EXMO. SR. JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE BELO HORIZONTE - MG.
ASSOCIAÇÃO DE HOSPITAIS DE MINAS GERAIS - AHMG, entidade civil de direito privado, inscrita no CNPJ sob o nº 17.241.118/0001-04, com endereço nesta Capital à Rua Carangola, nº 225, Bairro Santo Antônio, Cep 30330-340, vem, à presença de V.Exª., propor a presente
AÇÃO ORDINÁRIA com pedido de tutela antecipada
em face deUNIMED BH COOPERATIVA DE TRABALHO MÉDICO LTDA, empresa inscrita no C.N.P.J. sob o número 19.891.852/0001-44, com endereço à Av. Francisco Sales, nº 1483, Bairro Santa Efigênia, CEP 30150-221, Belo Horizonte/MG, tudo de conformidade com os fundamentos fáticos e jurídicos a seguir aduzidos:
DA LEGITIMIDADE DA ENTIDADE AUTORA
A entidade autora, qualificada no preâmbulo desta exordial, encontra-se legalmente legitimada para propor a presente ação em benefício de seus associados consoante se infere pela análise do art. 2º do estatuto da entidade, "verbis":
Artigo 2º - A AHMG tem por finalidade:
g) A orientação, coordenação, proteção, defesa e representação legal de todos os estabelecimentos hospitalares e nosocomiais Associados no Estado de Minas Gerais; (grifos nossos)
Diante da análise do dispositivo estatutário em questão pode-se claramente inferir que a entidade autora encontra-se expressamente autorizada a representar seus associados judicialmente.
A Constituição Federal no art. 5º, inciso XXI, também disciplina a questão ao preceituar:
XXI – as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente; (grifos nossos)
Quanto a prerrogativa constitucional garantida as entidades civis de atuarem como substitutos processuais de seus filiados, cumpre trazer à baila o voto proferido pelo Ministro do STF Celso Melo nos autos do MS nº 20.936-DF-TP, publicado no D.J.U. EM 11.09.92:
"A nova Constituição do Brasil, ao deferir o direito de ação às entidades civis e associações comunitárias, acentuou o reconhecimento do Estado quanto à decisiva importância dos corpos intermediários na dinâmica do processo de poder.
(...)
As técnicas e os instrumentos processuais ortodoxos tornaram-se insuficientes na tutela e proteção jurisdicional dos direitos, cuja transindividualidade gera, por isso mesmo, grandes dificuldades de ordem formal, que impediam o necessário resguardo de bens, valores, direitos e interesses coletivos e difusos.
Nessa situação, a exigência de universalização da tutela jurisdicional- que hoje se constitui moderna tendência do direito processual- era diretamente afetada.
Impunha-se a formulação de novos meios que viabilizassem, de modo eficaz, a proteção jurisdicional de tais direitos.
A ampliação subjetiva da legitimidade ativa ad causam representou, nesse contexto, um passo de grande relevo. (...)
Essa legitimação extraordinária para agir justifica o ingresso, em juízo, do substituto processual, para postular e defender, em nome próprio, direito ou interesse titularizado, no plano jurídico material, por terceiro."(MS nº 20.936-DF-TP-STF, voto do E. Ministro Celso Mello, DJU 11.09.92).
Neste sentido, cite-se o acórdão nº 89.01.09455-0/DF proferido pelo TRF da 1ª Região, tendo como relator o Juiz Plauto Ribeiro:
CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL - ENTIDADES ASSOCIATIVAS - REPRESENTAÇÃO JUDICIAL DE SEUS ASSOCIADOS - ART. 5º, XXI, DA CF/88 - AUTORIZAÇÃO ESTATUTÁRIA.
I - Dispõe o art. 5º, XXI, da CF/88 que "as entidades associativas, quando expressamente autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente", autorização que se pode dar via de lei ou pelo estatuto da entidade associativa, vale dizer, a associação deve ter, no rol de seus fins sociais, o da defesa dos direitos de seus associados (Cf. Celso Ribeiro Bastos, Comentários à Constituição do Brasil, 2º vol., pág. 114).
II - Autorizando o estatuto da autora a representação dos seus associados, em Juízo, na forma permitida pela Constituição Federal e legislação infraconstitucional, encontra-se legitimada ativamente para postular judicialmente reajuste de vencimentos, em favor de seus associados. Precedentes do TRF-1ª Região (AC nº 89.01.09455-0/DF, Rel. Juiz Plauto Ribeiro) e do STF (RE nº 188837-7/DF).
III - Apelação provida.
A doutrina por seu turno já reconhece a validade e a amplitude dos institutos jurídicos relativos a substituição processual, suplantando a visão individualista abarcada pelo art. 6º do Código de Processo Civil. Nesse sentido, em artigo publicado na Revista do Advogado, o processualista Arruda Alvim disserta com propriedade sobre o tema:
"Se, de uma parte, não pode deixar de subsistir o sistema do Código, voltado para o processo entre indivíduos, a grande característica emergente das sociedades contemporâneas, consiste em viabilizar que, ao lado desse sistema clássico, venha a existir o processo coletivo, ou processos coletivos, com vistas ao atendimento dessa nova realidade: a de que o aparato estatal socorra às necessidades de uma sociedade de massa. As profundas carências, para não falar em frustrações continuadas, que fora do Brasil ocorreram e que, entre nós, só em tempos recentes, vieram a se manifestar, constituem a evidência de serem insuficientes os sistemas tradicionais, i.e., individualistas. (...)
Por outras palavras, desde que as situações possam ser havidas como efetivamente equilibradas, dever-se-á respeitar à igualdade existente entre os sujeitos de tais situações. No entanto, a partir da percepção de que inexiste essa igualdade, deve o legislador acorrer para tratar desigualmente os desiguais, pois que, assim o fazendo, é que estará fazendo com que se respeite a própria essência do princípio da igualdade." (Revista do Advogado-AASP, nº 40, julho/93, página 22/29)
Por sua vez o jurista Hugo Nigro Mazilli ao discorrer sobre o tema assim conclui:
"Abriu-se hoje, sem dúvida, caminho à legitimação extraordinária para defesa de quaisquer interesses difusos e coletivos, ainda que não mais previstos na lei (art. 5º, XXI, LXX e LXXIII, e arts. 8º, III, 103, IX e 129, III, da CF; art. 1º, IV, da lei 7.347/85); de outra parte surgem perspectivas para a extensão do princípio da responsabilidade objetiva e solidária quando da lesão a outros interesses difusos e coletivos". (A DEFESA DOS INTERESSES DIFUSOS EM JUÍZO; 5ª ed., Ed. RT, página 332)
DA SITUAÇÃO FÁTICA
A entidade autora representa um número de 330 hospitais no Estado de Minas Gerais, hospitais estes que ao longo dos anos vêm sendo vítimas de inúmeras condutas maledicentes e perniciosas levadas a cabo pelas operadoras de plano de saúde que se valem de sua superioridade econômica e da flagrante dependência dos nosocômios para impor as suas vontades unilateralmente, em prejuízo das instituições hospitalares e, por via de conseqüência, dos consumidores.
A dependência econômica e a pressão sofrida pelos hospitais mineiros nos últimos anos por parte das operadoras de plano de saúde encontra-se demonstrando em um estudo encomendado pela entidade autora e apresentado no mês de janeiro de 2001.
Vale frisar que o referido estudo fora realizado por amostragem, levando em conta a realidade de um universo de 18 (dezoito) hospitais da Capital no intuito de aferir de forma fidedigna à realidade da relação estabelecida entre os hospitais e os convênios.
O estudo em apreço revelou inicialmente que os convênios representam 80% (oitenta por cento) da receita de alguns hospitais. Cumpre na oportunidade transcrever trechos do estudo em comento, "verbis":
Em função deste processo, deu-se uma força extremada e incomum aos convênios, que se tornaram peças chaves e fundamentais para a sobrevivência das instituições hospitalares, chegando alguns hospitais pesquisados a confessar que 80% (oitenta por cento) de suas receitas advém de um ou dois convênios principais. (grifos nossos)
Diante da análise sistêmica da assertiva supra, depreende-se de forma cristalina a dependência econômica dos hospitais face aos convênios, bem como a superioridade de forças destes. O quadro delineado vem levando os hospitais a uma nítida condição de fragilidade junto aos seus "parceiros" contratuais, gerando em razão disso um enorme desequilíbrio entre as partes contraentes.
Para retratar tal fragilidade vivenciada pelos hospitais, bem como o desequilíbrio contratual havido na relação travada entre os nosocômios e os convênios, importante transcrever alguns trechos do diagnóstico que acompanha o estudo em exame:
- Em grande parte dos casos, os pagamentos são feitos fora do prazo contratualmente previsto, sem atualização e demais penalidades; (grifos nossos)
- Modificação unilateral das datas de pagamento; (grifos nossos)
- As alterações contratuais , na grande maioria dos casos, são impostas unilateralmente e sem maiores formalidades pelos Convênios; (grifos nossos)
- Imposição imediata das alterações sem observância de prazo mínimo para sua vigência. (grifos nossos)
Os pontos destacados no diagnóstico em apreço destacam com acuidade a dura realidade dos hospitais no Estado de Minas Gerais que acabam sendo obrigados a suportar todas as pressões e imposições adotadas pelos convênios de planos de saúde a fim de não perder a sua maior fonte de subsistência e por via de conseqüência prejudicar o atendimento de milhares de cidadãos.
É insofismável o munus público conferido aos hospitais em razão de sua árdua e digna missão de guardiões da saúde, fazendo as vezes do Estado na tarefa de garantir a saúde ao cidadão.
Todas as considerações trazidas aos autos são fundamentais e necessárias para demonstrar com precisão o novo quadro que assola os hospitais de Belo Horizonte.
Recentemente, os Hospitais da Capital mineira filiados a entidade ré e que atualmente mantêm convênios com a UNIMED-BH vêm sendo vítimas de uma prática condenável adotada pela ré no sentido de impor aos "parceiros" contratuais de forma unilateral a obrigatoriedade de se valerem do uso de medicamentos genéricos.
Tal imposição restou materializada através da edição da Circular 034/2002 de 09 de julho de 2002 expedida pela ré e endereçada de forma genérica aos hospitais conveniados.
Para elucidar a questão cumpre na oportunidade transcrever alguns trechos da referida circular, "verbis":
"Contudo, sabedores da necessidade de um período de transição estaremos adotando oficialmente esta medida a partir de 25 de outubro de 2002, quando os medicamentos genéricos serão utilizados como referência para efeito de pagamento dos nossos prestadores de serviços de saúde. A partir desta data, será pago o medicamento genérico utilizado, constante do Brasíndice ou da lista referencial de materiais e medicamentos da Unimed-BH. Caso o prestador de serviço utilize um medicamento de marca que possua um genérico correspondente, será pago o valor do genérico constante no Brasíndice." (grifos nossos)
Diante do posicionamento externado na circular em apreço, resta claro que a partir do dia 25 de outubro de 2002 a ré utilizará o medicamento genérico como referência para o pagamento dos serviços de saúde, remunerando os hospitais apenas com base nos valores de tais medicamentos, mesmo que estes se utilizem de medicamentos tidos como de marca.
Da forma como fora posta a questão por parte da ré UNIMED ficaram os hospitais jungidos a uma verdadeira camisa de força, porquanto não poderão mais se valer dos medicamentos de marca, mesmo diante da recomendação e prescrição médica neste sentido, sob pena de não receberem a remuneração correspondente, sendo obrigados em razão disso a suportar inúmeros prejuízos com o pagamento das diferenças compreendidas entre os medicamentos.
Neste particular, importante destacar que os hospitais conveniados à ré já amargam um prejuízo significativo em razão da notória defasagem na tabela de procedimentos e serviços que não sofre reajustes a cerca de 4 (quatro) anos, sendo obrigados ainda a suportar uma avalanche de "circulares" da ré que promovem a supressão unilateral de pagamentos de taxas e demais despesas hospitalares. Neste dramático contexto o único item de serviços prestados pelos Hospitais e que vinham sendo remunerados dentro da conjuntura econômica atual era a comercialização de medicamentos. Isso porque os hospitais, conforme se depreende dos contratos firmados, são remunerados pela venda dos remédios obtendo como ganho uma margem de comercialização, incidente sobre valores atualizados com base na Tabela BRASÍNDICE.
Em razão da política patrocinada pela ré ao longo dos anos em relação a todos os outros serviços prestados a rentabilidade dos estabelecimentos hospitalares vem sendo gradativamente achatada, prejudicando os próprios serviços assistenciais disponibilizados aos pacientes.
Destarte, face as inúmeras dificuldades financeiras compreendidas pelos hospitais da Capital, não existe a menor possibilidade destes acatarem a imposição leonina engendrada pela ré e abarcarem mais este prejuízo relativo a diferença entre o medicamento genérico e o de marca.
Para demonstrar o grau de endividamento da rede hospitalar no Estado de Minas Gerais e comprovar as alegações lançadas nos autos cumpre trazer a colação alguns dados do setor levantados por meio de uma pesquisa realizada pela entidade autora no mês de março de 2001 que revela o perfil de endividamento em um universo de 41 Hospitais:
Fornecedores: R$ 19.519.052,97
Bancos: R$ 10.128.091,09
Impostos em atraso: R$ 4.003.809,73
Encargos trabalhistas em atraso: R$ 20.455.652,69
Salários em atraso: R$ 1.384.127,54
Honorários do Corpo Clínico em atraso: R$ 2.931.838,87
Outras dívidas: R$ 9.437.645,58
TOTAL DO ENDIVIDAMENTO: R$ 67.860.218,47
Dívidas de curto prazo (menor do que 90 dias): R$
23.208.356,07
Dívidas de médio prazo (90 a 180 dias): R$ 10.333.457,24
Dívidas de longo prazo (acima de 180 dias): R$ 34.318.405,16
Dívidas em dólar: US$ 8.071.331,84 - PARA 6 HOSPITAIS
Necessidades de recursos para sanear as finanças dos Hospitais: R$52.398.876,85.
Tal quadro evidencia a triste realidade econômica vivenciada pelos hospitais em Minas Gerais e denota a impossibilidade destes assumirem a diferença entre os valores a serem pagos pela UNIMED relativos ao medicamento genérico.
Não se pode também olvidar que tal medida representa um sério prejuízo para os consumidores usuários dos planos de saúde mantidos pela ré na medida em que estes serão obrigados a se valerem apenas dos medicamentos genéricos, comprometendo em alguns casos o tratamento indicado pelos médicos, tendo em vista as particularidades do medicamento genérico aliado ao fato de que os próprios profissionais da saúde ainda não dispõem de informações adequadas e claras sobre a efetividade comparada dos medicamentos genéricos.
Neste sentido mister transcrever trechos de um importante trabalho a respeito financiado pelo Fundo de Defesa dos Direitos Difusos de autoria de Eduardo Fiúza, extraídos do site da Fundação Getúlio Vargas (www.fgv.br) :
É importante salientar que a falta de informações fluidas, sistematizadas e consolidadas sobre efetividade comparada entre os medicamentos disponíveis no mercado é um sério obstáculo a uma avaliação abalizada do médico sobre qual medicamentos prescrever, magnificando o efeito do fator 2.2, portanto a fluidez da informação é tão ou mais importante que a sua mera existência. Temin (1980) aponta três causas para este problema de informação:
a) A segurança e a eficácia do medicamento tem múltiplas dimensões: quais condições indesejadas visa corrigir; qual o método de administração ao paciente; qual a velocidade de ação e sua durabilidade; a amplitude de condições que ele trata, quais os efeitos adversos; etc.
b) Os médicos não podem sair usando seus pacientes como cobaias; (grifos nossos)
c) Falta aos médicos capacidade de extrapolar os resultados dos testes publicados para sua realidade. Para eles, estatística e prática da medicina são atividades distintas. Eles não têm qualificação para fazer pesquisa ou avaliar as pesquisas dos outros.
Com relação a eficácia e a qualidade dos medicamentos genéricos o referido estudo ainda informa:
O médico desconhece os preços dos genéricos, e tem reservas quanto à sua qualidade em relação ao produto de referência. A qualidade, por sua vez, abre-se nas dimensões de (i) biodisponibilidade – quanto do princípio ativo é absorvido no fluxo sanguíneo, onde e quanto age terapeuticamente; (ii) bioequivalência – dois medicamentos são bioequivalentes se têm a mesma composição química e a mesma biodisponibilidade; (iii) grau de pureza do produto (e, portanto, do processo produtivo).
Também se deve atentar para a questão da fiscalização e controle dos medicamentos genéricos como evidencia o estudo em apreço, "verbis":
O fato é que, na ausência de regras claras de substituição de medicamentos por genéricos (o que, por sua vez, pressupõe a certificação de qualidade) e de uma fiscalização eficiente da venda de medicamentos nas farmácias, a substituição do medicamento prescrito sujeita-se ao poder discricionário de pacientes e farmacêuticos em conluio.
Em que pese os medicamentos genéricos representarem um avanço e uma tentativa válida adotada por parte do Governo e da sociedade civil de buscar uma redução dos custos dos remédios em benefício do consumidor final, devemos nos atentar para o fato de que ainda existem inúmeras incertezas que rodeiam a matéria.
Face a estas considerações percebe-se que ainda subsistem inúmeras barreiras ligadas a informação, conhecimento, adaptação e até culturais a serem suplantadas no que tange ao uso dos medicamentos genéricos que só serão transpostas com o tempo. Mudanças abruptas de comportamento, nos termos impostos pela ré podem trazer graves prejuízos a saúde dos consumidores, à autonomia profissional dos médicos que prescrevem os medicamentos e sobretudo aos hospitais que podem eventualmente ser responsabilizados na hipótese destes medicamentos não surtirem os efeitos desejados.
Também merece destaque no caso dos autos o modo absurdo e estapafúrdio de como se processou a determinação emanada pela UNIMED de vincular sua tabela de remuneração a dos medicamentos genéricos, uma vez que tal determinação fora imposta unilateralmente, ao arrepio dos pactos contratuais firmados com os hospitais conveniados e sem a anuência destes.
Em momento algum fora garantido aos hospitais a possibilidade de virem a discutir tal ato encampado pela ré e que ainda representa uma profunda ingerência nas condutas médico-hospitalares.
Ademais, cumpre salientar que os instrumentos contratuais firmados com os hospitais conveniados não abarcam qualquer prerrogativa que permita a ré a adoção de modificações unilaterais nos contratos, bem como ingerência da mesma nas atividades hospitalares, muito ao contrário, a maioria dos dispositivos contratuais analisados informa de forma clara e inequívoca que todas as modificações devem ser efetivadas de comum acordo entre as partes.
Para convalidar uma medida deste jaez caberia à ré inicialmente o dever de travar uma discussão pormenorizada e criteriosa com todos os hospitais conveniados, partes interessadas, para que se pudesse aferir com precisão as conveniências de cada nosocômio no que tange a implantação de tal medida, bem como as formas de adoção da mesma. Após ultrapassada esta fase de diagnóstico e negociação, as alterações contratuais eventualmente acertadas deveriam ser efetivadas através de termos aditivos próprios.
Ocorre que a ré preferiu, por conveniência, optar pela via transversa, qual seja, de adotar a postura de promover a modificação unilateral do contrato em prejuízo dos hospitais e dos consumidores.
Deve-se atentar também para o fato de que a grande maioria dos hospitais conveniados ainda não foram comunicados diretamente pela ré sobre as novas medidas a serem implementadas à partir do dia 25/10/2002, tendo em vista que a "comunicação" adotada pela ré fora realizada de forma genérica e encaminhada apenas para a entidade autora consoante comprova a circular em anexo que no seu preâmbulo informa:
DIR.
CIRC. 034/2002
09 DE JULHO DE 2002
A TODOS
OS HOSPITAIS E CLÍNICAS DA REDE CREDENCIADA (grifos nossos)
Muitos hospitais só tomarão conhecimento das novas disposições contratuais impostas pela operadora nas datas de pagamento das despesas hospitalares previstas nos seus contratos, sendo surpreendidos com a notícia e obrigados a absorver prejuízos não previstos nos seus apertados controles orçamentários, aumentando suas despesas e comprometendo seriamente o funcionamento e a manutenção dos hospitais.
Não obstante todas as conseqüências nefastas trazidas aos hospitais em razão da malfada modificação unilateral imposta pela ré, insta salientar que tal conduta ainda afeta de modo contundente o equilíbrio econômico financeiro dos contratos firmados junto aos hospitais que terão também a sua margem de lucro relativa ao percentual de comercialização dos medicamentos seriamente afetada, além de serem obrigados a arcar com despesas extras relativas ao uso de medicamentos de marca se esta for a solicitação do médico assistente, uma vez que o hospital não tem poderes legais para intervir no poder discricionário conferido aos médicos no que tange a prescrição dos medicamentos sob pena de estar ferindo a liberdade de atuação do profissional da saúde.
Há que se considerar ainda uma outra ofensa ao ordenamento jurídico em razão da prática ora atacada. Trata-se, sem sombra de dúvida, de uma conduta anticoncorrencial à luz da Lei 8884/94, haja vista que os hospitais são grandes compradores de medicamentos e em razão desta medida serão obrigados a adquirir apenas remédios oriundos de laboratórios que produzam medicamentos genéricos, alterando sensivelmente os rumos deste mercado relevante e prejudicando drasticamente os laboratórios que comercializam os medicamentos de marca.
Indignada com a malfadada postura adotada pela ré, a entidade autora, no interesse de seus filiados, encaminhou uma correspondência à ré, rechaçando de forma contundente os argumentos trazidos pela Circular. Cabe na oportunidade citar alguns pontos da referida carta assinada pelo Presidente da AHMG com data de 09 de outubro de 2002:
Os hospitais repudiam veementemente a forma como a UNIMED-BH se posiciona diante daqueles a quem chama de parceiros. A imposição de alterações de regras contratuais, com o estabelecimento de data para vigorarem e sanções pelo descumprimento - caso o prestador utilize um medicamento de marca que possua um genérico correspondente, será pago o valor do genérico constante no Brasíndice – denota uma conduta unilateral, que independe do mérito e é inadmissível per si.
Os hospitais, juntos ou individualmente, vêm buscando a mesa de negociações com a UNIMED – BH incessantemente e assim continuarão agindo. A renegociação dos contratos de prestação de serviços hospitalares é determinante para a reversão da série crise que vivemos e condição para a revitalização do setor como um todo, inclusive para a própria UNIMED-BH.
Quanto ao mérito assim asseverou a entidade autora na aludida carta de resposta:
Ao hospital por sua vez, compete a pronta disponibilização do medicamento prescrito pelo médico, e o seu descumprimento, seja por normas de conduta ética , seja pelo risco de sofrer sanções legais, é inadmissível.
Após tais considerações a entidade autora solicitou junto à ré a suspensão das condutas manifestas na circular conferindo a mesma um prazo de 72 horas para a suspensão desta postura.
Não obstante as considerações expendidas pela entidade autora, a ré até o presente momento não apresentou qualquer resposta ou manifestação sobre as mesmas, demonstrando seu completo descaso e indiferença para com os hospitais conveniados.
Importante destacar que, em outra oportunidade pretérita, alguns dos hospitais que tomaram conhecimento da conduta adotada pela ré também já haviam manifestado seu descontentamento com as medidas perpetradas, encaminhando também uma correspondência endereçada à ré com data de 16 de agosto de 2002. Cite-se alguns trechos da aludida correspondência:
b) Considerando-se que a prescrição do medicamento não compete ao hospital nem à UNIMED concordamos que todos os esforços neste sentido devam ser dirigidos ao cooperado e ao corpo clínico que efetivamente determinam a prescrição; além disso os hospitais possuem Comissões de Padronização que definem através de critérios técnicos, a adoção de todos os medicamentos a serem utilizados pelas clínicas. Esse grupo de trabalho é sempre consultado e somente após o seu parecer favorável, procedemos a inclusão de novo item;
c) Compete ao hospital disponibilizar prontamente, em benefício do paciente, o medicamento prescrito pelo médico, o que não podemos deixar de faze-lo por norma de conduta e até sob risco de sanções legais;
d) O contrato celebrado entre a UNIMED e os hospitais contempla como responsabilidade da UNIMED o pagamento do material e do medicamento prescritos e administrados ao paciente.
Como se não bastassem tais fatos os hospitais ainda sofrem constantes ameaças de descredenciamento por parte da ré quando se recusam ou estabelecem qualquer espécie de obstáculo às determinações unilaterais impostas pela UNIMED que faz valer de forma agressiva e assustadora a sua notória supremacia econômica como meio de obrigar os hospitais a acatarem todas as suas determinações.
Também deve ser assinalado que a medida adotada pela ré acaba por violar aspectos ligados a ética e liberdade de atuação do médico que virá a sofrer severas restrições nas suas recomendações e prescrições, prejudicando sensivelmente o tratamento indicado pelo mesmo aos pacientes.
De outra feita, como já fora informado nos presentes autos, os hospitais não dispõem de poderes para tolher a prescrição médica e adotar aleatoriamente, de acordo com suas conveniências e contra a indicação do profissional da saúde, medicamentos genéricos, chamando para si responsabilidade por eventuais danos causados ao consumidor e assumindo uma postura totalmente contrária ao Código de Ética Médica.
Diante de todos os fatos trazidos aos autos não restou à entidade autora outra alternativa senão recorrer à tutela jurisdicional como meio de buscar o restabelecimento da equidade e da justiça contratual que restaram seriamente comprometidas pela imposição leonina patrocinada pela ré de impor aos hospitais conveniados a adoção forçada dos medicamentos genéricos como referência para o pagamento dos gastos relativos a esta rubrica.