Sumário: 1. (In) Justiça em números. 2. A execução de sentença provisória do art. 475-O do CPC. 3. Aplicação do art. 475-O do CPC no processo do trabalho. 4. Especifidades da execução de sentença provisória no processo do trabalho. 4.1. Instauração ex officio. 4.2. Penhora em dinheiro. 4.3. Dispensa de caução. 5. A execução de sentença provisória na pendência das diversas espécies recursais. 5.1. Pendência de recurso extraordinário ou de agravo de instrumento para admiti-lo. 5.2 Pendência de recurso de agravo de instrumento em recurso de revista. 5.3. Pendência de recurso ordinário ou de agravo de instrumento para destrancá-lo. 5.4. Pendência de recurso interposto em face de decisão proferida na execução. 6. Execução de sentença provisória de obrigação de fazer. 7. Inexigibilidade da multa do art. 475-J do CPC na execução de sentença provisória. 8. Referências.
1. (IN) JUSTIÇA EM NÚMEROS
O direito à tutela jurisdicional efetiva (CF, art. 5º, XXXV) foi reforçado pelo direito à razoável duração do processo e aos meios que garantam a celeridade de sua tramitação (CF, art. 5º, LXXVIII). No processo do trabalho, o tema da tutela jurisdicional efetiva assume contornos dramáticos e complexos e o maior desafio reside na falta de efetividade da execução trabalhista.
Segundo o relatório Justiça em Números do Conselho Nacional de Justiça, para o ano de 2009, na Justiça do Trabalho existiam 1.972.784 execuções pendentes (excluídos precatórios e RPV´s). Em toda a Justiça do Trabalho, o relatório indicou que a Meta 2 foi alcançada, com o julgamento de todos os processos na fase de conhecimento até dezembro de 2005. Mostrou, entretanto, que nas varas há um congestionamento de 66,8% na fase de execução, 78% maior em comparação à fase conhecimento. Em relação aos números de 2008, houve aumento da taxa de congestionamento na fase de execução, que era de 59,6%.
A baixa produtividade na fase de execução decorre de múltiplas razões: o direito do trabalho, em regra, não se cumpre espontaneamente; a execução é real e sua concretização exige atos materiais de transferência patrimonial do executado para o exequente; negligenciamento teórico e jurisdicional em relação à fase de execução. Isso tudo, aliado a outros fatores, faz com que a maioria das execuções não tenha solução. Daí falar-se em execuções frutíferas ou infrutíferas, execuções possíveis ou impossíveis e execuções prováveis ou improváveis.
Geralmente figuram como executados micros e pequenas empresas, que possuem duração frágil e fugaz e na hora da execução frequentemente não há bens ou pelo menos suficiência de bens para garantir o crédito trabalhista. Assim, depois de uma luta de vários anos, percorrendo instâncias e esperando a solução de recursos, o trabalhador vê seu direito perder-se nas mãos da burocracia e da ineficiência do aparelho jurisdicional.
Nesse cenário, resulta indispensável potencializar a execução de sentença provisória como instrumento de efetividade da execução trabalhista. Isso implica a necessidade de conferir eficácia prática às sentenças, de modo que possa produzir resultados concretos. Por certo, não se defende a eliminação total dos recursos, na medida em que a solução reside em conciliar os valores da duração razoável, para que se preste à atividade jurisdicional em tempo útil, e a segurança das partes, para garantir o direito aos recursos.
O grande problema, portanto, está na distribuição do tempo do processo igualmente entre as partes. Recorrer e restringir são valores que informam o processo contemporâneo. Saber dosá-los num tempo razoável constitui sua principal missão. Portanto, nem a irrecorribilidade absoluta nem a recorribilidade plena, mas um razoável equilíbrio, que balanceie o direito da parte de tentar corrigir o suposto erro que viu na sentença e o direito do vencedor de receber aquilo que lhe foi reconhecido, garantindo a imediata, plena e efetiva prestação jurisdicional (SILVA, 2007, p. 20-25).
Objetivando distribuir de forma equânime o tempo de duração do processo, permitindo igualmente a interposição do recurso e a produção de efeitos da sentença, foi instituída a execução de sentença provisória. Destarte, surge a possibilidade de dar consequências jurídicas ao provimento jurisdicional mediante a convocação do executado para cumprir a sentença, ainda que pendente de recurso, posto que "o tempo deve ser repartido, no curso do procedimento, de acordo com o índice de probabilidade de que o autor tenha direito ao bem disputado" (MARINONI, 1999, p. 26-27).
Destaca-se então a execução de sentença provisória regulada pelo art. 475-0 do CPC. Na observação de Luciano Athayde Chaves (2007, p. 49), "Na Justiça do Trabalho, onde a legislação admite a execução provisória somente até a penhora (art. 899, caput da CLT), as normas do Código, que deverão ser adotadas por supletividade, dão um alento à jurisdição executiva, que poderá avançar um pouco mais". Este o objeto central da exposição, com análise crítica da jurisprudência atual do Tribunal Superior do Trabalho.
2. A EXECUÇÃO DE SENTENÇA PROVISÓRIA DO ART. 475-O DO CPC
No processo, se não há recursos, obtém-se a coisa julgada e encerra-se a controvérsia, iniciando-se a fase de cumprimento da decisão. Mas se há recurso, surge o problema dos efeitos da decisão. Para conciliar o problema, os sistemas processuais consagram os efeitos devolutivo e suspensivo dos recursos. Efeito devolutivo tem todo recurso, pois devolve à instância ad quem a decisão impugnada. No suspensivo, não se atribui nenhum efeito, ou seja, nada se executa. A cosia litigiosa "aguarda" a decisão da instância superior (SILVA, 2007, p. 26-27).
O que caracteriza a execução de sentença provisória é uma certa presunção em favor do direito do autor, podendo este promover a execução sob certas limitações. O réu não sofrerá a execução definitiva, pois a situação, enquanto pender recurso, pode ser modificada. Entre a execução definitiva e a provisória, procura-se um balanceamento. A execução provisória dá efeito à decisão, mas sem submeter o réu a uma execução sem o trânsito em julgado da decisão (SILVA, 2007, p. 28-33).
Nesse aspecto, impende reconhecer que:
não existe diferença ontológica entre execução provisória e a definitiva, tendo em vista que a provisoriedade é do título executivo e não do procedimento executivo. O fato de a decisão judicial poder sofrer algum tipo de reforma pelos tribunais é que determina o caráter não definitivo da execução. (CORDEIRO, 2009, p. 858) [01].
Portanto, ambas se processam de maneira idêntica, divergindo apenas na natureza do título.
Diz o art. 475-I, § 1º, do CPC: "É definitiva a execução da sentença transitada em julgado e provisória quando se tratar de sentença impugnada mediante recurso ao qual não foi atribuído efeito suspensivo". Já o art. 587, do CPC, dispõe: "É definitiva a execução fundada em título extrajudicial; é provisória enquanto pendente apelação da sentença de improcedência dos embargos do executado, quando recebidos com efeito suspensivo (art. 739)."
Assim, não há execução definitiva se pende recurso; e não há qualquer diferença entre as execuções provisórias por motivo de distinção entre os recursos: recurso de efeito suspensivo, nenhuma execução; recurso sem efeito suspensivo, permitida, não obstante e apenas, a execução provisória. Parece claro então que a execução provisória não é execução contrária ao Direito. Faz-se segundo a norma processual adequada. E existe em todos os sistemas processuais. (SILVA, 2007, p. 31).
Com a Lei nº 10.444/02, a execução de sentença provisória no processo comum já havia sido substancialmente aperfeiçoada. A Lei nº 11.232/05, além de aprofundar ainda mais o instituto, reformou profundamente o processo de execução, modificando o próprio conceito de sentença e instituindo o processo sincrético [02]. Com o art. 475-O do CPC, o microssistema de execução de sentença provisória ficou assim estruturado:
Art. 475-O. A execução provisória da sentença far-se-á, no que couber, do mesmo modo que a definitiva, observadas as seguintes normas:
I – corre por iniciativa, conta e responsabilidade do exeqüente, que se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os danos que o executado haja sofrido;
II – fica sem efeito, sobrevindo acórdão que modifique ou anule a sentença objeto da execução, restituindo-se as partes ao estado anterior e liquidados eventuais prejuízos nos mesmos autos, por arbitramento;
III – o levantamento de depósito em dinheiro e a prática de atos que importem alienação de propriedade ou dos quais possa resultar grave dano ao executado dependem de caução suficiente e idônea, arbitrada de plano pelo juiz e prestada nos próprios autos.
§ 1º No caso do inciso II do caput deste artigo, se a sentença provisória for modificada ou anulada apenas em parte, somente nesta ficará sem efeito a execução.
§ 2º A caução a que se refere o inciso III do caput deste artigo poderá ser dispensada:
I – quando, nos casos de crédito de natureza alimentar ou decorrente de ato ilícito, até o limite de sessenta vezes o valor do salário-mínimo, o exeqüente demonstrar situação de necessidade;
II – nos casos de execução provisória em que penda agravo de instrumento junto ao Supremo Tribunal Federal ou ao Superior Tribunal de Justiça (art. 544), salvo quando da dispensa possa manifestamente resultar risco de grave dano, de difícil ou incerta reparação.
3. APLICAÇÃO DO ART. 475-O DO CPC NO PROCESSO DO TRABALHO
A aplicação no processo do trabalho do disposto no art. 475-O do CPC não apenas é possível, como se impõe como meio de fortalecimento da efetividade da execução trabalhista. O dispositivo aprofundou ainda mais a execução de sentença provisória, permitindo atos alienatórios e levantamento de dinheiro até mesmo sem caução. Esse microssistema mais se justifica no processo do trabalho, pois representa importante instrumento para minimizar o efeito da interposição de recursos meramente protelatórios e assim dá exequilibilidade imediata à decisão, permitindo ao trabalhador o acesso ao crédito alimentar.
No processo do trabalho, o art. 899 da CLT diz que os recursos "terão efeito meramente devolutivo", acrescentando ser "permitida a execução provisória até a penhora". Portanto, não excluiu a executividade, mas limitou-a até a penhora (SILVA, 2007, p. 34). A expressão "até a penhora", no entanto, não "estabelece um limite intransponível para a continuidade do procedimento executório" (CORDEIRO, 2009, p. 856). Isso porque a expressão "teve apenas a finalidade de esclarecer o conteúdo da execução provisória e a impossibilidade, na época, de permitir a prática de atos de transferência patrimonial". (CORDEIRO, 2009, p. 858).
Na contemporaneidade, a limitação desaparece diante do marco normativo do processo comum, aplicável subsidiariamente em face da configuração de lacuna axiológica ou ideológica, que "surge da superação, pelos valores sociais, da forma de solução encontrada pela norma positiva". Portanto, possível a supressão dessas lacunas, através da interpretação integrativa, de modo que o processo do trabalho possa incorporar as normas do processo comum, preservados, no entanto, seu perfil peculiar e as especificidades dos seus elementos típicos. (FAVA, 2010, p. 70-75).
Nesse sentido, o Enunciado 69 da 1ª Jornada de Direito Material e Processual na Justiça do Trabalho, realizada no Tribunal Superior do Trabalho entre 21 e 23 de novembro de 2007:
ENUNCIADO 69. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. APLICABILIDADE DO ART. 475-O DO CPC NO PROCESSO DO TRABALHO. I- A expressão "...até a penhora..." constante da Consolidação das Leis do Trabalho, art. 899, é meramente referencial e não limita a execução provisória no âmbito do direito processual do trabalho, sendo plenamente aplicável o disposto no Código de Processo Civil, art. 475-O. II " Na execução provisória trabalhista é admissível a penhora de dinheiro, mesmo que indicados outros bens. Adequação do postulado da execução menos gravosa ao executado aos princípios da razoável duração do processo e da efetividade. III "É possível a liberação de valores em execução provisória, desde que verificada alguma das hipóteses do artigo 475-O, §2º, do Código de Processo Civil, sempre que o recurso interposto esteja em contrariedade com Súmula ou Orientação Jurisprudencial, bem como na pendência de agravo de instrumento no TST. Grifo nosso.
A aplicabilidade da execução de sentença provisória do processo comum foi reafirmada na Jornada Nacional sobre Execução na Justiça do Trabalho, promovida pela ANAMATRA – Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho, realizada entre 24 e 26 de novembro, na cidade de Cuiabá – MT. O enunciado 22 assim dispõe:
1. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. ARTIGO 475-O DO CÓDIGO DO PROCESSO CIVIL (CPC). APLICABILIDADE AO PROCESSO DO TRABALHO. FORMA DE MINIMIZAR O EFEITO DA INTERPOSIÇÃO DE RECURSOS MERAMENTE PROTELATÓRIOS E CONCEDER AO AUTOR PARTE DE SEU CRÉDITO, QUE POSSUI NATUREZA ALIMENTAR. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) é omissa no tocante à possibilidade de liberação de créditos ao exeqüente em fase de execução provisória, sendo plenamente aplicável o art. 475-O do CPC, o qual torna aquela mais eficaz, atingindo a finalidade do processo social, diminuindo os efeitos negativos da interposição de recursos meramente protelatórios pela parte contrária, satisfazendo o crédito alimentar. 2. O art. 475-O do CPC aplica-se subsidiariamente ao Processo do Trabalho.
Portanto, a execução de sentença provisória do processo comum pode perfeitamente ser transportada para o processo do trabalho, embora com os ajustes necessários, pois completa a execução provisória trabalhista, aperfeiçoando-a para torná-la um instrumento a serviço da maior efetividade da execução. Essa compatibilidade é reconhecida pelo TST no seguinte precedente:
RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. ART. 475-O DO CPC. COMPATIBILIDADE COM O PROCESSO DO TRABALHO. A regra e o princípio constitucionais da razoável duração do processo e da efetividade da jurisdição (art. 5º, LXXVIII, CF) tornam compatíveis com o processo do trabalho os novos dispositivos processuais civis favorecedores da célere, eficiente e efetiva prestação jurisdicional, tal como o recente art. 475-O do CPC reformado. Em par com essa fonte constitucional inovadora e heurística (por sí só bastante), o artigo 475-O do CPC é de aplicabilidade no processo do trabalho em face do permissivo contido no art. 769 da CLT e também porque a natureza do crédito trabalhista se compatibiliza com normas de índole protetiva que busquem o aperfeiçoamento dos procedimentos executivos, com o objetivo de se alcançar de forma efetiva a satisfação dos créditos reconhecidos judicialmente. A finalidade social da norma é inquestionável, possibilitando a diminuição do impacto sofrido pelo trabalhador que é dispensado sem a percepção de todos os direitos adquiridos ao longo do pacto laboral e é impedido de obter recursos financeiros para suprir necessidades básicas em virtude das várias medidas processuais disponibilizadas às partes, que permitem seja protelado o pagamento das verbas deferidas em juízo. A absorção , pelo processo do trabalho, das regras processuais civis, naquilo que tornam a execução mais rápida e eficaz, tem respaldo ainda em outro texto constitucional que, no art. 100, § 1º-A, reconhece expressamente a natureza alimentar dos créditos trabalhistas. Nesse sentido, é nítida a harmonia entre a norma contida no art. 475-O do CPC e o sistema processual trabalhista especializado. Recurso de revista não conhecido.
(Processo: RR - 163640-69.2008.5.03.0139 Data de Julgamento: 04/08/2010, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 13/08/2010). Grifo nosso.
Majoritariamente o TST entende inaplicável, conforme precedente abaixo:
(...) EXECUÇÃO PROVISÓRIA - APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA AO PROCESSO DO TRABALHO DO ARTIGO 475-O DO CPC - NÃO CABIMENTO - INTELIGÊNCIA DOS ARTIGOS 769 E 899 DA CLT. I - É lugar comum na doutrina e na jurisprudência que, para aplicação subsidiária do Processo Civil ao Processo do Trabalho, a teor do artigo 769 da CLT, é imprescindível não haver no âmbito do processo trabalhista norma específica que regule determinada situação que o seja naquele, e mesmo assim desde que a norma alienígena guarde compatibilidade com a sua estrutura procedimental. II - Nesse sentido, observa-se do artigo 899, caput, da CLT disposição expressa de os recursos terem efeito meramente devolutivo, permitida a execução provisória até a penhora, indicativa de que, ultimada a constrição judicial, não há margem para o prosseguimento de atos de expropriação, quer os que impliquem a deflagração da alienação judicial do bem que o tenha sido, quer os que envolvam a liberação de eventual depósito em dinheiro. III - Traga-se ainda à colação o teor cogente do § 1º do artigo 899 da CLT, segundo o qual, no caso de a condenação corresponder a 10 vezes o salário mínimo regional, os recursos interponíveis o devem ser mediante o recolhimento da respectiva importância, a qual, no entanto, só será liberada a favor da parte vencedora por simples despacho do juiz, após o trânsito em julgado da decisão recorrida. IV - Diante desse expressivo conjunto normativo, revela-se juridicamente inviável cogitar-se da aplicação subsidiária do artigo 475-O e seus parágrafos do CPC. Nem mesmo ao fundamento de ser importante - que a jurisprudência trabalhista cristalize e absorva - antes que seja consumida pela poeira do tempo - tudo aquilo que seja moderno e eficaz...-. V - É que o intuito de imprimir celeridade à execução trabalhista não pode se contrapor aos preceitos legais que a regulam, a fim de se prevenir a indesejável consequência de ela convolar-se numa ordem jurídica fragmentada e desconexa, inteiramente descompromissada com o novo paradigma do Direito do Trabalho, que se irradia para o Processo do Trabalho, de preservação da empresa como fonte de renda e de emprego.
(Processo: RR - 124300-79.2007.5.03.0131 Data de Julgamento: 10/11/2010, Relator Ministro: Antônio José de Barros Levenhagen, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 19/11/2010.). Grifo nosso.
A tese da inaplicabilidade do art. 475-O do CPC tem sido sistematicamente reiterada pelo TST. No último julgamento sobre a matéria, ocorrido em 17 de fevereiro de 2011, proferido nos E-ED-RR-34500-47.2007.5.03.0064, relatora ministra Maria Cristina Peduzzi, foi reafirmado o entendimento de que a execução de sentença provisória possui disciplina própria no âmbito do processo do trabalho – o artigo 899 da CLT -, que limita a execução provisória à penhora, excluindo, assim, a legislação processual civil. A decisão da SDI-I reformou o acórdão regional no ponto em que facultou ao exequente levantar, do depósito que existe nos autos, quantia até 60 salários mínimos. O julgamento foi por maioria, com a divergência aberta pelo ministro Augusto César Leite de Carvalho.
4. ESPECIFIDADES DA EXECUÇÃO DE SENTENÇA PROVISÓRIA NO PROCESSO DO TRABALHO
4.1. Instauração ex officio
No processo civil, a execução depende de iniciativa da parte interessada, não sendo possível a instauração ex officio pelo juiz (CPC, art. 475-O, I). No processo do trabalho, por força dos arts. 879 e 878, que estabelecem a iniciativa do juiz para o procedimento de liquidação e também para o procedimento de execução, a execução de sentença provisória deve ser instaurada ex officio [03]. Reforça essa possibilidade a natureza inquisitorial do processo do trabalho, em que os juízos "terão ampla liberdade na direção do processo e velarão pelo andamento rápido das causas" (CLT, art. 765).
O art. 475-O, I, do CPC, pelo qual "corre por iniciativa, conta e responsabilidade do exeqüente, que se obriga, se a sentença for reformada, a reparar os danos que o executado haja sofrido" não se impõe como óbice à execução ex officio de sentença provisória. Portanto, independentemente de qualquer requerimento da parte, devem ser iniciados de ofício os atos executórios. Não sendo o caso de formação de autos apartados, a execução ex officio não demanda formalidades. Sendo a hipótese de formação de autos apartados, cabe à Secretaria tomar a iniciativa, extraindo as peças necessárias (CPC, art. 475-0, § 3º) [04]. Como geralmente o reclamante goza dos benefícios da justiça gratuita, a despesa correrá por conta da União.
O TST parece admitir a execução provisória ex officio, ao dispor que "[...] o ordenamento jurídico brasileiro resguarda ao magistrado o poder de promover, de ofício, a execução provisória do julgado. Recurso de revista não conhecido. [...] (Processo: RR - 147840-85.2007.5.23.0007 Data de Julgamento: 10/06/2009, Relator Ministro: Aloysio Corrêa da Veiga, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 19/06/2009).
A instituição de ofício da execução de sentença provisória foi admitida na Jornada Nacional sobre Execução na Justiça do Trabalho, nos termos do Enunciado 15:
EXECUÇÃO PROVISÓRIA. INSTAURAÇÃO DE OFÍCIO. A execução provisória poderá ser instaurada de ofício na pendência de agravo de instrumento interposto contra decisão denegatória de recurso de revista.
4.2. Penhora em dinheiro
A jurisprudência do TST fixou-se na vedação de penhora em dinheiro quando se tratar de execução de sentença ainda pendente de recurso, ao estabelecer na Súmula 417, item III, que "Em se tratando de execução provisória, fere direito líquido e certo do impetrante a determinação de penhora em dinheiro, quando nomeados outros bens à penhora, pois o executado tem direito a que a execução se processe da forma que lhe seja menos gravosa, nos termos do art. 620 do CPC."
Esse tem sido o maior entrave à aplicação no processo do trabalho do art. 475-O do CPC. Afirma-se com fundadas razões que a súmula provocou o aniquilamento da execução provisória na Justiça do Trabalho. De fato, vários argumentos demonstram o equívoco da súmula: inexiste diferença ontológica entre execução de sentença definitiva e provisória; a lei estabelece o rol de preferências do art. 655 do CPC; há apenas um momento processual para a penhora, não se fazendo nova penhora com o trânsito em julgado da decisão; a dívida trabalhista deveria ocupar lugar privilegiado na hierarquização das obrigações do devedor. (FAVA, 2010).
Ademais, o item III da Súmula 417 do TST, aprovada pela Resolução nº 137, publicada no DJ de 22, 23 e 24.08.2005, encontra-se superado pelo art. 475-O do CPC, instituído com a reforma da Lei nº 11.232, de 22.12.2005. A tese da superação da jurisprudência sumulada do TST prevaleceu nos debates realizados durante a Jornada Nacional sobre Execução na Justiça do Trabalho promovida pela ANAMATRA. Eis o teor do Enunciado 21:
EXECUÇÃO PROVISÓRIA. PENHORA EM DINHEIRO. POSSIBILIDADE. É válida a penhora de dinheiro na execução provisória, inclusive por meio do Bacen Jud. A Súmula nº 417, item III, do Tribunal Superior do Trabalho (TST), está superada pelo art. 475-O do Código de Processo Civil (CPC).
No mesmo sentido:
MANDADO DE SEGURANÇA. PENHORA ON LINE. EXECUÇÃO PROVISÓRIA. POSSIBILIDADE. Não fere direito líquido e certo a determinação judicial de bloqueio on line para penhora em dinheiro (Sistema BACEN-JUD). A observância da ordem gradativa estabelecida no art. 655 do CPC (art. 882, CLT) emerge como matéria de ordem pública, de observância obrigatória pelas partes e magistrado, ainda quando se trate de execução provisória. A garantia do devedor no sentido do processamento da execução menos onerosa não possui força de subverter, por si só, todo um procedimento contemplado em lei não sujeito aos interesses das partes, mas sim da necessidade de se dar cumprimento aos princípios da celeridade e economia processual. Da mesma forma que existe preceito legal amparando o devedor (art. 620, do CPC) há também o que ressalva os interesses do credor (art. 612 do CPC), o qual determina que a realização/efetivação da execução seja processada no interesse do credor. O item III da Súmula 417 do TST encontra-se superado pelo novel art. 475-O, acrescido ao CPC pelo art. 4º da Lei nº 11.232, de 22 de dezembro de 2005, segundo o qual mesmo em execução provisória, é admissível o levantamento de dinheiro sob certas condições. Nesse sentido, decisão do próprio TST (AIRR-2161/2006-138-03-41.3 - 1ª Turma do TST. Relator: Ministro Lélio Bentes Corrêa. Publicação: DEJT 17/04/2009). Se é admissível o levantamento em dinheiro, admissível é também a penhora de dinheiro ainda que em execução provisória.
(MS 00079-2009-000-22-00-5, Rel. Des. Arnaldo Boson Paes, TRT da 22ª Região, Tribunal Pleno, julgado em 15/7/2009, DJT 5/8/2009). Grifo nosso.
4.3. Dispensa de caução
De acordo com o art. 475-O, III, do CPC, sujeitam-se à caução os seguintes atos: a) o levantamento em dinheiro; b) a prática de atos que importem alienação de propriedade; e c) atos dos quais possa resultar grave dano ao executado. A caução deve ser: a ) suficiente e idônea; b) arbitrada pelo juiz; e c) prestada nos autos. Por sua vez, dispõe o §2º que a caução pode ser dispensada: " I – quando, nos casos de crédito de natureza alimentar ou decorrente de ato ilícito, até o limite de sessenta vezes o valor do salário mínimo – o exeqüente demonstrar situação de necessidade".
Além da natureza alimentar do crédito e sua proveniência de ato ilícito, há duas condições para a dispensa da caução: a) uma, de natureza meramente quantitativa, fixada discricionariamente pelo legislador: 60 salários mínimos; b) outra, de natureza subjetiva, diz respeito à pessoa do exequente, a quem a lei atribuiu o ônus de provar "situação de necessidade" para poder levantar a quantia. No tocante à situação de necessidade, não deve o juiz exigir prova robusta dessa circunstância, sendo suficiente meros indícios e evidências da situação de necessidade.
Logo, até 60 salários mínimos a prestação jurisdicional é definitiva. O exeqüente recebe o valor ou pode praticar atos alienatórios para apurá-lo. A execução continua seu curso e não deixa de ser provisória. Só que a provisoriedade consistirá na possibilidade de o exequente ter de devolver a quantia que recebeu. Assim, se houver penhora em dinheiro, o juiz autorizará o levantamento da quantia até 60 salários mínimos. Se não for feita em dinheiro, autorizará os atos expropriatórios para obtê-la. Havendo reversão da decisão, as partes serão restituídas ao estado anterior, apurando-se os prejuízos nos próprios autos, seguindo-se os atos executórios (CPC, art. 475-0, II).
No tocante ao argumento que o executado jamais receberá de volta a quantia levantada no caso de provimento do recurso, esse aspecto não obsta a liberação de valores. A vontade do legislador foi equilibrar entre as partes os riscos do processo. Se o empregador corre o risco de não receber de volta o dinheiro levantado, também corre idêntico risco o empregado de nunca ter o dinheiro quando a execução se prolonga e a empresa desaparece, resultando em execuções infrutíferas, em que os autos vão para o arquivo provisório e de lá seguem para o arquivo definitivo sem nenhum resultado efetivo para o trabalhador.