Deverá o Supremo Tribunal Federal, em breve, decidir se cabe ou não ao Ministério Público promover investigações policiais, à revelia da Polícia, ou se, nas funções próprias das Polícias Federal e Estaduais, teriam elas a exclusividade da condução das investigações, como "longa manus" do Poder Judiciário (Polícia Judiciária), cabendo ao MP e a Advocacia delas participar, defendendo os interesses da sociedade ou do Poder Público, o que pertine às duas instituições, em igualdade de condições.
A discussão centra-se nos incisos VI, VII e VIII do art. 129 da Constituição Federal, assim redigidos: "Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: ..... VI - expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los, na forma da lei complementar respectiva; VII - exercer o controle externo da atividade policial, na forma da lei complementar mencionada no artigo anterior; VIII - requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial, indicados os fundamentos jurídicos de suas manifestações processuais; ......".
O primeiro dispositivo, a meu ver, cuida apenas de procedimentos pertinentes à competência do Ministério Público e não diz ser de sua alçada conduzir as investigações policiais. O segundo estabelece caber-lhe o exercício do controle externo da atividade policial, o que vale dizer, fiscalizar a atividade policial e não, exercê-la. E a lei complementar a que se refere não poderia, risco de violar a Lei Suprema, dizer mais do que disse a Constituição, alargando competências não outorgadas pela lei maior. O terceiro inciso refere-se aos requisitos para instauração do inquérito policial, a ser executado pelas polícias federal ou estadual, em seu âmbito de atuação.
O sistema plasmado na Carta Máxima, de colaboração entre as duas instituições (MP e Polícia), parece-me corretíssimo, pois define a área de iniciativa e controle das investigações policiais e diligências criminais por parte do MP, mas outorga a uma instituição neutra -a serviço do Poder Judiciário, também Poder neutro- a apuração preambular de eventuais delitos, que, na órbita judiciária, caberá ao Ministério Público conduzir. E, por outro lado, ao cidadão, garante o direito de defesa, que é o grande diferencial entre as democracias e as ditaduras, assegurando-lhe o direito de ser acompanhado por seu defensor constitucional, que é o advogado.
Nada obstante a extrema importância do Ministério Público como órgão essencial à administração da Justiça, não é ele mais importante que a advocacia, lembrando-se que o capítulo IV do Título IV da Constituição Federal cuida das três instituições (Ministério Público-inciso I, Advocacia Pública-inciso II e Advocacia e Defensoria Pública-inciso III – arts. 127 a 135).
Já demonstrei, por outro lado, em parecer veiculado por órgãos especializados, que o delegado de polícia participa de carreira jurídica de Estado, tal como os magistrados, membros do Ministério Público e Advogados públicos, visto que nenhum deles pode concorrer aos respectivos cargos, em concursos públicos de seleção, se não forem bacharéis em direito.
Tais considerações eu as faço, com o respeito devido a todas as instituições, a partir daquela a que pertenço (Advocacia), pois admitir privilégios na investigação que descompassem o direito de defesa e o equilíbrio entre os defensores do cidadão e do Poder Público, é fulminar o amplo direito de defesa, assegurado pela Constituição Federal no art. 5º, inc. LV, assim redigido: "LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes".
É que, na investigação, o Ministério Público é parte e não juiz, já tendo, o STF, em voto que o Professor Miguel Reale e eu transcrevemos, em artigo elaborado para a Revista "Temas de Integração", da Universidade de Coimbra, assim decidido (REX 215.301-Ceará). No voto declara o Ministro Carlos Mário Velloso: "O Ministério Público, por mais importantes que sejam as suas funções, não tem a obrigação de ser imparcial. Sendo parte, a parcialidade lhe é inerente".
Parece-me ser esta – salvo melhor juízo, e sempre o Supremo Tribunal Federal tem o melhor juízo, porque definitivo, sobre divergências dos doutrinadores nacionais – a inteligência mais adequada quanto à participação das 3 instituições (Polícia, Ministério Público e Advocacia), nas investigações policiais.