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Sindicância: mandado de segurança contra cerceamento de defesa e desobediência ao contraditório

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02/09/2005 às 00:00
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05. DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO VIOLADO_________________

Diante da robusta fundamentação apresentada nesta peça, constata-se que o Prefeito Municipal de I. deu início a um processo punitivo disciplinar contra o impetrante na ausência de justa causa, o que já nulifica o Feito desde seu nascedouro.

Concomitantemente, exarou a portaria instauradora do processo sem a mínima fundamentação ou motivação, ensejando uma nítida acusação genérica, o que inviabilizou o exercício pleno do contraditório pelo impetrante.

Constituiu uma comissão processante de forma irregular, uma vez que o ato constitutivo se deu antes da instauração do processo disciplinar.

O processo disciplinar se processou com irregularidades gritantes, capazes de nulificar irremediavelmente todo o procedimento, uma vez que sua instrução foi apartada dos princípios constitucionais que norteiam os feitos dessa natureza, mormente o do contraditório e da ampla defesa (Art. 5°, LV), do devido processo legal (Art. LIV), da presunção da inocência (Art. LVII), da motivação das decisões (Art. 93, IX) e da inadmissibilidade de provas obtidas por meios ilícitos (Art. 5°, LVI).

O direito ao contraditório e à ampla defesa, máxime do Estado Democrático de Direito e positivado pelo legislador constituinte, foi flagrantemente violado em todas as fases da instrução processual administrativa, conforme exaustivamente demonstrado nesta peça.

Diante disso, se torna clarividente a lesão ao direito líquido e certo do impetrante, qual seja, o de se ver processar de acordo com as regras do contraditório.

Tal lesão, evidenciada desde a instauração do processo disciplinar, reclama a incontinenti intervenção do Poder Judiciário, que exercendo o controle jurisdicional dos atos administrativos, no que se refere ao seu conformismo com os preceitos legais e constitucionais, deve, a bem da justiça, tornar NULO o ato demissionário do impetrante, consubstanciado na Sentença Administrativa datada de 14 de junho de 2005 e no Decreto n° 098/2005, exarados pelo Prefeito Municipal de I.-ES, uma vez que não foram amparados no devido processo legal, do qual o contraditório e a ampla defesa são consectários.


06. CONSIDERAÇÕES FINAIS__________________________________

Eminente Magistrada!

É extremamente lamentável que procedimentos administrativos dessa natureza ainda coadunem com a realidade da Administração Pública.

Se os filósofos do iluminismo pudessem por um dia apenas retornar a este mundo material, perceberiam de pronto a gigantesca deturpação de suas idéias e ensinamentos, trazendo-lhes um amplo sentimento de tristeza ao vislumbrarem a utilização da democracia, que é uma das grandes conquistas da humanidade para beneficiar um pequeno e inescrupuloso grupo e prejudicar inteiramente os demais integrantes do povo.

Na realidade, nosso país vive numa verdadeira "democradura", ou seja, um misto de democracia com ditadura e oligarquia, que impede o avanço social.

Parece que vivemos ainda sob os reflexos da Constituição de 1821, onde Dom Pedro somente "aceitou" o seu texto em razão da reserva do chamado Poder Moderador. Através dele, a função executiva do império poderia se sobrepor às demais funções do Estado e até mesmo revogar os seus atos quando com os mesmos não houvesse concordância. Criou-se em razão disso a cultura do SUPER PODER EXECUTIVO, que se arvora e se intitula soberano e hierarquicamente superior às funções legislativa, judiciária e até mesmo dos princípios e garantias constitucionais.

Toda esta exposição é para situar o caso do processo administrativo disciplinar instaurado contra o impetrante, onde as principais garantias fundamentais conquistadas pelo povo brasileiro notadamente quando da promulgação da Carta de 1988, foram violentadas de forma vergonhosa e despudorada por autoridades públicas que se julgam acima "do bem e do mal" e da própria lei.

O processo disciplinar instaurado pelo Alcaide do município de I. é um exemplo típico dos procedimentos que devem ser banidos a todo custo do cotidiano da Administração Pública, uma vez que atentam contra a democracia penosamente conquistada pelo povo brasileiro.

Tais procedimentos perfazem um instrumento perigoso de violência gratuita à honra e a carreira de servidores públicos, que ficam a mercê dos caprichos inescrupulosos de administradores que se apartam do bem público em prol de interesses pessoais, voltados sempre ao partidarismo político.

E o que é pior, se utilizam de servidores públicos para formarem uma "comissão" que nada mais é do que um fantoche nas mãos do governante todo poderoso.

Diante desse desabafo, MMª. Juíza, é que se roga a imediata intervenção do Poder Judiciário para coibir todos esses desmandos administrativos.


07. DA LIMINAR_______________________________________________

Pleiteia-se desde já a concessão de LIMINAR, inaudita altera pars, visando a imediata reintegração do impetrante ao serviço público, no cargo de auxiliar administrativo.

A robusta prova pré-constituída apresentada pelo impetrante demonstra de forma inequívoca não só a verossimilhança da pretensão manifestada na presente ação (fumus boni iuris), mas o evidente e inquestionável direito de ver anulado o processo que redundou em sua demissão, além de sua recondução ao cargo público.

A lesão ao direito líquido e certo do impetrante, consubstanciada na ofensa aos princípios do contraditório, ampla defesa, motivação, dentre outros, evidenciada nesta peça, autoriza a concessão imediata do pleito liminar. Qualquer cidadão possui o direito líquido e certo de se ver processar de acordo com as regras do devido processo legal, do qual o contraditório e a ampla defesa são corolários.

O periculum in mora reside no fato de que a demora normal da marcha do processo acarretará danos maiores do que aquele já sofrido pelo impetrante em face da indisponibilização dos seus vencimentos, os quais para ele constituem-se verbas de natureza alimentar, sem as quais não pode passar, já que não é detentor de nenhum outro ofício, além do cargo público que ocupava, para garantir a sua sobrevivência e da sua família, composta de esposa e filhos.

Assim, encontrando-se o impetrante desempregado, e sendo titular de direito líquido e certo, não seria justo e nem lícito que fosse obrigado a aguardar o deslinde do processo para que voltasse a desempenhar a sua profissão e receber os vencimentos a que tem direito, seja porque se acha estampada a ilegalidade de sua demissão, seja por estar a necessitar com urgência de ser reintegrado à sua função para que possa assegurar a manutenção e o sustento de sua família.

Não há dúvida, portanto, da necessidade de serem prevenidos prejuízos ainda maiores, que se tornarão irreparáveis para o impetrante pela privação da percepção de verbas com absoluto caráter alimentar, cujas lesões só podem ser estancadas mediante o deferimento da liminar ora pleiteada.

Indispensável ressaltar que o deferimento do pleito liminar não acarretará nenhum prejuízo à Administração Pública, ainda que a Segurança seja denegada ao final, uma vez que, embora a Administração tenha que arcar com os vencimentos do impetrante neste período, receberá em contrapartida a prestação de seus serviços em prol da mesma Administração; ao passo que os prejuízos para o impetrante serão irreversíveis no caso de indeferimento da liminar, ainda que a segurança seja concedida ao final, uma vez que o impetrante deixará de perceber, neste interstício de tempo, verbas indispensáveis para prover sua subsistência e de sua família. Fato este, MMª Juíza, que milita em favor do imediato deferimento da liminar ora pleiteada, devendo ser aplicado o princípio da proporcionalidade, pelo qual "no conflito entre dois bens jurídicos, deve-se outorgar a tutela para evitar que o bem maior seja sacrificado ao menor, segundo uma escala de valores pela qual se pauta o ‘homo medius’, na valoração dos bens da vida" (Carreira Alvim).

Sobre o pleito liminar, manifesta-se a jurisprudência:

"AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE ATO JURÍDICO CUMULADA COM REASSUNÇÃO NO CARGO E FUNÇÃO ADMINISTRATIVA DE CONSELHEIROS EFETIVOS E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS, COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA - CONCESSÃO DA MEDIDA CAUTELAR - INEXISTÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO - CERCEAMENTO DE DEFESA CARACTERIZADO - RECURSO NÃO PROVIDO - DECISÃO UNÂNIME.

- Restando caracterizado o cerceamento de defesa dos conselheiros excluídos, uma vez que a ré instaurou processo administrativo disciplinar e aplicou sanções aos agravados, sem a observância das devidas cautelas legais, eis que não foi dada aos mesmos a oportunidade de produção de provas, não pode ser acoimada de abusiva a decisão que determinou ‘a imediata recondução dos autores aos respectivos cargos e funções’."

[grifo nosso] (Agravo de Instrumento nº 0107268200, Acórdão 8039, 6ª Câmara Cível do TJPR, Curitiba, Rel. Des. Antônio Lopes de Noronha. j. 05.09.2001)

"ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. DEMISSÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. LIMINAR DEFERIDA. REINTEGRAÇÃO NO CARGO. AGRAVO DE INSTRUMENTO.

Comprovado o ‘fumus boni juris’, deve ser deferida a segurança, ‘in limine’, para que sejam suspensos os efeitos de ato exoneratório de servidor público. O pedido de reintegração no cargo reveste-se, por via reflexa, de natureza alimentar, devendo, por isso, também ser considerado o princípio da proporcionalidade: ‘no conflito entre dois bens jurídicos, deve-se outorgar a tutela para evitar que o bem maior seja sacrificado ao menor, segundo uma escala de valores pela qual se pauta o ‘homo medius’, na valoração dos bens da vida’ (Carreira Alvim)." [grifo nosso] (Agravo de Instrumento nº 2002.004206-4, 6ª Câmara Civil do TJSC, Guaramirim, Rel. Des. Newton Trisotto. j. 06.05.2002, unânime).

"AGRAVO DE INSTRUMENTO - MEDIDA CAUTELAR INOMINADA - REINTEGRAÇÃO DE SERVIDOR MUNICIPAL EM CARGO PÚBLICO - EXONERAÇÃO DURANTE ESTÁGIO PROBATÓRIO - ATO EXPEDIDO LOGO APÓS LAUDO DE AVALIAÇÃO - INOBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL - REGRA EXPRESSA NO ESTATUTO DO SERVIDOR PÚBLICO MUNICIPAL - LIMINAR - PRESENÇA DOS REQUISITOS.

A exoneração de servidor concursado durante estágio probatório não prescinde devido processo administrativo a ser instaurado após sua avaliação, a fim de que possa exercitar o direito de ampla defesa. A Administração Pública ofende o princípio da legalidade quando não observa regra expressa neste sentido constante no estatuto do servidor público municipal. Presentes os requisitos para a decisão ‘in limine’, deve ela ser deferida, reintegrando o servidor no cargo público para o qual obteve aprovação mediante concurso." [grifo nosso] (Agravo de Instrumento nº 01.009104-6, 5ª Câmara Civil do TJSC, Quilombo, Rel. Des. Volnei Carlin. j. 01.11.2001, unânime).


08. DO PEDIDO_______________________________________________

Diante do exposto, REQUER-SE de Vossa Excelência:

a) a concessão de LIMINAR, inaudita altera pars, visando a imediata reintegração do impetrante ao cargo de AUXILIAR ADMINISTRATIVO da PREFEITURA MUNICIPAL DE I.-ES, conforme vasta e robusta fundamentação apresentada nesta peça, que atesta a nulidade de sua demissão e evidencia a lesão a direito líquido e certo;

b) a notificação dos coatores sobre o conteúdo desta petição e documentos anexos para que, no prazo de dez (10) dias, prestem as informações necessárias;

c) a oitiva do ilustre representante do Ministério Público;

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d) in meritis, requer que seja confirmada a liminar ao seu tempo deferida, reintegrando o impetrante, em definitivo, à seu cargo no serviço público, e declarando a nulidade do processo administrativo disciplinar deflagrado contra ele através da Portaria n° 034/2005, bem como, de todos os atos exarados em conseqüência do referido processo, notadamente a sentença administrativa de Fls. 419/421 (Doc. 285) e o Decreto n° 098/2005 (Doc. 297), que demitiu o impetrante do serviço público.

Valor da causa: R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

Nestes Termos,

P. Deferimento.

I.-ES, 29 de junho de 2005.

KAYO ALVES RIBEIRO

Advogado – OAB-ES 11.026


09. ROL DE DOCUMENTOS____________________________________

: Decreto de Nomeação do Impetrante

- Doc. 03: Portaria 009/2005 (Nomeou Comissão de Sindicância Administrativa)

- Doc. 04: Ofício 009/2005

- Doc. 05: Portaria 013/2005 (Afastou preventivamente o impetrante por 15 dias)

- Doc. 06: Requerimento do impetrante

- Doc. 07: Ofício 014/2005

- Doc. 08: Portaria 019/2005 (Prorrogou o afastamento do impetrante por mais 15 dias)

- Doc. 09: Ofício 014/2005

- Doc. 10: "Citação" para depoimento na Sindicância Administrativa

- Doc. 11: Depoimento prestado pelo impetrante na Sindicância Administrativa

- Doc. 12: Ofício 022/2005

- Doc. 13: Ofício 022/2005

- Doc. 14: Portaria 034/2005 (Instaurou Inquérito Administrativo contra o impetrante)

- Doc. 15: Portaria 027/2005 (Afastou preventivamente o impetrante por 60 dias)

- Doc. 16: Requerimento do impetrante

- Doc. 17: Resposta de requerimento

- Doc. 18: Requerimento do impetrante

- Doc. 19 e 20: Resposta de requerimento

- Doc. 21: Mandado de Notificação

- Doc. 22 e 23: Prorrogação do prazo para defesa

- Doc. 24: Mandado de Citação

- Doc. 25: Relatório Conclusivo da Comissão Processante

- Doc. 26: Remessa

- Doc. 27: Sentença Administrativa

- Doc. 28: Decreto n° 098/2005 (Demitiu o impetrante do serviço público)

09.2. LEI MUNICIPAL N° 115/97

- Doc. 29: Cópia integral da Lei Municipal n° 115/97, que a partir do Artigo 181 dispõe sobre o Processo Administrativo Disciplinar

09.3. PORTARIA 014/2005

- Doc. 30: Portaria 014/2005 (Nomeia o Sr. JIM como Presidente da Comissão de Sindicância)

09.4.CÓPIA INTEGRAL DO PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR

09.4.1. FASE DA SINDICÂNCIA

- Doc. 31: Relatório conclusivo da Sindicância Administrativa

- Doc. 32 a 100: Depoimentos da Sindicância Administrativa

- Doc. 101 a 140: Documentos diversos relativos à Sindicância Administrativa

09.4.2. FASE PROCESSUAL

- Doc. 141: Atestado Médico do Presidente da Comissão

- Doc. 142 e 143: Resposta de Requerimento e Mandado

- Doc. 144 a 155: Portarias

- Doc. 156 a 248: Defesa Administrativa dos Indiciados.

- Doc. 249 a 254: Procurações ao Patrono dos Indiciados;

- Doc. 255 a 284: Depoimentos das Testemunhas de Defesa, todos duplicados, sendo que às Fls. 380 (Doc. 265) encontra-se o Termo de Assentada da audiência realizada para oitiva dessas testemunhas.

- Doc. 285: Sentença Administrativa

- Doc. 286: Remessa dos Autos ao Prefeito Municipal

- Doc. 286 a 292: Relatórios Conclusivos da Comissão Processante

- Doc. 293 a 299: Decretos (inclusive o de demissão do impetrante)

- Doc. 300: Concessão de Vista ao Patrono dos indiciados, conforme liminar concedida nos autos do Mandado de Segurança n° 028.05.000743-5, em tramitação perante este Juízo.

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Sobre o autor
Kayo Alves Ribeiro

Advogado militante na área cível em Irupi-ES

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

RIBEIRO, Kayo Alves. Sindicância: mandado de segurança contra cerceamento de defesa e desobediência ao contraditório. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 791, 2 set. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16634. Acesso em: 22 nov. 2024.

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