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Contribuição previdenciária dos exercentes de mandato eletivo:

inconstitucionalidade

08/11/2005 às 00:00
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Ação ajuizada por Município para restituição da contribuição patronal recolhida sobre as remunerações pagas aos exercentes de mandato eletivo não submetidos a regime previdenciário especial.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA ____ VARA CÍVEL DA SEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO PAULO / SP.

            Ação Declaratória

            cumulada com

            Repetição de Indébito

            Rito Comum Ordinário

            O MUNICÍPIO DE. ......, pessoa jurídica de direito público interno, inscrito no CNPJ do MF sob n.º, com sede na Rua. ..., Bairro, CEP. ......., por meio de seu procurador, vem propor pelo rito comum ordinário


AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICO-TRIBUTÁRIA

CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO,

            com requerimento de antecipação de efeitos da tutela

            em face de INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, autarquia federal, pelas razões que passa a aduzir.


DA CAUSA DE PEDIR

            Com o advento da Lei Ordinária Federal n.º 9.506, de 30 de outubro de 1997, foi acrescida a alínea h ao inciso I do art. 12 da Lei n.º 8212/91, com a seguinte redação:

            Art. 12. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:

            I - como empregado:

            [...]

            h) o exercente de mandato eletivo federal, estadual ou municipal, desde que não vinculado a regime próprio de previdência social;

            Por via de conseqüência, o autor teve que começar a recolher ao INSS a contribuição de 20% sobre os pagamentos feitos aos indivíduos enquadrados nessa nova categoria de segurado obrigatório, nos termos do art. 22, inc. I, da Lei 8212/91. Além dessa contribuição de 20%, também foi recolhido o percentual de 1%, nos termos do inciso II do art. 22 da Lei 8212/91:

            Art. 22. A contribuição a cargo da empresa, destinada à Seguridade Social, além do disposto no art. 23, é de:

            I - vinte por cento sobre o total das remunerações pagas, devidas ou creditadas a qualquer título, durante o mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos que lhe prestem serviços, destinadas a retribuir o trabalho, qualquer que seja a sua forma, inclusive as gorjetas, os ganhos habituais sob a forma de utilidades e os adiantamentos decorrentes de reajuste salarial, quer pelos serviços efetivamente prestados, quer pelo tempo à disposição do empregador ou tomador de serviços, nos termos da lei ou do contrato ou, ainda, de convenção ou acordo coletivo de trabalho ou sentença normativa.

            II - para o financiamento do benefício previsto nos arts. 57 e 58 da Lei no 8.213, de 24 de julho de 1991, e daqueles concedidos em razão do grau de incidência de incapacidade laborativa decorrente dos riscos ambientais do trabalho, sobre o total das remunerações pagas ou creditadas, no decorrer do mês, aos segurados empregados e trabalhadores avulsos:

            a) 1% (um por cento) para as empresas em cuja atividade preponderante o risco de acidentes do trabalho seja considerado leve;

            Entretanto, por diversos motivos, a inovação trazida pela Lei 9506/97 não respeitou os ditames constitucionais pertinentes, conforme entendimento recentíssimo do PLENÁRIO do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, no julgamento do Recurso Extraordinário n.º 351.717-1, cuja ementa segue abaixo:

            CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. PREVIDÊNCIA SOCIAL. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL: PARLAMENTAR: EXERCENTE DE MANDATO ELETIVO FEDERAL, ESTADUAL OU MUNICIPAL. Lei 9.506, de 30.10.97. Lei 8.212, de 24.7.91. C. F., art. 195, II, sem a EC 20/98; art. 195, § 4.º; art. 154, I.

            I – A Lei 9.506/97, § 1º do art. 13, acrescentou a alínea h ao inc. I do art. 12 da Lei 8.212/91, tornando segurado obrigatório do regime geral de previdência social o exercente de mandato eletivo, desde que não vinculado a regime próprio de previdência social.

            II. - Todavia, não poderia a lei criar figura nova de segurado obrigatório da previdência social, tendo em vista o disposto no art. 195, II, C.F.. Ademais, a Lei 9.506/97, § 1º do art. 13, ao criar figura nova de segurado obrigatório, instituiu fonte nova de custeio da seguridade social, instituindo contribuição social sobre o subsídio de agente político. A instituição dessa nova contribuição, que não estaria incidindo sobre "a folha de salários, o faturamento e os lucros" (C.F., art. 195, I, sem a EC 20/98), exigiria a técnica da competência residual da União, art. 154, I, ex vi do disposto no art. 195, § 4º, ambos da C.F.. É dizer, somente por lei complementar poderia ser instituída citada contribuição.

            III. - Inconstitucionalidade da alínea h do inc. I do art. 12 da Lei 8.212/91, introduzida pela Lei 9.506/97, § 1º do art. 13.

            IV. - R.E. conhecido e provido.

            Vale acrescer que, quando da edição da Lei n.º 9506/97, os incisos I e II do art. 195 vigiam com a seguinte redação:

            Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:

            I - dos empregadores, incidente sobre a folha de salários, o faturamento e o lucro;

            II – dos trabalhadores;

            Entre as diversas inconstitucionalidades cometidas, nota-se, em primeiro lugar, que os detentores de mandato eletivo, como o prefeito, o vice-prefeito, e os vereadores, não integravam a fonte de custeio prevista no art. 195, II, da Constituição, pois não se enquadram no conceito de trabalhadores.

            A propósito, merecem transcrição as palavras do relator do RE 351.717-1, Ministro CARLOS VELLOSO:

            O agente político, portanto, não é o ‘trabalhador’ do inciso II do art. 195 da Constituição Federal, convindo esclarecer que esta, no art. 29, IX, deixa expresso que os vereadores estão sujeitos à disciplina dos parlamentares.

            Por via reflexa, também não se poderia considerar o pagamento feito a esses agentes políticos como integrando a base de cálculo "folha de salários" prevista no inciso I do art. 195.

            Somente o exposto até aqui já seria suficiente para o reconhecimento da inconstitucionalidade da alínea h do inciso I do art. 12 da Lei 8.212/91, mas ainda há outro vício.

            Embora a Constituição da República permita a criação de novas fontes de custeio, essa criação deve se dar por meio de lei complementar, conforme art. 195, § 4.º c.c. art. 154, I, todos da Constituição da República.

            Tendo a inclusão dos aludidos agentes políticos sido feita por meio de Lei Ordinária, esta padece de vício de inconstitucionalidade formal, o que foi reconhecido expressamente no mencionado julgado.

            A propósito, eis as palavras do ilustre Relator, Ministro CARLOS VELLOSO:

            "A instituição dessa nova contribuição, que não estaria incidindo sobre ‘a folha de salários, o faturamento e os lucros’ (C.F., art. 195, I, redação sem a EC 20/98), somente poderia ser instituída com a observância da técnica da competência residual da União, inscrita no art. 154, I, ex vi do disposto no art. 195, §4.º, ambos da Constituição Federal.

            É dizer, somente por lei complementar poderia ser instituída a citada contribuição."

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            O Ministro MARCO AURÉLIO acompanhou o relator com o seguinte voto:

            o argumento do relator quanto à natureza da lei que institua nova fonte de custeio é, a meu ver, irrefutável, tendo em conta que o § 4.º do art. 195 da Constituição Federal remete ao artigo 154, inciso I, o qual exige uma envergadura maior quanto ao ato normativo para ter-se – como se disse – a criação de uma nova fonte de custeio.

            Diante do que foi aduzido até aqui, torna-se patente que, sendo inconstitucional a alínea h do inciso I do art. 12 da Lei n.º 8212/91, também o será o recolhimento devido pelo Município no importe de 20% sobre os pagamentos feitos a seu Prefeito, Vice-Prefeito e Vereadores.

            Acresça-se, outrossim, que no julgamento da Ação Declaratória de Inconstitucionalidade n.º 1102-2/DF, onde se tratou de caso análogo, também foi julgada inconstitucional a exigência do recolhimento de 20% sobre os pagamentos feitos aos autônomos e empresários, uma vez que esses valores, do mesmo modo, não se enquadravam no conceito de folha de salários previsto no art. 195, I, da Constituição.

            Ante o princípio da segurança jurídica que impera em nosso sistema, embora atualmente a alínea h do inciso I do art. 12 da Lei 8212/91 esteja com sua execução suspensa por força da Resolução n.º 26/2005 do Senado, tal ato normativo apenas produz efeitos ex nunc, de modo que é necessária uma medida judicial para afastar a exigibilidade da norma quanto aos fatos geradores que ocorreram em sua vigência.

            Nessa linha, é de rigor o reconhecimento incidenter tantum da inconstitucionalidade da alínea h do inciso I do art. 12 da Lei 8212/91, inserida pela Lei Ordinária Federal n.º 9506/97, declarando-se inexistente qualquer relação jurídica entre o Município. ......... e o INSS decorrente do pagamento feito por ele a seu Prefeito, a seu Vice-Prefeito e a seus Vereadores.

            Por conseguinte, é imperativa a condenação do INSS à devolução dos montantes indevidamente recolhidos, bem como os que venham a ser pagos.


DO CABIMENTO DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

            [OBSERVAÇÃO: UTILIDADE DA ANTECIPAÇÃO DE TUTELA VINCULADA A DÉBITOS ANTIGOS FUNDADOS NA ALÍNEA H DO INCISO I DO ART. 12 DA LEI 8212/91 – EXEMPLO DE UTILIDADE: EXPEDIÇÃO DE CND VINCULADA A TAIS DÉBITOS]

            Tendo em vista que a matéria versada é eminentemente de direito, fica evidente a verossimilhança das alegações, no sentido da inconstitucionalidade da inclusão da alínea h no inciso I do art. 12 da Lei 8.212/91, fato este reconhecido por unanimidade pelo plenário do Supremo Tribunal Federal.

            Essa verossimilhança está inequivocamente comprovada diante da publicação do acórdão do RE n.º 351.717-1/PR e da Resolução n.º 26/2005 do Senado Federal, que suspendeu a execução da supramencionada alínea h.

            Sendo assim, não é plausível que se aguarde o trânsito em julgado do provimento final para que se suspenda a indevida exigibilidade das contribuições que tiveram como base na alínea h do inciso I do art. 12 da Lei 8212/91.

            Caso o autor deixe não recolha as contribuições sociais consideradas inconstitucionais pelo pleno do STF no RE 351.717, o réu não expedirá a Certidão Negativa de Débitos –CND– necessária para obtenção de repasses da União.

            A relevância desse transtorno foi ressaltada pelo Ministro JOAQUIM BARBOSA ao despachar a Ação Cautelar n.º 179/PR, conforme trecho segue abaixo:

            Estão presentes os requisitos do periculum in mora e do fumus boni juris. O primeiro, porque a demora da decisão pode afetar sensivelmente as finanças do município, que necessita de recursos federais a fim de cumprir suas obrigações; o segundo, porque decisão recente da Corte (RE 351717, de 8/10/2003) embasa o posicionamento do município requerente.

            Não se deve olvidar que os montantes recolhidos não retornarão automaticamente ao autor após a tutela definitiva buscada, pois será necessário ainda ter que aguardar o trâmite da subseqüente execução, bem como o demorado rito dos precatórios.

            Esse fato configura o periculum in mora, conforme já decidiu o Tribunal Regional Federal da 3.ª Região:

            PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. COMPENSAÇÃO PIS X PIS, COFINS E CSL. ART.66 DA LEI N.º 8383/91. POSSIBILIDADE DA COMPENSAÇÃO.

            1 - O Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o RE n.º 148.754-2-RJ declarou a inconstitucionalidade dos decretos-lei n.º 2445/88 e 2449/88.

            2 - Com a edição da lei n.º 8383, de 30.12.91, exsurgiu a possibilidade jurídica de se compensar o que tiver sido pago indevidamente ou a maior a título de tributos federais, nos moldes autorizados pelo seu artigo 66. precedentes do superior tribunal de justiça.

            3 - Caracterizado o "periculum in mora", pois caso não assegurado o provimento perseguido ficará a agravante sujeita à autuação fiscal ou ao "solve et repete".

            4 - Outrossim, a correção monetária dos valores a serem compensados deverá ser efetuada pelos mesmos índices que o fisco utiliza na atualização de seus créditos.

            5 - Incabível a incidência de juros, por se tratar compensação de procedimento facultado ao particular, não se podendo imputar mora à administração.

            6 - agravo parcialmente provido.

            (Sexta Turma, AG 98478, Processo: 1999.03.00.058736-3/SP, Relator JUIZA DIVA MALERBI, j.15/03/2000, DJU 26/04/2000, p. 93)

            Assim, de modo a assegurar a efetividade da tutela jurisdicional, requer seja determinada a suspensão da exigibilidade das contribuições incidentes sobre os pagamentos efetuados pelo autor a seu prefeito, vice-prefeito e vereadores.

            Por conseguinte, requer seja expedido ofício ao INSS para que não se negue a emitir a CND relativa a essa contribuições.


CONCLUSÃO

            Ante o exposto, o autor pede que, reconhecida incidentalmente a inconstitucionalidade a alínea h do inciso I do art. 12 da Lei n.º 8.212/91, inserida pela Lei n.º 9506/97, seja declarada a inexistência de relação jurídica com o réu, no que tange às contribuições sociais previstas nos incisos I e II, a, do art. 22 da Lei 8212/91, incidentes sobre os pagamentos feitos ao seu prefeito, vice-prefeito e vereadores.

            Além disso, pede seja o réu condenado a restituir os valores já recolhidos até. ......, cujo montante atualizado é de. ....., bem como as quantias que venham a ser pagas, tudo devidamente atualizado pela SELIC desde a data de cada pagamento indevido até a data da efetiva restituição.

            Por fim, pede seja o réu condenado a pagar honorários advocatícios no percentual de 20% sobre o valor da condenação, nos termos do art. 20 do Código de Processo Civil, bem como a arcar com os demais ônus sucumbenciais.

            O autor provará a veracidade do quanto aduziu mediante prova documental, bem como por qualquer outro meio necessário e cabível no trâmite processual.

            Em remate, requer a citação do réu na pessoa de seu procurador, no seguinte endereço: Rua Xavier de Toledo, 288, Centro de São Paulo/SP.

            Atribui à causa o valor de R$. ......

            Nos termos do art. 24 da Lei 10.522/02, o Município está dispensado de autenticar as cópias apresentadas em juízo.

            Termos em que pede deferimento.

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Sobre o autor
Leandro Sarai

Doutor e Mestre em Direito Político e Econômico e Especialista em Direito Empresarial pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Advogado Público.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SARAI, Leandro. Contribuição previdenciária dos exercentes de mandato eletivo:: inconstitucionalidade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 10, n. 858, 8 nov. 2005. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16648. Acesso em: 29 mar. 2024.

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