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Idade mínima em concurso militar: princípio da razoabilidade

01/08/2002 às 00:00
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Ação ordinária com pedido de tutela antecipada para participação em concurso público para cargos militares, em virtude de o impetrante contar com apenas 11 dias a menos que a idade mínima exigida no edital.

EXMO. SR. DR. JUIZ FEDERAL DA __ VARA DA JUSTIÇA FEDERAL – SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO PIAUÍ

________________

Demandante: José Eleonor de Carvalho Filho

Demandado: União Federal

"Só a justiça basta para sustentar um homem contra tudo" Ruy Barbosa

JOSÉ ELEONOR DE CARVALHO FILHO

, brasileiro, solteiro, estudante, portador do R.G. n.º 1.998.995 SSP-PI, CPF nº 663759403-20, residente e domiciliado na Quadra 115, Casa 17, Parque Piauí, nesta Capital, vem à presença de V.Ex.ª, por intermédio da Defensoria Pública da União, legalmente constituída pelo instrumento de Mandato incluso (Doc. 01), propor a presente

AÇÃO ORDINÁRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULA EDITALÍCIA com pedido de Tutela Antecipada inaudita altera pars

em face da UNIÃO FEDERAL, pessoa jurídica de direito público interno, na pessoa do seu representante legal, chefe da Advocacia Geral da União, a ser citado na Rua Firmino Pires, 146 – Norte/Centro, com esteio no caput do art. 5.º, no inciso XXX do art. 7.º, e inciso X do art. 142, todos da Constituição Federal, bem como no art. 273 e seguintes do CPC, pelos motivos fático-jurídicos que doravante passa a aduzir:


Sinopse Fática

O Demandante é um laborioso estudante e, visando a obter uma melhoria nas suas condições de vida, consubstanciada num futuro profissional de sucesso, pretende participar do concurso de admissão aos Cursos de Formação de Sargentos de 2003, realizados pela Escola de Sargentos das Armas, do Exército Brasileiro - Ministério da Defesa, cujas regras encontram-se estabelecidas no Edital n.º 2, de 20 de fevereiro de 2002 (doc. 03), regido pelas Instruções Reguladoras do Concurso de Admissão e da Matricula nos Cursos de Formação de Sargentos (IRCAM/CFS)- Portaria n.º 10/DEP, de 09 de janeiro de 2002, refletidas no Manual do Candidato, em anexo (doc.04).

A fim de obter êxito no seu intento, como primeiro passo, o Demandante inscreveu-se no referido concurso público, em 22.03.2002, conforme prova cópia da ficha de inscrição acostada.(doc.05).

Ocorre, MM. Julgador, que no início do mês de abril de 2002 o Demandante viu-se tolhido no seu direito de participar do certame, haja vista ter recebido uma correspondência enviada pela Coordenação de Concurso da ESA, informando o indeferimento de sua solicitação de inscrição, sob o fundamento de que a data de nascimento do candidato está fora do período previsto, de acordo com o item 1, letra a, n.º 4, do Manual do Candidato.

Com efeito, a previsão do Manual do Candidato que impõe restrição de idade, gizada no aludido Edital que rege o certame, notadamente no seu art. 3.º, § 4.º, IV, dispõe no mencionado dispositivo constituir condição de inscrição e matrícula o candidato completar, até 31 de dezembro de 2002, no mínimo dezoito e no máximo vinte e três anos de idade (nascidos no período compreendido entre 01/01/1979 e 31/12/1984), tendo o Demandante nascido em 20.12.1978, portanto, apenas 11 (onze) dias antes do período determinado pelo edital.

Não bastasse o exíguo tempo que, em tese, excluiria o Demandante do certame, o que afeta inarredavelmente o princípio da razoabilidade, deve-se frisar que o dispositivo consignado em edital, que prevê limitação de idade aos candidatos ao concurso em tela, é nulo, eis que mencionada matéria cinge-se ao preceito da reserva legal, não sendo admissível a imposição ora vergastada em nível de ato administrativo, hierarquicamente inferior à lei, strictu sensu.

A negativa de efetivação da inscrição no certame evidencia, como se verá, lesão ao direito do requerente de participar do concurso público, fazendo-se necessário o ajuizamento da presente actio para a efetivação de seu direito constitucionalmente assegurado de acesso aos cargos públicos. Vê o Demandante no Poder Judiciário a última sentinela de sua esperança na realização da justiça.


DO DIREITO

De início, impende acentuar que a Constituição Federal admite, em seu art. 37, inciso I, a limitação de idade para o ingresso no serviço público, assegurando o acesso aos cargos, empregos e funções públicas aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei.

Percebe-se, portanto, que são admitidas restrições para o acesso a determinados cargos, desde que as mesmas sejam devidamente estabelecidas em lei, com os critérios e requisitos para o ingresso no serviço público.

No caso em apreço, cuida-se de ingresso nas Forças Armadas, cuja disciplina encontra-se nos arts. 142 e 143 da Constituição da República. O inciso X do art. 142, com a redação determinada pela Emenda Constitucional n.º 18/98, estabelece que:

"a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para inatividade, os direitos, os deveres a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra"

Depreende-se, pois, do texto constitucional que a matéria referente à limitação de idade está expressamente condicionada ao disciplinamento por lei formal, pelo que se afigura irrefragável a nulidade de qualquer disposição sobre o assunto, mormente através de um simples ato administrativo, sem que esteja albergada em lei.

Dessa forma, não havendo norma que atribua comando à referida previsão constitucional, tem-se, na espécie, imposição de condições de ingresso nas Forças Armadas realizadas exclusivamente por atos expedidos pela Administração Pública, através de edital, sem qualquer amparo legal que o legitime, ferindo de morte o princípio da reserva legal.

DA LEGALIDADE ESTRITA NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Cediço é que, no direito brasileiro, o princípio da legalidade, consagrado especialmente nos art.s 5.º, inc. II, 37 e 84, inc. IV da Carta Magna, ao mesmo tempo em que assegura ao cidadão a liberdade de agir a não ser que haja restrição contida na lei, restringe a atividade administrativa a agir somente nos casos em que a lei assim autorize.

Nessa esteira, a Administração não poderá proibir ou impor comportamento algum a terceiro, salvo se estiver previamente embasada em determinada lei que lhe faculte proibir ou impor algo a quem quer que seja. Vale dizer, não lhe é possível expedir regulamento, instrução, resolução, portaria, enfim, qualquer espécie de ato para restringir a liberdade dos administrados, salvo, se, em lei, já existir delineada a contenção ou imposição que o ato administrativo venha minudenciar.

A mais consolidada doutrina corrobora esse entendimento, consoante se denota da lição do respeitado Hely Lopes Meirelles, verbis:

"A legalidade, como princípio de administração (CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional,sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato invalido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso." (Direito Administrativo Brasileiro, 26.ª edição, São Paulo: Malheiros, 2001, p. 82).

In casu, como o Poder Legislativo ainda não cuidou de concretizar o mandamento constitucional e editar a norma primária concernente aos requisitos necessários ao ingresso na careira militar, não cabe ao administrador estipular, coativamente, mediante portaria, os critérios para o provimento dos cargos nas Forças Armadas.

Destarte, a previsão editalícia reproduzida no Manual do Candidato para o concurso de admissão ao referido curso de formação, ao estipular a idade máxima para o ingresso no certame, na ausência de lei específica, feriu a norma constitucional mencionada, transformando o indeferimento da inscrição do Demandante em ato ilegal e absolutamente reprovável, por abusivo.

DA NULIDADE DA CLÁUSULA EDITALÍCIA FUSTIGADA

O inciso IV, do § 4.º, do art. 3.º do Edital n.º 2, de 20 de fevereiro de 2002, dispõe o seguinte requisito para inscrição no concurso: "completar, até 31 de dezembro de 2002, no mínimo dezoito e no máximo vinte e três anos de idade; e até 31 de dezembro do ano da matrícula, no mínimo dezenove e no máximo vinte e quatro anos de idade (nascidos no período compreendido entre 01/01/1979 a 31/12/1984)".

Conforme analisado precedentemente, a regra acima descrita mostra-se eivada da mais absoluta nulidade, eis que a restrição pela mesma veiculada é matéria cingida à reserva legal, e, não havendo qualquer previsão em lei a respeito, a imposição carece de qualquer eficácia.

Dessa forma, não existindo base que sustente a norma atacada, os seus efeitos também devem ser afastados, notadamente a restrição ao limite de idade, pelo que se afigura justo o acolhimento da inscrição do Demandante no Concurso em tela.

O posicionamento ora esposado encontra guarida na mais abalizada jurisprudência, sendo, inclusive, matéria pacificada pelo Egrégio TRF-1.ª Região, que já se manifestou diversas vezes acerca do tema. Vejamos alguns arestos:

ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. MILITAR. LIMITE DE IDADE. CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ART. 142, § 3º, X.

1. Não editada a lei referida no inciso X do § 3º do art. 142 da Constituição Federal, dispondo sobre o limite de idade para ingresso nas Forças Armadas, sem amparo legal se apresenta a limitação contida em instruções de concurso para ingresso no curso de formação de sargentos.

2. Caso, ademais, em que a pequena diferença de idade do impetrante em relação ao limite estabelecido não justifica sua exclusão do certame, já que em nada interferirá nas condições de higidez física e mental. Aplicação, à hipótese, do princípio da razoabilidade.

3. Sentença confirmada.

4. Apelação e remessa oficial desprovidas.

(AMS n.º 01000349663 - Processo: 2000.010.00.34966-3/MG, TRF – 1.ª Região, Sexta Turma, Relator: Juiz Daniel Paes Ribeiro. Data da Decisão: 17/08/2001, DJ data: 17/09/2001, pagina: 262)

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA CARGO DA CARREIRA MILITAR. LIMITAÇÃO DE IDADE ESTABELECIDA POR PORTARIA, COM BASE EM DELEGAÇÃO LEGAL DE COMPETÊNCIA. VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 142, X, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 05.10.1988, E 25 DO ADCT.

1. É possível a fixação de limite de idade para participação nos concursos para ingresso na carreira militar, não se aplicando ao caso a vedação constante do art. 7º, inciso XXX, da CF/88.

2. Tal limitação, entretanto, que encontra respaldo no inciso X do § 3º do art. 142 da mesma Constituição, somente pode ser estabelecida por lei formal, sendo ineficaz aquela resultante de mera portaria, ainda que embasada esta em lei anterior à vigente Carta Magna, eis que cessadas, a partir de 180 (cento e oitenta) dias da sua promulgação, todas as delegações de competência então existentes sobre matéria por ela reservada ao Poder Legislativo, consoante disposto no art. 25 do ADCT.

3. Apelação e remessa ex-officio improvidas.

(AMS n.º 01000280976 – Processo n.º 1999.010.00.28097-6/MG, TRF 1.ª Região, Quinta Turma, Relator: Juiz Fagundes de Deus. Data da Decisão: 10/12/2001, DJ data: 20/03/2002, pagina: 363.)

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO - MANDADO DE SEGURANÇA - AUTORIDADE COATORA - EXERCÍTO BRASILEIRO - CONCURSO DE ADMISSÃO AOS CURSOS DE FORMAÇÃO DE SARGENTOS - EDITAL - INSCRIÇÃO RESTRITA AOS INTERESSADOS NASCIDOS ENTRE 1º/01/74 E 31/12/79, COM IDADE MÍNIMA DE 23 (VINTE E TRÊS) ANOS - PREENCHIMENTO DO REQUISITO.

1. (...).

2. (...).

3. Embora o art. 42, § 9º, da Constituição Federal, permita limite de idade na espécie, uma vez que se trata de servidor militar, e o seu § 11 afaste a regra prevista no art. 7º, XXXIII, do texto constitucional, que proíbe limite de idade, não há lei limitando-a na hipótese dos autos, mas, apenas, o regulamento do certame, que não é lei.

4. Apelação e Remessa Oficial denegadas.

5. Sentença confirmada.

(AMS 01000646767, Proc. N.º 1998.010.00.64676-7/MG, TRF – 1.ª Região, Primeira Turma, Relator: Juiz Catão Alves. Data da Decisão: 29/11/1999, DJ data: 28/08/2000, pagina: 26.)

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. MILITAR. CONCURSO PARA ADMISSÃO AOS CURSOS DE FORMAÇÃO DE SARGENTOS. LIMITE DE IDADE. EXIGÊNCIA. AUSÊNCIA DE LEI QUE O AUTORIZE. ILEGALIDADE.

1. À época da impetração, vigia a redação original do art. 42 da CF/88, que não vinculava, aos então denominados "servidores públicos militares", a aplicação do art. 7º, XXX, da mesa Carta Magna, que proíbe limite de idade na espécie, preceito constitucional ainda hoje vigente ( art. 142, § 3º, X).

2. Conquanto não seja a regra absoluta, o Estatuto dos Militares (Lei n. 6.880/80) não estabelece limite mínimo para o ingresso na carreira militar, sendo defeso fazê-lo através de Edital de concurso, à míngua de Lei que o autorize.

3. Apelação e Remessa Oficial desprovidas.

4. Sentença confirmada.

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(AMS – 01341706, Processo n.º 1996.01.34170-6/DF – TRF 1.ª Região, Segunda Turma, Relatora: Juíza Assusete Magalhães. Data da Decisão: 24/11/2000, DJ data: 30/01/2001, pagina: 17)

Portanto, ante o manancial de decisões exaradas pelo Pretório Regional Federal da 1.ª Região, mostra-se cristalina a viabilidade do pleito exordial, bem como incontestável a nulidade da cláusula editalícia que impõe a fustigada limitação de idade.

Não se pode admitir tamanha afronta à Carta Constitucional, como se esta não se constituísse no fundamento de validade de todo o ordenamento jurídico. O Poder Judiciário cuidará para manter a integridade dos valiosos princípios insculpidos no Texto Supremo. A propósito, vale a pena transcrevermos as lições do ilustre constitucionalista Paulo Bonavides:

"É dever de todos nós manter a autoridade e supremacia da Carta com o zelo, a intransigência e devoção que urge consagrar àquela que representa a mais alta regra de organização jurídica do País." (Paulo Bonavides, Curso de Direito Constitucional, São Paulo: Malheiros Editores, 11.ª edição, p. 319).

DO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE

Além da flagrante ilegalidade do ato combatido, percebe-se que o indeferimento da inscrição do Demandante também afrontou os princípios constitucionais da proporcionalidade e da razoabilidade.

Ora, é evidente que, até que seja editada a lei, a Administração deve considerar as situações individuais para aferir se a diferença de idade é realmente relevante. O intérprete deve perquirir se o ônus, a limitação imposta ao administrado é compatível com o benefício para a sociedade. Não havendo essa compatibilidade, o ato será inconstitucional, violando o princípio da proporcionalidade, que está inscrito na cláusula do substantive due process of law.(art. 5.º, LIV).

No caso destes autos, o impetrante viu-se impedido de participar do concurso por uma questão de exatamente 11 dias (!!!), vez que completará 24 anos de idade no dia 20 de dezembro de 2002 e o regulamento estabelece como limite não ter o candidato completado 24 anos de idade até o dia 31 de dezembro de 2002.

O indeferimento da inscrição mostrou-se, assim, desproporcional e dezarrazoado, porquanto a irrisória diferença entre a idade do impetrante e aquela exigida no edital é insuficiente para justificar qualquer prejuízo no desempenho das atribuições do cargo.

Na realidade, sabe-se que o limite de idade em concursos militares é autorizado, quando previsto em lei, em razão da natureza do trabalho a ser exercido pelo aprovado, que deve ter um mínimo de condição física para suportar o labor diário de um militar.

Todavia, a diferença de idade que ensejou o indeferimento da inscrição do Demandante soma apenas 11 dias, como já afirmado, sendo, portanto digna de desprezo para os fins a que se dirige a norma restritiva em apreço.

Não se admite separar o fim do Direito. Nessa senda, vale a pena nos louvarmos dos dizeres de Rudolf Von Ihering:

"O fim é o criador de todo o Direito, não há norma jurídica que não deva sua origem a um fim, a um propósito, isto é, a um motivo prático."

Decerto que o Demandante ultrapassou a idade limite exigida, mas a finalidade da mencionada norma é exatamente selecionar profissionais com aptidão física e mental, que tenham capacidade de exercer escorreitamente as suas obrigações funcionais, condições estas perfeitamente preenchidas pelo Demandante, que não esmaecem em razão do transcurso de apenas 11 dias.

A legislação resguarda a tese ora perfilhada, como se pode perceber da dicção do inciso VI, do parágrafo único, do art. 2.º da Lei n.º 9.784/99, verbis:

"Art. 2.º - A Administração Pública obedecerá, dentre outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação, razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório, segurança jurídica, interesse público e eficiência.

Parágrafo único – (...).

VI – adequação entre meios e fins, vedada a imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público." (grifo nosso)

A doutrina, outrossim, é pacífica em ponderar a predominância da razoabilidade e proporcionalidade no âmbito da Administração Pública, conforme infere-se da lição do Mestre Hely Lopes Meirelles, que manifesta-se nos seguintes termos, verbis:

"Sem dúvida, pode ser chamado de princípio da proibição de excesso, que, em última análise, objetiva aferir a compatibilidade entre os meios e os fins, de modo a evitar restrições desnecessárias ou abusivas por parte da Administração Pública, com lesão aos direitos fundamentais." Direito Administrativo Brasileiro, 26.ª edição, São Paulo: Malheiros, 2001, p. 86).

Nesse diapasão, segundo os mais lídimos preceitos da legalidade, finalidade, proporcionalidade e razoabilidade inerentes ao ordenamento jurídico pátrio, afigura-se lamentavelmente esdrúxula a restrição de idade ocorrida na espécie, pois o interstício de 11 (onze) dias não extrai nem diminui em nada a capacidade física ou mental do Demandante.

DOS REQUISITOS AUTORIZADORES DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

A inequivocidade das provas, bem como a verossimilhança da alegação restaram amplamente demonstrada nos itens anteriores desta peça, bem assim nos documentos acostados à mesma, como o Manual do Candidato, Cópia do Edital n.º 02, de 20.02.2002, do indeferimento da inscrição do Demandante, dos documentos do mesmo, bem como as Leis que regem a matéria.

O indeferimento de inscrição pela Coordenação do Concurso (documento incluso) revela-se ato abusivo de direito inafastável do Demandante, porquanto a participação no certame consubstancia direito constitucionalmente assegurado, cuja limitação só pode ocorrer em face de lei em sentido estrito.

De outra parte, mostra-se patente o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, porquanto a realização das provas referentes à 1.ª etapa está marcada para o dia 23.07.2002 (Manual do candidato), ressalvando-se que os cartões de identificação dos candidatos inscritos serão remetidos aos Postos de Inscrição, de onde deverão ser retirados pelos candidatos, no período de 03 a 14 de Junho de 2002. Ou seja, corre o Demandante o risco concreto de deixar de participar do concurso público.

Diga-se, por oportuno, que a concessão da medida antecipatória pleiteada não acarretará qualquer dano à Ré, pelo que não se admite qualquer argumentação no sentido da existência de óbices à antecipação de tutela. Ora, a participação do Suplicante no certame não acarretará nenhum prejuízo à ré, pelo contrário, ampliará o número de candidatos, possibilitando que a Administração escolha os melhores candidatos dentre um conjunto maior de concorrentes.

Concorrem, pois, na hipótese, os requisitos autorizadores da antecipação de tutela, nos termos consignados no art. 273 do CPC, que dispõe:

"Art. 273. O Juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança da alegação e:

I-haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ou.."

A inserção do instituto da antecipação de tutela no direito pátrio constituiu-se em salutar providência, oriunda do direito italiano. Trata-se de medida que visa a dar efetividade ao processo, preocupação que cada vez mais tem imbuído o espírito do legislador, no sentido de oportunizar às partes o acesso a uma ordem jurídica justa. A sentença de mérito, ao acolher o pleito autoral, não pode ser como uma vitória de Pirro.

Outro não é o entendimento jurisprudencial predominante acerca do tema, senão vejamos:

"ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. TUTELA ANTECIPATÓRIA. MATRÍCULA. CURSO DE FORMAÇÃO PROFISSIONAL. DELEGADO DA POLÍCIA FEDERAL.. Se a TUTELA ANTECIPADA não constitui situação irreversível, mas resguarda a agravada de impossibilidade material de ver revertida a situação, caso não efetuada a matrícula na segunda etapa do CONCURSO, inexiste risco e prejuízo irreparável à União Federal, tanto que, se a ação vier a ser julgada improcedente, a TUTELA perde os seus efeitos.. Juízo antecipatório mantido, sob pena de extinguir-se o direito da autora de freqüentar o curso questionado.. Agravo improvido." (TRF, 4.ª Região, 4.ª T, AG n.º 96.04.38235-7-PR, Rel. Juíza Silvia Goraiedo, j. 19.11.96, DJ 29/01/97, p. 3585).

"AGRAVO DE INSTRUMENTO. ADMINISTRATIVO. TUTELA ANTECIPADA. CONCURSO PÚBLICO. PROCURADOR DA FAZENDA NACIONAL. PRÁTICA FORENSE. CONCEITO. SENTIDO AMPLO.

1 - Para o ingresso nas carreiras da advocacia-geral da união predica o art. 21, parágrafo 2º, da LC nº 73/93 que "o candidato, no momento da inscrição, há de comprovar um mínimo de dois anos de prática forense".

2 - Está pacificado, no entanto, que a prática forense não se restringe ao exercício da advocacia ou de cargo privativo de bacharel em direito (se a lei assim não considera), consoante reiteradas manifestações do Eg. STJ, que demonstram o requisito da verossimilhança a ser reconhecido em prol das alegações do agravado.

3 - Não assegurada a inscrição definitiva do candidato ficaria este alijado do certame, restando inócuo o provimento jurisdicional, se lhe favorável ao final.

4 - precedentes do eg. STJ e desta Corte.

5 - agravo improvido." (TRF 5.ª região, 1.ª t, AG 25399-CE, rel Des. Fed. Castro Meira, j. 25.05.2000, DJ 07.07.2000, p. 407).

"AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DE TUTELA ANTECIPADA. CONCURSO PÚBLICO. ASSISTENTE JURÍDICO DE 2ª CATEGORIA. ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO. PRÁTICA FORENSE. AUSÊNCIA DOS PRESSUPOSTOS DO ART. 4º DA LEI Nº 8.437/92.

1 - Não há repercussão deletéria ao interesse público do simples fato de alguém vir a participar de processo seletivo.

2 - a inscrição de um candidato em concurso público não prejudica a administração pública, a organização do certame ou os demais candidatos.

3 - precedentes desta Corte e do STJ.

4 - Agravo Regimental improvido." (TRF, 5.ª região, AGRPET 2902-ce, rel. Des. Fed. José Maria Lucena, j. 22.03.200, DJ 23.06.2000, p. 171).

Nessa esteira, inexorável a conclusão de que a antecipação dos efeitos da tutela pretendida constitui o remédio mais adequado e justo para assegurar a pretensão do Demandante, sob pena de ineficácia do provimento jurisdicional final.


DO PEDIDO

Restando amplamente demonstrada a nulidade da cláusula editalícia apontada, bem como o caráter ilegal e abusivo decorrente da mesma, consubstanciado no indeferimento da inscrição do Demandante no mencionado Concurso Público, vem o mesmo suplicar à Vossa Excelência, por ser da mais lídima justiça:

a) A concessão dos benefícios da justiça gratuita, na forma do art. 4.º da Lei n.º 1.060/50, por ser o Demandante pobre na forma da lei, não podendo arcar com as custas processuais e honorários advocatícios, sem prejuízo de seu prejuízo de seu sustento próprio e de sua família (Cf. Declaração de Pobreza em apenso, doc. 02);

b) A concessão de antecipação de tutela, initio litis e inaudita altera pars, para assegurar participação do Demandante no concurso de admissão no curso de formação de sargentos das Armas, a ser realizado no dia 23 de Julho de 2002, bem assim em todas as fases subseqüentes do referido concurso, inclusive para que seja expedido o Cartão de Identificação do mesmo, oficiando-se incontinenti ao Comandante Geral da Escola de Sargento das Armas, com endereço na cidade de Três Corações-MG na Av. Sete de Setembro 628, Centro, Fone: (35) 3239-4100 e FAX: (35) 3231-3908).

c) A intimação pessoal de todos os atos processuais e a contagem dos prazos processuais em dobro para os Defensores Públicos da União, na forma do inciso I do art. 44 da Lei Complementar n.º 80/94.

d) A citação da parte Demandada, para, se entender necessário, apresentar contestação no prazo legal, sob pena de revelia e confissão.

e) A procedência do pedido em todos os seus termos, no sentido de confirmar os efeitos da antecipação de tutela antes pleiteada, bem como declarar a nulidade da cláusula prevista no inciso IV, § 4.º, do art. 3.º do Edital n.º 2, de 20 de fevereiro de 2002, que rege o Concurso de Admissão aos Cursos de Formação de Sargentos de 2003, exarado pelo Exército Brasileiro, por meio o da Escola de Sargento das Armas.

f) Ad argumentandum tantum, caso não seja acolhida a tese de nulidade acima pugnada, o que se admite apenas para seqüenciar raciocínio, requer, à luz dos princípios da razoabilidade e da finalidade precedentemente minudenciados, que V. Ex.ª assegure a participação do Demandante em todas as fases do concurso aludido, ante a desprezível diferença de idade do Demandante para aquela exigida pelo Edital guerreado.

g) A intimação do Ilustre Representante do Parquet Federal, para que venha atuar no feito.

h) Por fim, a condenação da Demandada no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, com base no senso de justiça de V. Ex.ª.

Protesta provar o alegado por todos os meios de prova admitidos em direito, especialmente pela juntada de documentos e por tudo o mais que se fizer necessário à cabal demonstração dos fatos articulados na presente inicial.

Dá-se à causa o valor de R$ 100,00 (cem reais), para efeitos legais.

Nestes Termos,

Pede Deferimento

Teresina, 06 de maio de 2002.

MARCELO LOPES BARROSO

D

EFENSOR PÚBLICO DA UNIÃO

BERNARDO ALVES DA SILVA JÚNIOR

E

STAGIÁRIO
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Sobre o autor
Marcelo Lopes Barroso

Defensor Público Federal em Fortaleza (CE). Professor da Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Mestre em Direito pela Universidade Federal do Ceará (UFC).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BARROSO, Marcelo Lopes. Idade mínima em concurso militar: princípio da razoabilidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 7, n. 58, 1 ago. 2002. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16511. Acesso em: 22 dez. 2024.

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