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O princípio da individualização da pena e o cumprimento da pena em regime integralmente fechado para autores de crimes hediondos

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Agenda 06/01/2023 às 23:26

O cumprimento integral da pena em regime fechado nos crimes hediondos é compatível com a individualização da pena e a dignidade humana?

Resumo: Este trabalho tem por escopo analisar a compatibilidade, ou não, do cumprimento integral da pena em regime fechado, no que diz respeito aos crimes hediondos, com os princípios da individualização da pena e da dignidade humana. Para alcançar os objetivos, levou-se em consideração os princípios de direito, decisões dos tribunais superiores e teses doutrinárias.

Palavras chave: crime hediondo; regime de cumprimento de pena; individualização da pena; dignidade humana.


Introdução

A legislação atual, impõe, para aqueles que praticam crimes de maior gravidade, parâmetros mais rigorosos no que diz respeito ao tempo necessário para a progressão de regime.

Anteriormente, contudo, a Lei 8.072/90 previa, em seu artigo 2°, § 1º, a impossibilidade de progressão do regime, devendo a pena ser cumprida em regime integralmente fechado. O Supremo Tribunal Federal, no ano de 2006, quando do julgamento do Habeas Corpus n° 82959 / SP, declarou a inconstitucionalidade do § 1º2 do artigo 2º da Lei de Crimes Hediondos, sob o argumento de que violava o inciso XLVI3, do artigo 5º da Constituição da República. Ademais, nos termos do voto do ministro relator, o dispositivo que impunha o cumprimento da pena em regime integralmente fechado ia de encontro, ainda, ao princípio da dignidade da pessoa humana, já que um dos escopos da pena é a reinserção do delinquente na sociedade.

Após a referida decisão, a Lei 11.464/07, promulgada em março de 2007 promoveu alterações na Lei de Crimes Hediondos, passando a prever que o cumprimento da pena, para os crimes regulados por aquele diploma legal deveria ser inicialmente fechado, porém, houve a implementação de um regime de progressão, que passou a exigir o cumprimento de 2/5 da pena para os condenados que forem réus primários e de 3/5 para os reincidentes, frações estas já superadas após a edição da Lei 13.964/19.

Desta feita, o que se pretende discutir, no presente trabalho, é se há inconstitucionalidade na existência de previsão que imponha a obrigatoriedade de regime integralmente fechado para determinados crimes, tendo como parâmetro o princípio da individualização das penas.


Crimes hediondos

A Constituição da república, em seu art. 5º, XLIII, impede a suscetibilidade de anistia, graça ou fiança àqueles tipos penais tidos como hediondos ou a estes equiparados, deixando, contudo, de estabelecer o que se reputa crime hediondo, deixando tal tarefa a cargo da legislação infraconstitucional.

A lei 8.072/90, diploma legal que dispõe sobre os crimes hediondos, não definiu o que seriam estes crimes, limitando-se a citar, em seu artigo primeiro, as condutas típicas, já previstas no Código Penal, passariam a ser reputadas hediondas.

Hediondo, no vernáculo, quer dizer “depravado; imundo; nojento; feio4”, ou seja, são aquelas infrações penais de maior gravidade, que causam repulsa na sociedade.

A Lei 8.072/90, em seu art. 1º, traz o rol das condutas que serão reputadas hediondas, tais como o homicídio na sua forma qualificada ou quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, extorsão qualificada pela privação de liberdade ou pela morte da vítima, estupro e estupro de vulnerável, epidemia com resultado morte e outros.

Em que pese não estejam no rol do art. 1º, o tráfico de drogas, o terrorismo e a tortura se equiparam aos crimes hediondos, sobre eles recaindo as disposições da Lei 8.072/90.

O tráfico ilícito de entorpecentes ou drogas afins, o terrorismo e a tortura não são crimes hediondos, porque não constam do rol do art. 1º da Lei n. 8.072/90. Todavia, como possuem tratamento semelhante nos demais dispositivos da lei, são chamados de figuras equiparadas. Tal equiparação encontra fundamento no próprio art. 5º, XLIII, da Constituição Federal, que expressamente faz menção a tais infrações penais5.

Conforme se extrai do texto constitucional, os crimes hediondos e aqueles que a eles se equiparam são insuscetíveis de anistia, graça ou fiança e a Lei 8.072/90 ampliou o rol de restrição, tornando-se insuscetíveis, também, de indulto. De forma reduzida, pode-se dizer que graça é uma concessão de clemência, feita pelo Presidente da República, de forma individual, nos termos do art. 84, XII da Constituição da República, mediante solicitação. O indulto, por sua vez, também corresponde a uma indulgência do chefe do Poder Executivo da União que, mediante decreto que trata de fatos, contempla um grupo de pessoas, sem necessidade de formulação de requerimento. Em que pese a diferenciação doutrinária, "há entendimento de que a Constituição, ao mencionar o vocábulo graça, expressou-se em sentido amplo, referindo-se, assim, à indulgentia principis, englobando, desta forma, o indulto. A própria Lei de execução Penal refere-se à graça como indulto individual6".

A anistia, por sua vez, é atribuição do Congresso Nacional (Art. 48, VIII, CR/88) e consiste no esquecimento jurídico de uma ou mais infrações penais. A anistia, por se referir a fatos, pode contemplar uma pluralidade de indivíduos, extinguindo a punibilidade e os efeitos penais da condenação.


Penas aplicadas no Brasil

Na Constituição da República, verifica-se que, no inciso XLVI, do art. 5º, as penas adotadas no Brasil serão a privação ou restrição da liberdade, perda de bens, multa, prestação social alternativa e suspensão ou interdição de direitos, determinação esta que é sintetizada pelo art. 32 do Código Penal em três espécies: privativas de liberdade, restritivas de direito e multa.

No Código Penal, existem dois tipos de pena privativa de liberdade, reclusão e detenção, sendo que “a pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi- aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado”.7 A lei de Contravenções penais, contudo, prevê pena de prisão simples, que é um terceiro tipo de pena privativa de liberdade.

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As penas restritivas de direito são sanções penais menos gravosas, visando substituir as penas privativas de liberdade de menor duração, que não atenderiam ao escopo da pena, e está prevista no art. 43 do Código Penal:

Art. 43. As penas restritivas de direitos são:

  1. - prestação pecuniária;

  2. - perda de bens e valores;

  3. - limitação de fim de semana.

  4. - prestação de serviço à comunidade ou a entidades públicas; V - interdição temporária de direitos;

VI - limitação de fim de semana.

A pena de multa, pode ser aplicada cumulativamente com a privação de liberdade ou em sua substituição e tem por escopo a imposição, ao condenado, de pagamento de certo valor em dinheiro ao fundo penitenciário.

Cumpre destacar que a Constituição da República impede a imposição de penas de morte, salvo em caso de guerra declarada, bem como as de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento ou aquelas consideradas cruéis.


Escopo da pena

Nas precisas palavras de Rogério Sanches, “pena é espécie sanção penal, isto é, resposta estatal ao infrator da norma incriminadora (crime ou contravenção), consistente na privação ou restrição de determinados bens jurídicos do agente”8. A pena é, como sabido uma forma de controle irrenunciável, constituindo um “mal necessário” para a manutenção da convivência harmônica dos indivíduos de uma sociedade.

A doutrina debate acerca das funções que devem ser atribuídas à pena e, nesta seara, temos as teorias absolutas ou retributivas, que foram concebidas sob o entendimento de que as penas têm o escopo de retribuir um mal proporcionado pelo infrator, ou seja, o propósito da lei não visa nenhuma repercussão futura da pena, mas tão somente a aplicação do castigo em face da infração penal.

Rogério Greco explica que “a sociedade, em geral, contenta-se com esta finalidade, porque tende a se satisfazer com esta espécie de “pagamento” ou compensação feita pelo condenado, desde que, obviamente, a pena seja privativa de liberdade”9. Para o doutrinador, paira na sociedade a sensação de impunibilidade quando a pena aplicada é de multa ou restritiva de direitos, já que as pessoas se regozijam com o sofrimento causado pela privação de liberdade do infrator.

De outro lado, tem-se as teorias relativas ou utilitaristas que entendem a pena como um instrumento de prevenção, ou seja, um meio para evitar que o crime seja praticado novamente em momento futuro. As teorias relativas se fundamentam em quatro aspectos, quais sejam: 1) prevenção geral positiva; b) prevenção geral negativa; c) prevenção especial negativa; d) prevenção especial positiva.

A prevenção geral negativa pode ser chamada, também, de prevenção por intimidação, já que a pena serviria para coagir a sociedade, no todo, a não praticar crimes, partindo do pressuposto de que a existência da pena iria dissuadir os indivíduos com propensão à prática de atos tipificados como crime. A prevenção geral positiva, por sua vez, afirma que a pena passa a “assumir uma finalidade pedagógica e comunicativa de reafirmação do sistema normativo, com o objetivo de oferecer estabilidade ao ordenamento jurídico”10. O escopo da pena seria, portanto, demonstrar vigência, validade e eficiência do ordenamento jurídico.

No que diz respeito à prevenção especial negativa, está voltada à pessoa do infrator, já que o objetivo da pena seria a sua neutralização por meio da privação de liberdade, impedindo a reincidência delitiva. Já a prevenção especial positiva, a pena teria o escopo da ressocialização, uma vez que a sanção penal de privação da liberdade só seria legítima se conseguisse recuperar o condenado.

No Brasil, o art. 59 do Decreto-Lei 2.848/40, o Código Penal, introduziu a teoria mista ou unificadora da pena, pois, nele, consta o expresso mandamento de que a pena deve ser suficiente à reprovação e prevenção do crime, unificando, assim, as teorias absoluta e relativa, manifestando haver caráter retributivo e preventivo no que diz respeito às penas aplicadas em território nacional.


Do julgamento do Habeas Corpus 82.959/SP

No ano de 2006, o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que o cumprimento de pena em regime integralmente fechado é inconstitucional, conforme se extrai do Habeas Corpus 82.959/SP, oportunidade em que aquela corte discutiu a constitucionalidade do texto até então vigente do § 1º do artigo 2º da Lei de Crimes Hediondos:

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PENA - REGIME DE CUMPRIMENTO - PROGRESSÃO - RAZÃO DE SER. A progressão no regime de cumprimento da pena, nas espécies fechado, semi-aberto e aberto, tem como razão maior a ressocialização do preso que, mais dia ou menos dia, voltará ao convívio social. PENA - CRIMES HEDIONDOS - REGIME DE CUMPRIMENTO - PROGRESSÃO - ÓBICE

- ARTIGO 2º, § 1º, DA LEI Nº 8.072/90 – INCONSTITUCIONALIDADE - EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL. Conflita com a garantia da individualização da pena - artigo 5º, inciso XLVI, da Constituição Federal - a imposição, mediante norma, do cumprimento da pena em regime integralmente fechado. Nova inteligência do princípio da individualização da pena, em evolução jurisprudencial, assentada a inconstitucionalidade do artigo 2º, § 1º, da Lei nº 8.072/90.

O Habeas Corpus 82.959/SP teve como relator o Ministro Marco Aurélio, sendo reconhecida a inconstitucionalidade do § 1º do artigo 2º da Lei de Crimes Hediondos, tendo sido vencidos os Ministros Carlos Velloso, Joaquim Barbosa, Ellen Gracie, Celso de Mello e Nelson Jobim.

Dentre outros fundamentos, entendeu-se, por meio da referida decisão que o cumprimento da pena integralmente em regime fechado para os crimes hediondos contrariava os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da individualização da pena.

A referida decisão repercutiu na edição do enunciado de Súmula vinculante nº 26:

Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei 8.072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico.

Após a referida decisão, fora editada lei que alterou a norma do art. 2º, §1º da Lei 8.072/90, que passou a prever que o regime inicial de cumprimento seria, obrigatoriamente fechado, mas passou a prever frações de pena que permitiriam a progressão de regime para o réu primário e, também, para o reincidente. Com o advento da Lei 13.964/07, conhecida como “Pacote anticrime”, não mais subsistem as frações de 2/5 e 3/5 anteriormente trazidos pela Lei 11.464/07 para primário e reincidentes em crimes hediondos, respectivamente.


O regime inicial de cumprimento da pena e o julgamento do Habeas Corpus 111.840/ES e do ARE 1.052.700

No ano de 2021, fora submetido ao Supremo Tribunal Federal o Habeas Corpus 111.840/ES, por meio do qual a Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo pleiteou, em favor de um cidadão daquela unidade da federação condenado a pena de reclusão pela prática de tráfico de drogas, a fixação de regime inicial semiaberto de cumprimento de pena.

O Ministro relator, Dias Toffoli, argumentou que “se a Constituição Federal menciona que a lei regulará a individualização da pena, é natural que ela exista. Do mesmo modo, os critérios para a fixação do regime prisional inicial devem-se harmonizar com as garantias constitucionais, sendo necessário exigir-se sempre a fundamentação do regime imposto, ainda que se trate de crime hediondo ou equiparado”.

O Ministro argumenta ainda, em seu relatório, que a Constituição da República, no rol dos direitos e garantias fundamentais, do art. 5º, prevê, de forma abrangente e irrestrita, a individualização da pena, conforme se extrai do inciso XLVI.

Para Dias Toffoli, o art. 5º, XLV afasta, em relação aos crimes hediondos, a incidência de fiança, graça e anistia, permanecendo silente o texto constitucional no que diz respeito à obrigatoriedade de cumprimento de pena em regime inicial fechado, reconhecendo a inconstitucionalidade do §1º do art.2º da Lei 8.072/90, cuja redação havia sido modificada pela Lei 11.464/07.

No pleno, em sessão ocorrida no dia 27/06/2012, por maioria dos votos, a Suprema Corte brasileira decidiu, de forma incidental, pela inconstitucionalidade do §1º do art. 2º da Lei 8.072/90, segundo o qual a pena imposta pela prática de crimes hediondos teria o seu cumprimento em regime inicialmente fechado, obrigatoriamente.

No ano de 2017 a matéria fora novamente submetida ao Supremo Tribunal Federal que, na sessão plenária do dia 02 de novembro, reconheceu, por unanimidade, a repercussão geral da matéria e, no mérito, por maioria de seus membros, julgou inconstitucional o art. 2º, §1º da Lei de Crimes Hediondos, conforme se extrai da ementa.

EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. CONSTITUCIONAL. PENAL. TRÁFICO DE DROGAS. REGIME INICIAL. INCONSTITUCIONALIDADE DO ART. 2º, § 1º, da LEI 8.072/1990. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. 1. É inconstitucional

a fixação ex lege, com base no art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/1990, do regime inicial fechado, devendo o julgador, quando da condenação, ater-se aos parâmetros previstos no artigo 33 do Código Penal. 2. Agravo conhecido e recurso extraordinário provido.

O Relator, Ministro Edson Fachin, argumentou que a jurisprudência daquela corte já se encontrava consolidada no sentido de que seria inconstitucional a lei que impõe a obrigatoriedade de se iniciar o cumprimento de pena em regime fechado, ponderando, contudo, que as instâncias judiciais ordinárias não aplicavam o referido entendimento devido ao fato de que o entendimento do Supremo Tribunal Federal decorria de decisão de inconstitucionalidade incidental quando do julgamento do HC 11.840/ES, sem efeito erga omnes.


Individualização da pena

Fundamentando-se no expresso mandamento insculpido no inciso XLVI do art. 5º da Constituição da república, o princípio da insignificância é aquele segundo o qual deve-se "distribuir a cada indivíduo o que lhe cabe, de acordo com as circunstâncias específicas do seu comportamento - o que em matéria penal significa a aplicação de pena levando em conta não a norma penal em abstrato, mas, especialmente, os aspectos subjetivos e objetivos do crime11”.

O citado princípio constitucional prevê, portanto, que a pena aplicada será aquilatada pelo magistrado, conforme as circunstâncias do caso concreto, valendo destacar que a individualização da pena poderá ocorrer em três momentos: legislativo, judicial e administrativo.

Na seara legislativa, a individualização da pena se dá com a previsão, pelo Congresso nacional, de sanções adequadas e devidamente delimitadas com previsão de tempo mínimo e máximo cabíveis àquele tipo penal, além da previsão das circunstâncias que porventura poderão aumentar ou diminuir a sanção penal.

A individualização judicial é, por sua vez, aquela implementada pelo Poder Judiciário, que poderá, mediante circunstâncias do caso concreto, arbitrar a sanção penal cabível, dentro dos parâmetros previamente estabelecimentos pelo Poder Legislativo, obedecendo, para tanto, os critérios dos art. 59 e 68 do Código Penal.

Já a individualização administrativa, é aquela implementada na fase de execução da pena, de modo que o Estado cuidará para que a pena, em seu cumprimento, será singularizada, de acordo com a situação do condenado.

Para o escopo do nosso estudo, tem maior relevância a individualização da pena na seara administrativa, já que é a ela que está mais voltada a decisão do Habeas Corpus 82.959/SP.

Quanto à individualização da pena na seara administrativa, urge salientar que diversos são os aspectos de singularização do cumprimento, os quais, passaremos a debater.

Para Alexis Couto de Brito, "o princípio focaliza a classificação dos condenados para que cada uma, de acordo com sua personalidade e antecedentes, receba o tratamento penitenciário adequado12” e, nesse sentido, um dos aspectos de individualização está previsto no art. 84 da Lei 7.210/84, no qual há expressa previsão de que, dentro do estabelecimento prisional, ficarão separados os condenados de acordo com o delito praticado, sendo que, no inciso I daquele artigo, consta que um dos critérios de separação dos apenados será a prática de crimes hediondos ou equiparados.

Por outro giro, a Lei 7.210/84 estabelece, ainda, outro aspecto da individualização, impondo àquele preso que praticar crime doloso que cause subversão da ordem ou disciplina internas daquele local a aplicação de regime disciplinar diferenciado, nos termos do art. 52.

A inclusão do preso em regime disciplinar diferenciado pode ser feita ao preso provisório e ao condenado e é um procedimento jurisdicionalizado, ou seja, se trata de um incidente à execução que deve ser submetido ao Poder Judiciário, que decidirá após manifestação do ministério Público e da defesa, que será feita no prazo máximo de 15 dias.

Quanto ao comportamento do preso, a Lei de Execuções Penais prevê, ainda, sanções e recompensas que variam de acordo com o mau ou o bom comportamento do preso, que acabam por refletir diretamente no cumprimento da sanção penal. A prática de infração disciplinar, pelo preso, implica na instauração de procedimento administrativo com fim de apurar a necessidade da aplicação da sanção, sendo possível a aplicação nos termos do art. 53 da Lei de Execuções Penais no qual há rol taxativo, sendo possível aplicar advertência verbal, repreensão, suspensão ou restrição de direitos, isolamento do preso e a inclusão em regime disciplinar diferenciado.

O procedimento administrativo que tem por escopo a apuração da infração disciplinar será submetido ao contraditório e à ampla defesa e levará em conta a individualização da conduta e a proporcionalidade quando da aplicação da sanção, devendo-se considerar, no caso concreto, a gravidade da conduta do preso, as circunstâncias dos fatos e questões de ordem subjetiva.

Quanto às recompensas, a Lei 7.210 estabelece que são duas as possibilidades, sendo elas o elogio e a concessão de regalias. Elogio é uma anotação no prontuário do detento demonstrando que ele está agindo de modo adequado, é o reconhecimento de uma boa conduta dentro do estabelecimento prisional.

As regalias, por sua vez, são incentivos dados ao preso para que ele se sinta compelido a manter o bom comportamento dentro do estabelecimento prisional, porém, a legislação não esclareceu, exatamente, em que consistiriam tais benesses. A doutrina cita como exemplos de regalia autorização para fumar, melhor acesso a livros e periódicos, maiores facilidades de correspondência e para o recebimento de visitas, etc.

Renato Marcão esclarece, contudo, que “as ‘regalias’ não poderão contrariar os objetivos da Lei de Execução Penal ou traduzir-se em privilégios inaceitáveis e incompatíveis com a condição de pessoa presa. Não podem, ainda, revestir-se de aspectos discriminatórios13”.

Não se pode olvidar, ainda, dos institutos da remição, segundo o qual o condenado poderá subtrair de sua pena um dia para cada três em que ele exercer o trabalho ou estudar, de acordo com o art. 126 da Lei de Execuções Penais, e, ainda, a detração que, nos termos do art. 42 do Código Penal, é o cômputo, na pena privativa de liberdade, daquele tempo em que o condenado permaneceu recolhido ao estabelecimento penal sob prisão provisória.

A remição é um meio pelo qual o condenado pode tornar mais breve a sua condenação, desde que se dedique, diuturnamente, ao trabalho e ao estudo. A remição pelo trabalho pode ser feita pelo preso nos regimes fechado ou semiaberto e consiste na subtração de um dia de pena para cada três dias de trabalho regular. A Lei não autoriza a remição, pelo trabalho, para aqueles que se encontram no regime aberto ou em livramento condicional.

Todo trabalho pressupõe responsabilidade, organização e disciplina. Para fins de remição não é diferente, já que é preciso incutir tais valores na mente e na retina do executado, como forma de readaptá-lo a vida ordeira, dentro dos conceitos de uma sociedade produtiva.

A jornada laborativa que assegura o direito a remição deve observar o disposto no art. 33 da Lei de Execução Penal, e, por isso, não poderá ser inferior a seis, nem superior a oito horas, com descanso nos domingos e feriados14.

A dedicação aos estudos também pode ser utilizada para fins de remir a pena do condenado, já que tal prática permite o aprimoramento da cultura e auxilia na adaptação social, porém, para este fim, a Lei de Execuções Penais prevê que, para cada 12 (doze) horas de estudo regular, será remido um dia de pena, especificando, contudo, que estas horas deverão ser dividas em, no mínimo, 3 (três) dias. Os estudos poderão ocorrer na modalidade presencial ou à distância, devendo ser certificados pelas autoridades de educação competentes. Poderão se beneficiar da remição pelo estudo os presos em regime semiaberto e fechado, bem como aqueles que se encontram no regime aberto e os beneficiados com o livramento condicional.

A detração é o instituto segundo o qual o tempo de prisão provisória é abatido no tempo de cumprimento da pena definitiva e, para este fim, não importa a natureza da cautelar, seja ela em flagrante, temporária ou preventiva, sempre resultando na subtração do tempo em que permaneceu privado de liberdade antes da condenação.

A individualização da pena, quando de seu cumprimento, é possível sob diversos aspectos, tais como variação regime disciplinar, alocação do condenado conforme a natureza de seu crime, a suscetibilidade de sanções ou recompensas, bem como a possibilidade de remição ou detração da pena. Tais possibilidades aqui demonstradas evidenciam que, o regime de cumprimento da pena é apenas um dos aspectos a ser observado no que diz respeito à individualização, ou seja, a imposição legal de cumprimento integral em um regime específico, por si só, não implica em contrariedade ao princípio constitucional.

Sobre o autor
João Victor Teixeira Camargos Diniz

Investigador da Polícia Civil de Minas Gerais. Formação Técnico-Profissional, Carreira Investigador de Polícia. Bacharel em Direito pela PUC Minas. Pós-graduado em Advocacia Cível pela Escola Superior de Advocacia da OAB/MG e Pós-graduado em Direito Penal e Processo Penal pela Verbo Jurídico.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

DINIZ, João Victor Teixeira Camargos. O princípio da individualização da pena e o cumprimento da pena em regime integralmente fechado para autores de crimes hediondos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 28, n. 7128, 6 jan. 2023. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/101887. Acesso em: 27 dez. 2024.

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