12. AGENTES POLÍTICOS
A tradição jurídica brasileira amplia o conceito dos que seriam propriamente agentes políticos. Nessa linha de entendimento, consideram-se agentes políticos no âmbito do executivo, os Chefes do Executivo e seus respectivos Vices, bem como auxiliares diretos, Secretários Municipais e Estaduais, Ministros de Estado. Na esfera legislativa, por sua vez, apenas os próprios membros, Senadores, Deputados e Vereadores são considerados agentes políticos. Entretanto, em relação a estes, Vereadores, há regramento próprio no que se refere a acumulação de cargos.
Com relação aos Agentes Públicos a Constituição Federal prevê regra especifica em relação a apenas alguns deles, sujeitando-se os demais aos exatos termos do art. 37, inciso XVI, sem qualquer peculiaridade.
Art. 38. Ao servidor público da administração direta, autárquica e fundacional, no exercício de mandato eletivo, aplicam-se as seguintes disposições:
I - tratando-se de mandato eletivo federal, estadual ou distrital, ficará afastado de seu cargo, emprego ou função;
II - investido no mandato de Prefeito, será afastado do cargo, emprego ou função, sendo-lhe facultado optar pela sua remuneração;
III - investido no mandato de Vereador, havendo compatibilidade de horários, perceberá as vantagens de seu cargo, emprego ou função, sem prejuízo da remuneração do cargo eletivo, e, não havendo compatibilidade, será aplicada a norma do inciso anterior;
IV - em qualquer caso que exija o afastamento para o exercício de mandato eletivo, seu tempo de serviço será contado para todos os efeitos legais, exceto para promoção por merecimento;
V - para efeito de benefício previdenciário, no caso de afastamento, os valores serão determinados como se no exercício estivesse.
A regra transcrita não se aplica aos Secretários Estaduais e Municipais e aos Ministros de Estado. Em tais casos, os exercentes de tais cargos se sujeitaram ao disposto no art. 37, XVI. Nessa linha de entendimento, nem mesmo o cargo de Secretário ou Ministro da Saúde poderá ser acumulado com outro cargo privativo de profissionais de saúde, visto que aqueles cargos não são privativos de profissionais de saúde.
Nesse sentido está o Tribunal Regional da 2ª Região:
AÇÃO POPULAR. ACUMULAÇÃO DE CARGOS ILÍCITA. CARGO NÃO PRIVATIVO DE PROFISSIONAL DA SAÚDE. NÃO RESTITUIÇÃO AO ERÁRIO DA REMUNERAÇÃO PERCEBIDA. CONTRAPRESTAÇÃO AO SERVIÇO EFETIVAMENTE PRESTADO. 1. A acumulação de cargos públicos, em regra, é proibida pela Constituição da República Federativa do Brasil, que permite como exceção a possibilidade de acumular, desde que haja compatibilidade de horários: a) dois cargos de professor; b) um cargo de professor com outro, técnico ou científico; c) dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas (artigo 37, XVI). 2. É ilícita a acumulação do cargo público de Médico do Ministério da Saúde com os cargos de Assessor e Secretário Municipal de Saúde, porquanto estes não são cargos privativos de profissionais de saúde, já que as atribuições são administrativas, podendo ser exercidas por profissionais de outras áreas. Dessa forma, imperativa a decretação de nulidade da acumulação indevida, bem como do cômputo do tempo de serviço prestado em acumulação ilícita para fins de licenças e aposentadorias. 3. Tendo em vista o comando constitucional que veda a prestação de trabalho não voluntário gratuito (art. 7.º, inciso VII, da CF/88), entende-se que se o trabalho foi efetivamente prestado pelo servidor, impõe-se a contraprestação da Administração Pública, não havendo que se falar em restituição ao Erário da remuneração percebida. 4. Remessa Necessária parcialmente provida, recurso da União parcialmente conhecido e nesta parte desprovido e recurso do segundo réu conhecido e parcialmente provido. Origem: TRIBUNAL - SEGUNDA REGIAO Classe: AC - APELAÇÃO CIVEL – 395117
Processo: 199851010141481 UF: RJ Órgão Julgador: OITAVA TURMA ESPECIALIZADA Data da decisão: 25/06/2008 Documento: TRF200186962
Nessa linha de entendimento, tais cargos não poderiam se quer, via de regra, serem cumulados com cargos de professor, por não guardarem natureza técnica, pois muitas vezes exercidos por pessoas sem qualquer formação técnica.
A Constituição Federal de 1998, em relação aos Vereadores, traz regra própria. A eles é permitido continuar o exercício de emprego, cargo ou função, se houver compatibilidade de horário, recebendo pelo exercício das duas funções. Não havendo compatibilidade, poderá optar por qualquer das remunerações. Da mesmo forma o Prefeito Municipal, que poderá optar pela remuneração, porém não poderá cumular os cargos.
13. MILITARES E MILITARES DE SAÚDE
De todos os regimes de acumulação existentes, o dos militares é o mais restritivo e peculiar. Os militares no desempenho de suas funções não podem acumular sua função com qualquer outra, ressalva-se os Militares de Saúde, como se verá abaixo.
A regra vale tanto para os militares da União (Exército, Marinha, Aeronáutica), quanto para os militares dos estados (Polícia Militar e Corpo de Bombeiros Militar). Mesmo a Polícia Militar e Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal, órgãos da União, sujeitam por meio do art. 42, abaixo transcrito:
Art. 42 Os membros das Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares, instituições organizadas com base na hierarquia e disciplina, são militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios
§ 1º Aplicam-se aos militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios, além do que vier a ser fixado em lei, as disposições do art. 14, § 8º; do art. 40, § 9º; e do art. 142, §§ 2º e 3º, cabendo a lei estadual específica dispor sobre as matérias do art. 142, § 3º, inciso X, sendo as patentes dos oficiais conferidas pelos respectivos governadores.
Segundo a regra constitucional, o militar não pode exercer cumulativamente seu cargo militar com qualquer outro cargo civil. Assumindo cargo permanente, será transferido para reserva. Caso tome posse em cargo temporário, será agregado (espécie de disponibilidade específica dos militares), podendo permanecer nessa situação por até dois anos, contínuos ou não, quando, então, será transferido para reserva.
Eventual exercício de cargo eletivo, guarda mais peculiaridade, visto que, o militar ao ser diplomado, será transferido para reserva, isso se tiver mais de dez anos. Pois caso tenha menos, deverá se afastar antes mesmo de se candidatar [28]. Fica evidente, que o militar em hipótese alguma pode acumular função pública remunerada. A única exceção se dá com os militares de saúde.
Ao militar somente será possível cumular seus proventos de aposentadoria com vencimentos de outro cargo público remunerado, isso ainda apenas se tiver retornado ao serviço público antes da Emenda Constitucional nº 20 [29]:
EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. ACOLHIDA PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA DO COORDENADOR-GERAL DE RECURSOS HUMANOS. PROSSEGUIMENTO DO FEITO EM RELAÇÃO AO PRESIDENTE DA PRIMEIRA CÂMARA DO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. CUMULAÇÃO DE PROVENTOS DA RESERVA MILITAR E DE APOSENTADORIA EM CARGO CIVIL ANTES DA EMENDA CONSTITUCIONAL 20/1998. POSSIBILIDADE. O coordenador de Recursos Humanos da ABIN é parte ilegítima para figurar no pólo passivo da relação processual, porquanto mero executor da decisão administrativa do Tribunal de Contas da União. Prossegue, contudo, o feito em relação à segunda autoridade impetrada. A cumulação de proventos e vencimentos, no caso do impetrante, é possível. O art. 99, § 9º, da Constituição Federal de 1969 bem como a Constituição vigente, até a Emenda Constitucional 20/1998, não vedavam o retorno do militar da reserva para o serviço público, em cargo civil de caráter técnico, com acumulação de proventos e vencimentos. Se o militar tiver sido conduzido à reserva remunerada na vigência da Constituição de 1969 e aposentado no cargo civil antes da Emenda Constitucional 20/1998, não incide a vedação à acumulação prevista no art. 11 da referida emenda, porque se trata de um cargo civil e outro militar, e não de dois cargos civis. Precedentes. Segurança concedida. Origem: STF - Supremo Tribunal Federal Classe: MS - MANDADO DE SEGURANÇA Processo: 25045 UF: DF - DISTRITO FEDERAL.
Em se tratando de Oficiais Militares Médicos que, anteriormente à Constituição Federal de 1998, exerciam, além do cargo de Oficial, outro privativo de Médico na Administração direita ou indireta, o art. 17 do ADCT, assegura o direito de continuar exercendo os dois cargos. Eis a redação:
Art. 17. Os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os proventos de aposentadoria que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se admitindo, neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a qualquer título.
§ 1º - É assegurado o exercício cumulativo de dois cargos ou empregos privativos de médico que estejam sendo exercidos por médico militar na administração pública direta ou indireta.
§ 2º - É assegurado o exercício cumulativo de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde que estejam sendo exercidos na administração pública direta ou indireta.
Em relação aos demais Oficiais Militares das demais áreas de saúde, diante da redação do § 2º, acima transcrito, a possibilidade de manutenção dos cargos gerou dúvidas. Inicialmente o Supremo Tribunal Federal entendeu pela impossibilidade, sob o fundamento que o § 1º se referia aos militares, logo o § 2º, referente a profissionais civis, não poderia ser estendido aos militares:
Integrante da Corporação do Corpo de Bombeiros Militar do Distrito Federal, que exercia, à época da promulgação da Constituição Federal, cumulativamente à função de auxiliar de enfermagem da referida corporação, cargo de idêntica denominação na Fundação Hospitalar do Distrito Federal. Não incidência do art. 17, § 2º da ADCT à espécie, tendo em vista que a norma aplicável aos servidores militares é a prevista no § 1º do art. 17 do ADCT, a qual prevê acumulação lícita de cargos ou empregos por médico militar, hipótese que não se estende a outros profissionais de saúde. Recurso extraordinário conhecido e provido. (STF, RE 298.189/DF, relatora Ministra Ellen Gracie, publicação DJ 03/09/2004)
Posteriormente, o Tribunal mudou de posição [30], admitindo a interpretação do § 2º que contemple os demais Oficiais Militares de Saúde, sob o fundamento de que se deve interpretar o inciso III do § 3º do art. 142 em sincronia com o art. 17 da ADCT; logo, os demais Oficiais Militares de Saúde poderiam manter a acumulação que já possuíam antes de 5 de outubro de 1988, sem necessidade de ser transferido para a reserva:
EMENTA: Recurso extraordinário. 2. Acumulação de cargos. Profissionais de saúde. Cargo na área militar e em outras entidades públicas. Possibilidade. Interpretação do art. 17, § 2o, do ADCT. Precedente. 3. Recurso extraordinário conhecido e provido(RE 182811, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 30/05/2006, DJ 30-06-2006 PP-00035 EMENT VOL-02239-02 PP-00351 LEXSTF v. 28, n. 331, 2006, p. 222-227).
Essa interpretação perdeu o sentido em função da Emenda Constitucional nº 34, que incluiu todos os profissionais de saúde na alínea "c", do inciso VXI, do art. 37, da Constituição, e atual entendimento do Supremo Tribunal Federal que autoriza a aplicação da citada alínea aos Oficiais Militares de Saúde:
EMENTA: Recurso extraordinário. 2. Acumulação de cargos. Profissionais de saúde. Cargo na área militar e em outras entidades públicas. Possibilidade. Interpretação do art. 17, § 2o, do ADCT. Precedente. 3. Recurso extraordinário conhecido e provido. (RE 182811, Relator(a): Min. GILMAR MENDES, Segunda Turma, julgado em 30/05/2006, DJ 30-06-2006 PP-00035 EMENT VOL-02239-02 PP-00351 LEXSTF v. 28, n. 331, 2006, p. 222-227)
Pelo exposto, conclui-se que os Oficiais Militares da área de saúde podem cumular cargos públicas remunerados da mesmo forma que os profissionais civis.
14. OFICIAIS DE REGISTRO
As serventias extrajudiciais instituídas pelo Poder Público para o desempenho de funções técnico-administrativas destinadas a garantir a publicidade, a autenticidade, a segurança e a eficácia dos atos jurídicos, regulamentadas pelo Lei nº 8.935/94, constituem órgãos públicos titularizados por agentes que se qualificam, na perspectiva das relações que mantém com o Estado, como típicos servidores públicos.
Essas atividades, mesmo que desempenhadas no âmbito de serventias não oficializadas, constitui em decorrência de sua própria natureza, função revestida de estatalidade, sujeitando-se, por isso mesmo, a um regime estrito de direito público. É esse o entendimento do Supremo Tribunal Federal.
Pelo exposto, não há dúvida de que são servidores, por mais singulares que sejam, submetem-se às disposições constitucionais, no que se refere a vedação de cumulação de cargos públicos.
Em relação a esses servidores, existe regra infraconstitucional ratificando os termos da Constituição, pois apesar do disposto na Lei 8.935, de 18 de dezembro de 1994, a vedação decorre da Lei Maior, pouco importando a vedação legal.
Eis o teor da Lei:
Art. 26. Não são acumuláveis os serviços enumerados no art. 5º.
Parágrafo único. Poderão, contudo, ser acumulados nos Municípios que não comportarem, em razão do volume dos serviços ou da receita, a instalação de mais de um dos serviços.
Que fique claro que, o previsto no parágrafo único não se trata de cumulação de cargos, e sim da situação onde um serviço notarial e de registro tenha por atribuição mais de um município. A abrangência do serviço contempla mais de uma cidade, mas o cargo permanece apenas um.
Vislumbre-se, ainda, que, a vedação da Lei se refere a acumulação entre os serviços enumerados no art. 5º, nada impedindo a acumulação com um cargo de professor, pois evidente a função técnica dos Oficiais de Registo, não podendo a Lei dispor de forma diversa da Constituição.
Sobre o tema já se manifestou o Supremo Tribunal Federal:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. MEDIDA CAUTELAR. RESOLUÇÕES 2 E 3, DE 02.06.2008, DO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA DO ESTADO DE GOIÁS. REORGANIZAÇÃO DOS SERVIÇOS DE NOTAS E DE REGISTROS MEDIANTE SIMPLES DESACUMULAÇÃO. REGULAMENTAÇÃO PARA A REALIZAÇÃO DE CONCURSOS UNIFICADOS DE PROVIMENTO E DE REMOÇÃO NA ATIVIDADE NOTARIAL E DE REGISTRO. ALEGAÇÃO DE OFENSA AO ART. 236, CAPUT E §1º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL, E AOS PRINCÍPIOS DA CONFORMIDADE FUNCIONAL, DA RESERVA LEGAL, DA LEGALIDADE E DA SEGURANÇA JURÍDICA. PLAUSIBILIDADE JURÍDICA NÃO VISLUMBRADA. 1. Aperfeiçoada, sem alterações substanciais, a Resolução 3/2008 atacada por meio da edição, em 17.09.2008, da Resolução 4/2008, também do Conselho Superior da Magistratura do Estado de Goiás, nada impede o aditamento da ação direta para que seus objetos passem a ser as Resoluções 2/2008 e 4/2008, procedentes do Poder Judiciário do Estado de Goiás. 2. O exame perfunctório dos autos demonstra que as resoluções impugnadas tiveram como propósito a reorganização, mediante simples desacumulação, de serviços que estavam irregularmente acumulados e a definição de regras claras e gerais, até então inexistentes, para a realização, no Estado de Goiás, dos concursos públicos unificados para o ingresso e a remoção nos serviços de notas e de registro. 3. Não se vislumbra qualquer inconstitucionalidade formal ou material na atividade normativa de um Tribunal de Justiça que venha estipular regras gerais e bem definidas para a promoção de concurso unificado de provimento ou de remoção de serventias vagas no respectivo Estado-membro. Também parece isenta de qualquer vício a decisão mesma pela realização de concurso quando reconhecida a vacância de mais de trezentas serventias extrajudiciais, muitas delas ocupadas, já há muitos anos, por respondentes interinos, em direta e inaceitável afronta ao que disposto no art. 236, § 3º, da Constituição Federal. 4. Nesse primeiro exame, tudo indica que a autoridade requerida agiu no estrito cumprimento do que disposto nos arts. 5º e 26 da Lei Federal 8.935/1994, que veda a acumulação dos serviços que especifica. Ressalva para o fato de que o concurso público em andamento não poderá abranger cargos ou serventias que não tenham sido prévia e regularmente criadas por lei estadual. 5. Medida cautelar indeferida.
(ADI 4140 MC, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Tribunal Pleno, julgado em 27/11/2008, DJe-071 DIVULG 16-04-2009 PUBLIC 17-04-2009 EMENT VOL-02356-02 PP-00227)