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A fase preparatória das contratações na Lei nº 14.133/2021

Agenda 03/10/2022 às 23:12

A fase executória da licitação e sua consequente contratação são de extrema relevância. Isto não se discute, porém essas etapas atingem o objetivo se a fase preparatória, que é a forma balizadora, tiver sido executada com extremo êxito.

Palavra-chave: 1. Licitação; 2. Fase preparatória; 3. Contratações Públicas

A fase executória da licitação e sua consequente contratação são de extrema relevância. Isto não se discute, porém essas etapas atingem o objetivo se a fase preparatória, que é a forma balizadora, tiver sido executada com extremo êxito. A nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, apesar dos percalços, privilegiou essa fase com um capítulo específico e 9 artigos os quais enfrentaremos com interpretações e reflexões.

1. Apresentação

A escolha desse tema em específico me conforta bastante, pois tenho dedicado enorme tempo de estudo à matéria, apesar de a nova norma geral, segundo os administrativistas aos quais me filio, não ter andado bem e estar muito longe do que se aguardava por anos. Devemos inferir que a Administração Pública merecia algo melhor.

Os legisladores, em relação à fase preparatória, explicitaram que o seu conteúdo se tornou uma espécie de consolidação de leis, decretos, instruções normativas e acórdãos de órgãos de controle, tornando inclusive extensivo e detalhado, com alguns pontos que não deveriam sequer fazer parte da Lei. Quem lida com contratação pública sabe que a obediência é fator determinante de ser respeitado ou, ao menos, obrigatório de desenvolver um arrazoado de justificativas plausíveis quando não for obedecido.

Por tudo isto, não há um novo modelo transformador de contratação pública na nova Lei, sendo em muito louvável a preocupação da fase preparatória em que se incluiu o status do planejamento, elevando inclusive este a Princípio (art.5º da Lei), somado a que após a formalização da demanda (necessidade de algo) é importante alinhar esta com o planejamento estratégico do Ente Federativo e constar no plano de contratações anual (inciso VII do art.12). Difícil imaginar que entidades de pequeno porte e Administrações Municipais terão como atender tal encargo.

A Fase Preparatória, então, torna-se de extrema importância e é imperioso utilizarmos de exemplos quando explanamos sobre tal ponto e assim destacamos: O art. 5º da Lei nº 14.133/2021 instituiu (a Lei nº 8.666/93 também mencionava) o princípio da vinculação ao instrumento convocatório e como o instrumento convocatório é a Lei interna da convocação e tudo dela advém da fase preparatória, assim está mais do que comprovada a importância da fase preparatória em qualquer contratação.

Ouso mais, o sucesso da fase executória se vincula à fase preparatória, sendo esta basilar ao sucesso da contratação ao final. Entendo que é impossível eliminar falhas, equívocos ou erros cometidos quando publicado o ato convocatório (afinal, somos humanos) e, até por isso, a Administração só pode exigir ou requisitar o que efetivamente fez constar neste documento vinculante a todos que desejarem ofertar proposta. Assim, é mister o cuidado na elaboração dessa fase que deve ser extremado.

Dada a devida vênia, vamos esmiuçar o que mencionou a Nova Lei sobre esta fase focando nas obras e nos serviços de engenharia, até porque seu conteúdo deve abordar todas as considerações técnicas, mercadológicas e de gestão que podem interferir na contratação (inteligência do art. 18, caput).

2. Do Planejamento

É fato notório que em qualquer atividade se faz necessário a realização do planejamento e com as aquisições públicas temos convicção também de sua imprescindibilidade.

Demandado algo pela Administração, é necessário planejar como se realizará tal aquisição. Como estamos a falar de fase preparatória, é necessário buscar a otimização dos dispêndios de recursos, não se descuidando de determinar, no mínimo, as especificações, os requisitos a serem atendidos e como acrescer competitividade entre fornecedores.

É fácil identificar que a ausência do planejamento nas aquisições públicas poderá desencadear obras mal construídas, compras erradas, objetos de qualidade inferior a necessidade, entre tantos outros problemas, inclusive com risco de procedimentos licitatórios ilegais e até desperdícios de recursos públicos.

Diante de tudo isto, a nova Lei explicita com todas as letras que a fase preparatória é caracterizada pelo planejamento (art.18, caput). A título de princípio, o dever de planejar está intimamente correlacionado com o da eficiência e este é de obediência constitucional obrigatória (art. 37, CF/88), caracterizando assim a necessidade, ou melhor, a imprescindibilidade de realizar o ato do planejamento quando se está a adquirir algo.

Com efeito, além da previsão legal, como demonstrado, o planejamento da contratação na fase interna (preparatória da aquisição) busca a otimização também da fase externa (executória), pois o êxito desta depende, em muito, da eficácia daquela.

Como estamos a falar da nova Lei sobre planejamento é necessário incorporar os seus termos e assim se identifica no art.12, VII e §1º a necessidade de observar o seguinte:

Art. 12. No processo licitatório, observar-se-á o seguinte:

VII - a partir de documentos de formalização de demandas, os órgãos responsáveis pelo planejamento de cada ente federativo poderão, na forma de regulamento, elaborar plano de contratações anual, com o objetivo de racionalizar as contratações dos órgãos e entidades sob sua competência, garantir o alinhamento com o seu planejamento estratégico e subsidiar a elaboração das respectivas leis orçamentárias.

§ 1º O plano de contratações anual de que trata o inciso VII do caput deste artigo deverá ser divulgado e mantido à disposição do público em sítio eletrônico oficial e será observado pelo ente federativo na realização de licitações e na execução dos contratos.

Sobre plano de compras, a intenção é bem-vinda e sugiro a todos seguir nesta direção, apesar da difícil aplicação e disponibilização ao público em sítio eletrônico oficial, principalmente para as Administrações com menores estruturas.

Por outro ângulo, diferente do que menciona a legislação, prefiro entender que o planejar uma aquisição é uma atividade de trabalho em equipe (multisetorial) em que as vezes é até necessário participação de terceiros especialistas no que se deseja adquirir, devendo não se ater a modelos ou padrões pré-determinados, pois se busca o atender da demanda com as particularidades e finalidades pretendidas principalmente em serviços ou obras de engenharia.

Neste momento comungo com as palavras dos ilustres doutrinadores Joel Niebuhr e Edgar Guimarães, que em 2008 no livro sobre Registro de Preços: aspectos práticos e jurídicos, dizem:

Planejamento é um processo que visa determinar a direção a ser seguida para se alcançar determinado resultado. A sua utilização possibilita a percepção da realidade fática de certa situação, a avaliação das alternativas e dos possíveis caminhos a serem trilhados. Trata-se de um processo de avaliação e deliberação prévia que se organiza e racionaliza ações, antevendo resultados e que tem por escopo atingir, da melhor forma possível, os objetivos predefinidos.

Com esta passagem, relacionando-a com os objetivos predefinidos da nova Lei, art.18, incisos e parágrafos, chegamos à certeza de que não existe tempo perdido no planejamento como alguns pensam, pois, ao contrário, este será extremamente bem-vindo quando da sua efetiva execução e assim já é hora de adentrarmos na etapa inicial da fase preparatória, ou seja, primeira etapa do planejamento de uma contratação, como determinou a própria Lei quando definiu esta primeira etapa, chamando de Estudo Técnico Preliminar.

3. Do Estudo Técnico Preliminar

Por ter a Lei nº 14.133/2021, em seu art.6º, inciso XX, apresentado a definição deste documento técnico, é oportuno mencioná-lo para permitir melhor compreensão do que estamos a explanar e assim segue:

Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se:

XX - estudo técnico preliminar: documento constitutivo da primeira etapa do planejamento de uma contratação que caracteriza o interesse público envolvido e a sua melhor solução e dá base ao anteprojeto, ao termo de referência ou ao projeto básico a serem elaborados caso se conclua pela viabilidade da contratação;

Não satisfeito em mencionar sua definição, a norma geral foi muito além e assim explicitou a necessidade de inúmeros elementos e desta forma o art. 18, §1º expressa 13 incisos (os quais não apresentamos, face a não tornar exaustivo esse artigo) que devem ser obedecidos. De forma didática, julgamos que neste inicial momento atender exclusivamente a definição seria mais oportuno, até porque conforme seu conteúdo, estando caracterizado o interesse público envolvido e sua melhor solução, os demais elementos serão atendidos na elaboração consequente dos outros elementos técnicos (anteprojeto/ termo de referência ou projeto básico) também mencionados, necessários e obrigatórios.

O texto contido na nova legislação referente à fase preparatória falhou em descrever uma sequência lógica e, assim, são repetidos vários elementos nos artigos, parágrafos, incisos e alíneas que devem constar no estudo técnico preliminar, no anteprojeto, no termo de referência e até no projeto básico. Tal formatação dificulta por demais entender e/ou criar uma linha sequencial de trabalho,a qual optei por indicar atender a definição primeiro e quando mencionar o atendimento dos outros documentos, com certeza serão atendidos os elementos pormenorizados do art.18, §1º e incisos subsequentes desta Lei.

Voltando ao Estudo Técnico Preliminar, mencionado a partir deste momento como ETP, vamos pormenorizar a definição já apresentada e assim caracterizar o interesse público em uma contratação.

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De forma simples, atender o interesse público é atender a demanda de algo pela Administração Pública. O exemplo caracteriza melhor: se para a Administração existe a demanda de serviços como a de construção que é uma obra, o seu atendimento por meio de uma contratação é a configuração do atendimento de um interesse público.

Ultrapassada essa fase, o ETP tem que encontrar a melhor solução, pois a demanda (necessidade de obra) e o interesse público (atendimento via contratação) já estão definidos e assim a busca da melhor solução é mais laboriosa, necessitando de uma análise peculiar e profunda com a participação forte do requisitante e de especialista (normalmente uma equipe técnica) que em algumas vezes haverá a necessidade de contratação anterior para atender a necessidade demandada, face a entidade não possuir a estrutura de pessoal disponível, necessária e adequada.

Então, como encontrar a melhor solução? A não ser quando se trata da necessidade de bens e produtos, que a solução normalmente é a aquisição (as vezes o aluguel é mais indicado), no caso de serviços em geral, obras e serviços de engenharia, a complexidade em identificar a melhor solução será um trabalho perspicaz que normalmente envolverá uma equipe de profissionais para definir o caminho, ou seja, a melhor solução.

A título de exemplo, apresento um serviço de manutenção predial. Inicialmente, este se mostra simples, mas quando se adentra para caracterizar a melhor solução os problemas aparecem. Vejam as variáveis: contratar profissionais pontualmente para essa atividade ou contratar o serviço. Normalmente se opta pelo serviço. Outras variáveis: com dedicação exclusiva de mão de obra ou não; com material ou não; e os equipamentos necessários etc.; O horário do trabalho terá serviços à noite (tipo plantão), e os finais de semana; vai incluir a manutenção da área interna e externa ou é melhor contratar separado; os móveis e equipamentos, também serão inclusos na contratação ou não. São várias decisões e estudos que devem ser avaliados para se chegar a melhor solução.

As vezes os simplistas decidem seguir a maioria (fazer copia e cola), o que em muitas das vezes é um problema, pois já imaginou tratar os serviços de manutenção predial de modo igual? se ele for um serviço a ser exercido em um escritório administrativo, um hospital, uma escola ou um depósito sempre haverá diferenças. São localizações que exigem tratamento diferenciado, principalmente no atendimento das urgências e emergências, isto é, a melhor solução para um nem sempre é a melhor solução para outro local ou destinação.

Quando estamos a falar de infraestrutura, isto é, execução de obras, o problema se acrescenta e entendemos que o estudo deve ser preliminar mesmo, definindo a necessidade e o como atender, justificando tal decisão e deixando para a fase seguinte, possivelmente no anteprojeto uma definição detalhada da solução.

Finalizando, observe que adentramos em atender exclusivamente a definição do Termo, apenas abordei o primeiro inciso do art.18, visto que para os demais acarretaria a necessidade de um livro para falar por completo do ETP. Desta forma, atender a tudo mencionado se adentra na orçamentação, pesquisa, previsão de quantidade, impactos ambientais, medidas mitigadoras, reciclagens, aferição de padrões de desempenho e qualidade, etc.

A nova legislação, a bem da verdade, determinou que o ETP é o primeiro documento, e se este é preliminar não pode ser conclusivo em tudo, o que caracterizaria um equívoco que poderia acarretar enorme dificuldade aos que serão responsáveis por sua elaboração.

Defendo, portanto, que se limite no Estudo Técnico Preliminar ao que é de suma importância, buscar identificar a melhor solução em atender a demanda, deixando os demais pontos para serem avaliados pelos documentos subsequentes mencionados também pela legislação, isto é, pelo anteprojeto, termo de referência ou projeto básico.

4. Do Anteprojeto

Inicialmente trazendo o conceito explicitado na Lei nº 14.133/2021, esta o define como uma: peça técnica com todos os subsídios necessários à elaboração do projeto básico. Em outras palavras, é documento ainda preliminar de assistência para se elaborar o projeto básico.

Portanto, é inteligível que essa peça técnica somente terá sua elaboração quando se tratar de obras públicas e serviços de engenharia, necessitando de uma substancial equipe técnica destas áreas, principalmente.

Na definição do termo anteprojeto os legisladores seguiram a mencionar os elementos requeridos e incluíram 10 (dez) alíneas, de a a j, nas quais a alínea a possui conteúdo intrinsecamente ligado ao ETP, e acredito que sendo decidida a melhor solução, é possível obter com estudos subsequentes os elementos necessários de demonstração e justificativas, somado às necessidades do que se pretende executar, definindo visão global dos investimentos e o nível do serviço desejado.

Em relação aos demais elementos (alíneas b à j) só é possível se realizar, a contento, com uma equipe técnica e específica de arquitetura e engenharia como mencionado. São condições a atender que envolvem capacidade e conhecimento não comum a todos, só engenheiros e arquitetos os possuem. Somado a isto, serviços outros como traçados geométricos, sustentabilidade, concepção da obra, levantamentos, sondagens, necessitarão de contratações paralelas de apoio para atender a demanda, sendo neste caso a elaboração do anteprojeto necessária de incluir nesta contratação a elaboração do projeto básico e projeto executivo.

Em face da especificidade técnica mencionada nas demais alíneas da definição sobre anteprojeto trazido na Lei nº 14.133/2021, entendemos que não cabe adicionar maiores comentários a esse estudo para não fugir da temática legislativa submetida neste estudo sobre a fase preparatória das contratações.

5. Definição do Instrumento Preparatório da Contratação

Neste quesito, em relação as obras e serviços de engenharia (comuns ou especiais) a Administração tem que definir o seu caminho, pois em função do explicitado na nova Lei é possível identificar pós Estudo Técnico Preliminar ETP se o objeto a ser contratado se realizará através de uma compra ou trata-se de um serviço, se é uma obra, serviço comum de engenharia, ou ainda se é obra e serviço especial de engenharia.

Não entendemos como a legislação nova sobre Licitações e Contratos Administrativos traz essa possibilidade de definição, pelo contrário, entendemos que foram introduzidas definições que não tem objetividade, extremamente questionáveis, e que nem com um conhecimento técnico e de interpretação jurídica acima da média do senso comum se consegue caracterizar.

Transcrevemos o que a Lei nº 14.133/2021, definiu nesses pontos:

Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se:

XII - obra: toda atividade estabelecida, por força de lei, como privativa das profissões de arquiteto e engenheiro que implica intervenção no meio ambiente por meio de um conjunto harmônico de ações que, agregadas, formam um todo que inova o espaço físico da natureza ou acarreta alteração substancial das características originais de bem imóvel;

XXI - serviço de engenharia: toda atividade ou conjunto de atividades destinadas a obter determinada utilidade, intelectual ou material, de interesse para a Administração e que, não enquadradas no conceito de obra a que se refere o inciso XII docaputdeste artigo, são estabelecidas, por força de lei, como privativas das profissões de arquiteto e engenheiro ou de técnicos especializados, que compreendem:

a) serviço comum de engenharia: todo serviço de engenharia que tem por objeto ações, objetivamente padronizáveis em termos de desempenho e qualidade, de manutenção, de adequação e de adaptação de bens móveis e imóveis, com preservação das características originais dos bens;

b) serviço especial de engenharia: aquele que, por sua alta heterogeneidade ou complexidade, não pode se enquadrar na definição constante da alínea "a" deste inciso;

Observem, Senhores, que não existe definição do que é obra comum ou obra especial (1ª falha), depois, em relação aos serviços de engenharia, a nova Lei apresenta definição extremamente ampla sobre o que é serviço de engenharia e subdivide na sequência com citações não objetivas e questionáveis na sua essência.

A título de exemplo, a definição de serviço comum de engenharia é pífia no seu nascedouro: Qual engenheiro ou arquiteto assumiria que existe serviço de engenharia objetivamente padronizáveis em termos de desempenho e qualidade, de manutenção e de adaptação de bens móveis e imóveis? Cada serviço, em função do objeto, tem característica própria, inexistindo padrão único. Todos dessa área têm esse conhecimento, ou seja, em relação a serviço de engenharia por sua intelectualidade e conhecimento específico, não comungamos que este possua natureza comum.

Dando continuidade as definições, acredito que o conteúdo sobre serviço especial de engenharia posto na Lei nova é sui generis, porque como característica de enquadramento menciona: por sua alta heterogeneidade ou complexidade. Não é crível se utilizar desses termos que têm amplitude interpretativa diversa e de sentimento exclusivamente pessoal para se definir tipos de serviços e se esses são especiais ou comuns. Ou seja, é caracterizar tal definição de subjetividade e colocar problema a mais para os autores dos documentos essenciais da fase preparatória.

E, qual é o problema que esse enquadramento acarreta? Tal definição é o que proporciona identificar se o documento subsequente ao ETP será um Termo de Referência ou um Projeto Básico ou ainda se é necessário anteprojeto seguido do projeto básico e executivo. Soma-se ainda que tais definições (obra comum/ especial ou serviço de engenharia comum ou especial) também serão definidores da modalidade da licitação (pregão, concorrência, etc) da forma de execução e até do critério de julgamento na contratação.

Somado a esses problemas, ainda identificamos que não é possível se limitar ao conteúdo do Capítulo II DA FASE PREPARATÓRIA da Nova Lei para elaborar os documentos previstos nessa fase, pois alguns procedimentos são explanados em artigos mais à frente, definidores de modalidades (art.29, §único) ou explicitam outras informações como o art.46 §1º que veda a realização de obras e serviços de engenharia sem projeto executivo (exceto a hipótese do §3º do art.18, que é caracterizado como comum). O §2º do art.46 ainda menciona que quando se utilizar do regime de execução da contratação integrada deve-se exigir apenas a elaboração do anteprojeto,o qual também gera ressalvas sobre essa forma de contratação, com apenas esse elemento técnico.

Não é da minha índole apresentar problema sem solução e neste caso, em um esforço interpretativo, considerando todo o conteúdo da legislação que suscintamente foi mencionado, é possível apresentar um fluxograma dos elementos diversos que compõem a fase preparatória e seus possíveis caminhos, de forma a subsidiar os futuros atores nessa árdua missão em identificar pós Estudo Técnico Preliminar qual o documento técnico que deve ser elaborado, ou seja, se um Termo de Referência ou um Projeto Básico ou ainda um Projeto Básico com Projeto Executivo, e nos casos em que o serviço de engenharia ou a obra permitir, como melhor solução, utilizar-se da excepcionalidade da contratação integrada confeccionando apenas o Anteprojeto, jogando a responsabilidade da elaboração dos demais projetos para o contratado. Segue o fluxo projetado:

Acredito após estas informações e reflexões que já é possível vislumbrar que estamos diante de uma Nova Lei que evoluiu em alguns pontos, mas não vem resolver problemas e sim acrescentar outros novos, não se tratando de mera atualização e consolidação de Lei vigente, mais de inclusão de excessiva burocratização que com certeza exigirá ainda mais conhecimento, treinamento e cuidado pelos agentes de contratação da Administração e pelos pretensos participantes, que, em conjunto com os agentes viram acrescer penalidades ainda mais rigorosas quando ocorrer falhas ou equívocos.

Quanto à elaboração do conteúdo do Termo de Referência ou do Projeto Básico, estes conteúdos estão perfeitamente mencionados de forma sequencial na Lei em suas definições (art.6º, XXIII e XXV) respectivamente, devendo ser obedecido e/ou justificado quando não explicitados quaisquer destes elementos que são base da confecção na sequência do futuro edital e/ou contratação.

6. Da Orçamentação

Por tudo já mencionado, o autor identifica também na orçamentação problemas trazidos no contexto dessa nova legislação. Iniciam-se quando o art.18, §1º que trata do ETP em seu inciso VI exige estimativa otimizada de valor e assim determina:

VI - Estimativa do valor da contratação, acompanhada dos preços unitários referenciais, das memórias de cálculo e dos documentos que lhe dão suporte, que poderão constar de anexo classificado, se a Administração optar por preservar o seu sigilo até a conclusão da licitação;

Senhores, se o documento é um Estudo Técnico Preliminar, entendo que não se deveria exigir estimativa de valor com esse detalhamento tão específico. Por oportuno, é digno de registro que o orçamento é parte do ETP, mas também vai ser novamente detalhado no Termo de Referência ou no Projeto Básico, tornando-se um retrabalho cansativo que só quem já realizou orçamento de serviços de engenharia e obras tem a expertise dessa árdua tarefa.

Como solução proponho interpretar que se realize um orçamento estimativo simples para o ETP. Como assim? utilizando de parametrização de m2 (metro quadrado) ou algo similar. Observe que várias entidades confiáveis disponibilizam desta forma, alguns inclusive detalhando tipo de obra/serviço e sua qualidade (baixa/média/alta), sendo suficiente como algo preliminar.

Já no tocante ao orçamento base para a Contratação ou Licitação que é parte integrante de um Termo de Referência ou Projeto Básico, entendo que não se deve fugir do que mencionou o art.23, §2º quando se trata de orçamentação de obras e serviços de engenharia que, praticamente, não difere muito do que consta no Decreto Federal nº 7.983/13 (utilização dos sistemas referenciais SICRO ou SINAPI), acrescido dos Benefícios e Despesas Indiretas- BDI e dos encargos sociais cabíveis.

Por ser a orçamentação uma peça técnica de engenharia, entendemos que um detalhamento maior não é cabível neste momento particular, pois adentraria em uma discussão técnica científica de engenharia, não oportuna neste artigo legislativo.

Sobre orçamento sigiloso, a Lei nº 14.133/2021 prescreveu a discricionariedade da Administração em divulgar antes do certame ou da contratação, mas num dado momento será este tornado público, além de sempre os órgãos de controle terem seus acessos disponibilizados.

Soma-se ainda que conforme determinado pelo art.24 da Lei nº 14.133/2021, se a decisão da Administração é pelo sigilo antes da apresentação das propostas, o ato deve ser justificado no processo. Assim a regra é que o orçamento venha disponibilizado no termo de referência ou no projeto básico, se optado em contrário, deve haver justificativa para tal procedimento.

7. Análise e Matriz de Riscos

Entendemos ainda oportuno neste artigo, antecipar este assunto ao edital (última etapa da fase preparatória), mesmo que na sequência dos artigos da Lei isso não esteja a ocorrer, porém a motivação é simples, face a análise de risco ou matriz de risco serem atos anteriores à confecção do instrumento editalício.

Registre-se que apesar dos nomes (análise e matriz) estarem vinculados à risco da contratação, esses são dispares no procedimento. A análise é obrigatória por constar sua imposição no art.18, X, e serve para que a Administração tenha conhecimento destes antes da licitação e da contratação, visando o sucesso do certame e da execução. Já a matriz de risco é a forma, após identificado na análise de risco, de se realizar o ato de discriminar (mapa) e determinar em edital quais serão assumidos pelo contratado e quais riscos a Administração toma para si.

A bem da verdade, a Lei não foi incisiva em obrigar constar matriz de risco nas contratações, exceto quando esta envolver obras e serviços de grande vulto ou forem adotados os regimes de contratação integrada e semi-integrada, o edital obrigatoriamente comtemplará (art.22, §3º).

Por fim, merece registro que apesar de constar na legislação a exigência da análise de risco (art.18, X), não há prescrição ou diretrizes básicas de como se materializar tal ato, que costuma na prática se realizar em um documento que os identifica, relaciona, quantifica e os especifica.

8. Do Instrumento Convocatório Edital

Nesta última peça técnica da fase preparatória que se transforma em Lei interna da convocação elevada pelo princípio vinculativo, concebe-se após os elementos basilares, advindos do Estudo Técnico Preliminar, Anteprojeto e/ou Termo de Referência ou Projeto Básico se coadunando a elaboração do edital, estabelecendo regras para o certame, definindo modalidade, requisitos, critérios de julgamento, ou melhor, tudo o quanto for necessário para que se realize a competitividade e a melhor contratação.

O art.25 da Lei nº 14.133/2021 é taxativo em mencionar o conteúdo, quando diz:

O edital deverá conter o objeto da licitação e as regras relativas à convocação, ao julgamento, à habilitação, aos recursos e às penalidades da licitação, à fiscalização e à gestão do contrato, à entrega do objeto e às condições de pagamento.

Considero que é o coroamento da fase preparatória. Observe-se que na confecção do edital, um dos principais problemas é nas exigências da qualificação técnica para as obras e serviços de engenharia, nos quais é necessário indicar as parcelas de maior relevância técnica ou valor significativo do objeto. Filiamos-nos a que tais exigências devem vir definidas e mencionadas pelo Termo de Referência ou Projeto Básico, inclusive estas devem ter a participação do demandante, indicando quais serviços são os mais relevantes e se possuem, após a orçamentação, valor significativo para o objeto e assim podem ser exigidas como tal.

No edital, a menção (de parcelas de maior relevância técnica) é obrigatória em conjunto com a necessária qualificação econômico-financeira como requisitos, bem como os demais elementos definidores citados pela Lei no inciso IX do art.18 e do art.25 com seus parágrafos e incisos. Destaco que em cada ponto mencionado na Lei, inclusive de forma até repetitiva, será necessário justificar o porquê ou não da exigência, o que provoca uma enormidade de afazeres que poucas Administrações serão capazes de atender.

A nível de subsidiar os autores nas justificativas, considero que estas devem apontar os pressupostos que objetivamente foram a base das exigências desses requisitos, com ênfase naqueles que limitam a competitividade.

Por fim, fica a máxima: se os documentos que antecedem o edital atenderam com êxito as prerrogativas que lhe foram impostas, a confecção do Instrumento editalício será em muito facilitada e terá toda a possibilidade de atender com sucesso o futuro certame e a fase executória seguinte também com sucesso.

9. Considerações Finais

Acreditamos que já nos posicionamos bastante sobre o quanto se acresceu em formalidades e justificativas a nova legislação. A fase preparatória, apesar de se encontrar privilegiada, não escapou de uma excessiva burocracia, somada a infindáveis pontos que exigem justificativas, tanto no que se decidiu, quanto no que se optou por não mencionar ou requisitar.

Uma nova Lei sempre tem seu lado bom e ruim, mas essa possui,em nossa análise, uma prevalência negativa no conjunto geral, não obstante possuir em alguns pontos significativos avanços.

Um dos avanços que considero extremamente oportuno é o que mencionou o caput do art.53 da Lei, somado ao seu §1º e incisos I e II, que por sua importância transcrevemos:

Art. 53. Ao final da fase preparatória, o processo licitatório seguirá para o órgão de assessoramento jurídico da Administração, que realizará controle prévio de legalidade mediante análise jurídica da contratação.

§ 1º Na elaboração do parecer jurídico, o órgão de assessoramento jurídico da Administração deverá:

I - apreciar o processo licitatório conforme critérios objetivos prévios de atribuição de prioridade;

II - redigir sua manifestação em linguagem simples e compreensível e de forma clara e objetiva, com apreciação de todos os elementos indispensáveis à contratação e com exposição dos pressupostos de fato e de direito levados em consideração na análise jurídica;

Isto garantirá segurança jurídica importante para todos que de uma maneira ou outra participam da elaboração dos documentos e elementos que compõem a fase preparatória, inclusive da autoridade máxima que tem a prerrogativa de autorizar a divulgação do edital, passando a ser corresponsável por tudo elaborado.

Sobre este ponto, sempre advoguei que as Comissões de Licitação ou Equipes de Apoio ao Pregoeiro contivessem ao menos um de seus membros com conhecimento jurídico adequado, defendendo tese inclusive sobre isto, sugerindo que o profissional advogado por sua especificidade e competência, além do que prescreveu a Lei nº 8.906/64, seria a escolha certa para essa atividade.

Ainda sobre o controle da legalidade, que é muito bem-vindo, permanece válida a necessidade do profissional especialista em leis, pois se deixamos a análise de tudo para o final da fase preparatória, isto pode acarretar o refazer de muitas etapas, o que seria evitado, além do apoio significativo nas necessárias justificativas exigidas.

Registro que o legislador não se contentou com o simples visto da assessoria jurídica, mas requerendo a necessidade de parecer jurídico observando todos os atos praticados com os critérios objetivos e manifestação em linguagem simples, compreensível e de forma clara e objetiva das peças que compõem a fase preparatória. Será necessário, portanto, fortalecer em muito as assessorias jurídicas das Administrações, sob pena de não conseguir atender os ditames da legislação vigente.

Não nos esqueçamos que apesar do veto do §6º do art. 53, sobre a culpabilidade dos advogados públicos, o art. 184 do CPC é claro:entendimento ou manifestação interpretativa em parecer não é o mesmo que agir com dolo ou fraude no exercício de suas funções. Os demais agentes administrativos ou equiparados por força da última atualização do LINDB Lei de Introdução as Normas do Direito Brasileiro (Lei nº 4657/42), obtiveram também amparo pelas alterações ocorridas nos art. 22 e 28, respondendo apenas em caso de erro grosseiro ou dolo (órgãos de controle, por favor respeitem a legislação vigente nas aplicações de punições).

Nesta toada do lado bom da nova Legislação, a criação da nova modalidade diálogo competitivo é de um extremo avanço, não obstante as restrições impostas (art. 32, parágrafos, incisos e alíneas). O Procedimento de Manifestação de Interesse - PMI (art. 81) também segue o positivismo de reconhecer que a Administração sozinha não é capaz de resolver tudo e, assim, esse apoio nas formulações de soluções, principalmente as tecnológicas e inovadoras, é importante a participação de privados em tais ações.

Sobre os meios alternativos de resolução de controvérsias (art. 151 a 154) entendo mais do que oportuno, inclusive com a permissão de inclusão dos vários institutos a definir: da conciliação, da mediação, do comitê de resolução de disputa e a arbitragem. São institutos mais que importantes e se evita a judicialização, pena que não os colocou como obrigatórios nas contratações com a Administração Pública.

Voltando a essas considerações finais sobre a fase preparatória,a qual por tudo explanado, é forçoso reconhecer que o nível das exigências trazido para esta fase, apesar de demonstrar a busca do maior controle,requererá um nível de capacidade técnica acima do que muitos agentes públicos podem possuir e, por isso, é necessário investir em capacitação urgente para ter sucesso na aplicação correta deste novo instrumento legislativo que já é Lei Vigente.

Por fim, registro que a Legislação Nova mencionou a necessidade de regulamentação em vários pontos (por volta de 50 pontos) e que sem este regulamento se torna ainda mais temerário realizar o certame de acordo com a Lei nº 14.133/2021, sendo recomendado por este autor cautela no ser pioneiro em utilizar tais regras sem essas definições que ainda estão por vir, e, que, desde já, acrescento que interpretações díspares das esplanadas fazem parte do nosso sistema jurídico pátrio e da sociedade democrática como um todo.

10. Referências

BARBOSA, Fabriza Carvalho. Relação entre o Termo de Referência / Projeto Básico e o edital da licitação. Disponível em <http://www.jus.com.br/artigo, acessado em 28 de outubro de 2018;

BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, 1988;

BRASIL, Lei Nº 8.666, de 21 de Junho de 1993;

BRASIL, Lei Nº 10.520, de 17 de Julho de 2002;

BRASIL, Lei Nº 11.462, de 04 de Agosto de 2011;

BRASIL, Lei Nº 14.133, de 01 de Abril de 2021;

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Sobre o autor
Alberto de Barros Lima

Advogado e Engenheiro. Mestre em Leis de Direito Empresarial pela Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro, com mais de 35 anos de atuação na área de licitações. É autor das obras: "Como participar de licitações públicas", "As vantagens nas licitações e nas compras governamentais para as MPE´s", "As Leis de Licitações e Contratos", "Termo de Referência e Projeto Básico nas Aquisições Públicas" e "Lei nº 14.133/2021 - A Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos COMENTADA". É Consultor SEBRAE na área de Políticas Públicas, onde coordenou a Elaboração da Contribuição do SEBRAE para minuta de Lei Estadual de Pernambuco e do Rio Grande do Norte de Tratamento Simplificado, Favorecido e Diferenciado para as MPE´s. Foi o conteudista dos cursos “Como Participar de Processos de Licitações” e “Sistema Integrado de Compras e Licitações Eletrônicas”, elaborados para o SEBRAE-PE, com repasse a outras unidades da Federação. Fez parte do grupo de trabalho que analisou as mudanças da Nova Lei de Licitações (PLS 559/2013) e da atualização da Lei nº 8.666/93 pelo CONFEA. Foi professor da ESA OAB sobre Licitações Públicas e membro da Comissão de Direito a Infraestrutura da OAB-PE. É diretor do SINDUSCON-PE e é Membro Conselheiro do CREA-PE. Possui vários artigos publicados referente ao tema das compras governamentais.

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