquadram-se na hipótese de inexigibilidade de licitação prevista no inciso II do art. 25, combinado com o inciso VI do art. 13 da Lei nº 8.666/93; 2. retirar o sigilo dos autos e ordenar sua publicação em Ata; e 3. arquivar o presente processo.

10.    No caso em tela, com o devido respeito ouso discordar do TCU, pois de acordo com a legislação de regência do tema, a conditio sine quo non, para enquadrar o tipo de contratação pretendido pelo Município é, ao contrário de uma singularidade ou notória especialização, bem na verdade, uma inviabilidade de competição.

11.    Tenho, a priori, que não se pode cotejar magistério, ou seja, cultura, educação e metodologias de ensino/aprendizagem não devem ser bem postos à venda ou de detenção mitigada por “poucos e bons”, mas, antes disso, são verdadeiros axiomas de aprimoramento da sociedade e da conquista de melhorias da qualidade de vida.

12.    Assim sendo, a inexigibilidade de licitação “se define pela impossibilidade de licitar por inexistirem produtos ou bens que tenham características aproximadas e que, indistintamente, possam servir ao interesse público, ou por inexistir pluralidade de particulares que possam satisfazer o fornecimento de bens e serviços”. (D’AVILA, Vera Lúcia Machado. Temas Polêmicos sobre Licitações e Contratos. 3ª ed. rev. e ampl. São Paulo: Malheiros, 1998)

13.    No mesmo raciocínio:

"Licitação é escolha entre diversas alternativas possíveis. É disputa entre propostas viáveis. A inviabilidade de competição, essencial à inexigibilidade de licitação, quer dizer que esse pressuposto - disputa entre alternativas possíveis - não está presente. Não é possível licitação porque não existem alternativas. O que existe é uma única opção!" (VAZ, Anderson Rosa. Requisitos para a contratação de serviços advocatícios com base em inexigibilidade de licitação. BLC - Boletim de Licitações e Contratos. São Paulo: Editora NDJ, fev. 2004, p. 98.)

14.    E ao arremate:

“Segundo a fórmula legal, a inexigibilidade de licitação deriva da inviabilidade de competição. Essa fórmula não foi explicitada nem  esclarecida pela Lei, que se restringiu a fornecer um elenco de exemplos daquilo que caracteriza inviabilidade de competição. O tema tem sido objeto de contínuas incursões doutrinárias e sérias controvérsias jurisprudenciais, sem que tenham atingido soluções plenamente satisfatórias. Mas há alguns pontos definidos, que podem auxiliar à compreensão do art. 25. Todos esses dados se conjugam para conformar o conceito de viabilidade de competição.” (JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos, 11ª ed., São Paulo : Dialética, 2005, p. 271)

15.    Ao final, cabem ainda as palavras de Jessé Torres:

“...as hipóteses dos incisos não têm autonomia conceitual; entender diversamente significa subordinar o caput do artigo a seus incisos, o que afronta regra palmar de hermenêutica; sendo, como devem ser, os incisos de um artigo subordinados à cabeça deste, a inexigibilidade de licitação materializa-se somente quando a competição for inviável.” (PEREIRA JUNIOR, Jesse Torres. Comentários à Lei das Licitações e Contratações da Administração Pública, 8ª. Rio de Janeiro: Ed. Renovar, 2009, p.342).

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16.    Assim, é caso de licitação inexigível o caso em apreço, na forma do caput do art. 25, porque ao meu particular entendimento, não há como aquilatar, competitivamente, o trabalho dos professores, visto que cada aula ministrada, por si se revela única, não se trata de uma linha de produção, mas sim de instantes personalíssimos de transmissão e aprimoramento do conhecimento. Portanto, do modo com que se dão os critérios de julgamento das licitações, tenho-os por inaplicáveis quanto a este objeto.

17.    Todavia, alerto que não é o parecer jurídico a peça fundamental da motivação do ato, e o faço com base no que escreveu Eros Grau:

Impõem-se à Administração - isto é, ao agente público destinatário dessa atribuição - o dever de inferir qual o profissional ou empresa cujo trabalho é, essencial e indiscutivelmente, o mais adequado àquele objeto. Note-se que embora o texto normativo use o tempo verbal presente (‘é, essencial e indiscutivelmente, o mais adequado à plena satisfação do objeto do contrato’), aqui há prognóstico, que não se funda senão no requisito da confiança. Há intensa margem de discricionariedade aqui, ainda que o agente público, no cumprimento daquele dever de inferir, deva considerar atributos de notória especialização do contratado ou contratada. (Eros Roberto Grau, in Licitação e Contrato Administrativo - Estudos sobre a Interpretação da Lei, Malheiros, 1995, pág. 77)

18.    Aliás, avançando na questão, colaciono o art. 266 da Lei Municipal nº 1.886/94: 

Art. 266. Com o intuito de aprimoramento de seus serviços o Município promoverá:

I - cursos de aperfeiçoamento e especialização profissional em matéria de interesse do município;

II - cursos de extensão, conferências, congressos, publicações e trabalhos referentes ao serviço público;

III - viagens de estudo e visitas a serviços de utilidade pública, para fins de especialização e aperfeiçoamento

19.    Diria que há interesse do Município em capacitar, atualizar e incentivar a pesquisa, o desenvolvimento e o aprimoramento das diversas áreas dos serviços prestados pelos servidores, sendo uma das melhores expressões do princípio da eficiência.

20.    Passando agora a análise da minuta de contrato, verifico que obedece ao disposto na Lei nº 8.666/93, nos arts. 54 a 58, especialmente o art. 55, não havendo maiores comentários a se fazer a esses respeito. 


III - CONCLUSÃO

21.    Diante do exposto, opino que é caso de licitação inexigível nos termos da fundamentação acima.

22.    Anoto, por fim, que o preço da contratação é compatível com outros potenciais fornecedores, cabendo à Comissão de Licitações e ao Prefeito Municipal – enquanto a autoridade superior – justificar a contratação, nos termos do art. 26 da Lei nº 8.666/93.

É o parecer, salvo melhor interpretação. Ressalte-se que o presente Parecer Jurídico foi elaborado tão somente sob o ângulo jurídico e com base nos documentos trazidos à análise, não analisando elementos aprofundados de outras áreas que não a do Direito, bem como critério de conveniência e oportunidade administrativa, escoimando ainda, qualquer responsabilidade de seu signatário conforme o art.2º, § 3º da Lei n. 8.906/94 e entendimento do STJ no RHC: 39644 RJ 2013/0238250-5.

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Sobre o autor
Vinícius Scherch

Graduado em Direito pela Faculdade Cristo Rei, Cornélio Procópio - Paraná (2010). Pós-Graduado em Direito e Processo do Trabalho pela UNOPAR, Campus Bandeirantes - Paraná (2014). Graduado em Gestão Pública pela UNOPAR, Campus Bandeirantes-Paraná (2015). Mestre em Ciência Jurídica pela UENP -Jacarezinho. Advogado na Prefeitura Municipal de Bandeirantes - Paraná.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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