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Ministério Público pede fechamento de abatedouro clandestino

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28/07/2007 às 00:00
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Ação civil pública proposta contra Município, requerendo o fechamento de abatedouro clandestino de suínos, com riscos à saúde pública e ao meio ambiente, assim como a condenação do réu na recuperação ambiental na área afetada.

EXCELENTÍSSIMO(A) SENHOR(A) DOUTOR(A) JUIZ(A) DE DIREITO DA 2ª VARA CÍVEL E DOS FEITOS DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE ILHÉUS-BA

No referido matadouro, o que falta de cuidados na higiene e segurança, sobra em desrespeito ao meio ambiente [01].

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA, por intermédio de sua Promotora de Justiça que esta subscreve, lotada na 8ª Promotoria de Justiça de Ilhéus, com endereço para intimações pessoais na Avenida Lomanto Júnior, 324, Pontal, Ilhéus, no uso de suas atribuições constitucionais e legais, legitimada pelos artigos 129, inciso III, da Constituição Federal, 25, inciso IV, letra a, da Lei nº 8.625/93, 5º, caput, da Lei 7.347/85 e 82, inciso I, da Lei nº 8.078/90, vem perante Vossa Excelência ajuizar a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA, com pedido de tutela antecipada, EM DEFESA DO MEIO AMBIENTE E DOS CONSUMIDORES, pelo rito ordinário, contra

RÉU, endereço, qualificação.


O Ministério Público, através de sua 8ª Promotoria de Justiça de Ilhéus, instaurou o inquérito civil n.º 075/00-Con, para apurar o funcionamento de um matadouro clandestino de suínos nesta comarca, sem condições higiênicas, sanitárias e tecnológicas adequadas.

Concluído o expediente, verificou-se a veracidade do fato, a permanência e continuidade dos danos ao meio ambiente e aos consumidores.

Ficou comprovado que o matadouro de suínos, também nominado abatedouro, localizado na Rodovia Ilhéus/Itabuna, km 09, Banco da Vitória, foi construído por particulares em área pública, pertencente ao Município de Ilhéus (fl. 49). Composto por uma área ampla de concreto, coberta por telhas, tipo Eternit, conta com cerca de dez compartimentos.

É gerido por mais de uma pessoa, que dividem entre si as funções para o funcionamento do estabelecimento. Assim, há responsáveis diversos para matadouro dos suínos (fl. 28), para a salgadeira, para o local onde se armazena o couro (fl. 30), para o depósito, para o local onde sebo é fritado (fl. 32), entre outras atividades.

As pessoas que se incumbem de tais atividades o fazem por longo período de tempo, superior a dez anos, sem interferências, sobretudo do proprietário do terreno. Somente no ano de 2000, após provocação do Ministério Público, tratou o Município de Ilhéus de expedir notificações para a demolição da construção em área pública (fls. 38/46).

Contudo, a notificação foi meramente formal, pois não foi efetivamente exigida a demolição da obra. Ao contrário, o matadouro continua em atividade(fls. 97/99, Laudo da ADAB), sem contar com licenciamento ambiental (fl. 50). O abate é realizado às quintas e sextas-feiras, à noite até a madrugada, com uma média de trinta animais abatidos por semana (fls. 49 e 65).

O processo de abate é totalmente rudimentar, que causa sofrimento ao animal (fl. 13), efetuado em condições sanitárias insatisfatórias, sem qualquer tipo de inspeção sanitária a acompanhar a atividade (fl. 50).

Outros pontos negativos do matadouro foram referidos no laudo de inspeção da Delegacia Federal de Agricultura na Bahia (fls. 07/13), dos quais podem ser destacados: a) localização inadequada, posto que próximo a fontes produtoras de mau cheiro, de depósito de lixo e de área de manguezal; b) ausência de curral de observação, com tronco para exame clínico, de curral de matança, de plataforma de desembarque e de inspeção ante mortem, de local de lavagem e desinfecção de veículos; c)a sala de matança não apresenta os itens exigíveis, como dimensões suficientes, canaleta de sangria, sistema de movimentação das carcaças por trilhos lavatórios, água a vapor para higienização; d) não existem câmaras de resfriamento e de estocagem; e) não há dependências apropriadas para os subprodutos, como miúdos, cabeças, bucharia, triparia, charque, f) a água de abastecimento não recebe tratamento apropriado e seu volume é insuficiente; g) o esgoto é lançado sem tratamento prévio.

O Departamento de Polícia Técnica apresentou o laudo de exame pericial de fls. 32/33, para fins de instrução de inquérito policial nº 20011658-0. Valendo-se dessa prova emprestada, tem-se que o matadouro de suínos elimina a água corrente usada na limpeza do local por gravidade, direcionando-a para um brejo e, posteriormente, para o Rio Cachoeira.

A Secretaria de Saúde reconheceu que a área ocupada pelo matadouro de suínos pertence ao Município de Ilhéus (fl. 20). Reconheceu o precário estado de higiene e o risco de desabamento, em determinadas áreas. Contudo, apesar de afirmar o empenho para a solução do problema, não houve avanços.

Ao contrário, o Município de Ilhéus retrocedeu na decisão de exigir a demolição, sob os argumentos de que reformas na estrutura do local, com anuência da direção do matadouro municipal, seriam implantadas (fl. 78) ou por considerar a impossibilidade dos sujeitos envolvidos proverem o seu sustento mediante outras atividades (fl. 91).

Tais questões foram consideradas pelo Ministério Público, sobretudo pela ausência de indicação imediata de outro local para sediar o matadouro de suínos (fl. 102, laudo do CRA) e da necessidade de recursos financeiros para sua construção, nem sempre facilmente disponíveis.

No entanto, passado tempo suficiente para a correção dos problemas, inspeção realizada pela Agência Estadual de Defesa Agropecuária – ADAB, encaminhada ao Ministério Público em novembro último, demonstrou que se houve alteração no funcionamento do matadouro de suínos, foi no sentido de sua piora.

Segundo constou, o sacrifício de animais continua a dar-se de forma atrasada, oferecendo sérios riscos à saúde dos consumidores. O meio ambiente está sendo atingido, já que os resíduos sólidos são deixados espalhados, parte ao redor do prédio e o restante lançado no lixão, enquanto os resíduos líquidos são lançados, sem tratamento, na natureza.

Apontou o relatório, ainda, outros pontos críticos (fl. 108), dos quais se destaca a ausência de rede de esgoto, de instalação de frio, com câmaras e ante-câmaras, de instalações e água em todas as dependências de manipulação e industrialização, de rouparia, vestiários, banheiros e sanitários.

Salientou ainda que a ausência de inspeção sanitária e tecnológica constitui-se numa porta aberta para enfermidades transmissíveis por alimento que podem provocar infecções, intoxicações, toxinfecções, neuropatologias e até morte (fl. 109).

Assim sendo, ainda que significativa parcela da população neste município recepcione culturalmente o abate sem fiscalização sanitária e sem refrigeração posterior, o consumo do produto, nessas condições, como cientificamente comprovado, pode trazer danos à saúde do consumidor. Da mesma forma, se o funcionamento de matadouro de suínos, em atividade plenamente regularizada, já é considerado essencialmente impactante ao meio ambiente, quanto mais se o funcionamento for realizado à guisa de qualquer licenciamento.

Nesta seqüência, é necessário romper o ciclo de acomodação e exigir mudanças em nome dos consumidores e do meio ambiente. E o Poder Judiciário tem de ser suficientemente forte e soberano, como autêntico poder que é, para determinar a interdição do estabelecimento clandestino.


II- DA LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

O Ministério público foi incumbido pela Constituição Federal de 1988 da função de zelar pela ordem jurídica, pelo regime democrático e pelos interesses sociais e individuais indisponíveis. Sobre o papel do órgão ministerial no novo sistema constitucional leciona GEISA DE ASSIS RODRIGUES:

"Um novo desenho institucional foi reservado ao Ministério Público enfatizando sua vocação de defesa e promoção dos interesses mais importantes da sociedade". [02]

Assim é que a Carta Política preceitua, em seu artigo 129, incisos II e III ser função institucional do Ministério Público zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos nela assegurados, promovendo as medidas necessárias a sua garantia, bem como promover a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

Não é difícil a percepção de interesses transindividuais a figurar na presente demanda, que aproveita a um número indeterminado de pessoas, consumidoras efetivas ou potenciais de produtos de origem animal, expostos ao perigo da inserção no mercado de produtos impróprios ao consumo. É a hipótese elencada pelo inciso I, parágrafo 1º do artigo 81 do Código de Defesa do Consumidor.

Portanto, indubitável a pertinência de legitimidade ativa ao Ministério Público, valendo-se de sua condição de substituto processual, para a proteção dos interesses da coletividade de consumidores que adquiriu, consumiu ou se expôs ao consumo de produtos impróprios, de origem animal, como ação passada, ou que ainda o fará, como ação futura, face ao desconhecimento das condições e riscos do abate clandestino.


III- DO DIREITO

A Constituição Federal coloca a saúde como direito social e obrigação do Estado, como competência comum das três esferas de poder (Constituição Federal, arts. 6º, 196 e 23, II).

Igualmente, assegura o direito ao meio ambiente equilibrado, colocando sua defesa como dever de todos, Estado e coletividade.

Por sua vez, determina que a ordem econômica deve pautar-se pelo respeito tanto ao meio ambiente como pela defesa do consumidor (Constituição Federal, art. 170, incs. V e VI).

Nenhum desses aspectos tem sido observado no caso concreto, com a permissão dada pelo Município de Ilhéus à existência e ao funcionamento de matadouro clandestino de suínos, que opera sem qualquer licença ou fiscalização, seja ambiental, seja de natureza sanitária, incluindo as normas específicas sobre a comercialização e abate prescritas pelo Ministério da Agricultura.

Nessas condições, coloca em risco a saúde dos consumidores, afrontando aos artigos 8º e 18 da Lei nº 8.078/90, in verbis:

Art. 8º Os produtos e serviços colocados no mercado de consumo não acarretarão riscos à saúde ou segurança dos consumidores, exceto os considerados normais e previsíveis em decorrência de sua natureza e fruição, obrigando-se os fornecedores, em qualquer hipótese, a dar as informações necessárias e adequadas a seu respeito.

Art. 18 § 6º São impróprios ao uso e consumo:

II - os produtos deteriorados, alterados, adulterados, avariados, falsificados, corrompidos, fraudados, nocivos à vida ou à saúde, perigosos ou, ainda, aqueles em desacordo com as normas regulamentares de fabricação, distribuição ou apresentação;

Para além disso, o mesmo Código estabelece que a prática comercial, dessa forma efetivada, colocando no mercado de consumo produtos de origem animal sem qualquer fiscalização dos órgãos de inspeção sanitária, é abusiva:

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"Art. 39 - É vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, dentre outras práticas abusivas:

VIII - colocar, no mercado de consumo, qualquer produto ou serviço em desacordo com as normas expedidas pelos órgãos competentes..."

Por sua vez, o artigo 2º da Lei n.º 7.889/89 prevê sanções administrativas para os estabelecimentos que funcionem em condições inadequadas, colocando em risco a saúde da população.

Sem prejuízo da responsabilidade penal cabível, a infração à legislação referente aos produtos de origem animal acarretará, isolada ou cumulativamente, as seguintes sanções:

(...)

V-. Interdição, total ou parcial, do estabelecimento, quando a infração consistir na adulteração ou falsificação habitual do produto ou se verificar mediante inspeção técnica realizada pela autoridade competente, a inexistência de condições higiênico-sanitárias adequadas.

A conduta omissiva do Município de Ilhéus, que deixou de exercer seu poder de polícia e interditar estabelecimento potencialmente danoso ao meio ambiente e à saúde da coletividade é de ainda maior reprovação quando se constata que não se trata, somente, de atividade particular desempenhada ao arrepio da legislação (o que já seria censurável).

Trata-se de atividade danosa exercida em área pública, em terreno do Município, na área contígua ao Matadouro Municipal de Ilhéus, tudo com a permissão e conivência da pessoa jurídica de direito público responsável pelo espaço físico.

A Lei Orgânica do Município de Ilhéus coloca como competência dessa pessoa jurídica o seguinte:

Art. 14. Compete ao Município prover a tudo quanto diz respeito ao seu interesse e ao bem estar de sua população, cabendo-lhe, dentre outras atribuições e deveres:

II- promover o adequado ordenamento territorial, mediante o controle e ocupação do solo, dispondo sobre parcelamento, arruamento, zoneamento urbano e rural, edificações, fixando limitações urbanísticas, podendo, quanto aos estabelecimentos e às atividades industriais, comerciais e de prestação de serviços, observadas as diretrizes da lei federal:

c-renovar ou cassar a autorização ou licença, conforme o caso, daquele cujas atividades se tornem prejudiciais à saúde, à higiene, ao bem estar, à recreação, ao sossego, aos bons costumes, ou se mostrarem danosas ao meio ambiente;

d- promover o fechamento daqueles que estejam funcionando sem autorização ou licença, ou depois da sua revogação, anulação ou cassação,podendo interditar atividades, determinar ou proceder a demolição de construção ou edificação, nos casos e de acordo com a lei.

Assim sendo, além de restar clara a legitimidade do Município de Ilhéus para figurar no pólo passivo desta demanda, nítida é sua responsabilidade, inclusive objetiva, pelos danos causados ao meio ambiente, especialmente pela poluição ao Rio Cachoeira.

Por outro lado, os produtos do matadouro clandestino contêm alto potencial de ofensividade à saúde pública, sendo impróprios para o consumo. Não pode ser outra a catalogação, já que se obtém a carne nesse local, desprezando-se a necessidade de qualquer licença dos órgãos competentes para seu funcionamento, a falta de estrutura mínima do prédio e dos equipamentos, bem como os cuidados com as condições higiênico-sanitárias, aspectos comprovados à saciedade no inquérito civil.

Neste sentido, os seguintes julgados:

DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECÍFICO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ATIVIDADE DE ABATE DE ANIMAIS EM MATADOURO. AUSÊNCIA DE LICENÇA. LIBERAÇÃO DE EFLUENTE LÍQUIDO INDUSTRIAL SEM TRATAMENTO EM ARROIO LOCAL. PREJUÍZO AO AMBIENTE. Realização de atividade de abate de bovinos e suínos na empresa Matadouro Imigrante no Município de Teutônia, sem licença de operação válida. Vistoria do Batalhão da Polícia Ambiental da Brigada Militar que concluiu pela suspensão das atividades da empresa visando à proteção ao ambiente. Ato administrativo que goza de presunção de legalidade. AGRAVO IMPROVIDO.

(Agravo de Instrumento Nº 70013817705, Terceira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nelson Antônio Monteiro Pacheco, Julgado em 03/08/2006)

AÇÃO CIVIL PÚBLICA - Liminar - Objetivo - Interdição de matadouro municipal por tempo indeterminado - Admissibilidade - Prevenção a fato plausível e danoso à saúde pública - Condições sanitárias comprovadamente inadequadas - Ofensa a direito público indisponível - Liminar concedida - Recurso não provido

JTJ 234/186

Não diverge desse entendimento o Tribunal de Justiça da Bahia. Tanto que, através de seu Excelentíssimo Presidente, Des. Benedito A de Figueiredo, indeferiu pedido de suspensão de execução de liminar na ação civil pública nº 22805-1/2006 [03]. Eis os fundamentos da decisão:

Efetivamente, a liminar foi concedida, embasada em fortes razões jurídicas, somando-se às acima elencadas o grave fato de o Matadouro Municipal de Cipó não estar registrado perante os órgãos competentes, em clara afronta a dispositivos legais expressos, quais sejam, o art. 7º da Lei nº 7.889/1989, e o art. 10 da Lei Estadual nº 7.597/2000.

Desse modo, não se vislumbra, in casu, as alegadas ofensas à ordem e à economia públicas.

Na verdade, o funcionamento irregular do matadouro é que representa ofensa à legalidade, bem como à saúde pública, tanto que o texto legal autoriza, expressamente, a interdição das suas atividades.

Por outro lado, também não há como reconhecer-se a existência de lesão à economia pública, não apenas porque não foi essa devidamente demonstrada, mas porque, havendo interesse público a ser protegido, este se sobrepõe ao interesse do ente público na obtenção "da receita própria dos tributos que são cobrados aos comerciantes da feira".(grifos originais).


IV-DO PEDIDO

4.1. DO PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO PARCIAL DA TUTELA

Não há dúvida de que as atividades desenvolvidas com o consentimento do requerido constituem-se em prática comercial abusiva, que viola o direito de toda uma população de consumir produtos de origem animal em condições satisfatórias de higiene e salubridade, asseguradas mediante prévia inspeção sanitária.

Nessa situação, aplicável o artigo 273 do Código de Processo Civil, segundo o qual o juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que exista prova inequívoca e verossimilhança da alegação.

Tais requisitos encontram-se atendidos. O Inquérito Civil nº 075/00-Con, que acompanha a inicial, contém provas irrefutáveis dos danos ao meio ambiente e ao consumidor, inclusive sob o aspecto de sua saúde.

Da mesma forma, as tratativas com o Município de Ilhéus, ao longo da instrução do feito extrajudicial, revelam que tem conhecimento do funcionamento clandestino do matadouro de suínos em terreno de sua propriedade, bem público, e que não tem disposição ou interesse em interditá-lo, optando por permitir seu funcionamento, desacompanhado de qualquer regularização ou licenciamento.

Por outro lado, é o mesmo artigo 273 do Código de Processo Civil que dispõe que a tutela antecipada só pode ser deferida se, atendidos os requisitos supra analisados, haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação ou fique caracterizado o abuso de direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu.

Ambas as situações estão presentes no caso sub judice. O Município de Ilhéus apenas anuncia medidas para regularizar a situação, retomar a posse de seu terreno e fazer cessar o abate clandestino no local. Mas sequer movimenta sua máquina para a apreensão ou condenação das matérias-primas, produtos, subprodutos, e derivados de origem animal, sabidamente sem condições higiênico-sanitárias adequadas ao fim a que se destinam [04], demonstrando pretender somente protelar a questão.

Quanto ao fundado receio de difícil reparação, têm-se os danos à saúde pública, com relação entre causa – consumo de carne imprópria - e conseqüência – doença , nem sempre facilmente estabelecida. Muitas pessoas adoecem sem sequer ligar o fato ao consumo da carne suína obtida pelo abate sem condições de higiene.

Contudo, há doenças sabidamente adquiridas da carne suína, como a cisticercose suína, doença cujo agente causador é a Taenia solium, o verme do porco, que causa infecção intestinal com a forma adulta e somática com a larva (cisticercos). Entre outras maneiras,o homem adquire teníase quando ingere carne suína, crua ou parcialmente cozida, contendo cisticercos [05].

Igualmente, avançam estudos sobre a relação entre acidente vascular cerebral e reação imunológica (ELISA) para cisticercose positiva [06], já estando constatado que a cisticercose pode apresentar sintomas variados, agrupados nas síndromes de hipertensão craniana e convulsiva [07].

Ou ainda, os danos que está a sofrer o meio ambiente, pelo despejo dos resíduos líquidos nas águas do Rio Cachoeira e dos resíduos sólidos no lixão.

Para além disso, como se já não bastasse, a situação fática encontrada subsume-se no disposto no artigo 2º, inciso V, da Lei Federal n.º 7.889/89, o qual determina claramente a interdição do estabelecimento quando a inspeção realizada pelo órgão técnico concluir que não há as mínimas condições higiênico-sanitárias para as atividades exercidas.

No caso do matadouro clandestino de suínos em terreno municipal, foram realizadas seis vistorias: pela Delegacia Federal de Agricultura (fls. 07/13), pelo Centro de Recursos Ambientais- CRA (fls. 48/51 e 100/103), pelo Departamento de Polícia Técnica - DPT (fls. 64/67), pela Agência Estadual de Defesa Agropecuária da Bahia- ADAB (fls. 97/99) 106/110), e a cada uma delas observou-se que as condições pioravam, revelando desvalor para com as normas de proteção à saúde e aos direitos básicos do consumidor, mesmo após o compromisso melhorias e de adequação à legislação de regência.

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Sobre a autora
Karina Gomes Cherubini

Promotora de Justiça do Estado da Bahia. Especialista em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Especialista em Gestão Pública pela Faculdade de Ilhéus. Especialista em Direito Educacional pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CHERUBINI, Karina Gomes. Ministério Público pede fechamento de abatedouro clandestino. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 12, n. 1487, 28 jul. 2007. Disponível em: https://jus.com.br/peticoes/16793. Acesso em: 25 abr. 2024.

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