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Mandado de segurança preventivo contra as alterações no Cofins

01/05/1999 às 00:00
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Inicial de mandando de segurança argüindo a inconstitucionalidade da Lei 9718/98, que modificou a alíquota e a base de cálculo do Cofins.

          EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ FEDERAL DA __ VARA DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE RECIFE – ESTADO DE PERNAMBUCO.

          ITECI – INSTITUTO DE TECNOLOGIA EM INFORMÁTICA LTDA, empresa de direito privado com sede nesta cidade, na Rua Real da Torre, 637, Madalena, inscrita no CGC/MF sob o nº 09.465.816/0001-65, vem perante Vossa Excelência, através de seus advogado infra firmado e qualificado no incluso mandato (doc. anexo), impetrar o presente

MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO

          contra ato a ser perpretado pelo ILUSTRÍSSIMO SENHOR DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DE RECIFE, violador de direito líquido e certo da impetrante, pelos motivos de fato e de direito a seguir articulados:  


DOS FATOS

          A ora impetrante é empresa sediada nesta cidade, tendo como objetivo social, dentre outros, a prestação de serviços de consultoria técnica nos campos de processamento de dados e pesquisa operacional, consoante se vê de cópia do incluso contrato social e sua última alteração (doc. anexo).

          Nessa condição, a ora impetrante é contribuinte, por força de expressa disposição legal, da contribuição social denominada COFINS, incidente sobre seu faturamento (art. 195, I, da CF).

          Recentemente, através da edição da Lei nº 9.718/98, o poder legislativo majorou a alíquota da COFINS de 2% (dois por cento) sobre o faturamento para 3% (três) por cento da receita bruta (art. 8º).

          Irresignada com tal majoração, diga-se de passagem - ilegal e inconstitucional - a impetrante pretende suspender provisoriamente a exigibilidade desse tributo, via este "mandamus", já que violador de direito líquido e certo dos contribuintes de se submetem tão somente às exações legítimas.

          São os fatos.


O DIREITO

DA CONTRIBUIÇÃO PARA COFINS – ILEGALIDADE

          A Constituição Federal de 1.988, ao dispor sobre o financiamento da Seguridade Social, assim prescreveu:

          "Art. 195 – A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
          I – dos empregadores, incidente sobre a folha de salário, o faturamento e o lucro"
(grifos nosso).

          É por demais sabido que a Constituição Federal não cria tributos, mas apenas e tão somente dá autorização aos entes competentes para instituí-los, com fundamento nos estritos limites do Texto Magno.

          E, nesse caso, sobre a folha de salário, o faturamento e o lucro, a partir da vigência da Constituição Federal de 1.988 foram criadas as contribuições sociais respectivas, sendo que, algumas já existentes anteriormente, foram recepcionadas pelo atual regramento jurídico (princípio da recepção da norma que não colide com outra de hierarquia superior).

          Especificamente sobre o faturamento, o legislador complementar editou a Lei Complementar nº 70/91, que descreveu minuciosamente a regra matriz de incidência da COFINS, sendo sua base de cálculo o faturamento e, por seu turno, alíquota de 2% (dois por cento).

          Não satisfeito com o massacre fiscal imposto aos cidadãos brasileiros e outros que aqui residem, o Governo Federal editou a Medida Provisória nº 1.724, de 29.10.98, que alterou a base de cálculo da COFINS, transmudando-a para a receita bruta, ao invés do faturamento (art. 3º), bem como majorando a alíquota dessa exação de 2% (dois por cento) para 3% (três) por cento (art. 8º).

          Mas não é só.

          Proporcionou o Governo Federal, via essa MP, que as empresas que arcassem com a majoração para 3% (três por cento) poderiam, desde que obedecidas as exigências do § 1º e seguintes do art. 8º desse normativo, compensar essa diferença de alíquota com o imposto de renda devido.

          Porém, no inciso I do § 2º do art. 8º, a MP condicionou o direito à compensação "em relação à COFINS correspondente a mês compreendido no período de apuração do imposto de renda a ser compensado, limitada ao valor deste".

          Já no inciso II, § 2º do mesmo art. 8º da referida MP, também foi imposta como condição ao exercício do direito à compensação o seguinte: "não poderá ser efetuada com o imposto de renda determinado sobre base de cálculo estimada de que trata o artigo 2º da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996".

          Tais limitações Excelência, além de violarem o princípio constitucional da isonomia (art. 5º "caput"), maculam indiscutivelmente a exigência fiscal denominada COFINS, na forma prevista na atual legislação, porquanto a Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 1.988, que foi conversão da MP nº 1.724, de 29 de outubro de 1.998, não poderia, de forma alguma, majorar a alíquota de 2% (dois por cento) para 3% (três) por cento e, ainda, modificar a base de cálculo de faturamento para receita bruta.

          Senão vejamos.


ALTERAÇÃO DA BASE DE CÁLCULO - AFRONTA AO ART. 195, I, DA CF

          A Lei nº 9.718/98 (conversão da MP nº 1.724/98), em seu artigo 3º, modificou a base de cálculo da COFINS, alterando-a de faturamento para receita bruta.

          De início, cumpre ressaltar que a COFINS foi criada com base na Lei Complementar nº 70/91, incidindo sobre o faturamento dos contribuintes, à alíquota de 2% (dois por cento).

          Tal legislação teve assento na previsão constitucional constante do art. 195, I, que dispôs:

          "Art. 195 – A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
          I – dos empregadores, incidente sobre a folha de salário, o faturamento e o lucro"
(grifos nosso).

          Destarte, de forma alguma poderia o legislador ordinário, em total afronta à Constituição Federal, modificar a base de cálculo do tributo em questão.

          E nem se diga que os conceitos de faturamento e receita bruta se confundem, porquanto sabe-se que ambos são totalmente diferentes. Aliás, a teor do que dispõe o art. 110 do CTN, o legislador e a Administração Pública não podem, sobre o pretexto de criar ou majorar tributos, modificar o conceito, alcance e extensão de institutos de direito privado.

          A pretexto de corrigir essa situação de inconstitucionalidade flagrante, o Congresso Nacional sancionou em 16 de dezembro de 1.998 a Emenda Constitucional nº 20/98 que modificou a redação do art. 195, I, da CF, passando a vigorar da seguinte forma:

          "Art. 195 - ...........
          I - do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada na forma da lei, incidentes sobre:
          .........
          a) a receita ou faturamento;
          b) o lucro"

          Contudo Excelência, a Emenda Constitucional nº 20/98 é POSTERIOR à edição da Lei nº 9.718, de 27 de novembro de 1.998, não servindo, dessa forma, como respaldo àquela modificação operada por lei ordinária e em afronta ao Texto Constitucional.

          Quer parecer que a Lei nº 9.718/98, na verdade, a pretexto de modificar a base de cálculo da COFINS e, ainda, majorar a alíquota de 2% (dois por cento) para 3% (três por cento), criou nova exação tributária.

          Se assim foi, feriu, ainda, o disposto no § 4º do art. 195 da Constituição Federal, que dispõem:

          "A lei poderá instituir outras fontes destinadas a garantir a manutenção ou expansão da seguridade social, obedecido o disposto no art. 154, I".

          O referido art. 154, I, da CF, por sua vez, trata da exigência de lei complementar para instituição de novas exações tributárias.


DA LIMITAÇÃO À COMPENSAÇÃO - VIOLAÇÃO DO PRINCÍPIO DA ISONOMIA

          Outro aspecto relevante refere-se a violação ao princípio da isonomia, insculpido no art. 5º, "caput", da Constituição Federal.

          É que o Governo Federal proporcionou, via essa MP, que as empresas que arcassem com a majoração para 3% (três por cento) poderiam, desde que obedecidas as exigências do § 1º e seguintes do art. 8º desse normativo, compensar essa diferença de alíquota com o imposto de renda devido.

          Porém, no inciso I do § 2º do art. 8º, a MP condicionou o direito à compensação "em relação à COFINS correspondente a mês compreendido no período de apuração do imposto de renda a ser compensado, limitada ao valor deste".

          Já no inciso II, § 2º do mesmo art. 8º da referida MP, também foi imposta como condição ao exercício do direito à compensação o seguinte: "não poderá ser efetuada com o imposto de renda determinado sobre base de cálculo estimada de que trata o artigo 2º da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996".

          Dessa forma, impôs o legislador ordinário condição ao exercício do direito à compensação, limitando-o, nos termos dos artigos de lei supra transcritos às empresas contribuintes que atendessem as exigências postas na lei ora atacada.

          O princípio da igualdade tributária relaciona-se com a justiça distributiva em matéria fiscal. Diz respeito à repartição do ônus fiscal do modo mais justo possível.

          Pelas teorias subjetivas, há que se vislumbrar da observância do princípio do benefício e do princípio do sacrifício igual.

          Para o eminente JOSÉ AFONSO DA SILVA, "o primeiro significa que a carga dos impostos deve ser distribuída entre os indivíduos de acordo com os benefícios que desfrutam da atividade governamental; conduz à exigência da tributação proporcional à propriedade ou à renda; propicia, em verdade, situações de real injustiça, na medida em que agrava ou apenas mantém as desigualdades existentes".

          Melhor explicando, a isonomia ampla preservada pela Constituição Federal de 1.988 e, ainda, relacionada em matéria fiscal convergem, precipuamente, para o tratamento fiscal igualitário, à medida em que tratem de situações e pessoas que estejam em "pé de igualdade".

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          No caso em apreço, a legislação ordinária que majorou a alíquota da COFINS tratou de forma diferenciada pessoas e situações que encontram-se em "pé de igualdade", violando literalmente o princípio da isonomia fiscal.

          Traz o benefício da compensação para uns e, ao mesmo tempo, nega para outros, apesar de serem todos contribuintes da COFINS. Verdadeira injustiça fiscal, repugnada pelo Estado de Direito !!!


DA CONCESSÃO DE LIMINAR

          Ensina-nos o eminente HUGO DE BRITO MACHADO, in "Mandado de Segurança Preventivo em Matéria Tributária", Repertório IOB de Jurisprudência nº 16/91, pág. 298, quando afirma:

          "o mandado de segurança é uma das garantias que a Constituição Federal assegura aos indivíduos para proteção de direito líquido e certo, lesado OU AMEAÇADO DE LESÃO POR ATO DE AUTORIDADE. Assim, em face de cobrança de TRIBUTO INDEVIDO, pode o contribuinte, em princípio, valer-se do mandado de segurança"
(grifos e maiúsculos são da impetrante).

          O citado mestre em Direito Tributário afirma, ainda, que:

          "o tributo pode ser INDEVIDO porque sua cobrança está sendo feita em DESACORDO COM A LEI, ou porque a lei que o instituiu, ou aumentou, contraria a Constituição. Nesses casos o mandado de segurança é cabível, posto que nas questões a serem deslindadas são apenas questões de direito"
(in ob. cit.)

          Não está, porém, obrigado a esperar que se CONCRETIZE A COBRANÇA. Pode impetrar o MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO, diante da ameaça da cobrança de tributo ilegal ou inconstitucional.

          O mandado de segurança É PREVENTIVO quando, já existente a situação de fato que ensejaria a prática do ato considerado ilegal, tal ato ainda não tenha sido praticado, existindo apenas o JUSTO RECEIO de que venha a ser praticado pela autoridade impetrada.

          Explica, ainda, HUGO DE BRITO MACHADO:

          "É preventivo porque tende a evitar a lesão ao direito, mas pressupõe a existência da situação concreta na qual a impetrante afirma residir o seu direito cuja proteção, contra a ameaça de lesão, está a reclamar do Judiciário"
(in ob. cit.)

          E, por último, finaliza exemplificando:

          "Em matéria tributária merece o mandado de segurança preventivo especial atenção. O parágrafo único do artigo 142 do Código Tributário Nacional, estabelece que a atividade administrativa do lançamento é vinculada e obrigatória, SOB PENA DE RESPONSABILIDADE FUNCIONAL. Isto significa que, tendo conhecimento da ocorrência de um fato tributável, a autoridade administrativa não pode deixar de fazer o lançamento correspondente. Assim, editada uma lei criando ou aumentando tributo, desde que ocorrida a situação de fato sobre a qual incide, gerando a possibilidade de sua cobrança, desde logo é viável a impetração de MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. Não terá o contribuinte de esperar que se concretize a ameaça dessa cobrança. O JUSTO RECEIO, a ensejar a impetração, decorre do DEVER LEGAL da autoridade de fazer a cobrança. Não é razoável presumir-se qu a autoridade administrativa vai descumprir seu dever"
(grifos e maiúsculos são da impetrante).

          Portanto, resta claramente comprovada a existência do JUSTO RECEIO a fundamentar a impetração PREVENTIVA.

          É que a impetrante está moldada na situação de fato prevista na Lei nº 9718/98. Em vista disso, está obrigada a impetrante ao recolhimento mensal da COFINS, na forma vigente, não dependendo de qualquer ato da Administração Pública para realizar o pagamento do crédito tributário, em razão da natureza HOMOLOGATÓRIA do lançamento.

          Não é plausível pensar que a D. Autoridade Impetrada deixará de proceder o lançamento de ofício, se não recolhido tempestivamente o tributo devido pela impetrante, mês a mês.

          O bom direito que ampara a pretensão da impetrante restou exaustivamente demonstrado, decorrendo do próprio Texto Constitucional a plausibilidade da tese aqui sustentada.

          Por outro lado, o "periculum in mora" está evidenciado pela possibilidade de vir a ser autuada a impetrante, acaso não recolhido o tributo devido mensalmente, na forma prevista na lei ora atacada, decorrendo o direito de a Fazenda Pública Federal, após os trâmites regulares, exigir-lhe o cumprimento da obrigação tributária judicialmente, com a penhora de bens da impetrante, inserção de seu nome nos registros do CADIN, etc. Tal atitude, por certo que causará prejuízos irreparáveis à impetrante, ou pelo menos de dificílima reparação.

          Por tais razões, presentes os requisitos ensejadores para a concessão da liminar, espera a impetrante pelo seu deferimento, no sentido de SUSPENDER A EXIGIBILIDADE DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO que decorre da majoração da alíquota da COFINS, até o final julgamento deste "writ".

          Ao final, confirmada a liminar, seja a segurança concedida em definitivo, no sentido de reconhecer a ilegalidade do ato perpetrada pela D. Autoridade Impetrada, bem como a inconstitucionalidade da majoração da alíquota da COFINS e sua alteração na base de cálculo, proporcionando à impetrante ao pagamento do tributo devido nos termos da Lei Complementar nº 70/91.

          Ainda, seja oficiada à D. Autoridade Impetrada, no sentido de dar integral cumprimento às determinações de Vossa Excelência, inclusive com relação à liminar, acaso deferida, bem como para, querendo, prestar as informações que julgar necessárias.

          Dá-se à presente, para os efeitos fiscais, o valor de R$ 1.000,00 (hum mil reais).

          Pede Deferimento.

          Recife, 15 de abril de 1.999

          Ary Raghiant Neto
          OAB/MS 5.449

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Sobre o autor
Ary Raghiant Neto

Advogado em Campo Grande (MS),especialista em Direito Tributário, aqui atuando para Recife.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RAGHIANT NETO, Ary. Mandado de segurança preventivo contra as alterações no Cofins. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 4, n. 31, 1 mai. 1999. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16200. Acesso em: 18 abr. 2024.

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