1. Introdução
Nesta semana, dia 22 de outubro de 2009, foi noticiado no sítio do Superior Tribunal de Justiça importante decisão que causa uma mudança de paradigma no que concerne à legitimidade da mãe para pedir em nome próprio alimentos em favor dos filhos.
Na prática forense e na doutrina está (ou pelo menos estava) consagrado que o advogado ao ajuizar uma ação de alimentos em favor de filho menor este deveria constar no pólo ativo, sendo representado ou assistido pelos pais. Não poderia, pelo menos em tese, a mãe pleitear em nome próprio direito alheio. Nesse sentido é cristalina a redação do artigo 6º, do Código de Processo Civil, que dispõe que: "ninguem poderá pleitear, em nome próprio, direito alheio, salvo quando autorizado por lei.".
Porém, utilizando os princípios da instrumentalidade, da economia processual e, principalmente, da Função Social do Processo, a Ministra Nancy Andrighi afirmou que a formulação do pedido em nome da mãe não anula o processo, apesar da má-técnica processual, pois está claro que o valor se destina à manutenção da família.
Deste modo, questão importante se coloca: A mãe deixou de ser representante processual e passou a ser substituta processual?
2. Representação e Substituição Processual
A regra do sistema processual é a da legitimação ordinária que estabelece que a legitimidade para postular em juízo é do titular do direito, ou seja, o sujeito deverá postular em nome próprio defendendo interesse próprio.
No entanto, excepcionalmente admite-se a legitimação extraordinária, conforme previsto no artigo 6º, do Código de Processo Civil.
Não se pode confundir a substituição processual com a representação processual (legitimatio ad processum), fenônemo relacionado à capacidade de estar em juízo. O representante processual atua em nome alheio na defesa de interesse alheio, não sendo consderado parte no processo, mas mero sujeito que dá à parte a capacidade de estar em juízo. (NEVES, 2009). É o caso da mãe que postula alimentos em nome do filho para o próprio filho, dando-lhe capacidade processual.
O substituto processual é o sujeito que recebeu pela lei a legitimidade extraordinária de defender interesse alheio em nome próprio. É o que ocorre na legitimidade do Ministério Público para ajuizar tutelas coletivas para a defesa dos interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos.
Neste diapasão, é de clareza solar que a mãe ao pleitear alimentos em favor dos filhos deve fazê-lo na qualidade de representante processual, haja vista que não recebeu do legislador poderes para pleitear em nome próprio direito alheio no que concerne aos alimentos.
3. O entendimento do Superior Tribunal de Justiça
Conforme foi exposto acima foi noticiado, no dia 22 de outubro de 2009, que é possível à mãe pedir, em nome próprio, alimentos em favor de filhos menores. A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e foi tomada em um recurso apresentado pelo pai das crianças. A defesa dele sustentava, entre outras questões, ilegitimidade da mãe para agir em nome dos filhos. A discussão judicial começou em uma ação de dissolução de união estável, cumulada com partilha de bens e fixação de alimentos. O pedido foi julgado parcialmente procedente pela justiça de origem.
Segundo a decisão da Terceira Turma do STJ, é realmente dos filhos a legitimidade ativa para propor ação de alimentos, devendo os pais representá-los ou assisti-los conforme a idade. Contudo, a formulação do pedido em nome da mãe não anula o processo, apesar da má-técnica processual, pois está claro que o valor se destina à manutenção da família. "O pedido está claramente formulado em favor dos filhos", assinalou a relatora do processo, ministra Nancy Andrighi. "E esse entendimento traz como suporte o interesse público familiar que está na obrigação de prestar alimentos".
O dever de sustento, guarda e educação dos filhos, de acordo com a Turma é, em princípio, de ambos os cônjuges, e vem sendo cumprido de maneira direta pela mãe dos menores a quem coube a guarda após a dissolução da união estável."Naturalmente o direito aos alimentos, reconhecido pelo acórdão não é titularizado pela mãe, mas por cada um dos filhos a quem ela representou e, assim, eventual execução decorrente do seu inadimplemento deverá ser movida pelo titular, ou seja, por cada um dos seus filhos pessoalmente", prosseguiu a ministra.
A Terceira Turma reiterou que a maioridade do filho menor atingida no curso do processo não altera a legitimidade ativa para propor a ação, ainda mais quando a jurisprudência do STJ impossibilita a exoneração automática do alimentante por ocasião da maioridade do filho. "Para que a exoneração se configure é necessária a propositura de ação específica com esse fim, ou ao menos abertura do contraditório para a discussão específica da matéria na ação de alimentos", esclareceu a relatora. A circunstância isolada da maioridade, para a Turma, não justifica anulação do julgado.
4. Conclusão
Por tudo quanto foi acima exposto, resta claro que nao pretendeu o Superior Tribunal de Justiça mudar a natureza jurídica da "intervenção" da mãe ao pleitear alimentos em nome próprio em favor dos filhos.
A Terceira Turma do STJ deixou claro no julgado que é realmente dos filhos a legitimidade ativa para propor ação de alimentos, devendo os pais representá-los ou assisti-los conforme a idade. Trata-se, portanto, de representação processual.
Assumiu o STJ a verdadeira função jurisdicional que é a de solucionar conflitos entre os seres humanos, sendo que o processo assume a sua função de instrumento para a solução de crises jurídicas e gerando com tal solução a pacificação social.
Segundo ensinamento do mestre J.J. Calmon de Passos (2002) ao Direito não cabe a função de informar e confomar o comportamento humano, em sua dimensão social, sim e exclusivamente a função de solucionar os conflitos que decorram dessa convivência e escapem à composição pelos próprios interessados. Essa função ele a cumpre de dois modos ; colocando expectativas compartilháveis, que permitam um mínimo de previsibilidade de como serão compostos os conflitos que vierem a se instaurar na convivência social (o denominado direito material) e definindo o modo pelo qual os interessados e os agentes públicos devem atuar para solução dos conflitos de interesses não compostos ou insuscetíveis de ser compostos pelos próprios interessados (o denominado direito processual).
O processo de nosso final de século ( atual século XXI) é sobretudo um instrumento de realização efetiva dos direitos subjetivos violados e ameaçados
Bibliografia:
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. Rio de Janeiro : Forense ; São Paulo : Método, 2009.
PASSOS, J. J. Calmon de. Função social do processo . Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 58, ago. 2002. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/3198>. Acesso em: 23 out. 2009.
Sítio do Superior Tribunal de Justiça, disponível em: http://www.stj.gov.br. Acesso em: 23 de outubro de 2009.