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Empréstimos consignados: falta de clareza na publicidade.

Ação civil pública

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09/08/2006 às 00:00
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Ação civil pública movida pelo Ministério Público do Distrito Federal em face de banco privado que oferece empréstimos consignados a aposentados, requerendo medidas para que a publicidade do serviço esclareça melhor as condições contratuais, bem exigindo indenização por danos morais coletivos.

Exmo. Sr. Juiz de Direito da Vara Cível da Circunscrição Judiciária Especial de Taguatinga/DF.

"Um homem mau maltratava o seu velho pai, obrigando-o a morar em uma cabana miserável, longe da casa, vestindo-o com farrapos e dando-lhe sobras para comer. Um dia viu que seu filho estava colocando trapos sujos, que tinha tirado da lixeira, no lugar onde se guardava a roupa fina da casa e se enfureceu com ele. O seu filho respondeu assim: Papai, não brigue comigo. É para você que estou guardando estes trapos, para que você possa vestir quando for velho como o vovô." (Literatura oral iemenita).

Procuradoria de Assistência Judiciária do Distrito Federal, Núcleo de Atendimento de Taguatinga, órgão sem personalidade jurídica, que faz às vezes da Defensoria Pública, denominação doravante utilizada, com endereço no frontispício desta petição, vem, por meio do procurador abaixo firmado, propor ação civil pública com pedido de antecipação de tutela, com esteio na Lei 7347/85 e na Lei 8078/90, em face de Banco [BANCO] S.A [01]., pessoa jurídica de direito privado, inscrita sob o CNPJ ..., sediada em ..., pelas razões de fato e de direito que passa a expor:


LEGITIMIDADE DA DEFENSORIA PÚBLICA PARA PROPOSITURA DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA.

A lei 7347/85, conhecida como Lei da ação civil pública, é um importante instrumento de racionalização da prestação da tutela jurisdicional. Por meio de tal instrumento é possível, em uma única ação, a proteção de centenas, de milhares, de jurisdicionados sem que se faça necessário a propositura de um incontável número de ações individuais. Em face do artigo 1º da referida lei ela pode ser utilizada para proteção de qualquer interesse difuso ou coletivo. Além da lei da ação civil pública vale destacar a importância do Código de Defesa do Consumidor (Lei 8078/90), que determina, em seu artigo 90, que para proteção do consumidor seja aplicado a Lei da ação civil pública.

Na verdade, como lecionam Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart [02], "esse sistema permite dizer que é admissível, perante o direito nacional, a proteção de qualquer direito transindividual, e ainda a tutela adequada dos direitos que podem ser lesados nas relações características da sociedade de massa (art. 91 e ss do CDC)".

O espectro de abrangência de tutela do direito material é bastante amplo, a exemplo, aliás, do que acontece com os legitimados ativos para propositura desta espécie de demanda. A lei processual brasileira concebe, para as ações coletivas, um sistema de legitimação extraordinária, atribuindo a defesa dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos a determinados organismos que, supõe-se, tenham condições de adequadamente protegê-los, conforme lição dos autores acima citados [03].

Dentre os legitimados o direito brasileiro outorga o mister de propor tais ações: I) ao Ministério Público; II) A união, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal; III) as entidades e órgãos da Administração Pública, direta ou indireta, ainda que sem personalidade jurídica, especificamente destinados à defesa dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos (Art. 82 do CDC).

O Decreto Distrital 22490, de 19 de dezembro de 2001, reestruturou o Centro de Assistência Judiciária do DF [04], incumbindo ao órgão o dever de prestar gratuita e integral assistência jurídica aos necessitados. No Artigo 3º do mencionado Decreto resta estipulado que são funções do órgão: XI – patrocinar os direitos e interesses dos consumidores lesados. No mesmo sentido é a disposição da Lei Distrital 821/94. Além disso, a Lei Complementar 80/94, também aplicável, destina igual função aos por ela regidos.

Inquestionável, pois, é a assertiva de que o órgão autor ostenta legitimidade ativa para propositura de ação civil pública em defesa dos interesses coletivos dos consumidores.


DO MÉRITO. DEFESA DOS CONSUMIDORES.

A pessoa jurídica assentada no vértice passivo é Instituição Financeira, prestadora de serviço, que deve ser entendida como "qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista", segundo disposição expressa do § 2º do artigo 3º da Lei 8078/90.

Segundo a doutrina brasileira, fornecer significa prover, abastecer, guarnecer, dar, ministrar, facilitar, proporcionar, uma atividade, portanto, independente de quem realmente detém a propriedade dos eventuais bens utilizados para prestar o serviço e seus deveres anexos.

A Requerida, no exercício de sua atividade, financia a aquisição de produtos, fornece empréstimos em dinheiro, tudo, é claro, mediante a cobrança de juros que incidirão sobre o capital tomado por empréstimo.

A empresa Requerida, dentre as várias modalidades de empréstimos existentes em sua carteira, realiza empréstimos aos aposentados que recebem pelo Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS. O aposentado toma o empréstimo junto à Instituição Financeira, sendo que os pagamentos são repassados pelo próprio INSS, mediante desconto em folha de benefícios, o denominado empréstimo consignado.

O Banco [BANCO], para formalização da avença, se vale de dois contratos de adesão [05]. O primeiro é denominado contrato de empréstimo pessoal com taxa prefixada (consignação e/ou retenção INSS). O segundo formulário é denominado instrumento particular de aditamento ao contrato de empréstimo pessoal com taxa prefixada (consignação e/ou retenção INSS). O primeiro é utilizado na negociação originária, enquanto o segundo, com condições mais desvantajosas ao aposentado é utilizado quando, premido pela falta de recursos, o aposentado necessita renegociar a dívida.

O volume de negócios é impressionante. São 19 milhões de aposentados e pensionistas e mais de 6 milhões de operações já foram realizadas, sendo que mais de 50% dos negócios foram realizados por pessoas que recebem benefícios de até 01 salário mínimo mensal. Entre janeiro de 2005 e janeiro de 2006 o número de operações cresceu 664,12% [06].

A publicidade levada a efeito pela Requerida é bastante convidativa, pois se utiliza dos mais modernos instrumentos de publicidade, fazendo com que os mais desavisados acreditem, honestamente, que a tomada de crédito é algo vantajoso, que trará benefícios ao mutuário. Na verdade, a utilização do crédito, com as taxas de juros cobradas, acaba sendo um negócio ruinoso para os mutuários, especialmente para os aposentados de baixa renda, que, normalmente, possuem menor grau de instrução e, portanto, são mais vulneráveis aos apelos de marketing.

O portal da Jornal International Press [07] na Internet, um dos mais respeitados veículos de comunicação econômica no Brasil, asseverou que "o grande número de empréstimos consignados é composto pela população de baixa renda. Grande parte dessa população não tem acesso nem a talões de cheques. Em razão disso o tomador potencial não tem condições sequer de saber quanto paga de juros, muito menos procurar saber qual instituição cobra um juro mais baixo. O tomador fica sabendo apenas que o comprometimento da prestação é de 30% da renda mensal". Vale destacar que a maioria não consegue captar o real significado do que é ter comprometido 30% dos rendimentos. Ademais, muitas vezes tal tipo de empréstimo é concedido para pessoas que já contraíram outras formas de financiamento perante a Instituição Financeira, ou seja, para pessoas que já possuem mais de 30% de sua renda comprometida com débitos oriundos de contratos de cessão de crédito. O refinanciamento das consignações é outra modalidade muito utilizada pelo Banco [BANCO] S.A., conforme se pode ver nos contratos em anexo.

A reprodução gráfica abaixo, extraída do portal da requerida na Internet [08], deixa bem claro que o Banco [BANCO], mediante técnicas de publicidade, deixa transparecer que a realização do contrato, do empréstimo consignado, tem o condão de deixar a vida dos mutuários melhor. Confira-se:

Com a publicidade, bastante agressiva, diversos aposentados são atraídos para as agências da empresa, espalhadas em quase todos os municípios brasileiros. Insta salientar que o Banco [BANCO] S.A. se utiliza do fato de ser responsável pelo pagamento dos benefícios previdenciários de mais de 4 milhões de aposentados e pensionistas – informação fornecida pelo veículo último segundo – para assediar acintosamente tais aposentados e com isto convencê-los de que o crédito que lhes é oferecido é o caminho para uma vida mais completa, conforme veiculado na propaganda institucional da empresa.

O site Jornal International Press, antes citado, constatou que "quem passa por algumas estações de metrô, ou por outros locais de muito movimento no Brasil, já deve ter visto uma faixa chamando a atenção de aposentados do INSS para uma nova modalidade de empréstimo. É o empréstimo ou crédito consignado".

Os funcionários da Requerida demonstram, com sólidos argumentos, que o empréstimo é vantajoso, que é a solução para os problemas que os aposentados, em sua grande maioria carentes de recursos. Após a fase do "namoro", quando os clientes já estão subjugados pela propaganda, lhes é apresentado o contrato de adesão, redigido em letras pequenas, em pequenos espaços, recheados de termos técnicos e incompreensíveis para a maioria dos "clientes [09]". Além disso as cláusulas não são redigidas de forma direta, pois fazem referência a outras cláusulas, obrigando o leitor a praticar um verdadeiro malabarismo caso queira entender o significado do contrato. Veja, como exemplo, como está redigida [10] a cláusula que estipula o valor do empréstimo: 2º - O valor do empréstimo, deduzido o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) e o custo relativo à Tarifa de Abertura de Crédito (TAC), mencionados respectivamente nos campos 22 e 27, será lançado a crédito da conta corrente do(a) devedor(a) indicado no campo 11, ou por meio de emissão de DOC/TED, ou ainda por outro instrumento de pagamento observadas as normas expedidas pelo Banco Central do Brasil. Até mesmo pessoas experientes sentem dificuldades ao interpretar tais contratos, imaginem a situação de pessoas idosas e com baixo grau de instrução.

A cláusula acima se refere ao montante a ser creditado ao aposentado ou pensionista. Vejamos, agora a mais importante, a que estipula os juros: "1º - Pelo presente contrato o Banco empresta ao devedor, a importância mencionada no campo 17, que ele devedor se obriga a restituir acrescida dos encargos previstos nos campos 24 e 25, através do número de prestações mensais e sucessivas indicado no campo 18, vencendo-se a primeira no campo 20 e as demais em igual dia de recebimento dos benefícios previdenciários dos meses subseqüentes até a última vencível no dia mencionado no campo 26, cada uma no valor indicado no campo 19, nelas já incluídos os encargos convencionados". Ufa!!! É preciso fôlego para ler, imaginem como alguém com mais de 60 anos, as vezes 70, as vezes 80 consegue interpretar tal cláusula.

Em outras palavras a propaganda levada a efeito pelo Banco [BANCO] S.A. é bastante eficiente, moderna, direta, clara, fala olho no olho do consumidor idoso e com baixo grau de escolaridade. De seu canto, o contrato, a lei entre as partes, é confuso, cheio de complexidades e de termos incompreensíveis, como por exemplo, se vê na cláusula 6º, que faz remissão ao "caput" da cláusula 5º. A propaganda é a alma do negócio, diriam os desalmados. Explicativa a respeito dos motivos de posturas tão dispares entre a publicidade e o contrato é a notícia veiculada no sítio da Internet último segundo [11], sob o sugestivo título temporada é de caça ao aposentado. Diz a matéria, anexa a esta petição, que oferecer chá com biscoitos, sortear prêmios e viagens ou colocar na rua vendedores com terno e chapéu panamá são ações de marketing que começam a fazer parte da lista de estratégias de bancos e financeiras para atrair aposentados.

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Vale consignar que uma das formas de vulneração dos consumidores é a redação complexa, o tecnicismo e o uso de remissões a outras cláusulas do instrumento, exatamente como faz o Banco [BANCO] S.A. no contrato hostilizado. Sobre o tema vale a pena consultar o excelente artigo jurídico O princípio da vulnerabilidade e a defesa do consumidor no direito brasileiro: origem e conseqüências nas regras regulamentadoras dos contratos de publicidade [12], cujo inteiro teor encontra-se em anexo.

Quando a execução do contrato tem início, especialmente após os primeiros descontos em folha de pagamento, o aposentado percebe que o empréstimo, além de não auxiliar na resolução dos problemas que lhe afligiam, agregou aos seus infortúnios mais uma dívida. No final das contas percebe que obteve, com o empréstimo, uma redução de sua renda.

Os consumidores acabam ficando a mercê dos escrúpulos dos funcionários do banco, premidos pelas metas de desempenho estipuladas pela própria Instituição Financeira, cujo objetivo exclusivo é o lucro. A única salvaguarda dos clientes é o contrato, redigido de forma propositalmente ininteligível. Em anexo segue o modelo de contrato utilizado pelo banco réu.

Pior do que o contrato é o formulário de autorização de consignação/retenção de empréstimo nos benefícios previdenciários, o documento que autoriza o INSS a proceder aos descontos. Este é redigido em letra maior, mas nele inexiste campo explicativo do número de meses ou do valor que será retido mês a mês nos proventos do aposentado ou pensionista.

Como não há meios de se impedir que os empréstimos sejam disponibilizados, o que em algumas situações até poderia prejudicar os próprios aposentados, há de se buscar um meio de que o consumidor seja devidamente esclarecido, de que o contrato, mais do que um mero meio de documentação da avença, seja utilizado como instrumento de esclarecimento ao consumidor dos riscos que o negócio pode lhe propiciar, especialmente com relação ao superendividamento.

Vale mencionar que o Banco não se expõe a nenhum risco, pois além da garantia do repasse do INSS, na cláusula 4º existe a previsão de um seguro de vida, desde que o tomador do empréstimo seja menor de 80 anos. Se maior, segundo informações obtidas no banco, o mutuário precisa contratar um seguro privado (venda casada e discriminação etária [13]) sob pena de não obter aprovação no empréstimo.

A determinação judicial de que o texto seja redigido em fontes gráficas mais nítidas e maiores e, se possível, com a utilização de instrumentos que facilitem o entendimento do contrato, especialmente das taxas de juros cobradas, do valor final do empréstimo se faz, sem sombra de dúvidas, imprescindível para ao menos minorar a gravidade de tal quadro. Não é de se descartar a hipótese de inserção de desenhos, de legendas, da aposição, em letras garrafais, dos riscos do superendividamento. Enfim, é preciso que o crédito seja tomado de forma consciente.

Vale mencionar que o endividamento é um fato inerente à vida em sociedade, especialmente na sociedade de consumo. A economia de mercado é, por natureza, uma economia de endividamento. Consumo e crédito são duas faces de uma mesma moeda. Geraldo de Faria Martins da Costa [14] leciona que "na economia do endividamento, tudo se articula com o crédito. O crescimento econômico é condicionado por ele. O endividamento dos lares funciona como ‘meio de financiar a atividade econômica’. Segundo a cultura do endividamento, viver a crédito é um bom hábito de vida. Maneira de ascensão ao nível de vida e conforto do mundo contemporâneo".

Mas não é possível que se admita, a pretexto de fomentar a economia, que se oportunize, sem as devidas advertências, que o consumidor caia na esparrela do superendividamento, que no Brasil é tão grave que pode ser comparado a questões de saúde pública, tais como o tabagismo e o alcoolismo. Vale relembrar que nas caixas de cigarros, por exemplo, foram apostas imagens de fetos abortados, de pessoas com câncer, de órgão vitais carcomidos pelos danos causados pelo fumo, tudo com a intenção de alertar os fumantes dos riscos que se assume ao acender um cigarro. É passada da hora de se tomar, em prol dos consumidores, medida similar na concessão de crédito, especialmente para pessoas idosas e de baixo grau de instrução. Não é demais lembrar que mais de 50% dos empréstimos são concedidos para pessoas com renda de até 01 salário mínimo, presumivelmente, muitas delas semi-analfabetas e quase todas com baixíssimo grau de instrução.

A exigência de que informações claras e precisas constem do contrato, que deve ser redigido de forma compreensível ao consumidor, não é uma exigência descabida. A previsão consta do Artigo 46 do Código de Defesa do Consumidor, verbis: os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores (...), ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu alcance".

A Carta Cidadã, em seu artigo 230, caput, diz que "a família, a sociedade e o Estado têm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo a sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito a vida". O Banco [BANCO], ao formalizar contratos de adesão de difícil compreensão fulmina a pretensão do legislador constituinte e pior, o faz impunemente. É um absurdo inquestionável que há tanto tempo fira a honra e a dignidade da população, especialmente da população idosa e carente deste País.

Ao se analisar os contratos inclusos a esta petição, modelo padrão utilizado pelo Banco réu, fácil é perceber que o aposentado padrão do INSS, com baixa renda e baixo grau de instrução não tem condições de entender o caráter oneroso da obrigação que está assumindo. A língua inglesa utiliza o termo "loanshark" para designar o agiota, o usurário. Em tradução livre pode-se dizer "tubarão dos juros", ou, que os aposentados estão caindo direto na boca do tubarão.

No site Último Segundo [15] é relatado que para aumentar a taxa de adesão aos empréstimos o Banco [BANCO] contratou atendentes na faixa de 50 anos, que convidam os aposentados para um café, oportunidade, que segundo o Banco, os clientes terão tempo para refletir sobre a contratação ou não do empréstimo. A técnica utilizada pelo Banco [BANCO] S.A. objetiva conquistar a simpatia e confiança dos aposentados e pensionistas de forma que se sintam mais seguros ao firmar o contrato. Há de se ter em mente que os índices de depressão e carência afetiva entre os mais velhos, aqui e alhures, é alta, fruto do abandono a que muitos são submetidos. Muitos idosos necessitam apenas de alguém que lhes dê atenção, carinho. O Banco [BANCO] S.A. com o fito de realizar negócios, de ganhar dinheiro, muito dinheiro, resolveu preencher tal lacuna.

Claudia Lima Marques [16], inegavelmente uma das maiores autoridades em proteção consumerista, aduz em comentário ao artigo 46 que "a finalidade da norma é assegurar informação ao consumidor, ou, como estamos querendo frisar, a transparência necessária nas relações de consumo. Tenta, dessa maneira, evitar que o fornecedor utilize a sua superioridade econômica e mesmo técnica [17]para confundir o consumidor e impor a ele obrigações que, se tivesse compreendido o sentido do texto, não teria assumido". É o caso que se debate.

Vale consignar, como faz a autora adrede citada, que este dever de relação clara será ainda maior se o fornecedor desejar utilizar métodos de massa para contratação. O Banco [BANCO], por força de convênio com o Poder Público Federal, recebe milhares [18] de aposentados em suas agências mensalmente, pois é uma das Instituições pagadoras dos benefícios do INSS. Ou seja, além do atrativo de marketing externo, todos os meses diversos aposentados são obrigados a comparecer às suas agências para retirar seus benefícios, oportunidade em que são assediados a realizar a contratação de empréstimos, como já dito.

Claudia Lima Marques [19] diz que "o importante na interpretação da norma é identificar como será apreciada a questão referente a ‘ dificuldade de compreensão ’ do instrumento contratual. É notório que a terminologia jurídica apresenta dificuldades específicas para os não profissionais do ramo; de outro lado, a utilização de termos atécnicos pode trazer ambigüidades e incertezas ao contrato. Nestes 15 anos de CDC, os tribunais brasileiros vêm interpretando a norma em função do nível de conhecimento jurídico do consumidor médio, isto é, do homem atento, mas sem formação jurídica específica".

O importante é que o consumidor, especialmente o idoso economicamente carente, possa entender o teor das obrigações que está assumindo. Não pode ser olvidado que com o avanço da idade algumas funções, como a acuidade óptica e a atenção, perdem o vigor e que, neste contexto, a letra e a disposição gráfica do contrato (tamanho, fonte, espaçamento) utilizado pelo banco dificultam o entendimento do conteúdo da avença especialmente pelos mais idosos. Isso tudo sem esquecer das dificuldades decorrentes do baixo grau de instrução.

Não é sem razão que Claudia Lima Marques [20] conclui que "o artigo 46, in fine, do CDC indica, através de utilização das expressões ‘sentido e alcance’ do contrato, o ponto mais sensível da futura análise da transparência do instrumento contratual, isto é, a compreensão pelo consumidor das obrigações que está assumindo, especialmente quanto ao valor do pagamento, ao número de prestações, à espécie de correção e acréscimo possível da dívida, ao tempo de duração do vínculo contratual e ao envolvimento de futuras contratações. Uma interpretação sistemática da norma também chegaria a idêntica conclusão, utilizando as normas do art. 51 e 52 para verificar que pontos do contrato foram considerados relevantes na proteção do consumidor".

Assim, na forma em que redigido os contratos de adesão em anexo, suprime-se do consumidor, especialmente o idoso e economicamente hipossuficiente destinatário do denominado empréstimo consignado, a oportunidade de entendimento do conteúdo da avença. Após a realização do ruinoso contrato e a drástica redução da renda os problemas já existentes se agravam. O dinheiro do remédio, da alimentação passa a ser do banco.

Urge, assim, que seja expedido provimento, inclusive em caráter de antecipação de tutela, para determinar ao Banco [BANCO] S.A. que modifique a estrutura do contrato de adesão. Sugere-se, aqui, que doravante seja utilizado, no mínimo, a diagramação prevista no manual de redação da Presidência da República [21], qual seja:

3.2. Forma de diagramação

Os documentos do Padrão Ofício devem obedecer à seguinte forma de apresentação:

a) deve ser utilizada fontedo tipo Times New Roman de corpo 12 no texto em geral, 11 nas citações, e 10 nas notas de rodapé;

b) para símbolos não existentes na fonte Times New Roman poder-se-á utilizar as fontes Symbol e Wingdings;

c) é obrigatória constar a partir da segunda página o número da página;

d) os ofícios, memorandos e anexos destes poderão ser impressos em ambas as faces do papel. Neste caso, as margens esquerda e direta terão as distâncias invertidas nas páginas pares ("margem espelho");

e) o início de cada parágrafo do texto deve ter 2,5 cm de distância da margem esquerda;

f) o campo destinado à margem lateral esquerda terá, no mínimo, 3,0 cm de largura;

g) o campo destinado à margem lateral direita terá 1,5 cm;

h) deve ser utilizado espaçamento simples entre as linhas e de 6 pontos após cada parágrafo, ou, se o editor de texto utilizado não comportar tal recurso, de uma linha em branco;

i) não deve haver abuso no uso de negrito, itálico, sublinhado, letras maiúsculas, sombreado, sombra, relevo, bordas ou qualquer outra forma de formatação que afete a elegância e a sobriedade do documento;

j) a impressão dos textos deve ser feita na cor preta em papel branco. A impressão colorida deve ser usada apenas para gráficos e ilustrações;

l) todos os tipos de documentos do Padrão Ofício devem ser impressos em papel de tamanho A-4, ou seja, 29,7 x 21,0 cm;

m) deve ser utilizado, preferencialmente, o formato de arquivo Rich Text nos documentos de texto;

n) dentro do possível, todos os documentos elaborados devem ter o arquivo de texto preservado para consulta posterior ou aproveitamento de trechos para casos análogos;

o) para facilitar a localização, os nomes dos arquivos devem ser formados da seguinte maneira:

tipo do documento + número do documento + palavras-chaves do conteúdo

Ex.: "Of. 123 - relatório produtividade ano 2002"

A diagramação sugerida já constituiria um grande avanço na qualidade da informação repassada ao consumidor. Todavia, levando em conta a faixa etária dos aposentados destinatários do empréstimo, a utilização de fonte 14 e espaçamento duplo seria mais conveniente.

Além da modificação da diagramação utilizada no formulário de adesão, urge que seja expedido provimento jurisdicional determinando ao Banco Réu que divulgue no interior de seus estabelecimentos, ao lado e na mesma quantidade que a propaganda que oferta crédito avisos sobre o risco do superendividamento, decorrente das taxas de juros, comissões e tarifas de contratação cobradas pela Instituição ré. Também se faz necessário que conste do contrato, em letras destacadas, avisos aos aposentados sobre os riscos do superendividamento.

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Sobre o autor
André de Moura Soares

procurador da Assistência Judiciária do Distrito Federal

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SOARES, André Moura. Empréstimos consignados: falta de clareza na publicidade.: Ação civil pública. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 11, n. 1134, 9 ago. 2006. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16706. Acesso em: 27 dez. 2024.

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