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A incidência da multa do art. 475-J do Código de Processo Civil na execução provisória de título judicial.

Panorama atual e perspectivas diante do anteprojeto do novo Código de Processo Civil

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Agenda 28/03/2011 às 14:16

Resumo

A presente pesquisa busca a compreensão da aplicabilidade ou não da multa do art. 475-J do Código de Processo Civil nas execuções provisórias. Para tanto, a partir dos dispositivos legais e dos variados entendimentos doutrinários, discorrer-se-á sobre o escopo da execução provisória no processo e a natureza jurídica da multa do art. 475-J, como fundamento para embasar uma análise crítica e sistemática dos argumentos do Superior Tribunal de Justiça, a fim de revelar a real finalidade da multa e suas implicações no processo. Por fim, o tema será avaliado a partir do anteprojeto do novo Código de Processo Civil, no intento de se demonstrar que, caso aprovado em sua totalidade, mencionado diploma tende a pacificar a questão atualmente controvertida.

Palavras-chave: Execução provisória. Multa. Art. 475-J. Cabimento. Anteprojeto do novo Código de Processo Civil.


1. INTRODUÇÃO

A lei 11.232/2005, que integra um grande conjunto de reformas legislativas calcadas na celeridade e efetividade do processo, trouxe grandes inovações para o Código de Processo Civil. Dentre elas, a previsão da incidência de multa no caso de descumprimento da decisão judicial, descrita no art. 475-J do CPC.

O presente estudo consiste em avaliar se esta multa incide nas sentenças sujeitas a execução provisória e, para tanto, mister se faz a compreensão do instituto da execução provisória e seu escopo no processo, além da definição da natureza jurídica da multa e sua interpretação à luz das atuais reformas do Código de Processo Civil.

Será analisada a atual jurisprudência do STJ sobre o tema, de modo a sistematizar os fundamentos ali adotados e tecer comentários críticos no intento de avaliar sua compatibilidade com a real finalidade da multa e suas implicações no processo.

Ademais, considerando o fato de estar-se diante de um contexto de elaboração de um novo diploma processual civil, a questão será considerada, ainda, sob a ótica do anteprojeto do novo Código de Processo Civil que, a princípio, propõe solução para a controvérsia.


2. DESENVOLVIMENTO

2.1 Sistemática da Execução Provisória no Código de Processo Civil

O Código de Processo Civil define como título executivo judicial, "a sentença proferida no processo civil que reconheça a existência de obrigação de fazer, não fazer, entregar coisa ou pagar quantia" (art. 475-N, I, CPC). Assim, diferentemente da sentença penal condenatória, que só pode ser executada após o trânsito em julgado, a sentença civil comporta a denominada execução provisória, ou seja, execução de decisão sobre a qual ainda não se operou a coisa julgada.

Em que pese a importância do caráter definitivo e indiscutível da decisão judicial, que se atinge com a superveniência do trânsito em julgado, a execução provisória se faz possível ante o entendimento de que, em certas situações excepcionais, "seria mais prejudicial o retardamento da execução do que o risco de se alterar o conteúdo da sentença com o reflexo sobre a situação de fato decorrente dos atos executivos"(THEODORO JR., 2010, pág. 82). Dinamarco (2003, p. 255) completa a idéia afirmando que, na nova sistemática, a execução provisória passou a conter um sistema de certezas, probabilidades e riscos, cabendo ao legislador e ao julgador dimensionar as probabilidades e os riscos de acerto, sem abandonar a possibilidade de reparação de eventuais erros.

O teor das reformas, paulatinamente introduzidas no Código de Processo Civil, desde 1994, revela, portanto, o movimento de relativização de certezas em prol da efetividade demonstrando, no tema ora estudado, o escopo de conferir à execução provisória "maior abrangência e eficácia, de molde a permitir que o exeqüente possa realmente, de regra sob caução, receber o bem da vida que o julgamento lhe reconheceu ou atribuiu." (WAMBIER, 2006, pg. 405).

Inicialmente, cumpre asseverar a divergência quanto à própria nomenclatura do instituto, visto que, para muitos autores, dentre eles Assis (2007, p. 142), o termo "execução provisória" nada esclarece a respeito de sua natureza jurídica. A crítica advém do fato de que a execução provisória, em si, não se difere da definitiva, como preceitua o art. 475-O, CPC, sendo a provisoriedade característica pura do título sentencial e não da execução.

Assim sendo, pode-se afirmar que a execução provisória importa em verdadeiro adiantamento da execução que se opera enquanto pendente o julgamento do recurso dotado de efeito meramente devolutivo.

Sua previsão é constitucional, visto que, via de regra, a sentença produz seus efeitos desde a publicação e, uma vez não sendo suspensa por efeito de interposição de recurso, está apta a ser executada e produzir as suas conseqüências no mundo dos fatos. Ademais, tal mecanismo importa em conferir efetividade à tutela jurisdicional, propiciando a satisfação do crédito reconhecido na sentença sem descuidar das garantias a que tem direito o réu, no caso de provimento do seu recurso.

A execução provisória está prevista no art. 475-O do Código de Processo Civil e se processa nos seguintes moldes:

Art. 475- O: A execução provisória far-se-á, no que couber, do mesmo modo que a definitiva, observada as seguintes normas:

I- corre por iniciativa, conta e responsabilidade do exeqüente, que se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os danos que o executado haja sofrido;

II- fica sem efeito, sobrevindo acórdão que modifique ou anule a sentença objeto da execução, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidados eventuais prejuízos nos mesmos autos, por arbitramento;

III- o levantamento de depósito em dinheiro e a prática de atos que importem alienação de propriedade ou dos quais possa resultar grave dano ao executado dependem de caução suficiente e idônea, arbitrada de plano pelo juiz e prestada nos próprios autos.

§1º No caso do inciso II deste artigo, se a sentença provisória for modificada ou anulada apenas em parte, somente nesta ficará sem efeito a execução.

§2º A caução a que se refere o inciso III do "caput" deste artigo poderá ser dispensada:

I- quando, nos casos de crédito de natureza alimentar ou decorrente de ato ilícito, até o limite de sessenta vezes o valor do salário mínimo, o exeqüente demonstrar situação de necessidade;

II- nos casos de execução provisória, em que penda agravo de instrumento junto ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça (art. 544), salvo quando da dispensa possa manifestamente resultar risco de grave dano, de difícil ou incerta reparação.

§3º Ao requerer a execução provisória, o exeqüente instruirá a petição com cópias autenticadas das seguintes peças do processo, podendo o advogado valer-se do disposto na parte final do art. 544, §1º:

I- sentença ou acórdão exeqüendo;

II- certidão de interposição do recurso não dotado de efeito suspensivo;

III- procurações outorgadas pelas partes;

IV- decisão de habilitação, se for o caso;

V- facultativamente, outras peças processuais que o exeqüente considere necessárias.

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Por conseguinte, pode-se verificar que, diferentemente do que ocorre no direito alemão, onde a execução provisória é a regra e independe de manifestação da parte, no direito brasileiro, para sua configuração, é indispensável iniciativa da parte credora, já que ela é quem assume todos os riscos de reparar os danos causados ao executado se, posteriormente, houver reforma da sentença exeqüenda.

Além disso, é requisito a demonstração da existência de decisão impugnada mediante recurso não dotado de efeito suspensivo (art. 475, I, §1º, CPC), e a prestação de caução, no caso de levantamento de dinheiro, alienação de bens e outras hipóteses capazes de gerar dano ao executado.

O requerimento inicial da execução provisória poderá ser realizado tão logo tenha havido a interposição de recurso não dotado de efeito suspensivo ou quando emitido o pronunciamento do relator quanto aos efeitos em que será recebido o recurso.

A expressão "no que couber" contida no "caput" do art. 475-O, CPC, abre campo para as discussões pertinentes ao cabimento ou não da multa prevista no art. 475-J, CPC, visto que, para muitos, a ausência do trânsito em julgado da decisão é fator que afasta a sua incidência, sendo, portanto, uma exceção à regra da execução nos moldes da execução de sentença definitiva. Para outros, referida expressão apenas visa compatibilizar os procedimentos da execução definitiva com aqueles específicos da provisória, qual seja, relativo à prestação de caução pelo credor.


2.2 A multa do art. 475-J do Código de Processo Civil

O art. 475-J dispõe acerca do cumprimento de sentença que condena em obrigação de pagar, nos seguintes termos:

Art. 475 – J – Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze (15) dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação (BRASIL, 1973).

Nota-se que mencionado artigo, nem no "caput", nem nos seus parágrafos, excepciona a sua aplicação quando for o caso de execução provisória.

No tocante a sua natureza jurídica, há autores que defendem que sua função precípua é a de "mera remuneração moratória" (THEODORO JÚNIOR, 2010, p. 49). Desta forma, seria uma pena imputada àqueles que, condenados a pagar quantia certa, não o fazem nos quinze dias seguintes, como previsto em lei. Nesse sentido, Oliveira (2008, p. 107) defende que o caráter da multa é exclusivamente penitencial e que, apesar de induzir o devedor ao pagamento, não possui essa função precípua, tanto é que seu valor é fixo e proporcional ao da obrigação.

Por outro lado, contrapondo o entendimento acima, há autores, dentre eles Bueno (2006, pg. 97), que entendem que sua função é predominantemente coercitiva e não sancionatória, vez que sua utilização se caracteriza como mecanismo pelo qual se busca obter a efetividade do comando judicial, estimulando o cumprimento espontâneo da obrigação.

Esta última posição é a que se defende no presente trabalho, já que, por óbvio a imposição de multa pelo descumprimento da sentença visa primeiramente agir na vontade do devedor, compelindo-o a cumprir com sua obrigação. Sua natureza sancionatória vem a posteriori, como efeito reflexo, quando do seu efetivo descumprimento. O fato de seu valor ser fixo e aplicável automaticamente, uma única vez, por força da lei, não retira seu principal objetivo, qual seja, coagir o devedor a pagar.


2.3. Atual jurisprudência sobre o tema

O atual posicionamento do Superior Tribunal de Justiça, tem por base, principalmente, o Recurso Especial nº 1.100.658-SP (2008/0236605-3), Relator Ministro Humberto Martins1, que tem servido de referência para o julgamento de outros casos com este objeto. Neste julgado, entendeu-se, por unanimidade, ser inaplicável a multa do 475-J, CPC, à execução provisória. Os fundamentos da decisão foram diversos e podem ser enumerados nos seguintes argumentos:

1) o art. 475-J se utiliza do termo "condenado"e numa interpretação gramatical, enquanto o recurso estiver pendente, não deve o litigante ser compelido a pagar multa por descumprimento da sentença, pois, ante a possibilidade de reforma da decisão, ele ainda não se enquadra no termo aludido.

2) é o próprio ordenamento jurídico quem garante os meios recursais pertinentes e, assim, sendo, a parte não pode ser punida por se valer desse instrumento processual.

No voto do Recurso supra mencionado, o relator embasa seu posicionamento nos escritos de Sidney Palharini Júnior, segundo o qual:

Não se pode fechar os olhos à condição determinada pela lei para a incidência da multa, mais precisamente, para o início da contagem do prazo para pagamento sob pena de incidência de multa, qual seja a situação de condenado do devedor.

O alcance dessa expressão está inserido na abrangência do conceito do devido processo legal, estando a interpretação que pretendemos, portanto, embasada em preceitos constitucionais cogentes.

Com efeito, dispõe a Constituição Federal: 'Art. 5.º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal; LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes'.

Ao litigante, portanto, é assegurada a ampla defesa com os meios e recursos a ela inerentes em respeito ao devido processo legal. Desse modo, ao devedor condenado é permitido utilizar-se os instrumentos de impugnação que a lei lhe faculta. Ao final, mantida a condenação ou não, com o trânsito em julgado da sentença, estará o título executivo judicial definitivamente formalizado, sob o crivo do devido processo legal.

Enquanto pender recurso, independentemente dos efeitos de que seja dotado, não se pode dizer, à luz do devido processo legal, que há condenado, ante a possibilidade de reforma do título capaz de ensejar execução provisória.

Com isso não se está a dizer que a Constituição Federal aboliu a execução provisória, e sim que o litigante será tido por condenado somente com o trânsito em julgado da sentença.

Ao exigir o art. 475-J que o devedor esteja condenado, acabou por limitar a possibilidade de incidência da multa em questão somente às hipóteses de execução definitiva, uma vez que, antes do trânsito em julgado da sentença, não há que se falar que o devedor esteja, efetivamente, condenado, considerando-se a abrangência do conceito do devido processo legal. (Sidney Palharini Júnior. Algumas reflexões sobre a multa do art. 475-J do CPC. In: Execução civil: estudos em homenagem ao professor Humberto Theodoro Júnior. São Paulo: RT, 2007, pp. 274-275.)

Nesses dois primeiros pontos verifica-se que tais argumentos atacam, irreversivelmente, a própria existência da execução provisória e por si, não possuem o condão de afastar a aplicação da multa do 475-J, CPC.

Primeiramente, porque é pacífico que o termo "condenado" diz respeito ao sujeito contra o qual foi proferida sentença, reconhecendo a obrigação de pagar quantia, de entregar coisa e de fazer ou não fazer. Este singelo conceito coincide com o adotado pelo art. 475-N, CPC, para definir o primeiro tipo de título executivo judicial, para o qual não se exige o trânsito em julgado.

Considerando a constitucionalidade da execução provisória, seria concebível conferi-la senão aquele que foi condenado em primeiro ou segundo grau de jurisdição? Imediatamente a resposta será negativa, uma vez que a exeqüibilidade da sentença depende de um comando jurisdicional de cunho condenatório e, não isso só não basta, é necessário que os demais requisitos do título estejam presentes.

Em que pese a previsão de recurso cabível, uma vez ocorrida a condenação em primeiro grau, o sujeito é sim "condenado", e não existe outra palavra para enquadrá-lo, não o sendo em definitivo, já que, em segunda instância ou nos tribunais superiores, poderá ser mantido ou não o provimento condenatório.

Porém, há que se ressaltar que o art. 475-J, CPC, não exige a condenação definitiva do devedor, mas tão somente a sua condenação. Ora, se a lei não é boa, ela deve ser alterada, mas não isso deve servir de justificativa para seu descumprimento.

É certo que, se o próprio ordenamento prevê exeqüibilidade da sentença, inobstante não haver ocorrido seu trânsito em julgado, nada afasta a aplicação dos métodos de constrição patrimonial legalmente previstos e, sequer, a aplicação de multa pelo descumprimento do comando sentencial passível de execução. Nesse sentido, leciona Pontes de Miranda (2002, pg. 308):

No direito brasileiro, não se permite que o juiz imprima ou deixe de imprimir força executória ou efeito executório ao título. A executividade da sentença provém da lei, que atende à natureza da sentença (...). Princípio da executividade por lei.

Uma vez determinado pela lei que a execução provisória observará os moldes da definitiva e não restando qualquer restrição quanto à imposição da multa, deve ser esta aplicada pelo julgador e exigida plenamente pela parte interessada.

Com isso, não há negativa ao devido processo legal, mas, pelo contrário, está-se diante da estrita observância do comando normativo. Tal comando não veda nem pune o condenado por utilizar-se dos meios recursais previsto, mas sim, visa a preservação dos efeitos da sentença, já que, uma vez não estando suspensa, deve ser cumprida.

Por tal ótica, a multa do art. 475-J, CPC, corrobora exatamente o intuito de obter este cumprimento, imprimindo maior efetividade ao comando judicial.

Ademais, ao final do processo, havendo êxito no recurso interposto, o executado resgatará todo o valor pago, inclusive aquele depositado à título de multa.

3) o art. 475-J, CPC, se utiliza da expressão "pagamento", que corresponde à modalidade de extinção de obrigação e esse adimplemento voluntário seria incompatível com o ato de recorrer, consoante o art. 503, CPC. E ainda que, na execução provisória, não se estaria diante de um "pagamento", mas sim de segurança do juízo, sendo este seu objetivo primordial.

O entendimento colegiado baseou-se nas lições de Pedro da Silva Camargo, Fredie Didier Jr. e Daniele Andrade:

Boa parcela da doutrina afirma ainda ser cabível a incidência da multa do art. 475-J em execução provisória de sentença - ou melhor, em execução fundada em título provisório -, sem contudo justificar tal entendimento. Ocorre que nesse caso há uma incompatibilidade insuperável a impedir a imposição de multa nesse caso: de um lado, na execução provisória o devedor não realiza o pagamento da dívida, com imediata transferência de titularidade do dinheiro, mas apenas a garantia do juízo (ainda que eventualmente o credor possa levantar o dinheiro, com ou sem caução); e, do outro lado, a multa do art. 475-J visa estimular o pagamento definitivo do credor e não apenas a garantia do juízo. Assim, apenas quando houver trânsito em julgado daquela condenação provisoriamente executada é que o devedor-condenado terá o prazo de 15 para pagar a dívida, sob pena de multa. Vale dizer, se na execução provisória houver sido penhorado algum bem que não seja o próprio dinheiro, então ao transitar em julgado a sentença condenatória caberá ao devedor pagar sua dívida no prazo legal, sob pena de multa: (Pedro da Silva Camargo. A polêmica multa do art. 475-J. In: Aspectos polêmicos da nova execução 3. São Paulo: RT, 2006, pp. 413/414.).(CAMARGO apud BRASIL, 2009)

O pagamento do valor correspondente ao crédito caracteriza, sim, aceitação tácita da decisão, por ser ato incompatível com a vontade de recorrer (art. 503, parágrafo único, do CPC), acarretando a inadmissibilidade do recurso manejado. É uma nítida hipótese de preclusão lógica. (Fredie Didier Jr. e Daniele Andrade. Execução provisória e a multa do art. 475-J. In: Aspectos polêmicos da nova execução 3. São Paulo: RT, 2006, p.205.).( DIDIER JR.; ANDRADE, apud BRASIL, 2009)

O argumento é respeitável, e, tendo em vista que a questão não é de simples elucidação, deve ser analisado em consonância com os demais temas que circundam a matéria.

Assim, uma vez necessária a utilização de métodos interpretativos da norma, devem ser adotados aqueles que, de alguma forma, a compatibilizem com o ordenamento ao qual ela se insere.

Ocorre que, para compatibilizar o art. 475-O com os moldes da execução definitiva e, ainda, com o recentíssimo posicionamento da Corte Especial do STJ2 quanto o início da contagem do prazo da multa do 475-J, deve-se observar o seguinte:

a) Se o condenado recorreu, ainda que sem a obtenção de efeito suspensivo, por óbvio, manifesta é sua irresignação com a decisão proferida;

b) Claro perceber que, como a execução provisória corre a conta e risco do credor, cumprirá a ele, na peça inaugural da execução provisória, apresentar a planilha de cálculos atualizada do valor da condenação e requer a ciência do devedor para pagar em quinze dias sob pena de incidência da multa do 475-J e demais efeitos executórios. Nada impede, no entanto, que o credor opte por somente requerer a intimação do devedor do quantum devido, a ser pago sob pena da multa, sem requerer os atos de execução. Nessa hipótese, caso não haja o cumprimento espontâneo, a critério do credor, será instaurada fase executiva, onde a multa, automaticamente aplicada, poderá ser exigida;

c) Uma vez intimado, o pagamento da quantia devida, passa a ser direito do condenado, vistas a se resguardar do pagamento da multa e também de custas e honorários advindos dos atos inerentes à fase executiva (MOREIRA, 2007, pg. 196). Não implica automaticamente em concordância com o conteúdo da sentença.

Isso porque, o art. 503, parágrafo único, CPC, preconiza que a aceitação tácita da sentença se caracteriza pela prática, sem reserva alguma, de ato incompatível com a vontade de recorrer. Verificando sistematicamente o que fora construído até o momento, percebe-se que o executado já recorreu e está sofrendo a execução provisória da sentença. Sua discordância da sentença é manifesta, já o pagamento da obrigação contida no comando sentencial nada mais significa do que obediência ao seu dever de "cumprir com exatidão os provimentos mandamentais e não criar embaraços à efetivação dos provimentos judiciais, de natureza antecipatória ou final." estatuído no art. 14, CPC.

d) Posteriormente, caberá ao juiz deferir ou não o levantamento da quantia pelo credor, exigindo-se, via de regra, a prestação de caução idônea;

E ainda, ao contrário do afirmado pelos respeitados autores acima citados no julgado ora em análise, a finalidade da execução provisória não é a garantia do juízo, mas sim a satisfação da obrigação devida, ou seja, do pagamento de quantia certa, sendo que, seu levantamento pelo credor é que exige a garantia do juízo, para que, mesmo no caso de reversão do provimento final, não haja prejuízo a nenhuma das partes.

Assim, em que pese o respeitável entendimento do Superior Tribunal de Justiça a respeito da matéria, seus fundamentos não demonstram a congruência lógica com conclusão obtida, já que pelos mesmos fundamentos processuais e constitucionais aludidos, pode-se defender a aplicação da multa do 475-J à execução provisória.

Aparentemente, repita-se, é utilizada a negativa da execução provisória como um todo para justificar a inaplicabilidade da multa, o que, ante o escopo de celeridade e efetividade do processo, é inaceitável.

Tanto o é que a matéria persiste divergente, inclusive no Superior Tribunal de Justiça, onde se verifica entendimentos posteriores ao da segunda turma, supra analisado, favoráveis a aplicação da multa na execução provisória.

Sobre a autora
Flávia Hunzicker Vannucci

Advogada na área cível em Belo Horizonte; Graduada em Direito pela PUC-Minas; Especialista em Direito Processual Civil pelo IEC/PUC-Minas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VANNUCCI, Flávia Hunzicker. A incidência da multa do art. 475-J do Código de Processo Civil na execução provisória de título judicial.: Panorama atual e perspectivas diante do anteprojeto do novo Código de Processo Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2826, 28 mar. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18778. Acesso em: 18 nov. 2024.

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