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Acidentes do trabalho: repercussões previdenciárias e trabalhistas

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Agenda 25/04/2011 às 12:06

4.CONSEQUÊNCIAS DO ACIDENTE DO TRABALHO NA RELAÇÃO DE EMPREGO

A constatação de que a incapacidade laboral do empregado decorreu de acidente do trabalho ou de doença ocupacional ou profissional gera consequências na relação de emprego causando obrigações para a empresa ou empregador a ela equiparado. Por isso, em determinados casos, há certa hesitação do empregador em formalizar a comunicação de acidente de trabalho à Previdência Social, razão pela qual a Lei 11.430/2006 criou o Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário - NTEP.

4.1 Estabilidade acidentária

Talvez a mais conhecida conseqüência da incapacidade oriunda de acidentes do trabalho seja a estabilidade provisória introduzida pelo art. 118 da Lei 8.213/91. Trata-se de hipótese específica de garantia de emprego assegurada por meio de lei ordinária com fundamento no princípio da norma mais benéfica, não havendo que se falar em inconstitucionalidade em face do disposto no art. 7º, inc. I, da Constituição Federal.

Art. 118. O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente.

A garantia do seguro contra acidentes de trabalho (auxílio-doença acidentário, auxílio-acidente e aposentadoria por invalidez acidentária) é restrita aos segurados empregados e avulsos, excluído o doméstico, além do segurado especial.

Assim é que a estabilidade do art. 118 da Lei nº 8.213/91, a Justiça do Trabalho vem reconhecendo o direito aos segurados empregados que tenham sido demitidos nesse período:

ACIDENTE DO TRABALHO. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ART. 118 DA LEI 8.213/91. Caso em que, após a emissão da Comunicação de Acidente do Trabalho pelo sindicato da categoria profissional do reclamante, este gozou regularmente do benefício de auxílio-doença acidentário, inexistindo nos autos qualquer elemento de prova que contrarie a ocorrência do infortúnio. Mantida a sentença que reconheceu o direito do reclamante ao recebimento de indenização relativa ao período da garantia de emprego prevista no artigo 118 da Lei 8.213/91. [14]

A garantia de emprego de que trata o art. 118 da Lei nº 8.213/91 alcançará todas as espécies de acidentes de trabalho relacionados neste diploma legal, inclusive os acidentes de trajeto. Estes, a rigor, não geram direito à indenização civil pelo empregador, exceto se demonstrar culpa da empresa. Contudo, para fins de garantia de emprego, o acidente in itinere se equipara aos demais.

O assunto é controvertido quando se trata da aplicação da referida estabilidade nos contratos por prazo determinado. Maurício Godinho Delgado [15] admite a excepcional hipótese, mas na jurisprudência ainda não há consenso, conforme se vê dos arestos a seguir:

CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. A fruição de auxílio-doença acidentário suspende a eficácia do contrato de experiência enquanto perdurar o benefício previdenciário, devendo o empregado, após a cessação, cumprir o restante, até o limite legal de noventa dias, não havendo falar em conversão tácita em contrato por prazo indeterminado. O contrato de experiência não comporta também a estabilidade prevista no art. 118 da Lei 8213/91. Nega-se provimento.  (...) [16]

ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ACIDENTE DE TRABALHO. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. A estabilidade prevista no art. 118 da Lei nº. 8.213/91 é compatível com o contrato de trabalho a prazo determinado, devendo este ser prorrogado por força do acidente do trabalho. Desta forma, protege-se o empregado para que tenha recuperação plena após o acidente, privilegiando-se o direito fundamental a dignidade da pessoa humana - art. 1º, inciso III, da Constituição Federal. [17]

"É incompatível com a garantia de emprego a que alude o art. 118 da Lei nº 8.213/91 com o contrato a prazo, notadamente o contrato de experiência, porque a garantia de emprego pressupõe a proteção da continuidade do vínculo de emprego, nos contratos por prazo indeterminado". [18]

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A Súmula 378 do TST estabeleceu os pressupostos para a concessão da estabilidade:

SUM-378    ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ACIDENTE DO TRABALHO. ART. 118 DA LEI Nº 8.213/1991. CONSTITUCIONALIDADE. PRESSUPOSTOS

I - É constitucional o artigo 118 da Lei nº 8.213/1991 que assegura o direito à estabilidade provisória por período de 12 meses após a cessação do auxílio-doença ao empregado acidentado.

II - São pressupostos para a concessão da estabilidade o afastamento superior a 15 dias e a conseqüente percepção do auxílio-doença acidentário, salvo se constatada, após a despedida, doença profissional que guarde relação de causalidade com a execução do contrato de emprego.

De acordo com a CLT, "o empregado que for aposentado por invalidez terá suspenso o seu contrato de trabalho durante o prazo fixado pelas leis de previdência social para a efetivação do benefício" (art. 475, caput). Nos termos dos parágrafos do mencionado dispositivo, a Lei consolidada ainda prevê que:

§1º Recuperando o empregado a capacidade de trabalho e sendo a aposentadoria cancelada, ser-lhe-á assegurado o direito à função que ocupava ao tempo da aposentadoria, facultado, porém, ao empregador, o direito de indenizá-lo por rescisão do contrato de trabalho, nos termos dos arts. 477 e 478, salvo na hipótese de ser ele portador de estabilidade, quando a indenização deverá ser paga na forma do art. 497.

§2º Se o empregador houver admitido substituto para o aposentado, poderá rescindir, com este, o respectivo contrato de trabalho sem indenização, desde que tenha havido ciência inequívoca da interinidade ao ser celebrado o contrato.

Portanto, na aposentadoria por invalidez fica suspenso o contrato de trabalho, eis que, atualmente, o referido benefício previdenciário não é definitivo. De acordo com a Súmula 160 do TST, "cancelada a aposentadoria por invalidez, mesmo após cinco anos, o trabalhador terá direito de retornar ao emprego, facultado, porém, ao empregador, indenizá-lo na forma da lei". Portanto, resta superado entendimento exarado na Súmula 217 do STF [19], não devendo mais prevalecer a posição do Supremo.

4.2 Outras consequências na relação de emprego

Além da conhecida estabilidade acidentária vista acima, há outras consequências na relação de emprego advindas da incapacidade do empregado em face do reconhecimento de causa ligada ao trabalho.

De acordo com o art. 4º, parágrafo único da CLT, todo o período de afastamento por motivo de acidente do trabalho é considerado na contagem do tempo de serviço, sendo devidos os respectivos depósitos do FGTS (art. 15, §5º, da Lei 8.036/1990).

Além disso, não é considerada falta ao serviço, para efeito do direito de aquisição das férias, a ausência do empregado por motivo de acidente do trabalho (art. 131, inc. III, da CLT). No entanto, não terá direito a férias o empregado que, no curso do período aquisitivo, tiver percebido da Previdência Social prestações de acidente do trabalho por mais de seis meses, ainda que descontínuos (art. 133, inc. IV, da CLT).

Portanto, nos benefícios relacionados a acidentes do trabalho e doenças ocupacionais, o tempo de serviço é computado para todos os efeitos. Assim é que a tendência da doutrina majoritária considera que, "no acidente do trabalho, até o 15º dia de afastamento, tem-se a hipótese de interrupção do contrato de trabalho; a partir do 16º dia, observa-se uma suspensão sui generis do pacto laboral" [20].


5.SOBRE O NEXO TÉCNICO EPIDEMIOLÓGICO PREVIDENCIÁRIO

Quando o trabalhador estiver afastado do trabalho em função de causas ligadas direta ou indiretamente ao desempenho de sua função, seja por acidente de trabalho ou por doenças ocupacionais, o segurado fará jus ao percebimento de auxílio-doença acidentário ou de aposentadoria por invalidez. Nesse caso, é obrigação do empregador emitir a CAT – Comunicação de Acidente do Trabalho reconhecendo a natureza acidentária da incapacidade.

Entretanto, é comum ao empregador hesitar em emitir a CAT não só pelo ônus que isso pode lhe representar à luz da legislação trabalhista e previdenciária, mas também pela insegurança que rege a matéria em face de sua relativa complexidade. Tal fato resulta em evidente prejuízo ao trabalhador que muita vezes acaba por receber auxílio-doença previdenciário (B31) quando deveria ter sido amparado pela prestação acidentária (B91). Na realidade, atualmente não há diferença de valores entre os dois benefícios ocorrendo que, na prática, o empregado não dê importância imediata a esta distinção. Entretanto, a diferença entre as espécies B31 e B91 ocorre nas conseqüências que surgem para a relação de emprego, como visto anteriormente.

De modo a corrigir essa distorção, a Medida Provisória nº 316, de 11 de agosto de 2006, posteriormente convertida na Lei nº 11.430/2006, introduziu o art. 21-A na Lei nº 8.213/1991 que dispõe o seguinte:

Art. 21-A.  A perícia médica do INSS considerará caracterizada a natureza acidentária da incapacidade quando constatar ocorrência de nexo técnico epidemiológico entre o trabalho e o agravo, decorrente da relação entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade elencada na Classificação Internacional de Doenças - CID, em conformidade com o que dispuser o regulamento. 

§1º  A perícia médica do INSS deixará de aplicar o disposto neste artigo quando demonstrada a inexistência do nexo de que trata o caput deste artigo.

§2º  A empresa poderá requerer a não aplicação do nexo técnico epidemiológico, de cuja decisão caberá recurso com efeito suspensivo, da empresa ou do segurado, ao Conselho de Recursos da Previdência Social.

O Nexo Técnico Epidemiológico Previdenciário – NTEP permite o reconhecimento pelo INSS da incapacidade como sendo derivada do trabalho através da simples correlação entre a atividade econômica da empresa e a doença ocupacional manifestada pelo segurado. Como se sabe, os riscos ambientais do trabalho são classificados pela atividade econômica desenvolvida pela empresa conforme apontado pela Classificação Nacional das Atividades Econômicas - CNAE. Esse critério será utilizado para se verificar o nexo epidemiológico, ou seja, quando houver estatística significativa da associação entre o código da Classificação Internacional de Doenças-CID, e o da Classificação Nacional de Atividade Econômica-CNAE.

Trata-se de presunção relativa favorável ao trabalhador na medida em que estabelece a correlação entre a atividade da empresa e a entidade mórbida motivadora da incapacidade. O empregado não pode ser prejudicado diante da inércia da empresa que, ademais, sempre é quem assume o risco da atividade econômica (art. 2.º da CLT). Nesse sentido, é o teor do Enunciado 42, aprovado na 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, ocorrida no Tribunal Superior do Trabalho, em 23 de novembro de 2007:

"Acidente de trabalho. Nexo técnico epidemiológico. Presume-se a ocorrência de acidente de trabalho, mesmo sem a emissão da CAT – Comunicação de Acidente de Trabalho, quando houver nexo técnico epidemiológico conforme art. 21-A da Lei 8.213/1991".

O NTEP permite abandonar o CAT como único instrumento de informação no caso dos acidentes de trabalho. Com isso, verificada a existência do referido nexo técnico epidemiológico, não cabe mais ao empregado (segurado) provar ou demonstrar que a doença foi produzida ou desencadeada pelo exercício do trabalho peculiar a determinada atividade, ou que a doença foi adquirida ou desencadeada em função de condições especiais em que o trabalho é realizado e com ele se relacione diretamente. Presente o nexo técnico epidemiológico, a presunção é de se tratar de doença do trabalho ou profissional.

Em todo o caso, a empresa poderá discordar do enquadramento feito pela perícia médica mediante a demonstração de inexistência de nexo entre o trabalho e o agravo apresentado (art. 337, §7.º, RPS). Nesse caso, a empresa deverá apresentar as provas com que pretende demonstrar a inexistência de nexo entre o trabalho e o agravo podendo utilizar-se de laudos periciais, rol das CAT’s emitidas, mapeamento de riscos e sinistros, exames e outros. O segurado deverá ser informado sobre a contestação da empresa para, querendo, impugná-la.

Em que pese ter sido ajuizada ação direta de inconstitucionalidade perante o STF a esse respeito (ADI 3.931), ainda sem julgamento, não há que se falar em inconstitucionalidade do nexo técnico epidemiológico. Não se verifica, como se alegou, qualquer violação da liberdade profissional do médico, podendo o profissional afastar a aplicação do nexo mediante justificação fundamentada da ausência de liame entre a doença e o trabalho desenvolvido. Além disso, o nexo técnico epidemiológico gera apenas presunção relativa (juris tantum) da natureza ocupacional, podendo ser afastada pela empresa mediante prova em contrário.

Nesse aspecto, o NTEP pode contribuir significativamente para a fixação do índice do Fator Acidentário de Prevenção - FAP previsto como critério de redução ou incremento da alíquota da contribuição previdenciária devida a título de Seguro de Acidente de Trabalho – SAT. De acordo com o art. 10 da Lei nº 10.666/2006, o Poder Executivo poderá aumentar a alíquota do SAT em até cem por cento caso a empresa não atenda às expectativas de investimentos em prevenção e controle de acidentes do trabalho. De outro lado, poderá reduzir em até cinqüenta por cento as referidas alíquotas de acordo com os resultados positivos obtidos pelo estabelecimento em matéria de medicina e segurança do trabalho. O NTEP previsto no art. 21-A da Lei nº 8.213/91 tem influência direta no cálculo do FAP, pois permite a fixação da doença como decorrente do trabalho, a partir da vinculação a certas atividades econômicas.

Por fim, como alude Fábio Zambitte Ibrahim, "o NTEP insere-se na tentativa de resolução desta desordem gerencial ocorrida no âmbito dos órgãos públicos responsáveis pela fiscalização do ambiente de trabalho e pode contribuir na real fixação da contribuição patronal de acordo com os acidentes gerados" [21].

5 Ação regressiva do INSS em face do empregador

O art. 120 da Lei nº 8.213/92 prevê que, nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho, existe a possibilidade de o INSS propor ação regressiva contra os responsáveis para se restituir dos valores gastos nos benefícios pagos. Ora, o fato de a empresa contribuir solidariamente no financiamento do SAT não exclui sua responsabilidade previdenciária quando gerar benefícios pagos pela Previdência Social em razão de sua má conduta.

Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.

Nesse sentido, Gustavo Filipe Barbosa Garcia afirma que: "a perícia médica do INSS, quando constatar indícios de culpa ou dolo por parte do empregador, em relação aos benefícios por incapacidade concedidos, deverá oficiar à Procuradoria Federal Especializada – INSS, subsidiando-a com evidências e demais meios de prova colhidos, notadamente quanto aos programas de gerenciamento de riscos ocupacionais, para as providências cabíveis, inclusive para ajuizamento de ação regressiva contra os responsáveis, conforme previsto nos arts. 120 e 121 da Lei 8.213/91, de modo a possibilitar o ressarcimento à Previdência Social do pagamento de benefícios por morte ou por incapacidade, permanente ou temporária" [22].

Com efeito, Fernando Maciel anota que "ocorrido um acidente de trabalho por culpa dos empregadores, culpabilidade representada pelo descumprimento de alguma norma protetiva da saúde e segurança dos trabalhadores, bem como sobrevindo a implementação de alguma prestação social por parte do INSS, essa autarquia poderá voltar-se regressivamente contra o verdadeiro causador do dano, cobrando-lhe a integralidade dos gastos suportados" [23].

A pretensão ressarcitória do INSS em face do empregador ocorre nas hipóteses de culpa, aí incluída a inobservância das normas de higiene e segurança do trabalho. Mesmo que o art. 120 da Lei 8.213/91 refira-se apenas à negligência, a culpabilidade deve ser interpretada em caráter lato sensu, abrangendo eventuais condutas dolosas e outras modalidades de culpa em sentido estrito. Deve se observar que constitui contravenção penal, punível com multa, deixar a empresa de cumprir as normas de segurança e higiene do trabalho (art. 19, §2º, da Lei 8.213/91).

Discute-se a respeito da competência para o ajuizamento da ação regressiva acidentária por parte do INSS em face do empregador relapso. São três as correntes acerca da questão, a que confere competência à Justiça Federal, a que entende ser competente a Justiça comum Estadual, e a que – por força da EC n º 45/2004 – atribui competência à Justiça do Trabalho para julgar as ações . Em face do princípio da unidade de convicção e da especialidade da Justiça do Trabalho no que diz respeito ao cumprimento das normas de segurança e higiene do trabalho, bem como nos termos da Súmula 736 do STF [24], nos filiamos à ultima corrente.

Sobre o autor
Átila Da Rold Roesler

Procurador federal da Advocacia-Geral da União, especialista em Direito Processual Civil, autor do livro Execução Civil - Aspectos Destacados (Editora Juruá, 2007), ex-Delegado de Polí­cia Civil do Estado do Paraná.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROESLER, Átila Rold. Acidentes do trabalho: repercussões previdenciárias e trabalhistas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2854, 25 abr. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18965. Acesso em: 19 nov. 2024.

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